Pode ser
homologada no Brasil a sentença judicial de estado estrangeiro que,
considerando válida cláusula compromissória constante de contrato
firmado sob a expressa regência da lei estrangeira, determine – em face
do anterior pedido de arbitragem realizado por uma das partes – a
submissão à justiça arbitral de conflito existente entre os
contratantes, ainda que decisão proferida por juízo estatal brasileiro
tenha, em momento posterior ao trânsito em julgado da sentença a ser
homologada, reconhecido a nulidade da cláusula com fundamento em
exigências formais típicas da legislação brasileira pertinentes ao
contrato de adesão. É necessário ressaltar que estamos diante
de um caso típico de competência concorrente. Assim, a primeira decisão
que transita em julgado prejudica a outra. É da essência do sistema que,
se transitar em julgado primeiro a sentença estrangeira, fica
prejudicada a brasileira e vice-versa. Assim, a aparente exclusão da
sentença estrangeira pelo fato do trânsito em julgado do julgamento
brasileiro, sob invocação da soberania nacional, não se segue, porque se
está diante de clara competência concorrente. Ademais, o ingresso do
pedido de arbitragem anteriormente a todas as várias ocorrências
judiciais deve pesar em prol da opção pela homologação da sentença
estrangeira que prestigia a opção voluntária das partes pela arbitragem.
O Juízo arbitral é que era competente, no início de tudo, para examinar
a cláusula arbitral devido ao princípio Kompetenz-Kompetenz, e
foi isso que a sentença estrangeira assegurou. Esse princípio, que
remonta à voluntariedade da opção arbitral e realça a autonomia
contratual, revela o poder do árbitro para analisar e decidir sobre sua
própria competência, no que tange à validade e eficácia do pacto
arbitral, que lhe outorgou a referida função julgadora. Assim, o
tribunal arbitral tem competência para decidir sobre a validade da
cláusula compromissória, ou seja, sobre sua própria competência. A
propósito, o Protocolo de Genebra de 24/9/1923, subscrito e ratificado
com reservas pelo Brasil em 5/2/1932, estabelece a prioridade do Juízo
Arbitral sobre a Jurisdição Estatal, estabelecendo uma presunção de
competência em favor do Tribunal Arbitral. De outro modo, a negação de
homologação de sentença arbitral proferida há tempos em Estado
estrangeiro sob o fundamento de ocorrência da anulação da cláusula
arbitral por sentença proferida no Brasil significaria a abertura de
largo caminho para a procrastinação da arbitragem avençada por parte de
contratantes nacionais no exterior. Atente-se que, para bloquear tal
arbitragem, bastaria ao contratante brasileiro, após o pedido de
instauração da arbitragem no exterior, ingressar com processo anulatório
da cláusula arbitral no Brasil para, invocando peculiaridades da
legislação brasileira, como as especiais exigências nacionais da
cláusula de adesão (sobretudo diante do Código de Defesa do Consumidor,
com inversão de ônus de prova e outros consectários do direito
consumerista nacional), paralisar a arbitragem e judicializar toda a
matéria contra a jurisdição estatal no Brasil. Cabe ressaltar que não há
empecilho no julgamento brasileiro à homologação porque fundados o
julgamento estrangeiro e o nacional em motivos técnico-jurídicos
diversos, ou seja, o primeiro, na validade da cláusula arbitral ante os
termos da legislação estrangeira, para contrato celebrado no
estrangeiro, sem a consideração de restrições existentes no sistema
jurídico brasileiro, e o segundo fundado em exigências formais de
cláusula em contrato de adesão, típicas da legislação nacional.
Inexiste, assim, impedimento à homologação das sentenças estrangeiras em
virtude de coisa julgada nacional posterior. Pois, ajuizado o pedido de
arbitragem, no Brasil ou no exterior, ao juízo arbitral competia julgar
todas as matérias suscitadas pelas partes, inclusive a invalidade da
cláusula arbitral, não se autorizando a prematura judicialização perante
a atividade jurisdicional estatal. SEC 854-US, Rel. originário Min. Massami Uyeda, Rel. para acórdão Min. Sidnei Beneti, julgado em 16/10/2013.
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