Apelação cível. Instituição de Ensino Superior. Edital para concessão de bolsas semestrais. Aluna que, malgrado preste informações sócio econômicas inalteradas durante o curso, não logra a concessão do benefício em alguns semestres. Sistemática da distribuição de bolsas pela instituição que desprestigia o esforço do aluno já engajado em seus estudos. Violação aos Princípios da Boa Fé e da Confiança. Teoria do fato consumado. Inaplicabilidade. 1. Sustenta a autora, como causa de pedir, que cursando Medicina junto à instituição ré e sendo beneficiada com a concessão de bolsa de estudos para o 1º semestre de 2017, viu o mesmo benefício não lhe ser concedido no 2º semestre do mesmo ano, em que pesem inalteradas suas condições socioeconômicas naquele período. 2. Os documentos anexados e alegações de parte a parte mostram que semestralmente era lançado edital para concessão de bolsas aos alunos menos favorecidos e que atendessem aos requisitos lá previstos, nos moldes das lei 12.101/2009 e 11.096/2005. Previa o edital a distribuição das bolsas em três grupos de alunos segundo a instituição de ensino de que se originavam (pública ou privada) e sua eventual condição de bolsista ou não em escola particular. 3. Partindo-se da premissa de que, alcançando o benefício no 1º semestre e atendidos os requisitos previstos no edital de Bolsas para o 2º semestre assim como aos demais, inalteradas as condições sócio-econômicas da autora e de sua família, seria consequência lógica que fizesse a autora jus ao benefício. 4. Informações trazidas oralmente em audiência especial realizada pelo relator do recurso mostrou falha no sistema de concessão de bolsas adotado pela ré visto que ingresso de novos alunos enquadrados no grupo I prejudicaria os demais alunos insertos nos grupos II e III, este último onde se enquadrava a autora. 5. Tal critério não se revela adequado pois surpreende o aluno que já investiu grande tempo e esforço em seus estudos para, no meio do curso, se ver surpreendido com um ônus para o qual não estava preparado, levando-o à uma mora forçada e quase certamente ao malogro de seu plano de vida. 6. A alegada inspiração na lei 11.096/2005 (norma que institui o PROUNI) no estabelecimento dos critérios utilizados na concessão de bolsas que ora prejudicou a autora deixou de observar que o objetivo primordial do benefício concedido é exatamente dar acesso ao indivíduo à sua formação superior. 7. A natureza da relação de consumo ora existente entre as partes atrai a aplicação dos princípios que lhe são peculiares, em especial o Princípio da Boa-fé que faz surgir para as partes o dever de proceder com probidade, lealdade e cooperação nos objetivos da consecução dos fins do contrato assim como o Princípio da Confiança segundo o qual o consumidor deve exigir do fornecedor do serviço uma conduta pautada na lealdade no decorrer do contrato de modo a que se possam realizar suas legítimas expectativas quando da celebração do contrato. 8. Inadmissível que a autora, alcançando o deferimento da bolsa no 1º semestre de 2017 (1º período) e no 1º semestre de 2018 (3º período) não o logre no 2º período, vindo assim a cursá-lo sem a bolsa, ausente qualquer circunstância razoável e lógica que embasasse a negativa do benefício. Faz jus assim a autora a concessão da bolsa no 2º período já cursado visto que os demais períodos foram objetos de demandas próprias. 9. Já de longa consolidado o entendimento junto ao STJ no sentido da aplicabilidade da Teoria do Fato Consumado unicamente em situações excepcionalíssimas, cuidando-se para que não consolide situação contrária à lei amparadas por medidas de natureza precária como liminar em antecipação de tutela 10. Recurso parcialmente provido. |
0033433-55.2017.8.19.0014 - APELAÇÃO |
VIGÉSIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL |
Des(a). MARCOS ALCINO DE AZEVEDO TORRES - Julg: 29/01/2020 - Data de Publicação: 07/02/2020 |
Blog de direito civil dos professores Carlos Nelson Konder e Cintia Muniz de Souza Konder
sexta-feira, 24 de abril de 2020
INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR FALHA NO SISTEMA DE CONCESSÃO DE BOLSAS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ E DA CONFIANÇA VIOLAÇÃO
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