O prazo de prescrição de ações relacionadas a acidente aéreo, uma vez demonstrada a relação de consumo entre o transportador e aqueles que sofreram o resultado do evento danoso, é regido pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC). Esse foi o entendimento da Terceira
Turma do STJ, em 04/07/2013, ao julgar o REsp 1202013 da Unibanco AIG Seguros S/A contra a
Associação de Assistência às Famílias Castigadas por Acidentes Aéreos e
Tragédias Antigas e Modernas. A associação ajuizou demanda com pedido de indenização
pelos danos materiais e morais sofridos por moradores da rua Luís Orcine de
Castro, no bairro Jabaquara, em São Paulo, que tiveram suas casas atingidas
após acidente com a aeronave Fokker 100 da empresa Tam Linhas Aéreas em outubro
de 1996. Na sentença, o juiz reconheceu a prescrição, aplicando o prazo do
Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA), que é de dois anos em ação por danos
causados a terceiros na superfície. O Tribunal de Justiça de São Paulo, porém,
afastou a prescrição, por entender que o prazo é o de 20 anos, previsto no
Código Civil de 1916, e determinou o prosseguimento da ação. Paralelamente,
outra sentença condenou a Tam a indenizar os proprietários dos imóveis pelo
dano material decorrente de sua eventual desvalorização e pelos danos morais
sofridos. Os moradores das casas, seja por contrato de locação ou comodato,
também foram indenizados. A Unibanco Seguros foi condenada a restituir os
valores das indenizações pagas.
A seguradora recorreu ao STJ
alegando que, uma vez que existe legislação específica, o Código Civil não
poderia ser utilizado. No recurso, a empresa alegou também que seria impossível
a incidência do CDC. Segundo ela, enquanto o CBA trata da relação entre o
transportador aéreo e o transportado, incluindo terceiros na superfície, o CDC
trata da relação entre fornecedor e consumidor – o que não seria o caso – e o
Código Civil cuida do transporte em geral. Para a ministra Nancy Andrighi,
relatora do processo, o prazo prescricional da pretensão que versa sobre danos
causados por acidente aéreo a terceiros na superfície “não pode ser resolvido
pela simples aplicação das regras tradicionais da anterioridade, da
especialidade ou da hierarquia, que levam à exclusão de uma norma pela outra;
mas sim pela aplicação coordenada das leis, pela interpretação integrativa, de
forma a definir o verdadeiro alcance de cada uma delas, à luz do concreto”. A
ministra esclareceu que, apesar de estabelecido o prazo prescricional de dois
anos para a pretensão de ressarcimento dos danos, essa regra específica não
impede a incidência do CDC, desde que a relação de consumo entre as partes
envolvidas esteja evidenciada.
Segundo a ministra, a situação
dos autos traduz uma relação de consumo. “De um lado, está a TAM Linhas Aéreas
S/A, que desenvolve atividade de prestação de serviço de transporte aéreo;
fornecedora, portanto, nos termos do artigo 3º do CDC. De outro, estão os
moradores da rua em que se deu a queda da aeronave, os quais, embora não tenham
utilizado o serviço como destinatários finais, equiparam-se a consumidores pelo
simples fato de serem vítimas do evento (consumidores por equiparação ou
bystanders), nos termos do artigo 17 do mesmo diploma”, afirmou a relatora. Com
esse entendimento, a Terceira Turma, por unanimidade, alterou a decisão de
segunda instância, afastando a aplicação do Código Civil e determinando a
incidência da Código de Defesa do Consumidor, cujo prazo prescricional para
situações como a analisada é de cinco anos. Como o acidente ocorreu em outubro
de 1996 e a ação foi ajuizada em setembro de 2001, a pretensão não está
prescrita.
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