segunda-feira, 22 de agosto de 2016

"Na responsabilidade civil, o ofensor pode ser condenado a pagar os honorários contratuais pagos pelo ofendido ao seu advogado?" por Marco Aurélio Bezerra de Melo

Na responsabilidade civil, o ofensor pode ser condenado a pagar os honorários contratuais pagos pelo ofendido ao seu advogado?


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Como cediço, os honorários de sucumbência constituem direito autônomo do advogado que independe da relação contratual que este guarde com seu cliente (art. 23, lei 8906/94[1]) e se constitui como um efeito imediato da vitória na demanda, devendo constar, independentemente de pedido expresso, da sentença condenatória (art. 85 do CPC/2015[2]).
O advogado também pode estipular outra forma de remuneração que vem a ser os denominados honorários contratuais, isto é, aqueles que nascem do encontro de vontades entre o profissional e, no presente enfrentamento, a vítima do evento danoso. Assim, perfeitamente cabível que as partes entabulem por escrito o valor a ser pago pelo cliente a seu advogado. Esse valor pode ser vinculado ao êxito na demanda como, por exemplo, vinte por cento do valor recebido pelo autor, assim como desvinculado da eventual vantagem patrimonial a ser recebida pela suposta vítima de dano. Nada obsta ainda que as partes prevejam um valor a título de pro labore para o advogado, sem prejuízo dos honorários a serem pagos ao final da demanda e em caso de vitória. Por exemplo, o advogado receberá a importância inicial de dez mil reais a serem pagos em cinco prestações de dois mil reais, acrescidos de quinze por cento do valor recebido pelo cliente.
A indagação que se faz nesse exato ponto diz respeito a possibilidade de o ofendido cobrar do autor do dano o valor que se viu na contingência de pagar ao seu advogado. Integraria tal verba o dever de reparação integral do dano? Em nosso modo de ver a resposta afirmativa se impõe, pois configura dano emergente sofrido pela vítima a necessidade de contratar um causídico para buscar em juízo a reparação do dano experimentado.
Essa defesa decorre da constatação lógica de que se não fosse a prática do dano indenizável, a vítima não necessitaria contratar advogado para postular em juízo a reparação do prejuízo sofrido, integrando tal valor o dever de reparação integral a que se refere o artigo 944, caput, do Código Civil[3].
Nesse passo, valiosa é a lição do professor Pablo Malheiros da Cunha Frota[4]quando assinala que desvendar a existência do nexo causal, a par da função de identificar o causador do dano, também possibilita ao intérprete medir a extensão do dano e, inegavelmente, repise-se, há vinculação material entre a conduta daquele que cometeu o ato ilícito com a necessidade de a vítima buscar o socorro do Poder Judiciário para obter a devida reparação civil, circunstância que, à luz do direito constitucional e infraconstitucional, não pode prescindir do trabalho técnico do advogado que, em regra, é remunerado pelo seu constituinte no exercício de seu múnus.
Além do que, na mesma linha de raciocínio, os artigos 389[5] e 404[6] da mesma lei, incluem expressamente os honorários de advogado nas perdas e danos a serem compostas pelo ofensor. Constando da lei civil, parece-nos que a referência a tal verba não se confunde com os honorários de sucumbência que possuem índole processual civil.
Entendemos, outrossim, que não há espaço para que ao término da demanda judicial reparatória com o pagamento dos honorários contratuais, a vítima se volte uma vez mais em face do ofensor para perseguir o valor que pagou a seu patrono. Razões de política judiciária e até mesmo o evitamento da eternização dos conflitos sugere que essa nova demanda não pode se viabilizar (Apelação Cível Nº 70056251150, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 13/11/2013).
Destarte, deverá ser juntado ao processo o contrato de honorários de advogado a fim de que em caso de procedência do pedido indenizatório, conste na condenação o valor pago ao advogado do autor, ou seja, o ofensor, além dos honorários de sucumbência, deverá suportar o prejuízo experimentado pelo lesado no tocante à remuneração que teve que desembolsar com o seu causídico. Pensar em sentido contrário seria,concessa vênia, deixar de proporcionar à vítima a reparação integral do dano que sofreu com a lesão.
Importa ainda assinalar que o valor dos honorários cobrados pela vítima será submetido ao contraditório e devidamente avaliado pelo juiz, não podendo se configurar em um valor exorbitante. Para a busca de um valor razoável que não enseje enriquecimento sem causa ou até mesmo uma possível fraude, o magistrado pode se louvar no valor previsto na tabela sugerida pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados local, sem embargo da necessidade de aferir as circunstâncias do caso concreto.


[1] Art. 23. Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor.
[2] Art. 85.  A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. … omissis … § 2o Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I – o grau de zelo do profissional; II – o lugar de prestação do serviço; III – a natureza e a importância da causa; IV – o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. … omissis … nos termos da lei.
[3] Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.
[4] FROTA, Pablo Malheiros da Cunha. Responsabilidade por Danos. Imputação e Nexo de Causalidade. Curitiba, Juruá, 2014, p. 112/113.
[5] Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.
[6] Art. 404. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.
SOBRE O AUTOR

Alternative TextMarco Aurélio Bezerra de Meloé Mestre em Direito pela Universidade Estácio de Sá. Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Professor Adjunto de Direito Civil e do Consumidor da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro.


Fonte: GenJurídico, 22/08/2016







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