Blog de direito civil dos professores Carlos Nelson Konder e Cintia Muniz de Souza Konder
terça-feira, 28 de março de 2017
Prazo para anular partilha realizada mediante coação é de quatro anos
Em negócios jurídicos realizados com suposto vício de vontade, como no caso de partilhas estabelecidas com algum
tipo de coação, o prazo para apresentar o pedido judicial de anulação é de quatro anos, conforme estipula o artigo
178, inciso I, do Código Civil. No caso de coação, o prazo de decadência deve ser contado a partir do dia em que ela
cessar.
O entendimento foi estabelecido pela Quarta Turma, que, ao afastar a incidência do prazo decadencial de um ano,
determinou a reabertura do prazo de instrução processual na primeira instância. A decisão foi unânime.
O recurso teve origem em ação na qual a ex-companheira buscava anulação das escrituras públicas de
reconhecimento e dissolução de união estável com partilha de bens, sob o argumento de que teria consentido com
a divisão do patrimônio mediante ameaças de morte e violência física contra si e seus familiares. Na partilha, o excompanheiro
recebeu aproximadamente R$ 34 milhões.
Aplicação
Em primeira instância, o juiz julgou extinto o processo por entender ter havido a decadência do pedido, pois foi
ultrapassado o prazo de um ano estabelecido pelo artigo 1.029 do Código de Processo Civil e pelo artigo 2.027 do
Código Civil. A sentença foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).
Em recurso especial, a ex-companheira alegou que os dispositivos citados pelas instâncias ordinárias não deveriam
ser aplicados ao processo, pois, conforme a regra geral trazida pelo artigo 178, inciso I, do Código Civil, o prazo
decadencial para anulação de negócio jurídico por vício de coação é de quatro anos.
Segurança jurídica
O ministro Luis Felipe Salomão, relator do recurso, explicou que, sob a vigência dos códigos de processo civil de
1973 e de 2002, tanto o STF (quando ainda tinha a atribuição de interpretar a lei federal) quanto o STJ pacificaram
o entendimento de que o prazo decadencial de um ano é específico para a anulação de partilhas do direito
sucessório. Dessa forma, não haveria a possibilidade de extensão para as demais espécies de partilha amigável, que se
submetem à regra geral quadrienal.
Para o ministro, como as novas legislações não acarretaram modificação da jurisprudência consolidada dos
tribunais superiores, a manutenção do entendimento das instâncias ordinárias “acabaria por trazer insegurança
jurídica, repudiando o ordenamento jurídico e a própria ideologia do novel diploma instrumental, que preza
justamente pelo prestígio da jurisprudência, mantendo-a estável, íntegra e coerente”.
Regra específica
O ministro Salomão também afastou a possibilidade de extensão do prazo aplicável às questões sucessórias devido
à existência de regra legal específica que se adequa ao caso analisado (o artigo 178 do Código Civil), que estabelece
o prazo decadencial de quatro anos para anular por vício de vontade o negócio jurídico.
“Deveras, é inadequada a utilização de interpretação extensiva de uma exceção à regra geral – artigos 2.027 do CC
e 1.029 do CPC/73, ambos inseridos, respectivamente, no livro ‘Do Direito das Sucessões’ e no capítulo intitulado
‘Do Inventário e Da Partilha’ –, para o preenchimento de lacuna inexistente (já que o artigo 178 do CC normatiza a
questão), ainda mais quando a exegese acaba por limitar ainda mais os direitos subjetivos, já que a adoção de
prazo decadencial reduzido acarreta, inarredavelmente, em extinção mais rápida do direito da parte”, concluiu o
ministro ao acolher o recurso especial.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
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