Não gera dano moral coletivo o reconhecimento, em ação civil pública, de que é abusiva a cláusula de plano de
saúde que exclui cobertura de lentes intraoculares para cirurgia de catarata (facectomia) em contratos
anteriores à edição da Lei 9.656/98.
O entendimento é da Terceira Turma ao julgar recurso do Ministério Público Federal (MPF) contra a Golden
Cross Assistência Internacional de Saúde e a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Na sentença, o magistrado decidiu que não pode ser considerada ilegal uma conduta que antes era permitida
por lei, pois “somente com o advento da Lei 9.656/98 as próteses (lentes intraoculares), quando não destinadas
a fins estéticos, passaram obrigatoriamente a ser cobertas pelos planos de saúde”. Também ficou definido que
não havia omissão da ANS quanto ao dever de fiscalização.
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região, no entanto, reconheceu a exclusão como abusiva e condenou a
Golden Cross a ressarcir as despesas dos segurados com o valor das lentes, observando a prescrição de cinco
anos, contada da data da propositura da ação.
No STJ, o MPF afirmou que o simples fato de haver cláusula abusiva em contrato de adesão já geraria dano
moral coletivo. Requereu também a condenação da ANS à obrigação de elaborar um plano de ação que
“garanta a efetividade ao julgado”. Alegou, ainda, que o prazo prescricional para que os consumidores sejam
reembolsados seria de dez, e não de cinco anos.
Dúvida jurídica
De acordo com o relator, ministro Villas Bôas Cueva, o dano moral coletivo se dá “quando a conduta agride, de
modo totalmente injusto e intolerável, o ordenamento jurídico e os valores éticos fundamentais da sociedade
em si considerada, a provocar repulsa e indignação na consciência coletiva”.
Segundo ele, a mera infringência à lei ou ao contrato não é suficiente para a caracterização do dano moral
coletivo. “É essencial que o ato antijurídico praticado atinja alto grau de reprovabilidade e transborde os lindes
do individualismo, afetando, por sua gravidade e repercussão, o círculo primordial de valores sociais”.
Villas Bôas Cueva explicou que a dúvida jurídica que existia quanto ao caráter abusivo da negativa de cobertura
das lentes nos contratos anteriores à Lei 9.656/98 somente foi superada com a revisão de entendimento da
ANS sobre o tema. Assim, a Golden Cross, ao ter optado pela restrição contratual em data anterior, “não
incorreu em nenhuma prática socialmente execrável; tampouco foi atingida, de modo injustificável, a esfera
moral da comunidade”, disse o ministro.
Sem intenção
Para o relator, “não houve intenção deliberada da demandada em violar o ordenamento jurídico com vistas a
obter lucros predatórios em detrimento dos interesses transindividuais dos usuários de plano de saúde”.
Também, segundo ele, não há necessidade de condenar a ANS à obrigação de elaborar um plano de ação que
garanta efetividade ao julgado, pois após 15 de fevereiro de 2008 “nenhuma operadora de plano de saúde
pode mais recusar, para os contratos anteriores à edição da Lei 9.656/98, a cobertura de próteses (lentes
intraoculares) ligadas à cirurgia de catarata”.
Com relação ao prazo prescricional citado pelo MPF, Villas Bôas Cueva afirmou que, na falta de dispositivo legal
específico para a ação civil pública, “aplica-se, por analogia, o prazo de prescrição da ação popular, que é o
quinquenal, adotando-se também tal lapso na respectiva execução, a teor da Súmula 150/STF”.
Processo: REsp 1473846
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