Salomão destacou que a questão é
inusitada, porém recorrente. Segundo ele, há vários casos semelhantes
tramitando no país, mas esse é o primeiro analisado pelo STJ. Ele verificou
que, no campeonato alemão, um time recebeu indenização de dois milhões de euros
por erro na arbitragem. Mas, no caso, ficou comprovada a intenção do árbitro em
prejudicar o time, o que permitiu a aplicação da teoria da “perda da chance”. “Embora
possa parecer um tanto quanto insólita, é uma questão que tende a se tornar
recorrente e é importante que a enfrentemos, notadamente porque teremos uma
sequência de competições internacionais no nosso país”, alertou o relator.
Após ter o pedido de indenização
negado em primeira e segunda instância pela Justiça do Rio de Janeiro, o
torcedor Custódio Pereira Neto recorreu ao STJ alegando que, uma vez
reconhecidos o erro do árbitro e a relação de consumo entre torcedor e CBF, há
responsabilidade civil objetiva da entidade pelos atos de seus prepostos, entre
eles, os árbitros. Sustentou que não importa saber se o pênalti resultaria em
gol, pois a responsabilidade civil objetiva se consuma com erro,
independentemente da comprovação de culpa. Para justificar sua atitude de
buscar o Poder Judiciário para resolver questão aparentemente banal, Neto
apontou como precária a arbitragem brasileira de futebol. Afirma que
torcedores, jogadores e dirigentes de clube pedem providências à CBF, que
apenas aceita e valida as falhas dos árbitros, sem investir em sua formação e
aperfeiçoamento. No caso da partida realizada em 10 de maio de 2007, no
Maracanã, o torcedor afirma que o pênalti aconteceu aos 46 minutos do segundo
tempo, o árbitro estava em cima da falta violenta, mas não marcou. O lance,
segundo ele, aconteceu três dias depois que dirigentes do Botafogo teriam
pressionado a CBF por erros de arbitragem em outro campeonato. Do outro lado, a
defesa da CBF alegou que não houve nenhuma ilegalidade ou defeito na prestação
do serviço. “Erros de arbitragem e dos próprios jogadores são da própria
natureza do futebol”, afirmou o advogado na sustentação oral. Segundo ele, não
se pode atribuir a desclassificação do Atlético Mineiro ao erro de arbitragem.
“A prestação de serviço de arbitragem não inclui ser perfeito, até porque,
errar é humano”, disse.
O ministro Luis Felipe Salomão
afirmou que o artigo 3º do Estatuto do Torcedor (Lei 10.671/03) estabelece que
se equipara a fornecedor, nos termos do Código de Defesa do Consumidor (CDC) –
para todos os efeitos legais –, a entidade responsável pela organização da
competição. Mas para haver responsabilidade civil, é necessária a constatação
da materialização de ato ilícito, do dano e do nexo de causalidade. Segundo o
CDC, um produto ou serviço tem vício de adequação quando não corresponde à
legítima expectativa do consumidor quanto à sua utilização. Salomão destacou
que o artigo 30 do Estatuto do Torcedor, “atento à realidade das coisas”, não
proíbe o erro de fato não intencional do árbitro. O texto estabelece que é
direito do torcedor que a arbitragem seja independente, imparcial, previamente
remunerada e isenta de pressões. Por fim, o relator apontou que a derrota de
time de futebol, ainda que atribuída a erro da arbitragem, é dissabor que não
tem o poder de causar mágoa duradoura, a ponto de interferir intensamente no
bem-estar do torcedor.
Se o tema é futebol, Nelson
Rodrigues sempre aparece no debate. Ao criticar a qualificação dos árbitros
brasileiros, o torcedor citou o escritor: “Em futebol, o pior cego é quem vê
somente a bola.” Para questionar a tese do torcedor de que o pênalti não
marcado resultou na desclassificação do Galo, o advogado da CBF também buscou o
socorro do ilustre torcedor do Fluminense: “A função do pênalti é tão
importante que quem deveria cobrar era o presidente do clube.” Votos
proferidos, resultado definido, o ministro Antonio Carlos Ferreira encerrou o
julgamento com mais Nelson Rodrigues: “A arbitragem normal confere às partidas
um tédio profundo."
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