Blog de direito civil dos professores Carlos Nelson Konder e Cintia Muniz de Souza Konder
terça-feira, 14 de março de 2017
Estado deve indenizar preso em situação degradante, decide STF
O Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que o preso submetido a situação degradante e a superlotação na prisão
tem direito a indenização do Estado por danos morais. No Recurso Extraordinário (RE) 580252, com repercussão
geral reconhecida, os ministros restabeleceram decisão que havia fixado a indenização em R$ 2 mil para um
condenado.
No caso concreto, a Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul (DP-MS), em favor de um condenado a 20 anos de
reclusão, cumprindo pena no presídio de Corumbá (MS), recorreu contra acórdão do Tribunal de Justiça local (TJMS)
que, embora reconheça que a pena esteja sendo cumprida “em condições degradantes por força do desleixo dos órgãos e agentes públicos”, entendeu, no julgamento de embargos infringentes, não haver direito ao
pagamento de indenização por danos morais.
O Plenário acompanhou o voto proferido em dezembro de 2014 pelo relator, ministro Teori Zavascki (falecido), no
sentido do provimento do recurso. Em seu voto, o ministro restabeleceu o dever de o Estado pagar a indenização,
fixada em julgamento de apelação no valor de R$ 2 mil. Ele lembrou que a jurisprudência do Supremo reconhece a
responsabilidade do Estado pela integridade física e psíquica daqueles que estão sob sua custódia. Ressaltou
também que é notória a situação do sistema penitenciário sul-mato-grossense, com déficit de vagas e lesão a
direitos fundamentais dos presos.
Indenização e remição
Houve diferentes posições entre os ministros quanto à reparação a ser adotada, ficando majoritária a indenização
em dinheiro e parcela única. Cinco votos – ministros Teori Zavascki, Rosa Weber, Gilmar Mendes, Dias Toffoli e a
presidente do STF, ministra Cármen Lúcia – mantiveram a indenização estipulada em instâncias anteriores, de R$ 2
mil. Já os ministros Edson Fachin e Marco Aurélio adotaram a linha proposta pela Defensoria Pública de Mato
Grosso do Sul, com indenização de um salário mínimo por mês de detenção em situação degradante.
Proposta feita pelo ministro Luís Roberto Barroso, em voto proferido em maio de 2015, substituía a indenização
em dinheiro pela remição da pena, com redução dos dias de prisão proporcionalmente ao tempo em situação
degradante. A fórmula proposta por Barroso foi de um dia de redução da pena (remição) por 3 a 7 dias de prisão
em situação degradante. Esse entendimento foi seguido pelos ministros Luiz Fux e Celso de Mello.
Voto-vista
O julgamento foi retomado hoje com voto-vista da ministra Rosa Weber, que mesmo apoiando a proposta sugerida
pelo ministro Luís Roberto Barroso, viu com ressalvas a ampliação das hipóteses de remição da pena, e temeu a
criação de um salvo-conduto para a manutenção das condições degradantes no sistema prisional. “Estariam as
políticas públicas a perder duas vezes: as relativas aos presídios, em condições mais indesejadas, e as referentes à
segurança pública, prejudicada pela soltura antecipada de condenados”, afirmou. Também na sessão desta quintafeira,
votaram nesse sentido o ministro Dias Toffoli e a presidente, ministra Cármen Lúcia.
O voto do ministro Edson Fachin adotou a indenização pedida pela Defensoria. Ele fez ressalvas a se criar
judicialmente uma nova hipótese de remição de pena não prevista em lei. Adotou linha da indenização pecuniária
de um salário mínimo por mês de detenção em condições degradantes. Citando as más condições do sistema
prisional brasileiro – e do caso concreto – o ministro Marco Aurélio considerou “módica” a quantia de R$ 2 mil,
acolhendo também o pedido da Defensoria.
A posição de Luís Roberto Barroso foi seguida hoje pelo voto do ministro Luiz Fux, o qual mencionou a presença da
previsão da remição em proposta para a nova Lei de Execução Penal (LEP). Para ele, se a população carcerária em
geral propor ações de indenização ao Estado, criará ônus excessivo sem resolver necessariamente a situação dos
detentos. “A fixação de valores não será a solução mais eficiente e menos onerosa. Ela, será, a meu modo de ver, a
mais onerosa e menos eficiente”, afirmou.
Na mesma linha, o decano do Tribunal, ministro Celso de Mello, ressaltou a necessidade de se sanar a omissão do
Estado na esfera prisional, na qual subtrai ao apenado o direito a um tratamento penitenciário
digno. Ele concordou com a proposta feita pelo ministro Luís Roberto Barroso, destacando o entendimento de que
a entrega de uma indenização em dinheiro confere resposta pouco efetiva aos danos morais sofridos pelos
detentos, e drena recursos escassos que poderiam ser aplicados no encarceramento.
Tese
O Plenário aprovou também a seguinte tese, para fim de repercussão geral, mencionando o dispositivo da
Constituição Federal que prevê a reparação de danos pelo Estado:
“Considerando que é dever do Estado, imposto pelo sistema normativo, manter em seus presídios os padrões
mínimos de humanidade previstos no ordenamento jurídico, é de sua responsabilidade, nos termos do artigo
37, parágrafo 6º, da Constituição, a obrigação de ressarcir os danos, inclusive morais, comprovadamente causados
aos detentos em decorrência da falta ou insuficiência das condições legais de encarceramento”, diz.
Processo: RE 580252
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