O envio do cartão de crédito, ainda que bloqueado, sem pedido prévio e expresso do consumidor, caracteriza prática comercial abusiva e autoriza a indenização por danos morais. Para a
Terceira Turma do STJ, no julgamento do REsp 1199117 em 21/05/2013, essa prática viola
frontalmente o disposto no artigo 39, inciso III, do Código de Defesa do
Consumidor. A decisão foi tomada no julgamento de recurso do Ministério Público
de São Paulo contra uma administradora de cartão de crédito. Com o provimento
do recurso, foi restabelecida sentença da Justiça paulista que havia condenado
a administradora a se abster dessa prática e a indenizar os consumidores por
danos morais, além de reparar eventuais prejuízos materiais. A Turma, seguindo
a posição do relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, reconheceu o caráter
abusivo da conduta da administradora com o simples envio do cartão de crédito
sem solicitação prévia do consumidor. Para a Turma, o CDC tutela os interesses
dos consumidores em geral no período pré-contratual, proibindo abusos de
direito na atuação dos fornecedores no mercado de consumo. A prática de enviar
cartão não solicitado, concluiu, é absolutamente contrária à boa-fé objetiva.
O MP estadual ajuizou ação civil
pública visando impedir a administradora a remeter cartões de crédito aos
consumidores, sem que tenham solicitado previamente, sob pena de multa diária. Em
primeira instância, a administradora foi condenada a se abster, imediatamente,
de enviar ao consumidor, sem que haja solicitação prévia, cartões de crédito ou
outro tipo de produto que viole o disposto nos artigos 6°, inciso IV, e 39,
inciso III, do CDC, sob pena de multa diária de 50 salários mínimos. A
administradora foi ainda proibida de cobrar qualquer valor a título de encargo
ou prestação de serviço, referente aos cartões de crédito enviados aos
consumidores sem solicitação prévia, também sob pena do pagamento de multa
diária de 50 salários mínimos. Por fim, foi condenada a indenizar os
consumidores pelos danos morais e patrimoniais causados em razão do envio dos
cartões.
O banco apelou da sentença. O
Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), por maioria, proveu a apelação por
entender que o simples envio de cartão de crédito bloqueado não configuraria
prática vedada pelo ordenamento jurídico, constituindo mera oferta de serviço
sem qualquer dano ou prejuízo patrimonial. Contra a decisão, o MP interpôs
embargos infringentes, que foram rejeitados. Para o TJSP, o que o CDC veda é
que se considere contratado o serviço com o simples envio, obrigando o
consumidor a cancelar o cartão caso não o deseje.
Inconformado, o MP estadual
recorreu ao STJ sustentando que, na literalidade da lei, a prática adotada pela
administradora de cartões de crédito é expressamente vedada. É considerada
prática abusiva. O inciso III do artigo 39 do CDC diz que é vedado ao
fornecedor “enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer
produto, ou fornecer qualquer serviço”. Para o MP, a expressão legal não
permite relativização. Além disso, não reclama a ocorrência de lesão e não fala
em lesividade potencial ou situações de perigo. Simplesmente proíbe a conduta,
dentro da sistemática protetiva do CDC.
Em seu voto, o ministro Paulo de
Tarso Sanseverino ressaltou que, mesmo quando o cartão seja enviado bloqueado,
a situação vivenciada pelos consumidores gera angústia desnecessária,
especialmente para pessoas humildes e idosas. Ele citou precedente da própria
Terceira Turma, que, embora analisando situação diversa, concluiu pelo caráter
ilícito da conduta de enviar cartão não solicitado, com base no artigo 39, III,
do CDC. Naquele caso (REsp 1.061.500), foi duscutida a indenização por dano
moral a consumidor idoso que recebeu cartão desbloqueado, não solicitado,
seguido de faturas.
No caso atual, por maioria, a
Turma restabeleceu a sentença de primeira instância. Ficou vencido o ministro
Villas Bôas Cueva, para quem “o envio de cartão bloqueado ao consumidor, que
pode ou não solicitar o desbloqueio e aderir à opção de crédito, constitui
proposta, e não oferta de produto ou serviço, esta sim vedada pelo artigo 39,
III, do CDC”. Para o ministro Cueva, o envio de cartão desbloqueado pode gerar
dano patrimonial, em razão da cobrança indevida de anuidades, ou moral, pelo
incômodo das providências necessárias ao cancelamento. Já o cartão bloqueado,
segundo ele, não gera débito nem exige cancelamento. O ministro observou ainda
que, no caso, foram prestadas informações corretas ao consumidor.
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