A Editora Abril S/A não deve pagar indenização por danos morais ao desembargador aposentado do TJDF Asdrúbal Zola Vasquez Cruxên, pela publicação de matéria veiculada na revista Veja, na edição de 8 de dezembro de 1999, intitulada “Doutor Milhão”. A
Quarta Turma do STJ, ao julgar o REsp 801109 em 15/06/2012, afastou a condenação
imposta à Editora Abril pelo TJDF, no valor de R$ 50 mil, pela
publicação de material que foi considerado ofensivo à honra do
magistrado. O juízo de primeira instância havia fixado o valor em R$ 200
mil. Segundo a revista, Cruxên fora citado na Comissão
Parlamentar de Inquérito (CPI) do Judiciário, instituída pelo Senado,
como responsável por irregularidades no exercício da função. Citando o
relatório da CPI, a revista afirmou que o magistrado não teria agido com
zelo na condução do inventário de um menor, deixando que fosse
dilapidado um patrimônio de cerca de R$ 30 milhões. O fato teria
ocorrido quando Cruxên era juiz titular da Vara de Órfãos e Sucessões de
Brasília. De acordo
com a reportagem, o magistrado foi acusado de cometer crimes de abuso de
poder e prevaricação, além de improbidade administrativa. Cruxên teria
liderado uma reunião na qual os desembargadores do TJDF aprovaram
aumento de subsídio para si e para os demais juízes do DF, triplicando a
remuneração, ao custo de R$ 30 milhões. A reportagem noticiou ainda que
o desembargador teria sido flagrado em 1985 usando carro oficial numa
praia da Bahia com a família. Entre outras acusações retratadas
pela revista, estava a afirmação de que uma das filhas do desembargador
teria trabalhado para o então senador Luiz Estevão, quando este ainda
era deputado distrital, entre 1996 e 1997. Cruxên julgava ações de
interesse de Estevão no Tribunal de Justiça, tendo supostamente
determinado a paralisação de 14 inquéritos que tramitavam na polícia
para investigar o Grupo OK, de propriedade do ex-senador. A
Editora Abril sustentou, em sua defesa, que os atos da CPI não eram
sigilosos e que utilizou o título “Doutor Milhão” apenas para chamar a
atenção para a matéria, sem intenção de ofender o magistrado. O TJDF
entendeu que a ofensa surgiu da falta de autorização para o uso da foto
que ilustrou a matéria, tirada de Cruxên em seu ambiente de trabalho. De
acordo com a Súmula 403 do STJ, o uso de imagem de pessoa sem
autorização gera direito a indenização, exceto quando necessária à
administração da Justiça ou à manutenção da ordem pública. Segundo
entendimento da Quarta Turma, pessoas públicas ou notórias têm o direito
de imagem mais restrito que pessoas que não ostentam tais
características, o que torna incabível a concessão da indenização por
esse motivo. O relator do recurso apresentado pela Abril,
ministro Raul Araújo, entendeu que a crítica formulada contra o
magistrado se insere no regular exercício da liberdade de imprensa. A
reportagem, segundo ele, foi feita com base no relatório da CPI,
documento público relevante para a vida nacional e para a democracia do
país, uma vez que emanado do Senado Federal. A Quarta Turma
reconheceu o possível prejuízo sofrido por Cruxên com a publicação da
reportagem, mas considerou que isso não gera direito à indenização por
dano moral, em razão das circunstâncias do caso. Nos conflitos em que
estão em jogo a imagem de figuras públicas e a liberdade de informação,
segundo o ministro, é recomendável que se priorize a crítica. “É o preço
que se paga por viver em um estado democrático”, disse o ministro. A
conclusão do ministro Raul Araújo é que não caracteriza hipótese de
responsabilidade civil a publicação de matéria jornalística que narre
fatos verídicos ou verossímeis, embora eivados de opiniões severas ou
impiedosas, sobretudo quando direcionada a figuras públicas, que exerçam
atividades tipicamente estatais e de interesse da coletividade. “O
dever de veracidade ao qual estão vinculados os órgãos de imprensa não
deve consubstanciar dogma absoluto”, apontou Raul Araújo, citando voto
proferido pelo ministro Luis Felipe Salomão, também membro da Quarta
Turma, em outro processo: “A condição de liberdade de imprensa exige, às
vezes, um compromisso ético com a informação verossímil, o que pode,
eventualmente, abarcar informações não totalmente precisas” (REsp
680.794).
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