REsp 1.855.689-DF, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 13/5/2025, DJEN 19/5/2025.
DIREITO CIVIL
Herança. Superveniência de novos bens partilháveis. Sobrepartilha. Ausência de anulação da renúncia à herança. Impossibilidade de optar pela aceitação ou renúncia desse patrimônio.
A superveniência da descoberta de novos bens partilháveis, que ensejem sobrepartilha, não dá nova oportunidade ao herdeiro que renunciou à herança de optar pela aceitação ou renúncia desse patrimônio.
A controvérsia resume-se em definir se a superveniência da descoberta de novos bens partilháveis, que ensejem a sobrepartilha, dá nova oportunidade ao herdeiro que renunciou à herança de optar pela aceitação ou renúncia desse patrimônio, tornando-o, assim, parte legítima para requerer a habilitação do crédito na falência da pessoa jurídica devedora.
Por força da saisine, os herdeiros tornam-se titulares imediatos da herança com a abertura da sucessão, podendo aceitá-la, na forma do art. 1.804 do Código Civil, ou renunciá-la, nos termos do art. 1.806 do referido texto legislativo.
A aceitação da herança, na lição da doutrina, constitui "mera confirmação, por parte do herdeiro, da transferência que lhe havia sido feita", pois a aceitação é a ratificação dos efeitos da saisine, com efeitos retroativos à data da abertura da sucessão.
Na vigência do Código Civil anterior, a aceitação era retratável, conforme dispunha o art. 1.590 do diploma revogado, se não resultasse prejuízo aos credores. Na disciplina do atual Código, todavia, tanto a aceitação quanto a renúncia são irrevogáveis, segundo prevê o art. 1.812 da legislação vigente.
A renúncia à herança, por outro lado, representa o ato por meio do qual o herdeiro manifesta a sua vontade de não permanecer com o direito hereditário que recebe por ocasião da abertura da sucessão, com a morte do de cujus.
Com efeito, renunciada a herança, o herdeiro deixa, retroativamente, desde o início da sucessão, de ser continuador da totalidade das relações patrimoniais transmissíveis do de cujus, razão pela qual ou as repudia de forma global, ou não as repudia, integralmente, aceitando, a herança.
Nesse sentido, segundo a doutrina, "o direito de acolher ou de rejeitar a herança é indivisível, de tal sorte que se exerce por completo em relação a toda a herança", ou seja, abrange a universalidade de direitos que ela constitui.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, adota esse mesmo entendimento, registrando que a renúncia e a aceitação à herança são atos jurídicos puros não sujeitos a elementos acidentais, razão pela qual não se pode aceitar ou renunciar a herança em partes, sob condição (evento futuro incerto) ou termo (evento futuro e certo), e de modo que, perfeita a renúncia, extingue-se o direito hereditário do renunciante, o qual considera-se como se nunca tivesse existido, não lhe remanescendo nenhuma prerrogativa sobre qualquer bem do patrimônio.
Portanto, uma vez manifestada pelo herdeiro a vontade de renunciar, indivisível e irrevogavelmente, à herança, a produção dos regulares efeitos desse ato só pode ser obstada pela sua anulação.
No que toca ao propósito da partilha é, assim, caso necessária, o de encerrar o inventário, atribuindo a cada herdeiro a sua cota na herança.
É possível, todavia, que algumas espécies de bens, como os (a) sonegados, (b) descobertos depois da partilha; (c) submetidos a litígio ou a liquidação difícil ou morosa; ou (d) localizados em lugar remoto da sede do juízo em que se processa o inventário, não tenham participado da partilha inicial.
Esses bens ficam sujeitos a sobrepartilha, que corresponde à repartição, posterior à partilha, de bens que deveriam ter sido originalmente alvo de arrecadação sucessória, mas não o foram. Consiste em uma nova fase ou complementação da ação de inventário e que é processada no mesmo juízo, a despeito do trânsito em julgado da primitiva partilha.
Em outras palavras, a sobrepartilha consiste em procedimento de partilha adicional cujo escopo é o de repartir e dar o adequado destino desses bens dos arts. 2.022 do Código Civil de 2022 e 669 do Código de Processo Civil aos herdeiros, observando o procedimento do inventário e da partilha, na forma do art. 670 do Código de Processo Civil, mas sem rescindir ou anular a partilha já realizada, tampouco os atos nela praticados.
Nesse contexto, na forma da jurisprudência do STJ, "na hipótese de existirem bens sujeitos à sobrepartilha por serem litigiosos ou por estarem situados em lugar remoto da sede do juízo onde se processa o inventário, o espólio permanece existindo, ainda que transitada em julgado a sentença que homologou a partilha dos demais bens do espólio." (REsp n. 284.669/SP, rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 10/4/2001, DJ de 13/8/2001).
Dessa forma, a renúncia à herança é indivisível, acarretando o desposamento do renunciante da integralidade dos seus direitos hereditários de forma retroativa e com efeitos de definitividade, sendo que a sobrepartilha não anula ou rescinde a partilha já realizada, nem os atos nela praticados.
Portanto, a superveniência da descoberta de novos bens partilháveis não dá nova oportunidade ao herdeiro que renunciou à herança de optar pela aceitação ou renúncia desse patrimônio.
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