REsp 1.954.382-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Corte Especial, por maioria, julgado em 5/6/2024. (Tema 1153).
REsp 1.954.380-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Corte Especial, por maioria, julgado em 5/6/2024 (Tema 1153).
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Verbas remuneratórias. Impenhorabilidade. Art. 833, IV, do CPC. Honorários advocatícios. Execução. Verba de natureza alimentar e prestação alimentícia. Distinção. Art. 833, § 2º, do CPC. Exceção não configurada. Tema 1153.
A verba honorária sucumbencial, a despeito da sua natureza alimentar, não se enquadra na exceção prevista no § 2º do art. 833 do CPC/2015 (penhora para pagamento de prestação alimentícia).
A análise do tema perpassa, necessariamente, pela interpretação dos arts. 85, § 14, e 833 do Código de Processo Civil de 2015, à luz das hipóteses legais das quais exsurge o dever de prestar alimentos.
O ordenamento processual civil em vigor, ao tempo em que estabelece a impenhorabilidade das verbas remuneratórias, trata de especificar as exceções a essa regra, assim disciplinando a matéria: "Art. 833. São impenhoráveis: [...] § 2º O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8º, e no art. 529, § 3º".
A solução da controvérsia está em reconhecer a existência de sutil, mas crucial, distinção entre as expressões "natureza alimentar" e "prestação alimentícia", a que se referem os arts. 85, § 14, e 833, § 2º, do Código de Processo Civil de 2015, estando elas de fato interligadas por uma relação de gênero e espécie, como já defendido em alguns julgados desta Corte Superior, no entanto em sentido inverso, ou seja, a "prestação alimentícia" é que ressai como espécie do gênero "verba de natureza alimentar", e não o contrário.
Nessa linha de pensamento, os honorários advocatícios, apesar da sua inquestionável natureza alimentar, não se confundem com a prestação de alimentos, sendo esta última obrigação periódica, de caráter ético-social, normalmente lastreada no princípio da solidariedade entre os membros do mesmo grupo familiar, embora também possa resultar de condenações por ato ilícito e de atos de vontade.
Como bem salientou a Ministra Nancy Andrighi em seu voto apresentado no julgamento do REsp n. 1.815.055/SP, "(...) uma verba tem natureza alimentar quando é destinada para a subsistência de quem a recebe e de sua família, mas só é prestação alimentícia aquela devida por quem possui a obrigação de prestar alimentos familiares, indenizatórios ou voluntários em favor de uma pessoa que deles efetivamente necessita".
Essa, segundo se entende, é a interpretação que mais se harmoniza com o ordenamento jurídico como um todo, de modo a conferir o privilégio legal somente a quem dele necessita para garantir sua própria sobrevivência e de seus dependentes a curtíssimo prazo.
Estender tal prerrogativa aos honorários advocatícios, e em consequência aos honorários devidos a todos os profissionais liberais, implicaria que toda e qualquer verba que guardasse alguma relação com o trabalho do credor ou com qualquer outra fonte de renda destinada ao seu sustento e de sua família também deveria ser reconhecida como tal, tornando regra a exceção que o legislador reservou apenas para situações extremas.
Tal compreensão não retira a possibilidade de penhora de parte das verbas remuneratórias elencadas no art. 833, IV, do CPC/2015, desde que seja preservado percentual capaz de dar guarida à dignidade do devedor e de sua família, conforme entendimento firmado em precedentes da Corte Especial.
Em qualquer hipótese, portanto, independentemente da natureza jurídica do crédito executado e da pessoa do credor, será possível, em tese, a penhora tanto de parte das verbas de caráter remuneratório quanto de valores depositados em caderneta de poupança (e de outros a eles equiparados), especificadas nos incisos IV e X do art. 833 CPC/2015, caso se verifique, a partir da análise do caso concretamente examinado, que o ato de constrição judicial não retira do devedor a capacidade de manutenção de um mínimo existencial e de um padrão de vida digno em favor dele próprio e de seus dependentes.
Dessa forma, fixa-se a seguinte tese repetitiva: A verba honorária sucumbencial, a despeito da sua natureza alimentar, não se enquadra na exceção prevista no § 2º do art. 833 do CPC/2015 (penhora para pagamento de prestação alimentícia).
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