quarta-feira, 3 de abril de 2019

INSTITUIÇÃO BANCÁRIA TAXA DE COBRANÇA ABUSIVIDADE DEVOLUÇÃO EM DOBRO

APELAÇÃO CÍVEL. SENTENÇA (INDEX 388) QUE JULGOU PROCEDENTE, EM PARTE, O PEDIDO, PARA CONFIRMAR A TUTELA E DECLARAR NULA A CLÁUSULA DE IMPOSIÇÃO DE TAXA DE COBRANÇA, DEVENDO A REQUERIDA RESSSARCIR EM DOBRO OS CONSUMIDORES QUE EFETUARAM DESPESAS A ESTE TÍTULO. JULGOU IMPROCEDENTE O PEDIDO DE COMPENSAÇÃO DE DANO MORAL E DE AMPLA DIVULGAÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO DA REQUERIDA A QUE SE NEGA PROVIMENTO. Insurge-se a Requerida contra a sentença que julgou procedente, em parte, o pedido, para declarar nula a cláusula de imposição da taxa de cobrança, devendo a Demandada ressarcir, em dobro, os consumidores que efetuaram despesas a esse título. Alega o Ministério Público que, ao longo da instrução do Inquérito Civil nº 414/2014, foi apurado que o contrato de adesão da Ré possui cláusula estabelecendo a cobrança de tarifa que se destinaria a ressarcir o custo da atividade de cobrança dos valores mensais devidos pelo consumidor. Salienta que, além da tarifa de cobrança, os usuários do cartão ainda seriam submetidos a multa e juros moratórios, sendo duplamente punidos por encargos análogos quanto ao fato gerador. Ressalta que tais circunstâncias caracterizariam cláusula contratual abusiva, cujo exercício constituiria violação a normas basilares de proteção ao consumidor, bem como acarretaria prejuízos de ordem material e imaterial. Primeiramente, a Suplicada alega ilegitimidade ativa do Ministério Público, por entender que os direitos tutelados são heterogêneos, não comportando trato coletivo. Com relação à tutela coletiva dos consumidores, reputa-se que a proteção tem status constitucional e se materializa mediante o Código de Defesa do Consumidor, conforme previsto no artigo 81, em consonância com o artigo 21, da Lei nº 7.347/85. O Código de Defesa do Consumidor representou avanço na proteção dos direitos do consumidor, parte reconhecidamente vulnerável nas relações com os fornecedores de produtos e serviços. Assim, considerando tais disposições legais e a relevância da proteção dos direitos dos consumidores, verifica-se a possibilidade de ajuizamento de ação civil pública pelo Ministério Público visando à tutela do direito dos consumidores. Ademais, a medida se dirige a número indeterminado de pessoas, porquanto além de beneficiar aqueles que já aderiram ao cartão de crédito da Requerida, produzirá efeitos para aqueles que porventura vierem a contratar o serviço. Assim, não há que se falar em ilegitimidade ativa do Ministério Público. No que concerne a prescrição, igualmente não assiste razão à Requerida. Segundo jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o prazo prescricional para as ações de revisão de contrato bancário, com pedido de nulidade de cláusulas abusivas é vintenário ou decenal (Processo AgRg no AREsp 763465 / SP, Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial 2015/0197100-5, Relator(a) Ministro Marco Aurélio Bellizze (1150), Órgão Julgador T3 - Terceira Turma, Data do Julgamento 17/11/2015, Data da Publicação/Fonte DJe 27/11/2015). Ademais, como ressaltado pelo Ministério Público: "eventual incidência de prescrição sob as pretensões individuais será apurada em sede de liquidação de sentença, conforme apresentem os consumidores documentação comprovando os valores debitados de forma indevida". No que concerne à taxa de reembolso dos custos de cobrança, verifica-se que deve ser declarada nula, por abusividade. A Requerida alega que não há afronta ao artigo 51, inciso XII, do CDC, na medida em que há na cláusula expressa disposição de que "caberá igual direito ao cliente, nos termos do Código de Defesa do Consumidor". É certo que o Código Consumerista previu a possibilidade de ressarcimento de custos de cobrança, desde que o mesmo direito fosse assegurado ao consumidor. Contudo, conforme salientado pelo r. Juízo a quo: "No presente caso, apesar da alegação do réu de ser possível o reembolso ao consumidor, a aparente reciprocidade apresenta-se inútil, tendo em vista que não se vislumbra qualquer hipótese em que poderá ser invocada, simplesmente porque a instituição financeira nunca será devedora de obrigação financeira assumida voluntariamente em favor do autor." Assim, verifica-se que, em verdade, a Demandada visa cobrir com referida "taxa de cobrança" seus possíveis custos com exercício de atividade tipicamente empresarial, tais como, contratação de escritórios de cobrança, registro do nome do devedor em cadastro restritivo de crédito, entre outros, incidindo diretamente nas faturas mensais do consumidor. Sendo assim, se afigura abusiva a cobrança de taxa de serviço cumulada com os encargos de multa e juros para os consumidores em mora, devendo ser aplicado o disposto no inciso IV, do artigo 51, do CDC para declarar a nulidade da cláusula. Nesse passo, deve a Requerida ser condenada a devolver, em dobro, os valores cobrados indevidamente dos consumidores. Relativamente à devolução dos valores descontados, vale destacar que a norma inserta no parágrafo único, do artigo 42, do Código de Defesa do Consumidor impõe a sanção da devolução, em dobro, do indevidamente cobrado ao consumidor, cabendo ao fornecedor provar que o engano na cobrança teria sido justificado. No caso em exame, como não se comprovou engano justificável, incumbe-lhe a restituição na forma preconizada, ou seja, em dobro. Por fim, pleiteia a Suplicada a limitação dos efeitos da eficácia da sentença proferida na presente ação civil pública, para que seja limitada à Comarca do Rio de Janeiro, de acordo com o disposto no artigo 16 da Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85). Cabe ressaltar que, conforme mencionado pelo Parquet, a tese que predomina no Superior Tribunal de Justiça é a de que o artigo 16 da Lei nº 7.347/85 não se refere a constrições geográficas, mas, sim, aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido. Neste sentido, o voto do Excelentíssimo Senhor Ministro Luis Felipe Salomão sobre o tema (STJ, REsp. 1.243.887/PR, Corte Especial, Rel. Ministro Luis, Felipe Salomão, julgado em 19/10/2011, DJe 12/12/2011). Assim, a eficácia das decisões proferidas em ações civis públicas para tutelar direitos coletivos em sentido amplo possui eficácia nacional, não havendo que se falar em limitação à Comarca do Rio de Janeiro.

0399181-05.2014.8.19.0001 - APELAÇÃO
VIGÉSIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL
Des(a). ARTHUR NARCISO DE OLIVEIRA NETO - Julg: 08/11/2018

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