Para obter êxito em ação negatória de paternidade é necessário comprovar a inexistência de vínculo genético e, além disso, de vínculo social e afetivo. Com esse entendimento, a
Quarta Turma do STJ, em 29/02/2012, negou recurso
especial interposto por homem que, após mais de 30 anos,
pretendia anular os registros de nascimento das duas filhas, nos quais
consta o seu nome. O autor da ação sustentou que, após se casar,
foi induzido a registrar como suas as filhas que a esposa teve com
outro homem. Na época, ele não sabia que havia sido traído. Após um
tempo, desconfiou da esposa, que confessou a traição. Apesar
disso, ele nunca contou às filhas que não era seu pai biológico, nem
mesmo após separar-se da esposa. Depois disso, a relação de pai
continuou. “Quando já eram moças, ficaram sabendo que eu não era o pai
delas. Eu senti muito, mas, para mim, sempre foram minhas filhas”, disse
o homem em depoimento. O autor explicou que só entrou com o
processo devido a uma disputa sobre bens, mas, independentemente disso,
demonstrou o desejo de continuar sendo “o pai do coração delas”. Em
primeira instância, a ação foi julgada improcedente em relação às duas,
mesmo que uma delas não tivesse contestado o pedido. Para o juiz,
embora o exame de DNA tenha oferecido resultado negativo para a
paternidade, a ocorrência da paternidade socioafetiva deve ser
considerada. Na segunda instância, a decisão do juiz foi
mantida. Segundo a desembargadora relatora do acórdão, “sendo a filiação
um estado social, comprovada a posse do estado de filhas, não se
justifica a anulação do registro de nascimento”. Para ela, a narrativa
do próprio autor demonstra a existência de vínculo parental. No
recurso especial interposto no STJ, o autor sustentou que, apesar do
reconhecimento do vínculo social e afetivo entre ele e as filhas,
deveria prevalecer a verdade real, a paternidade biológica, sem a qual o
registro de nascimento deveria ser anulado, pois houve vício de
consentimento. O autor citou o julgamento proferido em outro
recurso especial, na Terceira Turma: “A realização do exame pelo método
DNA, a comprovar cientificamente a inexistência do vínculo genético,
confere ao marido a possibilidade de obter, por meio de ação negatória
de paternidade, a anulação do registro ocorrido com vício de
consentimento.” Para
o relator do recurso especial, ministro Luis Felipe Salomão, “em
conformidade com os princípios do Código Civil de 2002 e a Constituição
Federal de 1988, o êxito em ação negatória de paternidade depende da
demonstração, a um só tempo, da inexistência de origem biológica e
também de que não tenha sido constituído o estado de filiação,
fortemente marcado pelas relações socioafetivas e edificado na
convivência familiar”. “A pretensão voltada à impugnação da
paternidade”, continuou ele, “não pode prosperar quando fundada apenas
na origem genética, mas em aberto conflito com a paternidade
socioafetiva.” O relator explicou que não é novo na doutrina o
reconhecimento de que a negatória de paternidade, prevista no artigo
1.601 do Código Civil, submete-se a outras considerações que não a
simples base da consanguinidade. Segundo ele, “exames laboratoriais hoje
não são, em si, suficientes para a negação de laços estabelecidos nos
recônditos espaços familiares”. “A paternidade atualmente deve
ser considerada gênero do qual são espécies a paternidade biológica e a
socioafetiva”, disse Salomão. Segundo o ministro, as instâncias
ordinárias julgaram corretamente o caso ao negar o pedido do autor e
reconhecer a paternidade socioafetiva.
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