sábado, 12 de outubro de 2024

"O prêmio de loteria auferido por viúva casada sob o regime de separação legal obrigatória, antecedido de longo relacionamento em união estável, é bem adquirido por fato eventual (CC/2002, art. 1.660, II), reconhecido como patrimônio comum do casal, devendo ser partilhado segundo os valores existentes na data do falecimento, independentemente da avaliação sobre esforço comum"

 


Processo

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 24/9/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Prêmio de loteria. Fato eventual. Bem comum. Regime de casamento. Separação obrigatória de bens. União estável precedente. Comunhão. Desnecessidade de prova de esforço comum.

Destaque

O prêmio de loteria auferido por viúva casada sob o regime de separação legal obrigatória, antecedido de longo relacionamento em união estável, é bem adquirido por fato eventual (CC/2002, art. 1.660, II), reconhecido como patrimônio comum do casal, devendo ser partilhado segundo os valores existentes na data do falecimento, independentemente da avaliação sobre esforço comum.

Informações do Inteiro Teor

Cinge-se a controvérsia a saber se o de cujus tem direito à meação de prêmio de loteria auferido pela sua então esposa na vigência do casamento e antes do falecimento, haja vista que o regime de bens que regia o casamento era a separação legal obrigatória, formalizado após longo relacionamento em união estável.

A razão de ser da previsão legal que impõe a separação de bens ao idoso consiste na preservação de seu patrimônio em vista de casamentos realizados por exclusivo interesse financeiro. Tem-se opção legislativa objeto de severas críticas da doutrina, visto que afasta a autonomia privada e induz presunção de incapacidade do nubente sexagenário - atualmente, o septuagenário (CC/2002, art. 1.641, II) - para decidir sobre o regime de bens de seu casamento e o destino de seu patrimônio.

Bem por esse motivo que o STF decidiu pela interpretação conforme do art. 1.641, II, do CC/2002, "atribuindo-lhe o sentido de norma dispositiva, que deve prevalecer à falta de convenção das partes em sentido diverso, mas que pode ser afastada por vontade dos nubentes, dos cônjuges ou dos companheiros. Ou seja: trata-se de regime legal facultativo e não cogente" (Tema n. 1.236 da Repercussão Geral).

Consigne-se que o casamento entre o de cujus e a recorrida deu-se após longo relacionamento em união estável, não se afigurando razoável que a mera formalização do vínculo matrimonial, em momento ulterior, torne mais rigoroso o regime de bens existente entre os cônjuges - porque desnecessária a proteção de qualquer dos nubentes nesse contexto e, sobretudo, sem que tenham manifestado de forma expressa o interesse em disciplinar o regime de bens de forma diversa daquela que até então vigorava - a comunhão parcial.

Conforme orientação firmada pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça - STJ, "o prêmio de loteria é bem comum que ingressa na comunhão do casal sob a rubrica de 'bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior' (CC/1916, art. 271, II; CC/2002, art. 1.660, II)" (REsp n. 1.689.152/SC, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 24/10/2017, DJe 22/11/2017), solução aplicável ao regime da separação legal de bens (CC/1916, art. 258, § único, II; CC/2002, art. 1.641, inciso II).

No entendimento do STJ, portanto, em se tratando de bem comum, porque adquirido por fato eventual, o exame sobre a participação de ambos os cônjuges para sua obtenção (esforço comum) é desnecessário.

Dessa forma, necessário reconhecer a comunhão entre os cônjuges do prêmio de loteria obtido pela recorrida, cujos recursos - e os bens com eles adquiridos - devem integrar o monte partível, à situação verificada na data em que falecido o de cujus.

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