Em decisão unânime, a Terceira Turma entendeu que a cláusula arbitral não prevalece quando o consumidor
procura a via judicial para a solução de litígios. Segundo os ministros, é possível esse tipo de solução extrajudicial
em contratos de adesão, mas desde que haja concordância entre as partes, pois o consumidor sempre terá a
possibilidade de optar por levar o caso à Justiça estatal.
O autor da ação que resultou no recurso especial buscava a rescisão contratual e a restituição das quantias pagas
após desistir de comprar um imóvel. Em primeiro grau, os pedidos foram julgados parcialmente procedentes. O
Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), porém, declarou a incompetência da Justiça comum para julgar a ação, tendo
em vista a existência de cláusula arbitral entre as partes.
Segundo a empresa, essa cláusula foi redigida em negrito e exigiu a assinatura do comprador. Nela estava
estabelecido que todas as controvérsias do contrato seriam resolvidas por arbitragem.
Nulidade
Para a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, a relação de consumo do caso está corporificada em um
contrato de adesão, como foi reconhecido em primeiro grau. Segundo ela, a dúvida seria se nesse tipo de contrato
haveria incompatibilidade entre as leis consumeristas e a da arbitragem.
A ministra disse que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) se limitou a vedar a adoção prévia e compulsória
desse tipo de solução extrajudicial no momento da celebração do contrato, mas não impediu que, posteriormente,
havendo consenso entre as partes, fosse instaurado o procedimento arbitral diante de eventual litígio.
Segundo explicou, a aparente incompatibilidade das normas não se sustenta ao se aplicar o princípio da
especialidade das normas, uma vez que a Lei de Arbitragem versou apenas sobre contratos de adesão genéricos,
subsistindo, portanto, a disposição do CDC nas hipóteses em que o contrato, mesmo que de adesão, regule uma
relação de consumo.
“Ainda que o contrato chame a atenção para o fato de que se está optando pela arbitragem, o consumidor, naquele
momento, não possui os elementos necessários à realização de uma escolha informada”, explicou a ministra ao
citar precedentes do STJ no sentido de considerar nula a convenção de arbitragem compulsoriamente imposta ao
consumidor.
Três regramentos
Em seu voto, ela esclareceu que, com a promulgação da Lei de Arbitragem, passaram a conviver em harmonia
três regramentos de diferentes graus de especificidade.
A regra geral impõe a observância da arbitragem quando pactuada pelas partes, com a derrogação da jurisdição
estatal. A regra específica, contida no artigo 4° da Lei 9.307/96, é aplicável aos contratos de adesão genéricos,
restringindo a eficácia da cláusula compromissória. Por fim, há a regra ainda mais específica, no artigo 51 do CDC,
que impõe a nulidade de cláusula que determine a utilização compulsória da arbitragem, em contratos de adesão
ou não.
“A atitude do consumidor de promover o ajuizamento da ação principal perante o juízo estatal evidencia, ainda que
de forma implícita, a sua discordância em submeter-se ao procedimento arbitral, não podendo, pois, nos termos do
CDC, prevalecer a cláusula que impõe a sua utilização, visto ter-se dado de forma compulsória”, informou.
A Terceira Turma deu provimento ao recurso especial para determinar o retorno do processo ao TJGO, a fim de
prosseguir no julgamento, afastada a cláusula arbitral.
Nenhum comentário:
Postar um comentário