A obrigação alimentar do espólio só pode ser invocada se já foi estabelecida anteriormente ao falecimento do autor da herança – por acordo ou sentença judicial. Com esse entendimento, a
Quarta Turma do STJ, em julgamento de 11/02/2014, negou o pedido de uma
presidiária que pretendia receber pensão alimentícia do espólio de seus pais –
cuja morte foi ordenada por ela. A presa pedia a pensão para atender suas
necessidades no presídio de Tremembé, no interior de São Paulo. De forma
unânime, o colegiado seguiu o entendimento do relator do caso, ministro Luis
Felipe Salomão, que destacou ainda, em seu voto, a maioridade da autora e a
extinção do poder familiar. O ministro observou que a ação de alimentos foi
ajuizada em 2007, na vigência do Código Civil de 2002, e que a autora nasceu em
novembro de 1983. Portanto, já havia alcançado a maioridade e, em consequência,
estava extinto o poder familiar.
Em seu pedido, a presidiária
afirmou que sofre “descaso” e se encontra em situação de total abandono,
buscando amparo emocional e financeiro em seus advogados, por isso necessitaria
de “alimentos para atender suas necessidades, voltadas à aquisição de artigos
de higiene, roupas, medicamentos prescritos por profissionais do presídio,
alimentos propriamente ditos, vez que a falta de visita impede essa dádiva,
além de materiais para propiciar o desenvolvimento de atividades
laborterápicas”. A autora foi condenada a 38 anos de reclusão pelo envolvimento
no homicídio dos pais. Os assassinatos foram planejados por ela e executados
pelo seu namorado à época e pelo irmão dele. O juízo da 1ª Vara da Comarca de
Tremembé julgou extinto o processo, sem resolução de mérito, por entender que
os alimentos têm caráter personalíssimo. O Tribunal de Justiça de São Paulo
(TJSP) negou o recurso da defesa da presidiária, ao entendimento de que a
obrigação do herdeiro em continuar pagando os alimentos só existe se a pensão
já estiver fixada no momento da morte.
No STJ, a defesa sustentou que
não é adequado o entendimento do tribunal estadual acerca de não haver
legitimidade passiva do espólio, por não se tratar de encargo preexistente,
assim como por não se tratar de filho menor ou cônjuge dependente, pois a
presidiária não possuía renda própria, tampouco exercia trabalho remunerado ou
estágio, por ocasião da morte de seus pais. Ainda em seu voto, o ministro
Salomão fez o registro de que a autora foi declarada indigna, com exclusão da
herança, em sentença prolatada pela 1ª Vara de Família do Foro Regional de
Santo Amaro (SP). “A própria recorrente deixa nítido que é notório o crime em
razão do qual está encarcerada. Por isso, apenas a título de realce, por não
ser matéria apreciada pelas instâncias ordinárias, é bem de ver que a admissão
da transmissão do dever jurídico em abstrato de prover alimentos ensejaria a
teratológica e injusta situação de propiciar que herdeiros, que incorram em uma
das situações de indignidade previstas nos incisos do artigo 1.814 do CC/2002,
por via transversa, alcancem os bens deixados pelo de cujus”, concluiu o
relator. Por fim, o ministro Luis Felipe Salomão lembrou que o artigo 1.695 do
CC/2002 dispõe que “são devidos alimentos quando quem os pretende não tem bens
suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, a própria mantença”. “O preso
tem direito à alimentação suficiente, assistência material, à saúde e ao
vestuário e, como visto, a concessão de alimentos demanda a constatação ou
presunção legal de necessidade daquele que vindica alimentos. Entretanto, na
inicial, em nenhum momento a autora afirma ter buscado trabalhar durante o
período em que se encontra reclusa, não obstante a atribuição de trabalho e sua
remuneração sejam, simultaneamente, um direito e um dever do preso”, concluiu
Salomão.
O ministro destacou também que o
Projeto de Lei 61, de 2009, já aprovado no âmbito do Senado Federal, de autoria
do senador Expedito Junior, propõe a modificação da redação do artigo 1.700 do
Código Civil para, nas palavras do seu autor, “que não se perpetue a
impropriedade de cobrar-se pensão alimentícia do morto ou do espólio de seus bens”.
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