O STF , ao julgar a ADI 4274 dia 23/11/2011, reforçou a
legalidade dos eventos chamados “marcha da maconha”, que reúnem manifestantes favoráveis à descriminalização da droga. Por unanimidade,
os ministros decidiram que esse tipo de manifestação não pode ser
considerado crime previsto no artigo 33, parágrafo 2º, da Lei de Tóxicos
(Lei nº 11.343/2006), o que configuraria afronta aos direitos de
reunião e de livre expressão do pensamento, previstos na Constituição
Federal. O Plenário seguiu o voto do ministro Ayres Britto, relator da Ação
Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4274, proposta pela
Procuradoria-Geral da República (PGR), determinando que o dispositivo da
Lei de Tóxicos – que classifica como crime o ato de induzir, instigar
ou auxiliar alguém ao uso indevido de droga – seja interpretado em
conformidade com a Constituição Federal. Dessa forma, exclui-se da
interpretação da norma “qualquer significado que enseje a proibição de
manifestação e debates públicos acerca da descriminalização ou
legalização de drogas ou de qualquer substância que leve ao
entorpecimento episódico ou viciado das faculdades psicofísicas”,
conforme destacou o relator em seu voto. Segundo o ministro Ayres Britto, o direito de reunião, assim como os
direitos à informação e à liberdade de expressão, “fazem parte do rol de
direitos individuais de matriz constitucional, tidos como direta
emanação do princípio da dignidade da pessoa humana e da cidadania”.
“Vivemos hoje em uma sociedade de informação e de comunicação, em que o
ser humano primeiro se informa para melhor se comunicar com seus
semelhantes, e o direito de reunião pode ser visto como especial veículo
dessa busca de informação para uma consciente tomada de posição
comunicacional”, salientou. De acordo com o relator, existe na Constituição apenas uma única
vedação ao direito de reunião, referente àquelas cuja inspiração ou o
propósito da convocação ensejem a prática violência física armada ou
beligerante. “Quem quer que seja pode se reunir para o que quer que
seja, no plano dos direitos fundamentais, desde que o faça de forma
pacífica”, concluiu o ministro Ayres Britto, acrescentando que não se
pode confundir a criminalização da conduta (o uso de drogas), com o
debate sobre a referida criminalização, que é o propósito da “marcha da
maconha”. Com esta decisão, o STF reforçou o
posicionamento firmado em junho deste ano, no julgamento da Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 187, de relatoria do
ministro Celso de Mello. Na ocasião, a Suprema Corte liberou a
realização da “marcha da maconha”, por entender que o artigo 287 do
Código Penal deve ser interpretado conforme a Constituição, de forma a
não impedir manifestações públicas em defesa da legalização de drogas. Para o decano da Suprema Corte, a mera expressão de pensamento não
pode ser objeto de restrição, “sob pena de se estabelecer um domínio
institucional sobre o pensamento crítico”. “A defesa, em espaços
públicos, da legalização das drogas, longe de significar um ilícito
penal, quer sob a égide do Código Penal, quer sob o disposto na Lei de
Tóxicos – supostamente caracterizador de apologia ou instigação ao uso
de drogas ilícitas –, representa, na verdade, a prática legítima do
direito à livre manifestação do pensamento, propiciada pelo direito de
exercício de reunião”, sustentou. Também seguindo o voto do relator da ADI, o ministro Luiz Fux
reforçou que o entendimento do STF em relação à matéria é o de afastar a
incidência da criminalização sobre tipo de evento público, desde que
ele seja realizado de forma pacífica, sem armas, nem incitação à
violência, e que não haja na sua realização incentivo, estímulo ou
consumo de entorpecentes. Ele lembrou ainda que para realizar
manifestações coletivas dessa natureza é necessário informar previamente
às autoridades públicas competentes, a data, o horário e o local em que
será realizado o evento. Ao votar, o ministro Gilmar Mendes salientou a importância de esclarecer
para a sociedade os limites da decisão do STF, que se refere à
legalidade de eventos públicos favoráveis à descriminalização da droga. O
ministro alertou que a decisão da Suprema Corte não pode ser entendida
de maneira generalizada, aplicável a toda espécie de reunião que discuta
temas diversos do tratado na referida ação. “É preciso ter cuidado e
deixar claro, para que não se extraia da decisão a possibilidade de
direito de característica ilimitada”, afirmou ao alertar para o risco da
aplicação do preceito a reuniões favoráveis à descriminalização de
outros atos, como racismo ou aborto, por exemplo. Conforme salientou o presidente do STF, ministro Cezar Peluso, não é
possível traçar todos os limites de forma abstrata, sendo necessário que
a Corte analise caso por caso, quando assim for necessário. “Devemos
examinar se a questão discutida em cada caso não vai resultar em uma
outorga de legitimidade a certos atos que repugnariam à consciência
democrática, coletiva e ao próprio sistema jurídico constitucional de um
país civilizado”, afirmou.
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