Ao editar o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), o legislador enfatizou a responsabilidade dos pais no
exercício do poder familiar: zelar pela guarda e proteção dos menores
em suas atividades do dia a dia. Com esse fundamento, a Primeira Turma
do STJ, em 22/06/2012, atendeu ao REsp 1292143 do Ministério
Público de São Paulo (MPSP) para cassar portaria que instituía “toque de
recolher” em uma avenida de Fernandópolis (SP). Para o ministro
Teori Zavascki, o ECA restringiu expressamente o poder do juiz de
editar normas de caráter geral e abstrato, reservando tal competência ao
Poder Legislativo. O Código de Menores, de 1979, concedia mais poder ao
magistrado, ao autorizar a fixação de normas gerais necessárias à
assistência, proteção e vigilância ao menor. “Na
vigência da lei anterior, a autoridade judiciária devia regulamentar,
por portaria, o ingresso, a permanência e a participação de menores em
espetáculos teatrais, cinematográficos, circenses, radiofônicos e de
televisão, devendo, ainda, baixar normas sobre a entrada, a permanência e
a participação de menores em casas de jogos, em bailes públicos e em
outros locais de jogos e recreação”, ilustrou o relator. “O juiz
de menores podia ainda estabelecer regras a respeito de hospedagem de
menor, desacompanhado dos pais ou responsável, em hotel, motel, pensão
ou estabelecimento congênere, tendo em vista as normas gerais dos
artigos 50 a 58 do Código de Menores, levando em conta as condições
sociais da comarca e os malefícios a essas pessoas em formação”,
completou, citando voto anterior em caso similar. O ECA, porém, mudou
essa situação. O
ministro destacou que a portaria mencionada no ECA é atípica, por ser de
exclusividade do Poder Judiciário em sua atuação jurisdicional e
sujeita a recursos. O ministro destacou também que a portaria não se
constitui em liberalidade do juiz. “O legislador estatutário vinculou
sua expedição a cada caso concreto, vedando determinações de caráter
geral”, sustentou. Conforme Zavascki, o ECA retirou do juiz atribuições não jurisdicionais, como as ligadas à criação, implantação e provocação de políticas públicas, agora delegadas a órgãos como os Conselhos Tutelares e Ministério Público e Poderes Legislativo e Executivo. “O ECA criou as condições necessárias para a
adequação da função jurisdicional às suas características originárias,
conferindo a outros atores atribuições antes exercidas pelos
magistrados, além da possibilidade de estes provocarem a jurisdição,
através de processo regular”, afirmou o relator. Para
o ministro Teori Zavascki, o poder do juiz da infância e adolescência
de emitir portarias fica limitado aos exatos termos do artigo 149 do
ECA, só sendo possível disciplinar através de tais portarias a entrada
de crianças e adolescentes desacompanhados em certos locais públicos ou a
participação de crianças e adolescentes em certos eventos, desde que as
normas atendam a critérios predeterminados nesse artigo, sejam
fundamentadas e não possuam caráter geral. “O que ocorre com o
Estatuto é que o exercício do pátrio poder foi reforçado. Exemplo: antes
pai e mãe só podiam frequentar certos lugares com os filhos se o juiz
de sua comarca o julgasse adequado. A legislação anterior autorizava o
juiz a agir como se fosse o legislador local para esses assuntos,
expedindo portarias que fixavam normas sobre o que os pais podiam ou não
fazer nesse terreno”, explicou. “Ou seja, o juiz era
autorizado, por lei, a interferir no exercício da cidadania dos pais em
relação aos filhos. O juiz era quem autodeterminava no lugar dos pais!
Agora, cabe aos pais disciplinarem a entrada e permanência dos filhos,
desde que os acompanhem”, concluiu.
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