O pescador profissional artesanal que exerça a sua atividade em rio que sofreu alteração da fauna
aquática após a regular instalação de hidrelétrica (ato lícito) - adotadas todas as providências
mitigatórias de impacto ambiental para a realização da obra, bem como realizado EIA/RIMA - não tem
direito a ser compensado por alegados danos morais decorrentes da diminuição ou desaparecimento de
peixes de espécies comercialmente lucrativas paralelamente ao surgimento de outros de espécies de
menor valor de mercado, circunstância que, embora não tenha ocasionado a suspensão da pesca,
imporia a captura de maior volume de pescado para manutenção de sua renda próxima à auferida antes
da modificação da ictiofauna. Tratando-se de ato lícito, a indenização em análise não teria por base o princípio
da responsabilidade. Sua justificativa seria compensar o sacrifício do direito ou legítimo interesse individual em
prol da vantagem conferida à coletividade, não tendo como escopo desestimular o comportamento do agente
causador do fato danoso. Além disso, é óbvio que a atividade administrativa presume-se pautada pelo interesse
público, preponderante sobre o particular, e, portanto, não deve ser desencorajada. Diversamente, em se
tratando de ato ilícito, como é o caso de acidente ambiental causador de poluição, a condenação do poluidor não
apenas ao pagamento de indenização plena pelos danos materiais, incluídos os lucros cessantes, mas também
de indenização por dano moral, atende à finalidade preventiva de incentivar no futuro comportamento mais
cuidadoso do agente. Segundo a doutrina, "no caso da compensação de danos morais decorrentes de dano
ambiental, a função preventiva essencial da responsabilidade civil é a eliminação de fatores capazes de produzir
riscos intoleráveis". Na hipótese em foco, não há possibilidade de eliminação dos fatores que invariavelmente
levam à alteração do estoque pesqueiro do reservatório formado em decorrência da barragem. Isso porque a
alteração da fauna aquática é inerente à construção de usinas hidrelétricas. Necessariamente, com o
represamento do rio, as condições ambientais passam a ser propícias a espécies de peixes sedentárias ou de
pouca movimentação, de médio e pequeno porte, e desfavoráveis às espécies tipicamente migradoras, de maior
porte. Ademais, na hipótese em análise, a regularidade e o interesse público da atuação da concessionária não
é alvo de questionamento, tendo em vista que a concessionária providenciou o EIA/RIMA e cumpriu
satisfatoriamente todas as condicionantes, inclusive propiciando a recomposição do meio ambiente com a
introdução de espécies de peixes mais adaptadas à vida no lago da hidrelétrica. Além disso, não houve
suspensão, em momento algum, da atividade pesqueira, ao contrário do que ocorre em situações de poluição
causada por desastre ambiental, durante o período necessário à recuperação do meio ambiente. A simples
necessidade de adaptação às novas condições da atividade pesqueira - composto o dano patrimonial - não gera
dano moral autônomo indenizável. Convém assinalar que a alteração do meio ambiente não se enquadra, por si
só, como poluição (Lei n. 6.938/1981, art. 3º, III). Tratar como poluição qualquer alteração ambiental que afete a
biota implicaria, na prática, por exemplo, o impedimento à atividade produtiva agropecuária e inviabilizaria a
construção de hidrelétricas, por maiores e mais eficazes que fossem as condicionantes ambientais e os
benefícios ao interesse público. Desse modo, nestas circunstâncias, estabelecer a condenação por dano moral,
a qual, em última análise, onerará o contrato de concessão, com reflexos nos custos do empreendimento, a ser
arcado indiretamente por toda a sociedade, representaria negar a supremacia do interesse público e da
destinação social da propriedade. REsp 1.371.834-PR, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 5/11/2015,
DJe 14/12/2015.
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