APELAÇÃO CÍVEL. CONSUMIDOR. AÇÃO ORDINÁRIA ANULATÓRIA DE DISTRATO E INDENIZATÓRIA DE DANO MATERIAL E MORAL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. AUSÊNCIA DO DEVER DE INFORMAÇÃO POR PARTE DO RÉU. PROMESSA DE COMPRA E VENDA E DISTRATO. ANULAÇÃO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS. 1. Cinge-se a controvérsia recursal tão somente, se foi correta a decisão do douto juízo a quo, no sentido de decretar a rescisão contratual do negócio jurídico celebrado entre as partes, referente ao distrato, em razão do descumprimento por parte dos demandantes do pagamento do preço, determinando a retenção de 30% do valor pago, em razão de cobrança de valores descritos em cláusulas contratuais que reputou abusivas, além da fixação dos consectários legais, se houve ou não lesão aos direitos da personalidade dos autores, e se a cobrança da comissão de corretagem e seguro prestamista realmente ocorreu e se foi legal. 2. No que se refere a legalidade do instrumento de distrato entabulado entre as partes, observa-se que o entendimento jurisprudencial e doutrinário atuais são no sentido de que a interpretação mais benéfica ao consumidor aderente (art. 47 do CDC e art. 423 do Código Civil), bem como o princípio hermenêutico segundo o qual "nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem" (art. 112 do Código Civil), permitem afastar a cláusula de "ampla quitação" constante de instrumento de distrato, de teor inteiramente determinado pelo fornecedor e imposto ao consumidor em circunstâncias nas quais ele não podia recusar-se, e cujo alcance, na verdade, não pode ultrapassar o de um simples recibo dos valores efetivamente pagos. 3. O distrato não decorreu de desistência imotivada, arrependimento nem culpa dos adquirentes, mas sim por força da impossibilidade material de seu cumprimento, decorrente da não obtenção de financiamento imobiliário pela Caixa Econômica Federal, em razão do rendimento insuficiente dos autores, fato que foi omitido pela ré por ocasião da celebração do negócio. 4. A incorporadora sabia, ou devia saber, da impossibilidade material de manutenção da avença sem a aprovação do financiamento nos valores que o autor pretendia e que ela, a julgar pelo seu comportamento, julgava possível lograr. O malogro da obtenção do crédito, nestas circunstâncias, não pode equiparar-se à simples desistência, mas sim à impossibilidade de cumprimento do ajustado, por fato não imputável ao promitente comprador. 5. Nestes termos, a solução mais justa é exatamente a pura e simples restituição dos contraentes ao status quo ante, o que implica afastar a incidência de qualquer cláusula de retenção, porque a hipótese não é de desistência imotivada, mas de distrato decorrente da impossibilidade material de seu prosseguimento, risco que já era conhecido pela incorporadora. 6. A manutenção do contrato sem a aprovação do crédito que a parte autora esperava (e que a incorporadora, ao que parece, também julgava possível obter) implicaria a onerosidade excessiva de que trata o art. 478 do Código Civil, autorizando assim a resolução contratual. 7. Ademais, a hipótese não foi sequer de recusa do crédito, mas de completa omissão e languidez da incorporadora por essa falha de serviço, a tal ponto que, exasperados com a evolução do saldo devedor e com os meses de aflita espera pela simples obtenção do crédito, os autores se viram forçados a submeter-se ao distrato nas condições impostas pela promitente vendedora. 8. A conduta adequada, consoante aos ditames da cláusula geral de boa-fé, é a restituição dos contraentes ao status quo ante, com devolução integral das quantias desembolsadas, inclusive aquelas pagas a suposto título de comissão de corretagem e outros encargos contratuais, na forma da Súmula nº 98 desta Corte. 9. Noutro giro, configurado está o dano moral no caso concreto, com dúplice fundamento: de um lado, o desmazelo da ré incorporadora, em diligenciar o crédito habitacional; de outro, a abusiva e ilícita retenção dos valores pela promitente vendedora por ocasião do distrato, valores esses que montam a patamar vultoso para os parcos ganhos e modesto padrão de vida dos adquirentes (conforme demonstram os documentos de fls. 34-46), que a duras penas juntaram as economias com que pagaram o sinal e prestações. 10. In casu, aplicando-se o método bifásico, fixo a indenização em R$ 7.000,00 (sete mil reais) para cada autor, valor que reputo razoável e proporcional a lesão sofrida, levando em conta precedentes deste Colendo Tribunal, para casos análogos e em consideração às peculiaridades do caso concreto. RECURSO DOS AUTORES PROVIDO. NEGO PROVIMENTO AO RECURSO DO RÉU. |
0015224-03.2015.8.19.0210 - APELAÇÃO |
VIGÉSIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL CONSUMIDOR |
Des(a). ANDREA FORTUNA TEIXEIRA - Julg: 12/07/2017 |
Blog de direito civil dos professores Carlos Nelson Konder e Cintia Muniz de Souza Konder
sábado, 25 de novembro de 2017
PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE APARTAMENTO EM CONSTRUÇÃO DISTRATO ANULAÇÃO DEVOLUÇÃO INTEGRAL DOS VALORES PAGOS DANO MORAL
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