O cônjuge sobrevivente que era casado sob o regime da comunhão parcial de bens não concorre com os descendentes na partilha de bens particulares do falecido, mas, além de ter direito à meação, não pode ser excluído da sucessão dos bens comuns, em concorrência com os demais herdeiros. O entendimento é da Terceira Turma do STJ, ao julgar o REsp 1377084 em 16/10/2013. Na ação de inventário
que deu origem ao recurso especial, o juízo de primeiro grau considerou que uma
viúva que fora casada em regime de comunhão parcial, além da meação a que tinha
direito (metade do patrimônio conjunto adquirido durante o casamento), deveria
entrar na divisão dos bens particulares do marido (aqueles que ele tinha antes
de casar), concorrendo na herança com os descendentes dele. A decisão foi
mantida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Diante disso, o espólio do
falecido recorreu ao STJ para pedir a exclusão da viúva na partilha dos bens
particulares. Os ministros decidiram o caso com base na interpretação do artigo
1.829, inciso I, do Código Civil de 2002 (CC/02), segundo o qual, “o cônjuge
supérstite casado sob o regime da comunhão parcial de bens integra o rol dos
herdeiros necessários do de cujus, quando este deixa patrimônio particular, em
concorrência com os descendentes”.
A ministra Nancy Andrighi,
relatora do recurso especial, lembrou que, antes da Lei do Divórcio, o regime
natural de bens era o da comunhão universal, “que confere ao cônjuge a meação
sobre a totalidade do patrimônio do casal, ficando excluído o consorte da
concorrência à herança”. A partir da vigência da Lei 6.515/77, o regime natural
passou a ser o da comunhão parcial, “segundo o qual se comunicam os bens que
sobrevierem ao casal, na constância do casamento, consideradas as exceções
legais”, afirmou. Segundo a ministra, essa mudança, que foi confirmada pelo
CC/02, fez surgir uma preocupação, porque seria injustificável passar do regime
da comunhão universal, no qual todos os bens presentes e futuros dos cônjuges
são comunicáveis, para o regime da comunhão parcial – sem dar ao cônjuge
sobrevivente o direito de concorrer com descendentes e ascendentes na herança.Por
essa razão, o cônjuge passou a ser considerado herdeiro necessário. Para
Andrighi, “o espírito dessa mudança foi evitar que um consorte fique ao
desamparo com a morte do outro”. Apesar disso, ela considera que, na comunhão
parcial, os bens exclusivos de um cônjuge não devem ser partilhados com o outro
após a sua morte, “sob pena de infringir o que ficou acordado entre os nubentes
no momento em que decidiram se unir em matrimônio” (artigos 1.659 e 1.661 do
CC). Para a relatora, a interpretação mais justa do artigo 1.829, inciso I, do
CC é aquela que permite que o sobrevivente herde, em concorrência com os
descendentes, a parte do patrimônio que ele próprio construiu com o falecido,
“porque é com a respectiva metade desses bens comuns que ele pode contar na
falta do outro, assim na morte como no divórcio”.
Em seu entendimento, a
interpretação de parte da doutrina de que o cônjuge herda, em concorrência com
os descendentes, tanto os bens comuns quanto os particulares, representa “a
transmutação do regime escolhido em vida”. Além disso, para ela, essa
interpretação conflita com os princípios da dignidade da pessoa humana,
autonomia privada, autorresponsabilidade, confiança legítima, boa-fé e
eticidade. Por fim, a ministra ressaltou que “afastar o cônjuge da concorrência
hereditária no que toca aos bens comuns, simplesmente porque já é meeiro, é
igualar dois institutos que têm naturezas absolutamente distintas”: a meação e
a herança. Andrighi disse que a meação já é do viúvo em virtude da dissolução
do casamento pela morte, enquanto a herança “é composta apenas dos bens do
falecido, estes sim distribuídos aos seus sucessores, dentre os quais se inclui
o consorte sobrevivente”.
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