Para efeito de fixação de
indenização por danos à mercadoria ocorridos em transporte aéreo internacional,
o CDC não prevalece sobre a Convenção de Varsóvia quando o contrato de
transporte tiver por objeto equipamento adquirido no exterior para incrementar a
atividade comercial de sociedade empresária que não se afigure vulnerável na
relação jurídico-obrigacional. Na hipótese em foco, a mercadoria transportada
destinava-se a ampliar e a melhorar a prestação do serviço e, por conseguinte,
aumentar os lucros. Sob esse enfoque, não se pode conceber o contrato de
transporte isoladamente. Na verdade, a importação da mercadoria tem natureza de
ato complexo, envolvendo (i) a compra e venda propriamente dita, (ii) o
desembaraço para retirar o bem do país de origem, (iii) o eventual seguro, (iv)
o transporte e (v) o desembaraço no país de destino mediante o recolhimento de
taxas, impostos etc. Essas etapas do ato complexo de importação, conforme o
caso, podem ser efetivadas diretamente por agentes da própria empresa adquirente
ou envolver terceiros contratados para cada fim específico. Mas essa última
possibilidade – contratação de terceiros –, por si, não permite que se aplique
separadamente, a cada etapa, normas legais diversas da incidente sobre o ciclo
completo da importação. Desse modo, não há como considerar a importadora
destinatária final do ato complexo de importação nem dos atos e contratos
intermediários, entre eles o contrato de transporte, para o propósito da tutela
protetiva da legislação consumerista, sobretudo porque a mercadoria importada
irá integrar a cadeia produtiva dos serviços prestados pela empresa contratante
do transporte. Neste contexto, aplica-se, no caso em análise, o mesmo
entendimento adotado pelo STJ nos casos de financiamento bancário ou de
aplicação financeira com o propósito de ampliar capital de giro e de fomentar a
atividade empresarial. O capital obtido da instituição financeira,
evidentemente, destina-se, apenas, a fomentar a atividade industrial, comercial
ou de serviços e, com isso, ampliar os negócios e o lucro. Daí que nessas
operações não se aplica o CDC, pela ausência da figura do consumidor, definida
no art. 2º do referido diploma. Assim, da mesma forma que o financiamento e a
aplicação financeira mencionados fazem parte e não podem ser desmembrados do
ciclo de produção, comercialização e de prestação de serviços, o contrato de
transporte igualmente não pode ser retirado do ato complexo ora em análise.
Observe-se que, num e noutro caso, está-se diante de uma engrenagem complexa, que
demanda a prática de vários outros atos com o único escopo de fomentar a
atividade da pessoa jurídica. Ademais, não se desconhece que o STJ tem atenuado
a incidência da teoria finalista, aplicando o CDC quando, apesar de relação
jurídico-obrigacional entre comerciantes ou profissionais, estiver
caracterizada situação de vulnerabilidade ou hipossuficiência. Entretanto, a
empresa importadora não apresenta vulnerabilidade ou hipossuficiência, o que
afasta a incidência das normas do CDC. Dessa forma, inexistindo relação de
consumo, circunstância que impede a aplicação das regras específicas do CDC, há
que ser observada a Convenção de Varsóvia, que regula especificamente o
transporte aéreo internacional. Precedentes citados: REsp 1.358.231-SP,
Terceira Turma, DJ de 17/6/2013; e AgRg no Ag 1.291.994-SP, Terceira Turma, DJe
de 6/3/2012. REsp 1.162.649-SP, Rel. originário Min. Luis Felipe Salomão, Rel.
para acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 13/5/2014.
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