sábado, 25 de junho de 2022

"Ação de retificação de assento civil Prenome Constrangimento Comprovação Mutabilidade do nome Provimento do recurso"

 


Apelação cível. Direito civil. Ação de retificação de assento civil. Procedimento de jurisdição voluntária. Requerimento de alteração de prenome por alegado constrangimento. Sentença de improcedência. Inconformismo. 1. O nome é um direito essencial do indivíduo, que integra os direitos da personalidade, exercendo as funções precípuas de individualização e identificação das pessoas nas relações de direitos e obrigações desenvolvidas em sociedade. 2. Requerente idoso, com 60 anos de idade, que nasceu no interior no Nordeste e foi registrado aos 17 anos com o prenome Domingos, sendo negado pelo pai a escolha de outro nome. Relata situações de zombaria e constrangimentos desde a infância que se perpetuaram na vida adulta. 3. Autor que busca atendimento pelo SUS, concluindo o psicólogo pela insuportabilidade da situação fática para o requerente, fato corroborado no parecer psicológico da equipe técnica de confiança do juízo (ETIC), no sentido de que ele não se reconhece como Domingos. 4. A escolha do nome é delegada aos pais, mas não é retirada do próprio indivíduo, sendo direito potestativo a alteração do nome após a maioridade civil, no prazo decadencial de um ano. Inteligência do art. 56, da lei 6.015/73. 5. O nome civil era regido pelo princípio da imutabilidade, conforme redação original do art. 59, da Lei 6.015/73, sendo certo que, com as alterações da Lei 9.708/98, o novo artigo 58, passou a prever que o nome será definitivo e não mais imutável. 6. Sucessivas alterações do ordenamento jurídico e novas interpretações jurisprudenciais paulatinamente relativizaram o princípio da imutabilidade, inaugurando uma inversão das diretrizes a serem seguidas, de modo que vigora atualmente a mutabilidade do nome civil, desde que observadas questões de ordem pública e segurança jurídica. 7. Incidência do artigo 55, p. único, da lei 6.015/73. Embora o nome "Domingos" seja comumente adotado e, abstratamente, não exponha a pessoa ao ridículo, a prova dos autos denota que as situações vexatórias e o constrangimento experimentados partem de interpretação do próprio requerente quanto ao seu prenome, não se podendo menosprezar o sentimento pessoal e as repercussões psicológicas advindas dos episódios narrados. 8. Em procedimentos de jurisdição voluntária, o julgador pode adotar a solução que considerar mais conveniente, considerando as peculiaridades do caso concreto, o que nos conduz inegavelmente a autorizar a modificação do prenome pleiteada. Art. 723, pu, do CPC. 9. Interpretação histórico-evolutiva do princípio da imutabilidade do nome que resulta na prevalência da autonomia privada, com vistas ao pleno exercício dos direitos da personalidade e do direito à identidade. 10. Em matéria de direitos da personalidade, na ponderação de princípios entre segurança jurídica e autonomia privada, esta deve ser considerada com primazia quando não estiver em risco a segurança jurídica ou a ordem pública. No caso concreto, ganha relevo observar que todas as certidões do requerente foram negativas e o apelante continuará sendo identificado pelo número do seu CPF perante cadastros públicos e privados, malgrado tenha o seu prenome modificado. 11. Incidência, outrossim, do artigo 29 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU). 12. Desta feita, o caso é de reforma da sentença para julgar procedente o pedido, determinando-se a expedição de ofício ao RCPN para proceder a alteração do prenome do requerente para Guilherme. 13. Reforma da sentença. Provimento do recurso.

 

 

0017690-09.2019.8.19.0087 - Apelação

Décima Sexta Câmara Cível

Des(a). Marco Aurélio Bezerra de Melo - Julg: 19/04/2022 - Data de Publicação: 27/05/2022


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