O fornecimento de dados de usuários de serviços de internet equipara-se à exibição de documentos, portanto eles devem ser preservados pelo prazo cabível para ajuizamento de ações relacionadas. Com esse entendimento, a
Terceira Turma do STJ, so julgar o REsp 1398985, em 25/11/2013, estabeleceu que é de
três anos o tempo de guarda dos registros de usuários de provedores de
conteúdos. O período é contado da data de cancelamento do serviço. Conforme a
ministra Nancy Andrighi, esse tempo se relaciona ao prazo de três anos para
prescrição das ações de reparação civil, previsto no Código Civil (artigo 206,
parágrafo 3º, inciso V). A ministra explicou que o Código Civil dispõe que o
empresário é obrigado a guardar documentos relativos à sua atividade enquanto
não ocorrer a prescrição ou decadência relativa aos atos registrados (artigo
1.194). Esse dispositivo deveria ser aplicado analogicamente ao caso.
O caso trata de mensagem ofensiva
enviada por usuário do serviço Yahoo! Grupos. Um fórum formado por alunos e
professores de uma faculdade foi usado para postagem de mensagem
discriminatória contra um grupo de estudantes de baixa renda beneficiados por
bolsas de estudo. Preocupada com a manifestação e considerando necessário se
posicionar institucionalmente, a mantenedora da faculdade ingressou com medida
cautelar contra o Yahoo! para identificação do responsável pela mensagem. O
Yahoo! respondeu que não haveria obrigação legal de manter os dados, já
excluídos de seus registros pelo cancelamento do serviço. Para o Tribunal de
Justiça de Minas Gerais (TJMG), no entanto, mesmo com a conta cancelada o
provedor teria obrigação de diligenciar junto a terceiros na busca da
identificação do autor.
Conforme a ministra Nancy
Andrighi, os gerenciadores de fóruns de discussão virtual são espécie de provedores
de conteúdo. A responsabilidade, portanto, corresponde às atividades dessa
natureza. Isto é, cabe aos gerenciadores de fóruns de discussão virtual a
garantia do sigilo, da segurança e da inviolabilidade dos dados cadastrais dos
usuários, além do funcionamento e manutenção das páginas que contenham os
grupos de debate. Quanto à identificação dos usuários, a ministra esclareceu
que a Terceira Turma já tem precedentes segundo os quais, no caso de serviços
que possibilitam a livre divulgação de opiniões, é dever do fornecedor
propiciar meios de registro dos usuários, coibindo o anonimato. Caso não o
faça, assume os riscos dos danos causados a terceiros. Para a ministra, essa
obrigação decorre da vedação ao anonimato (Constituição Federal, artigo 5º,
inciso IV) e do dever de informação e transparência do fornecedor de serviço
(Código de Defesa do Consumidor, artigo 6º, inciso III). “Ao oferecer um
serviço de provedoria de conteúdo, deve o fornecedor obter e manter dados
mínimos de identificação de seus usuários, com vistas a assegurar a eventuais
prejudicados pela utilização indevida ou abusiva do serviço – consumidores por
equiparação nos termos do artigo 17 do CDC – informações concretas sobre a
autoria do ilícito”, afirmou a ministra. “Cuida-se de cautela básica,
decorrente da legítima expectativa do consumidor – mesmo aquele que jamais
tenha feito uso do serviço – de que, sendo ofendido por intermédio de um site,
o seu provedor tenha condições de individualizar o usuário responsável”,
completou.
A relatora destacou ainda que não
se trata de buscar burocratização excessiva da internet. Porém, em seu
entender, é necessário encontrar um limite para o anonimato de seus usuários,
promovendo um equilíbrio entre o mundo virtual e o material, proporcionando
segurança às relações estabelecidas pela rede sem tolher sua informalidade
peculiar. “Por mais que se queira garantir a liberdade daqueles que navegam na
rede, reconhecendo-se essa condição como indispensável à própria existência e
desenvolvimento da internet, não podemos transformá-la numa ‘terra de ninguém’,
onde, sob o pretexto de não aniquilar as suas virtudes, se acabe por tolerar
sua utilização para a prática dos mais variados abusos”, asseverou a ministra
Nancy Andrighi.
A ministra contrariou, porém, o
TJMG em relação à obrigação do Yahoo! de buscar junto a terceiros os dados
excluídos de sua base. Como a medida cautelar tem caráter satisfativo –
identificar o responsável pelo ato ofensivo – e o Yahoo! descartou os
documentos que deveria ter mantido, a exibição desses dados fica
impossibilitada. Conforme a relatora, não se pode exigir da empresa que busque
esses dados junto a terceiros, até porque não dispõe de poder de polícia para
forçar a entrega das informações. Porém, isso não prejudica eventual direito da
universidade a buscar reparação pela conduta omissiva do Yahoo!. Apesar de atender parcialmente à pretensão
recursal do Yahoo!, a ministra Nancy Andrighi condenou a empresa a arcar com
honorários advocatícios de R$ 5 mil, em observância ao princípio da
causalidade.
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