Em julgamento de recurso repetitivo, a Segunda Seção estabeleceu a tese de que não é possível a revisão de cláusulas contratuais em ações de prestação de contas. A decisão do colegiado, tomada por maioria de votos, não afasta a possibilidade de ajuizamento de pedido revisional.
O recurso especial julgado pela seção teve origem em processo de prestação de contas no qual uma dona de casa pedia que uma instituição bancária apresentasse os demonstrativos de movimentação financeira desde a abertura da conta corrente, em 1995.
O pedido foi acolhido pelo juiz de primeira instância, que também determinou que o banco exibisse à cliente os percentuais de juros cobrados e indicasse a existência ou não de capitalização, a origem dos lançamentos em conta e outras informações.
Em segunda instância, o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) estabeleceu o prazo de 90 dias para que a correntista interpusesse reclamação por eventual irregularidade na cobrança de serviços bancários. Todavia, o prazo decadencial foi afastado pelo STJ, em análise de recurso ainda na primeira etapa da ação de prestação de contas.
Encargos
Na segunda fase, a dona de casa impugnou as contas apresentadas pela instituição financeira, questionando lançamentos e encargos contratuais como tarifas e juros.
Com base em laudo pericial, a sentença reconheceu saldo credor em favor da autora. O TJPR reformou a sentença para determinar que os juros cobrados fossem limitados à taxa média de mercado e que fosse excluída a capitalização mensal dos juros.
O banco apresentou recurso especial sob a alegação de que o acórdão, de forma equivocada, permitiu a cumulação de ação de prestação de contas com pedido de revisão das cláusulas do contrato bancário. Segundo a instituição financeira, a revisão contratual ocorreu quando o TJPR estabeleceu limitação dos juros remuneratórios e afastou a possibilidade de cobrança de juros capitalizados.
Impossibilidade
Após a admissão do recurso pelo STJ como representativo de controvérsia (o tema foi cadastrado com o número 908 no sistema dos repetitivos), o ministro relator, Paulo de Tarso Sanseverino, propôs a fixação de duas teses: a impossibilidade de revisão de cláusulas contratuais em ação de prestação de contas e a limitação ao magistrado, para análise, apenas da existência e da eficácia das cláusulas contratuais.
Todavia, prevaleceu na Segunda Seção o entendimento da ministra Isabel Gallotti.
Em seu voto, a ministra acompanhou a posição do relator em relação à impossibilidade de alteração das bases contratuais em processo de prestação de contas, que tem rito especial e limitações em relação ao exercício do contraditório e da ampla defesa.
Entretanto, a magistrada sugeriu ao colegiado a adoção apenas da primeira tese apresentada. Em relação à segunda proposição, Gallotti explicou que a relação contratual que deve nortear a prestação de contas não está restrita ao formulário assinado no início do relacionamento – que normalmente não apresenta eventuais taxas de juros cobradas –, mas abarca o conjunto de documentos e práticas que construíram a relação bancária entre as partes ao longo dos anos. Por isso, para a ministra, não é possível que o magistrado substitua a taxa de juros remuneratórios, a periodicidade da capitalização ou os outros encargos aplicados durante a relação contratual.
“Dessa forma, penso que, após prestadas as contas, cabe ao julgador, na sentença da segunda fase da ação, analisar se tais contas foram prestadas na forma mercantil e fazer a verificação da compatibilidade das contas apresentadas entre os créditos, os débitos e o posterior saldo, sem promover a alteração nos encargos contratuais vigentes durante a relação contratual”, concluiu a ministra. Ela ressalvou, entretanto, a possibilidade de ingresso com ação revisional de contrato cumulada com repetição de eventual indébito.
No caso julgado, com base na tese firmada, a seção decidiu dar parcial provimento ao recurso do banco para manter os juros remuneratórios e a capitalização praticadas ao longo da relação contratual.
Processo: REsp 1497831
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