APELAÇÃO. IMPRENSA. LIBERDADE DE
EXPRESSÃO. HONRA E IMAGEM DA PESSOA. CONFLITO. PONDERAÇÃO DE VALORES E
INTERESSES. MÁXIMA OBSERVÂNCIA E MÍNIMA RESTRIÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS.
MANIFESTO ABUSO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO E CRIAÇÃO: CONSEQUENTE
RESPONSABILIZAÇÃO. I) Programa de televisão ("Pânico na Band") que
cria caricatura inequivocamente ofensiva do autor: como se fosse homossexual
estereotipado que se vale de linguajar e atitudes grotescas, vulgares e chulas,
em absoluto descompasso com o real comportamento público do alvo da chacota,
pessoa de hábitos notoriamente discretos. Claro abuso da liberdade de expressão
e de criação, violador de direitos da personalidade. II) Tendo os direitos e
liberdades em debate assento constitucional, é imprescindível que se lance mão
da técnica de ponderação dos interesses e valores em jogo, à luz da máxima
observância e mínima restrição daqueles e, sobretudo, da dignidade da pessoa
humana, alicerce constitucional (art. 1º, III, CR). III) Temática (homossexualidade)
que, por si só, exige maior cautela na forma de exploração. Uma caricatura que
exacerbe certos traços físicos de somenos, ou mesmo trejeitos quaisquer não tem
igual peso ao daquela que superdimensione a sexualidade da pessoa, que se
insere em universo peculiar, com valores caros e sensíveis à pessoa humana, não
sendo dado a ninguém explorá-lo de maneira a expor aquela ao ridículo,
propiciando o escárnio incontido e generalizado pela capilaridade decorrente da
ampla audiência nacional do programa em voga, altamente lucrativa, aliás. IV) A
honra subjetiva não se submete ao parâmetro médio social a respeito da moral,
tendo, a rigor, "termômetro próprio inerente a cada indivíduo. É o decoro,
é o sentimento de autoestima, de avaliação própria que possuem valoração
individual, não se podendo negar esta dor de acordo com sentimentos
alheios." (REsp 270.730/RJ); daí que, "embora a liberdade de imprensa
também mereça proteção especial e diferenciada, protegida com o 'status' de
direito fundamental constitucional, não pode o seu exercício ultrapassar o
limite bem definido das demais garantias constitucionais", na lição
doutrinária. V) Legitimar o Poder Judiciário um escárnio coletivo deliberado e,
sobretudo, aleatório, imotivado e até homofóbico, é o mesmo que se dar
carta-branca aos veículos de comunicação para que decidam quem deverá ser
impiedosamente ridicularizado e quando isso ocorrerá, sem limites, freios ou
responsabilidades, recrudescendo, em última análise, todo o preconceito que
ainda resiste no seio da sociedade, atinente à intolerância relacionada às
minorias. VI) Espécie que não traduz qualquer censura prévia, na medida em que,
apenas depois de veiculados os atos ofensivos, buscou a vítima do ilícito
impedir sua perpetuação. Afinal, "a democracia e as liberdades
constitucionais podem impor uma relativização no exercício de todo e qualquer
direito, inclusive no que tange à liberdade de expressão e de imprensa, quando
colidir com outros valores, também constitucionais, de proteção da pessoa
humana". Doutrina. VII) Dano moral evidenciado 'in re ipsa' e que deve ser
quantificado à luz de criteriosos ditames de razoabilidade e proporcionalidade.
VIII) Ratificação das obrigações de fazer e não fazer liminarmente antecipadas,
relativas à indevida exibição de imagens, caricaturas e nome do autor. RECURSO
PROVIDO.
TJRJ - 0260433-61.2012.8.19.0001 –
APELACAO - SEGUNDA CAMARA CIVEL - Des(a). ELISABETE FILIZZOLA ASSUNCAO - Julg:
02/07/2014
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