sábado, 18 de maio de 2024

"Vícios de construção - ... - Aplicação no caso em exame do prazo prescricional de 10 (dez) anos previsto no artigo 205 do Código Civil, que deve ser contado a partir do conhecimento dos vícios pelos adquirentes, vícios estes antes ocultos"

 


"PRESCRIÇÃO - Prazo - Termo inicial - Ação cominatória e indenizatória - Vícios de construção - Argumenta o Município réu que a pretensão dos autores estaria prescrita diante do transcurso de 9 (nove) anos desde a entrega do conjunto habitacional, já decorrido o prazo prescricional de 5 (cinco) anos previsto no Decreto nº 20.910/1932 - Insubsistência - Aplicação no caso em exame do prazo prescricional de 10 (dez) anos previsto no artigo 205 do Código Civil, que deve ser contado a partir do conhecimento dos vícios pelos adquirentes, vícios estes antes ocultos - Prescrição inocorrente - Preliminar rejeitada". (Apelação Cível n. 1000122-38.2018.8.26.0172 - Eldorado - 1ª Câmara de Direito Privado - Relator: Alexandre Marcondes - 04/10/2023 - 30754 - Unânime)

sexta-feira, 17 de maio de 2024

"É vedada a pactuação da cláusula del credere nos contratos de agência ou distribuição por aproximação"

 


Processo

REsp 1.784.914-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 30/4/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO EMPRESARIAL

Tema

Contratos de colaboração empresarial. Contrato de agência ou distribuição por aproximação. Contrato típico. Disciplina geral. Código civil. Princípio da especialidade. Lei n. 4.886/1965. Norma especial. Cláusula del credere. Vedação legal. Art. 698 do CC/2002. Analogia. Impossibilidade.

DESTAQUE

É vedada a pactuação da cláusula del credere nos contratos de agência ou distribuição por aproximação.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A controvérsia cinge-se em saber se no contrato de agência ou distribuição por aproximação seria admissível a pactuação da cláusula del credere, pacto pelo qual o colaborador assume a responsabilidade pela solvência da pessoa com quem contratar em nome do fornecedor, na forma dos arts. 688 e 721 do Código Civil.

O contrato em discussão foi qualificado no primeiro grau de jurisdição como contrato de agência e pelo Tribunal de origem como contrato de distribuição por aproximação. A consequência inicial desta categorização é a de que, a despeito da divergência terminológica, se cuida de um contrato socialmente típico, disciplinado pelo Código Civil e, naquilo que for compatível, com a legislação especial, a Lei n. 4.886/1965.

Tal conclusão é inescapável, na medida em que o novo Código Civil conferiu ao provecto contrato de representação comercial a nova denominação de contrato de agência, alinhando-se à terminologia majoritariamente adotada pela legislação estrangeira.

Acerca da disciplina legal, prevê o art. 721 do Código Civil: "Aplicam-se ao contrato de agência e distribuição, no que couber, as regras concernentes ao mandato e à comissão e as constantes de lei especial". Assim, a novel disciplina instituída pelo estatuto civil não afasta a incidência das normas especiais que não forem substancialmente incompatíveis com a última regulamentação.

Nesse sentido, o critério para a solução da antinomia no caso em questão decorre da aplicação do princípio da especialidade, de modo que a incompatibilidade normativa se soluciona pela aplicação da norma que contém elementos especializantes, subtraindo do espectro normativo da norma geral a aplicação em virtude de determinados critérios que são especiais. Sendo assim, concorrerão, naquilo que forem compatíveis, as disposições do Código Civil e da Lei de Representação Comercial - Lei n. 4.886/1965.

Os doze artigos do Código Civil que tratam dos contratos de agência e distribuição por aproximação não se ocupam, em nenhuma passagem, da cláusula del credere - pacto a ser inserto no contrato e pelo qual o colaborador assume a responsabilidade pela solvência da pessoa com quem contratar em nome do fornecedor, tornando-se solidariamente responsável. Contudo, há disposição no art. 43 da Lei n. 4.886/1965 estabelecendo que "é vedada no contrato de representação comercial a inclusão de cláusulas del credere".

Dessa forma, constituindo a vedação à cláusula del credere nos contratos de agência ou distribuição por aproximação disposição veiculada por legislação especial compatível com a posterior disciplina introduzida por norma geral, infere-se que se mantém no ordenamento jurídico a proibição da disposição contratual que transforme o agente solidariamente responsável pela adimplência do contratante.

Ademais, descabe cogitar em aplicação analógica no art. 698 do Código Civil, que estabelece que, se do contrato de comissão constar a cláusula del credere, responderá o comissário solidariamente com as pessoas com que houver tratado em nome do comitente, caso em que, salvo estipulação em contrário, o comissário tem direito a remuneração mais elevada, para compensar o ônus assumido. Com efeito, não há falar-se em omissão legislativa que tenha o condão de autorizar a aplicação da analogia pelo simples motivo de que existe norma especial que regula integralmente a questão.

quinta-feira, 16 de maio de 2024

"Comete ato ilícito, por abuso de direito, o órgão de imprensa que, apesar de divulgar fato verídico e sem a indicação de dados objetivos quanto aos partícipes do fato, relaciona a notícia à manchete de caráter manifestamente ofensivo à honra da vítima de crime de estupro de vulnerável, atribuindo à adolescente conduta ativa ante o fato ocorrido, trazendo menções injuriosas a sua honra"

 


QUARTA TURMA
Processo

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Tema
 

Estupro de vulnerável. Divulgação de matéria jornalística em site de notícias. Texto que relata fatos verídicos. Manchete que induz o leitor a atribuir conduta ativa à vítima menor de idade. Conteúdo manifestamente ofensivo. Ato ilícito. Ocorrência. Responsabilidade civil caracterizada.

DESTAQUE

Comete ato ilícito, por abuso de direito, o órgão de imprensa que, apesar de divulgar fato verídico e sem a indicação de dados objetivos quanto aos partícipes do fato, relaciona a notícia à manchete de caráter manifestamente ofensivo à honra da vítima de crime de estupro de vulnerável, atribuindo à adolescente conduta ativa ante o fato ocorrido, trazendo menções injuriosas a sua honra.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Cinge-se a controvérsia em definir se constitui ato ilícito, atribuível a órgão de imprensa, a publicação, em site de notícias, de matéria jornalística que traz em seu bojo relato de um crime de estupro de vulnerável, sem a indicação de dados objetivos quantos aos partícipes do fato, mas que atrela a narrativa do ocorrido a uma manchete de cunho sensacionalista, capaz de colocar em dúvida a conduta moral da vítima por ocasião dos fatos noticiados.

Esta Corte Superior tem reiteradamente assentado que "a liberdade de expressão, compreendendo a informação, opinião e crítica jornalística, por não ser absoluta, encontra algumas limitações ao seu exercício, compatíveis com o regime democrático, quais sejam: (I) o compromisso ético com a informação verossímil; (II) a preservação dos chamados direitos da personalidade, entre os quais incluem-se os direitos à honra, à imagem, à privacidade e à intimidade; e (III) a vedação de veiculação de crítica jornalística com intuito de difamar, injuriar ou caluniar a pessoa (animus injuriandi vel diffamandi)" (REsp n. 801.109/DF, Relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 12/6/2012, DJe de 12/3/2013).

Comete ato ilícito, por abuso de direito, o órgão de imprensa que, apesar de divulgar fato verídico, relaciona a notícia à manchete de caráter manifestamente ofensivo à honra da vítima de crime de estupro de vulnerável, atribuindo à adolescente conduta ativa ante o fato ocorrido, trazendo menções injuriosas a sua honra.

Os cuidados a serem dispensados pelos órgãos de imprensa, quando da divulgação de notícias envolvendo menores de idade, devem ser redobrados, face ao dever imposto a toda sociedade de zelar pelos direitos e o bem-estar da pessoa em desenvolvimento (arts. 16 e 17 do ECA).

Ainda que a notícia não contenha dados objetivos que possam identificar a vítima ao público em geral, é evidente, contudo, que ela própria e aqueles que circundam seus relacionamentos mais próximos têm conhecimento de que os fatos ofensivos lhe foram atribuídos, ressaindo daí dano psíquico-psicológico decorrente dos termos infamantes contidos na chamada da matéria, sobretudo por se cuidar a ofendida de menor de idade e por ter a manchete denotado a ideia de que a menor fora a responsável pelo episódio.

Nesse sentido, a posterior retratação do órgão de imprensa é irrelevante porquanto já consumado o dano moral à vítima da veiculação da notícia. Assim, a responsabilidade civil deve ser reconhecida, face à junção de todos os seus elementos: ato ilícito cometido por abuso de direito aliado ao nexo de causalidade entre o agir e o dano moral impingido.

quarta-feira, 15 de maio de 2024

"Embora a jurisprudência do STJ reconheça a legitimidade do filho para suscitar em embargos de terceiro a impenhorabilidade do bem de família em que reside, isso não pode ser usado para, por via transversa, modificar decisão que já rechaçou a impenhorabilidade do referido bem"

 


Processo

AgInt no REsp 2.104.283-SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 4/3/2024, DJe 6/3/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Embargos de terceiro opostos pelo filho dos executados para desconstituir a penhora do imóvel em que reside de titularidade dos pais. Alegação de impenhorabilidade de bem de família. Pretensão já negada em exceção de pré-executividade apresentada pela mãe, coexecutada. Impossibilidade. Penhora de bem do fiador. Súmula n. 549/STJ. Possibilidade.

DESTAQUE

Embora a jurisprudência do STJ reconheça a legitimidade do filho para suscitar em embargos de terceiro a impenhorabilidade do bem de família em que reside, isso não pode ser usado para, por via transversa, modificar decisão que já rechaçou a impenhorabilidade do referido bem.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Cinge-se a controvérsia à possibilidade de se rediscutir, em embargos de terceiros opostos pelo filho dos executados, a (im)penhorabilidade de bem de família já analisada em exceção de pré-executividade ajuizada pela coexecutada.

O filho tem legitimidade para suscitar em embargos de terceiro a impenhorabilidade do bem de família em que reside. Contudo, tal ação não pode ser usada para, por via transversa, modificar decisão judicial que já rechaçou a impenhorabilidade do referido bem, proferida em demanda que envolve os próprios proprietários.

No mais, ainda que fosse possível a reabertura da discussão acerca da impenhorabilidade do bem, o Superior Tribunal de Justiça, nos termos do que decidido pelo Supremo Tribunal Federal, possui entendimento firmado no sentido da possibilidade da penhora sobre bem de família pertencente a fiador de contrato de locação. Entendimento esse firmado em recurso repetitivo (REsp 1.363.368/MS, DJe de 21/11/2014, Tema n. 708 do STJ) e consolidado na Súmula 549/STJ: "É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação".

terça-feira, 14 de maio de 2024

"O reajuste por aumento de sinistralidade só pode ser aplicado pela operadora, de forma complementar ao reajuste por variação de custo, se demonstrado, a partir de extrato pormenorizado, o incremento na proporção entre as despesas assistenciais e as receitas diretas do plano, apuradas no período de doze meses consecutivos, anteriores à data-base de aniversário considerada como mês de assinatura do contrato"

 


Processo

REsp 2.108.270-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 26/4/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Plano de saúde coletivo. Reajuste anual. Aumento de sinistralidade. Aplicado de forma complementar ao reajuste por variação de custo. Extrato pormenorizado. Despesas assistenciais e receitas diretas do plano. Ausência de demonstração. Abusividade configurada.

DESTAQUE

O reajuste por aumento de sinistralidade só pode ser aplicado pela operadora, de forma complementar ao reajuste por variação de custo, se demonstrado, a partir de extrato pormenorizado, o incremento na proporção entre as despesas assistenciais e as receitas diretas do plano, apuradas no período de doze meses consecutivos, anteriores à data-base de aniversário considerada como mês de assinatura do contrato.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O propósito recursal é decidir sobre a apuração, em liquidação de sentença, do índice de reajuste por aumento de sinistralidade aplicado pela operadora do plano de saúde coletivo.

Esclarece a Agência Nacional de Saúde - ANS, sobre o reajuste anual de planos coletivos, que a justificativa do percentual proposto deve ser fundamentada pela operadora e seus cálculos (memória de cálculo do reajuste e a metodologia utilizada) disponibilizados para conferência pela pessoa jurídica contratante com o mínimo de 30 dias de antecedência da data prevista para a aplicação do reajuste.

O reajuste por aumento de sinistralidade só pode ser aplicado pela operadora, de forma complementar ao reajuste por variação de custo, se e quando demonstrado, a partir de extrato pormenorizado, o incremento na proporção entre as despesas assistenciais e as receitas diretas do plano, apuradas no período de doze meses consecutivos, anteriores à data-base de aniversário considerada como mês de assinatura do contrato.

Além de responder administrativamente, perante a ANS, por eventual infração econômico-financeira ou assistencial, a aplicação do reajuste pela operadora, sem comprovar, previamente, o aumento de sinistralidade, torna abusiva a cobrança do beneficiário a tal título.

Se a operadora, em juízo, é instada a apresentar o extrato pormenorizado que demonstra o aumento da sinistralidade e permanece inerte, outra não pode ser a conclusão senão a de que é indevido o reajuste exigido, por ausência do seu fato gerador, impondo-se, pois, o seu afastamento; do contrário, estar-se-ia autorizando o reajuste sem causa correspondente, a ensejar o enriquecimento ilícito da operadora.

segunda-feira, 13 de maio de 2024

"Não é possível atribuir ao intermediador de comércio eletrônico a obrigação de excluir, em razão de notificação extrajudicial, anúncios de vendas que violem os termos de uso da plataforma"

 


TERCEIRA TURMA
Processo

REsp 2.088.236-PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 26/4/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Site de intermediação de comércio eletrônico. Notificação extrajudicial. Violação aos termos de uso da plataforma. Requerimento de exclusão de anúncios. Impossibilidade.

DESTAQUE

Não é possível atribuir ao intermediador de comércio eletrônico a obrigação de excluir, em razão de notificação extrajudicial, anúncios de vendas que violem os termos de uso da plataforma.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Para o Marco Civil da Internet (MCI), os sites intermediadores do comércio eletrônico enquadram-se na categoria dos provedores de aplicações, os quais são responsáveis por disponibilizar na rede as informações criadas ou desenvolvidas pelos provedores de informação.

A publicação de anúncios em plataforma de comércio eletrônico é regida pelos seus termos de uso, os quais são utilizados, entre outras finalidades, para estabelecer as práticas aceitáveis no uso dos serviços, bem como as condutas vedadas. Não há regulamentação, no MCI, das práticas implementadas pelas plataformas de comércio eletrônico em virtude do descumprimento dos termos de uso. Assim, é preciso considerar as disposições aplicáveis aos provedores de aplicações.

Salvo as exceções previstas em lei, os provedores de aplicações apenas respondem, subsidiariamente, por danos gerados em decorrência de conteúdo publicado por terceiro após o desatendimento de ordem judicial específica (art. 19 do MCI). Busca-se evitar o abuso por parte dos usuários notificantes, o monitoramento prévio, a censura privada e remoções irrefletidas.

Nessa linha, conforme jurisprudência do STJ, não é possível impor aos sites de intermediação a responsabilidade de realizar a prévia fiscalização sobre a origem de todos os produtos. Isto é, à exceção das hipóteses estabelecidas no MCI, os provedores de aplicações não têm a obrigação de excluir publicações realizadas por terceiros em suas páginas, por violação aos termos de uso, devido à existência de requerimento extrajudicial.

domingo, 12 de maio de 2024

Indicação de livro: "Emancipação - Um Estudo sobre a Capacidade Civil de Adolescentes", de Maici Barboza dos Santos Colombo (editora Foco)

 


“O maior mérito da presente obra reside em não apenas colocar a questão nos devidos termos, como acima indicado, mas principalmente em apresentar a conciliação de situações aparentemente antagônicas: a cessação da incapacidade e a proteção do adolescente. Com base no artigo 12 da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, dispositivo poucas vezes invocado, a autora resolve o aparente problema. Com perspicácia, demonstra que a função precípua da emancipação no direito brasileiro contemporâneo é ser o instrumento de viabilização da atuação jurígena do adolescente que tenha condições de exercer essa capacidade progressiva.

A partir dessa perspectiva foi realizado o exame das bases legais de cabimento da emancipação civil, mantendo-se permanente diálogo entre o Código Civil, o ECA e demais normas que tratam da proteção infantojuvenil. A autora não descurou, porém, da verificação aprofundada do perfil estrutural da emancipação, para realizar uma apreciação crítica das duas espécies de emancipação previstas na lei brasileira: a voluntária e a legal ou tácita.

As considerações tecidas pela autora ganham maior consistência quando se tem em conta a pesquisa por ela realizada, verdadeiro corte histórico, a qual sustenta o “olhar retrospectivo” que é apresentado ao leitor, para se chegar aos aspectos conceituais e analíticos de cada um dos diferentes casos de cabimento da emancipação. Essa releitura feita sob o filtro dos princípios constitucionais é um verdadeiro presente para o leitor”.

Trecho do prefácio de Heloisa Helena Barboza

https://www.editorafoco.com.br/produto/emancipacao-estudo-capacidade-civil-adolescentes-2024

sábado, 11 de maio de 2024

"Aplica-se o prazo de prescrição decenal à ação que visa ao reconhecimento do direito ao resgate, após o prazo assinado em contrato, de capital segurado de seguro de vida com cláusula de sobrevivência"

 


QUARTA TURMA
Processo

REsp 1.678.432-RJ, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Seguro de vida. Cláusula de sobrevivência dotal. Resgate pelo segurado em vida. Possibilidade. Natureza complexa. Prazo de prescrição decenal.

DESTAQUE

Aplica-se o prazo de prescrição decenal à ação que visa ao reconhecimento do direito ao resgate, após o prazo assinado em contrato, de capital segurado de seguro de vida com cláusula de sobrevivência.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A controvérsia refere-se à prescrição de ação indenizatória movida por segurada contra seguradora em razão de suposto descumprimento de cláusula de contratos individuais de seguro de vida dotal com cláusula de sobrevida.

O seguro de vida é um tipo de seguro de pessoas com cobertura de riscos cujo objetivo é garantir indenização a segurado ou a seus beneficiários nos termos das condições e garantias contratualmente estabelecidas.

A cobertura por sobrevivência oferecida em seguros de vida é estruturada sob regime financeiro de capitalização e tem por finalidade o pagamento do capital segurado, de uma única vez ou em forma de renda, após atingido o período de diferimento previsto no contrato. O plano dotal, que pode ser puro, misto ou misto com performance, constitui um dos tipos de contrato de seguro de vida por sobrevivência.

O contrato de seguro individual de vida com cláusula de sobrevivência tem natureza complexa, visto que o capital de segurado pode ser pago aos beneficiários quando do falecimento do segurado, ao qual é permitido optar por resgatar, em vida, o valor econômico capitalizado após transcorrido o período de diferimento.

É certo que, nos termos da tese firmada no Incidente de Assunção de Competência n. 2, no julgamento do REsp n. 1.303.374/ES, "é ânuo o prazo prescricional para exercício de qualquer pretensão do segurado em face do segurador- e vice-versa- baseada em suposto inadimplemento de deveres (principais, secundários ou anexos) derivados do contrato de seguro, ex vi do disposto no artigo 206, § 1º, II, 'b', do Código Civil de 2002 (artigo 178, § 6º, II, do Código Civil de 1916)".

No caso, todavia, o pagamento do capital segurado não se dá apenas pelo falecimento do segurado, porquanto, em razão da cláusula de sobrevida, há importância de valor econômico capitalizado passível de ser resgatado em vida, o que evidencia, nessa parte, a natureza pessoal do contrato, a atrair a incidência do art. 177, IV, do Código Civil de 1916, ou seja, o prazo decenal, como previsto no art. 205 do Código Civil de 2002, respeitado o art. 2.028 do mesmo diploma.

Aplica-se o prazo decenal, e não a prescrição ânua do art. 206, II, do Código Civil, à ação que visa ao reconhecimento do direito ao resgate, após o prazo assinado em contrato, de capital segurado de seguro de vida com cláusula de sobrevivência.

sexta-feira, 10 de maio de 2024

"O simples descumprimento do prazo estabelecido em legislação específica para a prestação de serviços bancários não gera por si só dano moral in re ipsa"

 


RECURSOS REPETITIVOS
Processo

REsp 1.962.275-GO, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Segunda Seção, por maioria, julgado em 24/4/2024, DJe 29/4/2024. (Tema 1156).

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO DO CONSUMIDOR

Tema

Serviços bancários. Demora em fila. Legislação específica. Dano moral in re ipsa. Inexistência. Necessidade de demonstrar o dano e nexo de causalidade (Tema 1156).

DESTAQUE

O simples descumprimento do prazo estabelecido em legislação específica para a prestação de serviços bancários não gera por si só dano moral in re ipsa.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A perda de tempo quando injusta e ilegítima pode ensejar ilícito, desde que este seja comprovado, a partir da postura leniente do fornecedor de serviços e do nexo causal entre esta e o efetivo prejuízo causado ao consumidor.

O fator decisivo para definição da existência de prejuízo indenizável é a regra da experiência e as nuances fáticas, aplicáveis também às relações de consumo, cuja responsabilidade é em regra objetiva, assim como o preenchimento dos pressupostos basilares da conduta, do dano e do nexo de causalidade entre eles. O atraso em virtude de uma fila, por si só, não tem o condão de ofender direito de personalidade do consumidor dos serviços bancários.

O mero transcurso do tempo, por si só, não impõe um dever obrigacional de ressarcimento, por não configurar, de plano, uma prática abusiva a acarretar uma compensação pecuniária, como pressupõe a teoria do desvio produtivo, que considera a perda de tempo útil uma espécie de direito de personalidade irrenunciável do indivíduo. Sob tal perspectiva, qualquer atraso na prestação de serviços poderia atrair a tese. Contudo, o controle do tempo, por mais salutar que seja, depende de fatores por vezes incontroláveis e não previsíveis, como parece óbvio. Há atendimentos mais demorados que não são passíveis de fiscalização prévia e, por vezes, até mesmo eventos de força maior, que podem ensejar atrasos.

Por outro lado, incumbe ao consumidor que aguarda em fila de banco demonstrar qual é de fato o prejuízo que está sofrendo e se não haveria como buscar alternativas para a solução do problema, tal como caixas eletrônicos e serviços de internet banking (autosserviço).

A mera alegação genérica de que se está deixando de cumprir compromissos diários, profissionais, de lazer e de descanso, sem a comprovação efetiva do dano, possibilita verdadeiro abuso na interposição de ações por indenização em decorrência de supostos danos morais.

Indenizar meros aborrecimentos do cotidiano, por perda de tempo, que podem se dar em decorrência de trânsito intenso, reanálise de contratos de telefonia, cobrança ou cancelamento indevido de cartão de crédito, espera em consultórios médicos, odontológicos e serviços de toda ordem, sejam públicos ou privados, tem o potencial de banalizar o que se entende por dano moral, cuja valoração não pode ser genérica nem dissociada da situação concreta, sob pena de ensejar uma lesão abstrata, e, por outro lado, tarifação, que é vedada nos termos da Súmula n. 281/STJ.

quinta-feira, 9 de maio de 2024

"É válida a comunicação remetida por e-mail para fins de notificação do consumidor acerca da inscrição de seu nome em cadastro de inadimplentes, desde que comprovado o envio e entrega da comunicação ao servidor de destino"

 


Processo

REsp 2.063.145-RS, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por maioria, julgado em 14/3/2024.

Ramo do Direito

DIREITO DO CONSUMIDOR

Tema

Inscrição em cadastro de inadimplentes. Notificação prévia via e-mail. Validade. Art. 43, §2º, do CDC. Atendimento. Comprovação do envio e da entrega da comunicação ao servidor de destino. Necessidade.

DESTAQUE

É válida a comunicação remetida por e-mail para fins de notificação do consumidor acerca da inscrição de seu nome em cadastro de inadimplentes, desde que comprovado o envio e entrega da comunicação ao servidor de destino.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Cinge-se a controvérsia a definir a validade ou não da comunicação remetida por e-mail ao consumidor acerca da inscrição de seu nome em cadastro de inadimplentes para fins de atendimento ao disposto no art. 43, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor.

O dispositivo legal determina que a abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele.

Considerando que é admitida até mesmo a realização de atos processuais, como citação e intimação, por meio eletrônico, inclusive no âmbito do processo penal, é razoável admitir a validade da comunicação remetida por e-mail para fins de notificação prevista no art. 43, § 2º, do CDC, desde que comprovado o envio e entrega da comunicação ao servidor de destino.

Assim como ocorre nos casos de envio de carta física por correio, em que é dispensada a prova do recebimento da correspondência, não há necessidade de comprovar que o e-mail enviado foi lido pelo destinatário.

Comprovado o envio e entrega de notificação remetida ao e-mail do devedor constante da informação enviada ao banco de dados pelo credor, está atendida a obrigação prevista no art. 43, § 2º, do CDC.

quarta-feira, 8 de maio de 2024

"A natureza taxativa ou exemplificativa do rol da ANS não importa para fins de análise do dever de cobertura de medicamentos para o tratamento de câncer"

 


Processo

AgInt no REsp 2.017.851-SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 26/2/2024, DJe 28/2/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO DA SAÚDE

Tema
 

Plano de saúde. Danos materiais. Tratamento de câncer. Fornecimento de medicamento prescrito por médico assistente. Rol de procedimentos da ANS. Desimportância.

DESTAQUE

A natureza taxativa ou exemplificativa do rol da ANS não importa para fins de análise do dever de cobertura de medicamentos para o tratamento de câncer.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A Quarta Turma do STJ, em julgamento realizado em dezembro de 2019, firmou entendimento no sentido de que o rol da Agência Nacional de Saúde - ANS não pode ser considerado meramente exemplificativo, sob pena de se inviabilizar a saúde suplementar (REsp n. 1.733.013-PR, Quarta Turma, julgado em 10/12/2019, DJe 20/2/2020).

Todavia, "há categorias de produtos (medicamentos) que não precisam estar previstas no rol - e de fato não estão. Para essas categorias, não faz sentido perquirir acerca da taxatividade ou da exemplaridade do rol" - dentre eles, os medicamentos para tratamento de câncer, em relação aos quais há apenas uma diretriz na resolução da ANS.

Ademais, segundo a jurisprudência do STJ, "é abusiva a recusa da operadora do plano de saúde de custear a cobertura do medicamento registrado na ANVISA e prescrito pelo médico do paciente, ainda que se trate de fármaco off-label, ou utilizado em caráter experimental" (AgInt no AREsp n. 1.653.706-SP, Terceira Turma, julgado em 19/10/2020, DJe 26/10/2020).

terça-feira, 7 de maio de 2024

"A alteração do nome civil para exclusão do patronímico adotado pelo cônjuge, em razão do casamento, é inadmissível se não houver circunstâncias que justifiquem a alteração, especialmente quando o sobrenome se encontra incorporado e consolidado em virtude de seu uso contínuo por longo período de tempo"

 


QUARTA TURMA
Processo

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 4/3/2024, DJe 11/3/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Divórcio. Manutenção do uso do nome de casada. Direito indisponível. Direito ao nome. Direito da personalidade. Proteção. Longo tempo de uso contínuo.

DESTAQUE

A alteração do nome civil para exclusão do patronímico adotado pelo cônjuge, em razão do casamento, é inadmissível se não houver circunstâncias que justifiquem a alteração, especialmente quando o sobrenome se encontra incorporado e consolidado em virtude de seu uso contínuo por longo período de tempo.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O art. 1.578 do Código Civil prevê a perda do direito de uso do nome de casado para o caso de o cônjuge ser declarado culpado na ação de separação judicial. Mesmo nessas hipóteses, porém, a perda desse direito somente terá lugar se não ocorrer uma das situações previstas nos incisos I a III do referido dispositivo legal. Assim, a perda do direito ao uso do nome é exceção, e não regra (AgRg no AREsp n. 204.908/RJ, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, DJe 3/12/2014).

Segundo a jurisprudência do STJ, "conquanto a modificação do nome civil seja qualificada como excepcional e as hipóteses em que se admite a alteração sejam restritivas, esta Corte tem reiteradamente flexibilizado essas regras, interpretando-as de modo histórico-evolutivo para que se amoldem a atual realidade social em que o tema se encontra mais no âmbito da autonomia privada, permitindo- se a modificação se não houver risco à segurança jurídica e a terceiros. Precedentes" (REsp n. 1.873.918/SP, Relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 4/3/2021) e (AgInt na HDE n. 3.471/EX, Rel. Ministro Humberto Martins, Corte Especial, DJe 27/05/2021).

Dessa forma, a alteração do nome civil para exclusão do patronímico adotado pelo cônjuge virago, em razão do casamento, por envolver modificação substancial em um direito da personalidade, é inadmissível quando ausentes quaisquer circunstâncias que justifiquem a alteração, especialmente quando o sobrenome se encontra incorporado e consolidado em virtude de seu uso contínuo, como no presente caso, por quase 20 anos.

segunda-feira, 6 de maio de 2024

"A resolução do contrato implica o retorno das partes ao estado anterior à avença, devendo a titularidade do direito real retornar ao mantenedor do cemitério, com a restituição do respectivo valor pago, admitindo-se a retenção de percentual suficiente para indenizar pelo tempo de privação de uso do jazigo"

 


Processo

REsp 2.107.107-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 16/4/2024, DJe 19/4/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Direito funerário. Jazigo em cemitério particular. Contrato de concessão de direito real de uso perpétuo. Resolução do contrato. Retorno ao estado anterior. Restituição da titularidade do direito real. Devolução do valor pago. Retenção de percentual pelo tempo de uso.

DESTAQUE

A resolução do contrato implica o retorno das partes ao estado anterior à avença, devendo a titularidade do direito real retornar ao mantenedor do cemitério, com a restituição do respectivo valor pago, admitindo-se a retenção de percentual suficiente para indenizar pelo tempo de privação de uso do jazigo.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Cinge-se a controvérsia em saber se, na hipótese de concessão de direito real de uso perpétuo de jazigo em cemitério particular, a resolução contratual enseja a restituição dos valores pagos.

Na jurisprudência desta Corte, nos poucos precedentes sobre o tema, definiu-se que o jus sepulchri (direito de sepultura) em cemitérios públicos é regido pelo direito público, enquanto o jus sepulchri em cemitério particular é regido pelo direito privado, aplicando-se, inclusive, o Código de Defesa do Consumidor (REsp n. 747.871/RS, Segunda Turma, DJe 18/11/2008; e REsp n. 1.090.044/SP, Terceira Turma, DJe 27/6/2011).

A par das diversas classificações defendidas (enfiteuse, propriedade limitada ou resolúvel, servidão etc.), tem-se que o jus sepulchri mais se assemelha ao direito real de uso do jazigo, que pode ser cedido pelo cemitério particular ao interessado. Não se trata, todavia, de um comum direito real de uso, previsto no Código Civil.

Dentre as suas diferenças, o Código prevê a sua extinção pela morte do usuário, por aplicação subsidiária do art. 1.410, enquanto a doutrina é pacífica no sentido de que uma das características essenciais do jus sepulchri é a sua transferência por ocasião do falecimento do titular, sendo admitida, ainda, a cessão onerosa entre vivos, quando se trata de jazigo vazio em cemitério particular.

Como é cediço, no âmbito do direito privado, o contrato pode ser extinto antes de sua execução por causas supervenientes à sua formação, por meio da resolução ou resilição (ambas genericamente chamadas de rescisão contratual). Registra-se que a jurisprudência desta Corte reconhece a possibilidade de a própria parte inadimplente pleitear a resolução do contrato, diante da insuportabilidade das prestações (REsp n. 1.300.418/SC, Segunda Seção, DJe 10/12/2013).

Essa é a hipótese do caso em discussão, tendo em vista que uma das partes, alegando não mais possuir condições de pagar as taxas pactuadas, ajuizou a presente ação, requerendo a "rescisão contratual", com a restituição ao estado anterior. Ressalta-se que as partes não divergem quanto à resolução do contrato, nem quanto à restituição da titularidade do direito real de uso do jazigo ao cemitério.

A controvérsia se limita à possibilidade ou não de restituição das quantias pagas em negócio pactuado, em que o recorrente, de um lado, se comprometeu a transferir o direito real de uso perpétuo do jazigo e o recorrido, em contraprestação, se comprometeu pagar o valor equivalente na forma pactuada, além de pagar a taxa semestral de manutenção e administração.

Nesse sentido, a resolução do contrato implica a restituição das partes ao status quo ante, com a restituição recíproca de todos os valores necessários para que as partes retornem ao estado anterior à avença, indenizando-se o que não puder ser restituído, além de perdas e danos. Assim, o recorrente (mantenedor do Cemitério) deve receber de volta a titularidade do direito real de uso perpétuo do jazigo, que poderá, novamente, ser transferido de forma onerosa a outrem (até mesmo por valor igual ou superior ao que foi pago pelo recorrido).

No contrato em exame, o objeto é a transferência da titularidade do direito real de uso perpétuo do jazigo, de modo que o valor pago não foi correspondente a apenas um período determinado de uso, mas sim pelo uso perpétuo, o que, como visto, não se consumou. Sendo assim, se a titularidade do direito real retornará ao mantenedor do Cemitério, este deve restituir o respectivo valor pago sob pena, inclusive, de enriquecimento sem causa.

Ressalte-se, contudo, que não se pode admitir que a parte use o jazigo pelo período que bem entender e obtenha a resolução do contrato com a restituição integral do valor pago, sob pena de também caracterizar enriquecimento sem causa, pelo tempo de uso gratuito do jazigo. Assim, diante da natureza desse contrato e considerando que o valor pago foi pelo uso perpétuo, a melhor forma de indenizar pelo período efetivamente usado é autorizar ao Cemitério a retenção de parte do valor pago, proporcionalmente ao tempo utilizado, a ser analisada em cada hipótese.