quarta-feira, 11 de março de 2015

DIREITO AUTORAL PUBLICACAO NAO AUTORIZADA DE BIOGRAFIA OFENSA A HONRA E A IMAGEM INEXISTENCIA LIBERDADE DE EXPRESSAO GARANTIA CONSTITUCIONAL

APELAÇÃO. DIREITO AUTORAL. ALEGADO EXCESSO DE CITAÇÕES "DESAUTORIZADAS" A OBRA DE TERCEIRO. CARÁTER COMPROVADAMENTE ACESSÓRIO: LICITUDE. LEI 9.610/98. INTELIGÊNCIA. VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL: INOCORRÊNCIA. CIVIL. CONSTITUCIONAL. BIOGRAFIA NÃO AUTORIZADA: JOÃO GUIMARÃES ROSA. LICEIDADE. BALIZAS DOUTRINÁRIAS. DANOS À IMAGEM DO BIOGRAFADO: MANIFESTA INEXISTÊNCIA. PECULIARIDADE "A LATERE": VIDA PRIVADA INTOCADA. VAZIA INTENÇÃO DE CALAR MERAS OPINIÕES, SEQUER DIFAMATÓRIAS, COM O NÍTIDO FIM DE MONOPOLIZÁ-LAS. LIBERDADES DE EXPRESSÃO E DE PENSAMENTO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. I) DIREITO AUTORAL. DANOS PATRIMONIAIS. SUPOSTO EXCESSO DE'"CITAÇÕES LEGÍTIMAS" A OBRA DA FILHA DE GUIMARÃES ROSA. INOCORRÊNCIA. Conquanto dependa "de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como a reprodução parcial ou integral" (art. 29, I, Lei 9.610/98), é certo que" não constitui ofensa aos direitos autorais a citação em livros de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra" (art. 46, III), bem como""a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores" (art. 46, VIII), hipóteses que bem contemplam o caso dos autos. Laudo pericial categórico em atestar o nítido cunho acessório - e, portanto, lícito - das citações realizadas, ao assinalar que "a obra de Alaor Barbosa, Sinfonia Minas Gerais, se sustenta e é útil ao conhecimento da vida do biografado e também como obra literária mesmo sem as referências à obra de Vilma Guimarães Rosa". II) DIREITO CIVIL-CONSTITUCIONAL. DANOS MORAIS. BIOGRAFIA NÃO AUTORIZADA. ABALO À IMAGEM DO BIOGRAFADO. FLAGRANTE INEXISTÊNCIA. O candente debate nacional acerca das biografias não autorizadas, que, na atual conjuntura, se projeta assim sobre o plano legiferante como sobre o âmbito jurisdicional de controle de constitucionalidade de normas, não abrange, propriamente, o peculiar caso dos autos, em que, além de a obra chegar a ser criticada pelo excessivo cunho laudatório à pessoa de João Guimarães Rosa, sequer desce a aspectos delicados, polêmicos, com ênfase na vida pessoal e íntima do biografado, o que, a rigor, constitui a maior dificuldade em matéria de ponderação entre as liberdades de expressão e de pensamento e a proteção à imagem e intimidade do biografado. III) Espécie em que a irresignação da herdeira do renomado escritor, ao lado da editora com a qual tem contrato de edição, se limita ao teor de parcas e meras opiniões externadas pelo biógrafo a respeito da vida literária - sequer pessoal - do biografado, não combatendo nem mesmo a veracidade de qualquer fato veiculado na obra impugnada. Percepção pessoal do escritor cuja exteriorização, a toda evidência, não pode ser tolhida, máxime por não encerrar a imputação de nenhum fato inverídico ou potencialmente desonroso ao objeto de sua obra. IV) Pretensão que não esconde a real tese advogada, com fincas na faceta interpretativa mais claramente inconstitucional do art. 20 do Código Civil: a necessidade de autorização prévia para se abordar todo e qualquer aspecto a respeito da vida de alguém, independentemente até do teor da abordagem. Desejo de pura e simples filtragem preliminar de conteúdo que, claramente, não se coaduna com as liberdades de expressão e de pensamento constitucionalmente asseguradas, constituindo indisfarçável censura privada. V)"Há incongruência lógica, teleológica, dogmática e sistemática entre as liberdades de expressão e de pensamento e a escolha de fatos a serem admitidos em obras biográficas. A ponderação prévia e "in abstracto" entre o direito fundamental à informação e as liberdades de expressão e de pensamento, de um lado, e, de outro, a proteção à imagem, honra, privacidade e intimidade do biografado não pode importar em sacrifício das primeiras, sob pena de se consagrar censura privada e a extinção do gênero biografia" Doutrina contemporânea. VI) De mais a mais, "a proteção à imagem deve ser ponderada com outros interesses constitucionalmente tutelados, especialmente em face do direito de amplo acesso à informação e da liberdade de imprensa. Em caso de colisão, levar-se-á em conta a notoriedade do retratado e dos fatos abordados, bem como a veracidade destes e, ainda, as características de sua utilização (comercial, informativa e biográfica), privilegiando-se medidas que não restrinjam a divulgação de informações" (enunciado 279, CJF), critérios unissonamente conducentes ao descabimento da proibição da veiculação da biografia ora vergastada. VII) Demanda, portanto, destacada do próprio lugar-comum dos casos envolvendo a matéria, por revelar altíssimo grau de censura a obra literária; afinal, enquanto a discussão, em tema de biografias não autorizadas, tende a gravitar em torno das garantias constitucionais que tutelam a intimidade e a vida privada do biografado, estas, "in casu", permaneceram de todo incólumes. RECURSO DESPROVIDO.
SEGUNDA CAMARA CIVEL
Des(a). ELISABETE FILIZZOLA ASSUNCAO - Julg: 08/10/2014

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