sexta-feira, 11 de julho de 2025

"É legítima a cobrança do laudêmio pela transferência onerosa de imóveis edificados sobre terreno de marinha, em caso de "permuta no local", espécie de negócio pelo qual a incorporadora recebe o terreno em troca dos imóveis futuramente construídos"

 


Processo

REsp 1.652.517-SC, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 10/6/2025, DJEN 16/6/2025.

Ramo do Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO

Tema

Terreno de marinha. Permuta no local. Laudêmio. Incidência sobre a transferência dos imóveis construídos em troca do domínio útil do terreno cedido pelo ex-titular. Reserva parcial de titularidade sobre o terreno. Inexistência.

Destaque

É legítima a cobrança do laudêmio pela transferência onerosa de imóveis edificados sobre terreno de marinha, em caso de "permuta no local", espécie de negócio pelo qual a incorporadora recebe o terreno em troca dos imóveis futuramente construídos.

Informações do Inteiro Teor

Cinge-se a controvérsia sobre a possibilidade de cobrança do laudêmio pela transferência onerosa de imóveis edificados sobre terreno de marinha, em caso de "permuta no local", espécie de negócio pelo qual a incorporadora recebe o terreno em troca dos imóveis futuramente construídos.

Segundo o Tribunal de origem, a incidência não estaria justificada porque a parte recorrida reservou para si, desde o início, a parcela de 22,43% da fração ideal do terreno, por ocasião da primeira etapa da permuta. Essa parcela seria equivalente aos imóveis construídos que, portanto, jamais teriam saído da titularidade do cedente do domínio útil.

Contudo, para o Superior Tribunal de Justiça, no âmbito privado, essa entrega dos imóveis construídos é uma relação autônoma, pela qual o ex-proprietário do terreno paga, com ele, pelos novos imóveis que recebe. Isto é: a permuta não desnatura o negócio consumerista de compra do imóvel construído (REsp n. 686.198/RJ, relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, relatora para acórdão Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 23/10/2007, DJ de 1/2/2008), nem a relação tributária imobiliária das duas etapas da troca (REsp n. 722.752/RJ, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 5/3/2009, DJe de 11/11/2009).

Não há nem mesmo possibilidade de confusão entre o domínio útil do terreno e dos imóveis construídos, como parece ter concluído a origem. Pela natureza do negócio entabulado, o que se pode compreender é que as construções transferidas ao ex-titular do domínio útil sobre o terreno equivaleriam, financeiramente, a aproximados 78% do valor do domínio útil do terreno todo, razão pela qual a parte recorrida reservou a titularidade da parcela remanescente. Essa questão, porém, diz respeito unicamente aos particulares e ao valor do negócio entre eles.

Caso fossem relações privadas, haveria regular cobrança de ITBI (ou tributos sobre a renda, conforme o caso) sobre ambas as etapas da troca, tanto na transferência do terreno à construtora quanto na entrega dos imóveis construídos ao ex-proprietário do terreno.

Em analogia, sendo aqui abordada relação de direito administrativo, há incidência do laudêmio pela transferência dos imóveis edificados, que não se confundem, de qualquer maneira, com o terreno anteriormente existente.

Concluída a obra, portanto, aperfeiçoa a permuta pela transferência do novo imóvel ao ex-titular do domínio útil do terreno. É dizer, em outros termos, que a permuta no local não se confunde com contrato de empreitada, realizada esta pela construtora, em troca do domínio útil do terreno.

Assim, no que tange ao pagamento do laudêmio sobre as edificações, o acórdão comporta reforma.

Quanto à questão do laudêmio sobre o terreno nu, conforme a inicial, a autora reservou para si 22% das benfeitorias existentes sobre o terreno, e não sobre o próprio terreno. Não é possível compreender essa condição como reserva da titularidade do domínio útil sobre o terreno de marinha.

Ainda que a reserva tivesse sido efetivada sobre o terreno, o que se extrairia seria a existência de uma espécie de "contrato de gaveta" sobre a titularidade do domínio útil do terreno de marinha, eventualmente válido entre os particulares, mas inoponível à União, ainda que registrado. Isso porque a transferência parcial do domínio útil demandaria novo aforamento e desmembramento do imóvel. Nesse mesmo sentido, por analogia, são as teses fixadas nos Temas a n. 1.142/STJ e n. 419/STJ.

Nesse sentido, a transferência do domínio útil poderia ser parcial, disso não há dúvida, e somente seria cobrado o laudêmio sobre a parcela transferida, mas para isso seria necessária a atribuição da propriedade. Porém, o anterior titular do domínio não providenciou esse ato, tanto assim que foi necessário o recolhimento integral do laudêmio.

Inexiste nessa exigência administrativa ilicitude apta a desconstituir a cobrança. Seria indispensável evidenciar a nulidade do ato administrativo, em primeiro lugar, ainda que pela regularização da titularidade do terreno de marinha, para posteriormente discutir-se a eventual insubsistência da cobrança.

Dessa forma, mantida a premissa de que a transferência, no que tange à União, foi integral, não é viável restituir o laudêmio por força de contrato entre os particulares.

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