terça-feira, 16 de setembro de 2014

PROGRAMA DE TELEVISAO - CARICATURA OFENSIVA - ABUSO NO DIREITO DE EXPRESSAO - DANO MORAL IN RE IPSA

APELAÇÃO. IMPRENSA. LIBERDADE DE EXPRESSÃO. HONRA E IMAGEM DA PESSOA. CONFLITO. PONDERAÇÃO DE VALORES E INTERESSES. MÁXIMA OBSERVÂNCIA E MÍNIMA RESTRIÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS. MANIFESTO ABUSO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO E CRIAÇÃO: CONSEQUENTE RESPONSABILIZAÇÃO. I) Programa de televisão ("Pânico na Band") que cria caricatura inequivocamente ofensiva do autor: como se fosse homossexual estereotipado que se vale de linguajar e atitudes grotescas, vulgares e chulas, em absoluto descompasso com o real comportamento público do alvo da chacota, pessoa de hábitos notoriamente discretos. Claro abuso da liberdade de expressão e de criação, violador de direitos da personalidade. II) Tendo os direitos e liberdades em debate assento constitucional, é imprescindível que se lance mão da técnica de ponderação dos interesses e valores em jogo, à luz da máxima observância e mínima restrição daqueles e, sobretudo, da dignidade da pessoa humana, alicerce constitucional (art. 1º, III, CR). III) Temática (homossexualidade) que, por si só, exige maior cautela na forma de exploração. Uma caricatura que exacerbe certos traços físicos de somenos, ou mesmo trejeitos quaisquer não tem igual peso ao daquela que superdimensione a sexualidade da pessoa, que se insere em universo peculiar, com valores caros e sensíveis à pessoa humana, não sendo dado a ninguém explorá-lo de maneira a expor aquela ao ridículo, propiciando o escárnio incontido e generalizado pela capilaridade decorrente da ampla audiência nacional do programa em voga, altamente lucrativa, aliás. IV) A honra subjetiva não se submete ao parâmetro médio social a respeito da moral, tendo, a rigor, "termômetro próprio inerente a cada indivíduo. É o decoro, é o sentimento de autoestima, de avaliação própria que possuem valoração individual, não se podendo negar esta dor de acordo com sentimentos alheios." (REsp 270.730/RJ); daí que, "embora a liberdade de imprensa também mereça proteção especial e diferenciada, protegida com o 'status' de direito fundamental constitucional, não pode o seu exercício ultrapassar o limite bem definido das demais garantias constitucionais", na lição doutrinária. V) Legitimar o Poder Judiciário um escárnio coletivo deliberado e, sobretudo, aleatório, imotivado e até homofóbico, é o mesmo que se dar carta-branca aos veículos de comunicação para que decidam quem deverá ser impiedosamente ridicularizado e quando isso ocorrerá, sem limites, freios ou responsabilidades, recrudescendo, em última análise, todo o preconceito que ainda resiste no seio da sociedade, atinente à intolerância relacionada às minorias. VI) Espécie que não traduz qualquer censura prévia, na medida em que, apenas depois de veiculados os atos ofensivos, buscou a vítima do ilícito impedir sua perpetuação. Afinal, "a democracia e as liberdades constitucionais podem impor uma relativização no exercício de todo e qualquer direito, inclusive no que tange à liberdade de expressão e de imprensa, quando colidir com outros valores, também constitucionais, de proteção da pessoa humana". Doutrina. VII) Dano moral evidenciado 'in re ipsa' e que deve ser quantificado à luz de criteriosos ditames de razoabilidade e proporcionalidade. VIII) Ratificação das obrigações de fazer e não fazer liminarmente antecipadas, relativas à indevida exibição de imagens, caricaturas e nome do autor. RECURSO PROVIDO.

TJRJ - 0260433-61.2012.8.19.0001 – APELACAO - SEGUNDA CAMARA CIVEL - Des(a). ELISABETE FILIZZOLA ASSUNCAO - Julg: 02/07/2014

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