Cinge se a controvérsia à possibilidade de se indenizar o filho que não vem recebendo do pai biológico a devida assistência moral e afetiva, tema complexo e que gera muita polêmica em nossos tribunais. Como é cediço, nos termos dos artigos. 186 e 927 do Código Civil aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. Embora o caso em análise trate de indenização que decorre de danos produzidos na esfera das relações familiares, também aqui deverão ser preenchidos os elementos da responsabilidade civil subjetiva. Em outras palavras, deverão estar comprovados a conduta culposa do agente, o nexo de causalidade e o dano, consistente na violação de um dever. De fato, o Código Civil arrola os deveres inerentes ao poder familiar, dentre os quais se destacam o dever de dirigir a educação e criação dos filhos e tê los em sua companhia e guarda (artigo 1634). Conforme ressaltado pela Procuradoria de Justiça em seu parecer, mais do que um dever dos pais, ser cuidado é um direito do filho, inerente à sua dignidade humana. Assim, é direito básico de todo filho receber atenção e afeto de seus pais. Violado o dever legal do pai e, portanto, o direito do filho, exsurge o dano e, via de consequência, o dever de indenizar. Na hipótese em exame, restou evidenciado através do estudo social e do depoimento das partes que o afastamento entre pai e filho foi provocado pela nova união do pai. A genitora afirmou à assistente social que, mesmo após a separação, o vínculo entre pai e filho sempre foi estreito. A nova união do genitor, contudo, parece ter sido o início de um período de afastamento entre pai e filho, o que causou no adolescente problemas na fala, comportamento agressivo e dificuldades na escola. O quadro só foi estabilizado depois de iniciado tratamento com fonoaudiólogo e psicólogo. O apelante, por seu turno, relatou à assistente social que sua atual companheira sente muito ciúme da genitora do menor. Afirmou, também, que ela não maltrata o filho, porém a animosidade entre ambos é evidente. Assim, para evitar problemas conjugais, acabou se afastando do filho. Percebe se, portanto, que o genitor apelante afastou se do convívio com o filho não só por residir em outro município, mas também por não querer problemas em sua nova união. De fato, o apelante não sabe lidar com o ciúme excessivo da nova companheira e com a antipatia do filho por esta, tendo escolhido se manter inerte e deixar que os problemas se resolvam espontaneamente. Ocorre que o tempo passa, os filhos crescem, e as oportunidades de oferecer educação e cuidados se vão. Não pode um genitor colocar em polos opostos seu novo casamento e seu relacionamento com os filhos, pois não se trata de disputar a atenção, computar a dedicação dada a um ou outro. O bom relacionamento com os filhos, assim como uma relação amorosa satisfatória, são elementos essenciais para a saúde psíquica do indivíduo, que não pode adotar uma postura inerte diante de eventuais disputas, sob pena de comprometer a integridade psicológica de todos os envolvidos. Assim, a indenização em hipóteses como a dos autos assume um caráter eminentemente punitivo e pedagógico, tendo por objetivo primordial alertar o pai negligente sobre a importância do convívio com o filho. Destarte, presentes os elementos pertinentes à responsabilidade civil, correta a sentença que condenou o recorrente a reparar os danos sofridos pelo apelado decorrentes do abandono moral. Recurso a que se nega provimento.
Precedente Citado : TJRJ AC 0154617 61.2010.8.19.0001, Rel. Des. Cherubin Helcias Schwartz, julgado em 03/05/2012.APELACAO 0000940 62.2009.8.19.0060
TERCEIRA CAMARA CIVEL
Des(a). MARIO ASSIS GONCALVES Julg: 14/07/2014
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