domingo, 30 de dezembro de 2012

Mesmo sem relação de consumo, Embratel deve indenizar revendedora de carros por falhas no serviço

Ainda que uma empresa revendedora de veículos não possa ser equiparada a consumidor final de serviços de telefonia, a fornecedora deve indenizar pelas falhas ocorridas no sistema. A Terceira Turma do STJ, ao julgar o REsp 1195642 em 19/12/2012 , aplicou o direito à espécie para, mesmo afastando a incidência do CDC, manter a indenização por danos materiais concedida a uma revendedora de veículos com fundamento no CC. Os problemas nos telefones da revendedora ocorreram em agosto de 2007, no Rio de Janeiro. A loja alegava que as falhas teriam comprometido seus investimentos em publicidade, causando danos materiais e morais. A sentença acolheu o pedido de devolução parcial dos valores gastos com publicidade, fixando o dano em R$ 26 mil.
A ministra Nancy Andrighi, inicialmente, apontou que o STJ tem acolhido a teoria finalista aprofundada nas relações de consumo. Por essa interpretação, pode ser equiparada a consumidor a empresa que não retira o produto ou serviço de forma definitiva do mercado, desde que ocorra uma situação de vulnerabilidade. Assim, ainda que o consumo vise o lucro e se integre à atividade negocial, havendo vulnerabilidade da empresa contratante diante da fornecedora, podem-se aplicar as regras das relações consumeristas. A relatora acrescentou que, tradicionalmente, a doutrina apresenta três tipos de vulnerabilidade: técnica, caracterizada pelo desconhecimento específico do produto ou serviço; jurídica ou científica, pelo desconhecimento jurídico, contábil ou econômico e suas consequências nas relações; e fática ou socioeconômica, que abrange situações de insuficiência física, econômica ou mesmo psicológica do consumidor. Além disso, a jurisprudência estaria acolhendo mais recentemente a vulnerabilidade informacional, como desdobramento autônomo da vulnerabilidade técnica. E, ainda conforme a ministra, poderiam ser identificadas em cada caso outras formas de vulnerabilidade capazes de atrair a aplicação do CDC. No caso analisado, no entanto, nenhuma delas estaria presente. E a própria revendedora alegava que o serviço fazia parte de sua cadeia produtiva, sendo essencial ao seu negócio. Por isso, também não poderia ser considerada destinatária final do serviço de telefonia.
A relatora avaliou que, afastado o CDC e não havendo necessidade de revisar as provas produzidas, poderia o próprio STJ aplicar o direito ao caso concreto, conforme autoriza seu regimento interno. Assim, evita-se o retorno dos autos à origem, privilegiando a economia processual e a duração razoável do processo, ambos princípios constitucionais. “Compulsando os autos, verifica-se que, apesar de terem aplicado o CDC, as instâncias ordinárias concluíram pela suficiência da prova carreada aos autos e pela existência de culpa da Embratel”, afirmou a ministra. Um documento juntado pela própria telefônica indica que não houve nenhum serviço prestado entre 9 e 22 de agosto daquele ano. A sentença também considerou que, entre os dias 1º e 9 daquele mês, foram registradas menos de quatro ligações diárias e nenhuma entre os dias 10 e 21. Para a sentença, isso evidencia a existência do problema apontado pela autora. A Embratel não pleiteou a produção de prova contrária.
“Vale frisar que o juiz de primeiro grau de jurisdição não se baseia exclusivamente no CDC para impor o ônus da prova à Embratel, tendo fundamentado sua decisão no fato de que cumpria a ela comprovar a suposta inexistência de falha na prestação do serviço, porque se trata de fato impeditivo do direito da autora”, acrescentou a ministra. A relatora afirmou ainda que não se trata de inverter ou não o ônus da prova, mas aplicar a teoria da distribuição dinâmica da carga probatória. Assim, a Embratel teria melhores condições de produzir prova de inexistência do defeito do que a revendedora de provar tecnicamente sua ocorrência. Essa prova poderia ser até mesmo impossível, considerou a ministra Nancy Andrighi. “Seja com for, constata-se que a prova carreada aos autos é suficiente para evidenciar a culpa da Embratel pelos danos suportados pela recorrida, sendo evidente que o defeito no funcionamento das linhas telefônicas tornou inócuo, nos dias em que perdurou o problema, o investimento realizado em publicidade”, acrescentou a ministra. “Diante disso, apesar de, no particular, a condição de consumidora não ser extensível à recorrida, não se vislumbra motivo para reforma da parte dispositiva da sentença, calcada na existência de culpa da Embratel”, concluiu.

sábado, 29 de dezembro de 2012

Acionamento de air bag por buraco na pista não gera dano moral

Há responsabilidade objetiva do fabricante pelo disparo de dispositivo de proteção contra colisão efetivado pelo simples tráfego em estrada esburacada. Porém, o fato não causa dano moral indenizável. A decisão da Terceira Turma do STJ, ao julgar o REsp 1329189 em 21/12/2012, manteve a indenização por danos materiais, de R$ 12 mil, imposta à BMW pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN), mas afastou a condenação por danos morais. Na primeira instância, a sentença entendeu que o air bag foi acionado corretamente e sem vícios, já que o impacto causado pelo buraco na pista teria até mesmo cortado o pneu. O TJRN, porém, deu provimento à apelação, condenando a fabricante pelos danos materiais e também pelos morais, estes estipulados em R$ 5 mil. Para o TJRN, o abalo sofrido pelo adquirente de automóvel de luxo, que confia em sua qualidade divulgada pela propaganda, seria evidente. O dano moral decorreria do susto “memorável” e dos instantes de incerteza quanto aos desdobramentos “terríveis” do disparo do air bag, que afetou o controle do carro.
A ministra Nancy Andrighi afirmou que o acionamento do air bag realmente foi indevido e constitui defeito do produto. Para ela, o tráfego pelas rodovias brasileiras, com frequência em mau estado de conservação, configura situação regular de uso do produto, e não gera risco além do normal, por isso não se exclui a responsabilidade da fabricante. Ela destacou que a responsabilidade pelo fato do produto nas relações de consumo é objetiva e dispensa a análise da culpa. “O air bag constitui dispositivo de segurança, que objetiva proteger os ocupantes do veículo em caso de colisão. Dessa forma, se a causa do acionamento foi o automóvel ter passado por buraco na estrada em que trafegava, por óbvio que o dispositivo de segurança foi acionado erroneamente, o que constitui defeito do veículo”, avaliou a ministra.
Porém, com relação ao dano moral, ela divergiu do TJRN. Para a relatora, apesar de ser dispensável a comprovação do dano psicológico, sua ocorrência deve ser avaliada conforme regras de experiência do julgador. No caso, segundo ela, o acionamento do air bag representa mero aborrecimento, sem nenhuma exposição dos proprietários do carro a vexame ou constrangimento. “Não se discute a frustração da expectativa que se depositou na utilização de um veículo de luxo que apresentou defeito. Esse acontecimento, contudo, não é suficiente para evidenciar o dano moral”, ponderou a ministra Nancy Andrighi. De acordo com a relatora, não é possível imputar à fabricante do carro nenhuma conduta capaz de representar ofensa moral aos proprietários, e por essa razão deve ser afastada a condenação à compensação por danos morais imposta pelo tribunal de origem.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Sindicato responde por danos causados à sociedade em operação tartaruga

O STJ, ao julgar o REsp 207555 em 21/12/2012, confirmou a condenação do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários de Belo Horizonte ao pagamento de multa em razão de uma “operação tartaruga” promovida pela entidade em 1994, que causou verdadeiro caos urbano e prejuízos a toda a comunidade, usuários ou não do serviço. A Terceira Turma, em decisão unânime, seguiu o voto do relator, ministro Villas Bôas Cueva, que manteve o entendimento das instâncias originárias de que o sindicato responde civilmente pelos danos causados aos consumidores, lesados pela deflagração de paralisação “desarrazoada” do serviço público. O sindicato, afirmou o ministro, “responde, à luz das regras civilistas, por suas condutas material e moralmente lesivas praticadas no curso de movimento de cunho grevista, consoante previsto no artigo 15 da Lei 7.783/89”, bem como em virtude do dever de não lesar o próximo. O relator afirmou que, “evidentemente, mesmo no período de greve, ou de movimento sindical, em atividade essencial de transporte público (artigo 10, V, da Lei 7.783), faz-se necessário observar as garantias fundamentais previstas no artigo 5º da Constituição Federal, tais como o direito à vida, à segurança, à livre expressão e difusão do pensamento, à livre circulação, à propriedade privada e à liberdade de trabalho, a fim de encontrar o equilíbrio que deve ser buscado na colisão de direitos”. Villas Bôas Cueva concluiu que “a liberdade sindical relativa ao direito de greve não é absoluta, encontrando limites no sistema jurídico, em que os direitos dos cidadãos devem conviver harmonicamente”. O sindicato também foi proibido de realizar futuras manifestações análogas, sob pena do pagamento de multa, impondo-se a cessação do movimento ilegal.
Em 1994, após assembleia, o sindicato decidiu instigar a chamada “operação linguição” como estratégia de pressão para a reivindicação de melhoria de condições salariais a determinada categoria de empregados celetistas. Para tanto, os motoristas deveriam reduzir a velocidade dos ônibus para dez quilômetros por hora, “evitando toda e qualquer ultrapassagem, fechando cruzamentos e impedindo a entrada e saída de veículos particulares de suas garagens”. A Associação Brasileira de Consumidores ajuizou ação civil pública contra o sindicato, pedindo indenização correspondente à soma dos valores arrecadados pelas empresas concessionárias de transporte público de Belo Horizonte (vales-transportes, tickets e passagens) durante a operação padrão. A petição inicial esclarece que o sindicato não foi demandado como prestador ou fornecedor de serviços públicos, mas por, “deliberadamente e indevidamente, decidir, programar e executar ilícito civil em detrimento dos direitos do consumidor (usuário do transporte coletivo), com claro e nítido prejuízo econômico e moral".
Ao julgar o caso, o ministro Villas Bôas Cueva teceu reflexões sobre a competência para julgamento do processo. Salientou que até a Emenda Constitucional 45/04 (a denominada “Reforma do Judiciário”), as ações envolvendo reparação civil por prejuízos causados pelos sindicatos, decorrentes de atos ilícitos relacionados ao exercício do direito de greve, eram ajuizadas perante a Justiça comum. A partir da promulgação da emenda, houve ampliação do rol das matérias submetidas à Justiça do Trabalho, que passou a ser competente para julgar todas as ações fundadas no exercício do direito de greve. A sentença é de 1997, razão pela qual foi mantida a competência da Justiça comum para conhecer e julgar o caso em análise, conforme prevê a Súmula 367 do STJ.
“Independentemente da declaração da ilegalidade da denominada ‘operação linguição’, deflagrada na década de 90, as instâncias ordinárias reconheceram a ocorrência de efetivos danos aos consumidores, vítimas da má prestação do serviço público de transportes urbanos na cidade de Belo Horizonte” – afirmou o ministro, observando que o movimento provocou “verdadeiro caos urbano” cuja responsabilidade foi imputada exclusivamente ao sindicato, responsável por sua deflagração e instigação. O tribunal de segunda instância reconheceu o sindicato como responsável e mentor da operação, autor da ordem que deflagrou o movimento que “desrespeitou acintosamente o direito dos consumidores”. Para o ministro, “o sindicato ultrapassou os limites do seu direito, contrariando a finalidade da norma, abusando da paralisação”.
O sindicato pretendia que a empresa concessionária de transporte coletivo fosse incluída no processo, mas o relator confirmou o entendimento do tribunal estadual no sentido de não haver relação contratual ou legal apta a permitir eventual denunciação da lide no caso. Para o ministro, o sindicato pretende “desviar o foco da questão a fim de imputar a outrem (vítima do evento, diga-se de passagem) responsabilidade por sua conduta ilegal e abusiva no exercício do direito de greve, que deve ser reparada na esfera civil”.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Prescrição de indenização por morte conta do óbito e não do acidente que o causou

O prazo de prescrição do dano moral decorrente de falecimento de ente querido é contado da data da morte e não do acidente que a causou. Para a Terceira Turma do STJ, em julgamento do REsp 1318825 em 18/12/2012, não é possível que a pretensão à indenização, nesses casos, surja antes da morte. No recurso julgado, a Energisa Sergipe Distribuidora de Energia S/A discutia a obrigação de indenizar pela morte do morador de uma casa derrubada por inundação em 2004. O desabamento causou forte choque elétrico na vítima, que foi carregada pelas águas, desacordada. Localizada em estado grave, foi levada a hospital e faleceu dias depois. A Energisa foi condenada a pagar R$ 15 mil em danos morais a cada um dos dez autores da ação indenizatória, mais pensão de dois terços do salário mínimo até que a viúva completasse 70 anos de idade e os demais autores, 18 anos. Para a Justiça de Sergipe, a empresa foi negligente ao não isolar sua instalação elétrica, nem desligar a fonte de energia durante a inundação.
A ação foi proposta em 23 de janeiro de 2007, com pedido de danos morais por morte ocorrida em 5 de fevereiro de 2004, decorrente de afogamento e eletrocussão ocorridos em 21 de janeiro de 2004. Para a Energisa, a ação estaria prescrita, porque foi ajuizada mais de três anos depois da inundação, já que o prazo contaria do ato ilícito e não de seu resultado. Para a ministra Nancy Andrighi, acolher o entendimento da Energisa causaria situação absurda: “Se o pedido formulado pelos requeridos é de indenização por dano moral decorrente da perda de convívio com o ente querido, naturalmente sua pretensão nasce, não do acidente que o levou ao hospital, tão somente, mas do fato jurídico de sua morte, como consectário desse acidente. O óbito, assim, é um componente essencial do suporte fático sobre o qual incide a norma que ordena a indenização”. “Basta pensar em situação na qual a vítima permanecesse por mais de três anos em coma no hospital, em decorrência do acidente, antes de falecer. A contagem da prescrição a partir da data do fato, e não do óbito, poderia resultar na impossibilidade de ajuizamento da ação: antes da morte, por ausência de interesse; depois da morte, pela prescrição”, acrescentou.
Ela avaliou que poderia ser argumentada a possibilidade de ajuizamento de ação já em razão do acidente, mas concluiu que as pretensões seriam diversas. “A dor decorrente da perda do ente querido é fonte autônoma de direito a reparação, e tal dor não pode ser sentida por antecipação”, entendeu. “O mesmo raciocínio vale para o direito ao dano material decorrente do falecimento. Enquanto a vítima se encontrava em tratamento no hospital, não era possível avaliar se de lá sairia apta ou não para o trabalho. A fonte do direito à reparação, portanto, também para este aspecto da controvérsia, está no falecimento”, concluiu.
A Energisa também sustentou que não seria a hipótese de responsabilização objetiva, porque o acidente decorreu de chuva torrencial, caso fortuito clássico que afastaria o nexo causal. Porém, a ministra Nancy Andrighi apontou que a Justiça local entendeu ter havido omissão de funcionário da empresa. Mesmo solicitado, ele não desligou a chave de força, agravando o risco. Essa situação evidencia nexo causal entre a atitude do agente da empresa e o dano, e contrariar tal conclusão exigiria revisão de provas, proibida pela Súmula 7 do STJ.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Ford terá de indenizar antiga concessionária por rescisão de contrato sem justa causa

A Ford terá de indenizar uma revendedora de veículos por ter rescindido sem justa causa o contrato de concessão comercial. O STJ, ao julgar o REsp 1345653 em 14/12/2012, reconheceu que houve violação do artigo 11 da Lei Renato Ferrari (Lei 6.729/79), segundo o qual o pagamento do preço das mercadorias não pode ser exigido antes do faturamento, salvo ajuste diverso. A Terceira Turma seguiu o voto do relator, ministro Villas Bôas Cueva, para dar provimento ao recurso especial para restabelecer a sentença. A Autovel e a Ford mantiveram por vários anos contrato de concessão de veículos automotores, sendo a ação proposta em virtude do descumprimento, pela montadora, da obrigação assumida de faturar 180 veículos por mês, durante oito anos. A Ford, em sua defesa, alegou que a falta de pagamento constituiu justa causa para a desoneração da obrigação de faturar unidades à concessionária e para a rescisão da concessão. Em primeiro grau, o pedido foi julgado procedente, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) deu provimento ao apelo da Ford, acolhendo o argumento de que a recusa de faturamento foi lícita, porque a concessionária deixou de efetuar o pagamento à vista antes do faturamento. Assim, para o TJSP, teria havido justa causa para a rescisão do contrato de concessão. No recurso especial, a Autovel afirmou que o acórdão violou os artigos 476 do Código Civil e 11 da Lei 6.729/79, pois descumpriu a ordem estabelecida entre as partes no contrato: primeiro faturar para em seguida promover o pagamento.
Ao analisar o caso, o ministro Villas Bôas Cueva constatou que a solução do litígio no STJ não exigia o debate sobre cláusulas contratuais, nem sobre provas. Para ele, a questão é jurídica e resume-se a definir a ordem para que se proceda ao pagamento à vista: se antes ou depois do faturamento. O ministro fez comentários sobre a Lei Renato Ferrari, que dispôs sobre a concessão comercial entre produtores e distribuidores de veículos automotores de via terrestre. “Na elaboração da lei, agiu o legislador com grande avanço e coragem, reconhecendo e tipificando uma das modalidades contratuais mais controvertidas, que surgiu com o crescimento industrial no setor automobilístico”, refletiu Cueva. E exatamente por se tratar de diploma legal que tem como um de seus objetos a regulação de relações de mercado de todo um setor econômico, previu algumas permissões entre os contratantes, reconhecendo a necessidade de lhes delegar a fixação de determinadas questões, como a forma de pagamento, através das convenções das marcas.
No caso da convenção da Ford, consta que o pagamento deveria ser à vista. No entanto, o ministro Cueva constatou que em nenhum momento foi resolvido que o pagamento seria efetuado antecipadamente ao faturamento. “Não existindo na convenção de marcas a determinação do pagamento antecipado, o preço somente poderá ser exigido após o faturamento, nos termos do artigo 11 da Lei Ferrari, em sua primeira parte”, disse. O ministro lembrou o que dispõe o artigo 476 do Código Civil: “Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento do outro.” Ou seja, somente ocorrendo o descumprimento da obrigação de uma das partes, a outra pode deixar de cumprir sua parcela no trato, porque, em tese, poderá não receber o que lhe é devido. Assim, o relator concluiu que houve abuso de direito por parte da Ford, o que justifica a condenação aos prejuízos a que deu causa.

DIREITO DO CONSUMIDOR. CONSUMO INTERMEDIÁRIO. VULNERABILIDADE. FINALISMO APROFUNDADO.



Não ostenta a qualidade de consumidor a pessoa física ou jurídica que não é destinatária fática ou econômica do bem ou serviço, salvo se caracterizada a sua vulnerabilidade frente ao fornecedor. A determinação da qualidade de consumidor deve, em regra, ser feita mediante aplicação da teoria finalista, que, numa exegese restritiva do art. 2º do CDC, considera destinatário final tão somente o destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa física ou jurídica. Dessa forma, fica excluído da proteção do CDC o consumo intermediário, assim entendido como aquele cujo produto retorna para as cadeias de produção e distribuição, compondo o custo (e, portanto, o preço final) de um novo bem ou serviço. Vale dizer, só pode ser considerado consumidor, para fins de tutela pelo CDC, aquele que exaure a função econômica do bem ou serviço, excluindo-o de forma definitiva do mercado de consumo. Todavia, a jurisprudência do STJ, tomando por base o conceito de consumidor por equiparação previsto no art. 29 do CDC, tem evoluído para uma aplicação temperada da teoria finalista frente às pessoas jurídicas, num processo que a doutrina vem denominando “finalismo aprofundado”. Assim, tem se admitido que, em determinadas hipóteses, a pessoa jurídica adquirente de um produto ou serviço possa ser equiparada à condição de consumidora, por apresentar frente ao fornecedor alguma vulnerabilidade, que constitui o princípio-motor da política nacional das relações de consumo, premissa expressamente fixada no art. 4º, I, do CDC, que legitima toda a proteção conferida ao consumidor. A doutrina tradicionalmente aponta a existência de três modalidades de vulnerabilidade: técnica (ausência de conhecimento específico acerca do produto ou serviço objeto de consumo), jurídica (falta de conhecimento jurídico, contábil ou econômico e de seus reflexos na relação de consumo) e fática (situações em que a insuficiência econômica, física ou até mesmo psicológica do consumidor o coloca em pé de desigualdade frente ao fornecedor). Mais recentemente, tem se incluído também a vulnerabilidade informacional (dados insuficientes sobre o produto ou serviço capazes de influenciar no processo decisório de compra). Além disso, a casuística poderá apresentar novas formas de vulnerabilidade aptas a atrair a incidência do CDC à relação de consumo. Numa relação interempresarial, para além das hipóteses de vulnerabilidade já consagradas pela doutrina e pela jurisprudência, a relação de dependência de uma das partes frente à outra pode, conforme o caso, caracterizar uma vulnerabilidade legitimadora da aplicação do CDC, mitigando os rigores da teoria finalista e autorizando a equiparação da pessoa jurídica compradora à condição de consumidora. Precedentes citados: REsp 1.196.951-PI, DJe 9/4/2012, e REsp 1.027.165-ES, DJe 14/6/2011. REsp 1.195.642-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/11/2012.

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Acidente no rodoanel de São Paulo gera dano moral a moradores que tiveram de sair de casa

A Terceira Turma do STJ, ao julgar o REsp 1292141 em 13/12/2012 , entendeu que a necessidade de desocupação temporária de residências, em razão de acidente ocorrido durante a execução de obras no Rodoanel Mário Covas, em São Paulo, caracteriza a ocorrência de dano moral. O colegiado condenou a Petróleo Brasileiro S/A (Petrobras) e a Dersa Desenvolvimento Rodoviário S/A, solidariamente, ao pagamento de R$ 500 por dia de comprovado afastamento dos moradores da área do acidente. Os moradores ajuizaram ação de compensação por danos morais contra a Petrobras, por causa do rompimento de gasoduto, durante obras executadas pela Dersa no Rodoanel Mário Covas. O acidente provocou a formação de uma nuvem de gás sobre os bairros vizinhos, o que obrigou os moradores a deixar suas casas às pressas, durante três dias, causando-lhes “graves abalos emocionais”. O juízo de primeiro grau negou o pedido, considerando que não foi comprovada a existência de dano moral. O Tribunal de Justiça de São Paulo, ao julgar a apelação, afirmou que a descrição dos danos foi genérica e imprecisa, não demonstrando a ocorrência de danos morais a serem indenizados. Entretanto, reconheceu expressamente a responsabilidade civil da Petrobras e da Dersa pelos danos que porventura decorressem do evento.
Os moradores recorreram ao STJ sustentando que a necessidade de desocupação dos lares por “no mínimo” três dias já é suficiente para caracterizar a existência de dano moral. Alegaram ainda que não é necessário comprovar o dano, sendo suficiente a demonstração do fato que o gerou, uma vez que a situação retratada não pode ser compreendida dentro do padrão de normalidade do homem médio. Em seu voto, a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, afirmou que a retirada dos moradores de suas residências foi necessária e eficaz para a sua segurança, como forma de evitar danos mais graves. Entretanto, segundo a ministra, essa remoção resultou em dano moral, “decorrente da angústia que naturalmente envolveu os moradores quando, totalmente fora de suas legítimas expectativas, se viram obrigados a deixar seus lares às pressas, tomados pela incerteza de que não seriam destruídos pelo risco de eminente explosão”. Ao arbitrar em R$ 500 por dia o valor da indenização, a ministra Nancy Andrighi levou em consideração a falta de descrição individualizada da situação vivenciada por cada uma das partes, além das notícias de que algumas pessoas permaneceram fora de casa por tempo maior que outras. “Assim, tenho que a indenização deve ser fixada por cada dia de efetivo afastamento do lar, deixando para a fase de liquidação a comprovação da totalidade de dias”, declarou a ministra.

DIREITO CIVIL. IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA. CONTRIBUIÇÃO CRIADA POR ASSOCIAÇÃO DE MORADORES.



A impenhorabilidade do bem de família, conferida pela Lei n. 8.009/1990, não pode ser afastada em cobrança de dívida fundada em contribuições criadas por associações de moradores. As taxas de manutenção criadas por associações de moradores não são devidas por morador não associado, pois não podem ser equiparadas, para fins e efeitos de direito, a despesas condominiais. A possibilidade de cobrança de taxa condominial decorre de lei, e tem natureza jurídica de dívida propter rem. O fundamento da cobrança de tal contribuição é, entre outros, a existência de áreas comuns, de propriedade de todos os condôminos, que obrigatoriamente devem ser mantidas pela universalidade de proprietários. O direito ao pagamento da taxa devida a associação de moradores é pessoal, derivado da vedação ao enriquecimento ilícito, assim não se pode enquadrar a verba no permissivo do art. 3º, IV, da Lei 8.009/1990, que excepciona a impenhorabilidade do bem de família nas hipóteses de "cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar". A orientação das hipóteses descritas nessa norma é claramente a de excepcionar despesas impositivas, como ocorre nos tributos em geral. Nesse sentido, a despesa condominial, por seu caráter propter rem, aproxima-se de tal natureza, daí a possibilidade de seu enquadramento nesse permissivo legal. A taxa associativa, de modo algum carrega essa natureza. Precedentes citados: EREsp 444.931-SP, DJ 1º/2//2006, e AgRg no REsp 1.125.837-SP, DJe 5/6/2012. REsp 1.324.107-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/11/2012.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Terceira Turma aplica teoria da perda da chance e reduz indenização por erro médico

A Terceira Turma do STJ, ao julgar o REsp 1254141 em 14/12/2012, reduziu o valor de indenização – de R$ 120 mil para 96 mil – a ser paga por médico oncologista em virtude de erro profissional no tratamento de câncer de mama. O colegiado, seguindo o voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, aplicou ao caso a teoria da perda da chance. “Admitida a indenização pela chance perdida, o valor do bem deve ser calculado em uma proporção sobre o prejuízo final experimentado pela vítima. A chance, contudo, jamais pode alcançar o valor do bem perdido. É necessária uma redução proporcional”, assinalou a ministra. No caso, a família da vítima ajuizou ação de indenização contra o médico alegando que, durante o tratamento do câncer na mama, ele teria cometido uma série de erros, como falta de recomendação da quimioterapia, realização de mastectomia parcial em vez da radical e falta de orientação para não engravidar. A família afirmou ainda que, com o reaparecimento da doença, novamente o tratamento foi inadequado, e houve metástase que foi negada pelo médico. Em medida cautelar de produção de provas ajuizada previamente, os erros foram confirmados.
O médico negou todos os fatos, defendendo a adequação do tratamento por ele prescrito, e impugnou o laudo pericial. Também apresentou reconvenção, alegando que o processo conteria apologia ao erro médico e que a indenização seria devida a ele, tanto pelo abalo psicológico, como pelo suposto dano de imagem decorrente da acusação feita pela família. O juízo de primeiro grau condenou o médico ao pagamento de R$ 120 mil pelo dano moral, mais a reparação do dano material alegado pela família. No julgamento da apelação, o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) manteve a condenação, considerando que a falecida teve chances objetivas perdidas por conta do erro médico.
Em seu voto, a ministra Nancy Andrighi afirmou que o STJ vem enfrentando diversas hipóteses de responsabilidade civil pela perda da chance em sua versão tradicional, na qual o agente tira da vítima uma oportunidade de ganho. Segundo a ministra, nos casos em que se discute erro médico, a incerteza não está no dano experimentado, principalmente nas situações em que a vítima vem a morrer. “A incerteza está na participação do médico nesse resultado, à medida que, em princípio, o dano é causado por força da doença, e não pela falha de tratamento”, disse ela. A ministra destacou que, no caso, a extensão do dano já está definida, e o que resta saber é se esse dano teve como causa também a conduta do réu. “A incerteza, portanto, não está na consequência. Por isso ganha relevo a alegação da ausência de nexo causal. A conduta do médico não provocou a doença que levou a óbito, mas, mantidas as conclusões do acórdão quanto às provas dos autos, apenas frustrou a oportunidade de uma cura incerta”, disse a relatora.
No julgamento do processo foi exposta a controvérsia acerca do assunto existente entre a doutrina francesa e a americana. Muitos autores franceses entendem que, nas situações em que a conduta adequada do réu teria potencial de interromper um processo danoso, não seria possível aplicar a teoria da perda da chance. Haveria, nesses casos, um dano conhecido e a necessidade de comprovação da responsabilidade do réu por esse dano. O julgamento, assim, teria de ser realizado mediante um critério de tudo ou nada: se o nexo entre a conduta do réu e o dano fosse comprovado, a indenização deveria ser integral. Se o nexo não fosse comprovado, nenhuma indenização seria devida. Nos Estados Unidos, por outro lado, a doutrina, aplicando à hipótese os princípios da análise econômica do direito, vê a chance perdida como uma “commodity” autônoma, passível de indenização. O nexo, assim, seria estabelecido entre a conduta do réu e a perda desse direito autônomo à chance. Contornam-se, com isso, os desafios que a apreciação do nexo causal suscita e toda a dificuldade do trato da questão seria resolvida no âmbito da quantificação do dano. A Terceira Turma, acompanhando o voto da relatora, posicionou-se no sentido da doutrina americana, reconhecendo a autonomia do dano. Tendo isso em vista, e ponderando todas as circunstâncias do caso, a Turma concluiu que as chances perdidas, por força da atuação do médico, têm conteúdo econômico equivalente a 80% do valor fixado pela sentença e mantido pelo TJPR a título de indenização.

DIREITO CIVIL. JUROS DE MORA. NÃO INCIDÊNCIA DA SELIC CUMULADA COM CORREÇÃO MONETÁRIA.



A incidência da taxa Selic como juros moratórios exclui a correção monetária, sob pena de bis in idem, considerando que a referida taxa já é composta de juros e correção monetária. Precedentes citados: EDcl nos EDcl nos EDcl nos EREsp 727.842-SP, DJe 23/11/2009; REsp 951.521-MA, DJe 11/5/2011, e REsp 1.139.997-RJ, DJe 23/2/2011. EDcl no REsp 1.025.298-RS, Rel. originário Min. Massami Uyeda, Rel. para acórdão Min. Luis Felipe Salomão, julgados em 28/11/2012.

domingo, 23 de dezembro de 2012

Excesso em doações que possa prejudicar herdeiros deve ser avaliado no momento do ato

A Segunda Seção do STJ, em 17/12/2012, rejeitou AR 3493 que pretendia anular julgamento da Terceira Turma, que entendeu válidas as doações feitas ao longo da vida por falecido à sua viúva. Para o autor da rescisória, o excesso de doações deveria ser considerado no momento da abertura da sucessão. O autor, herdeiro necessário do falecido, argumentava que as sucessivas doações teriam dilapidado o patrimônio e o quinhão a que ele teria direito. Ao final dos 30 anos de convivência e depois da doação de 19 imóveis à esposa, teria restado ao filho do falecido, na partilha, apenas 0,006% do patrimônio original.
Para o ministro Luis Felipe Salomão, o herdeiro não comprovou a existência de doações que ultrapassassem, no momento em que realizadas, a parcela patrimonial de que o proprietário poderia dispor livremente – isto é, que avançassem sobre a parte do patrimônio que a lei reserva aos descendentes ou ascendentes, considerados herdeiros necessários. Na decisão da Terceira Turma, atacada pela ação rescisória, o ministro Menezes Direito afirmou que “o argumento da pobreza final, da não existência de bens para os herdeiros necessários quando da abertura da sucessão, não tem força para anular as doações se, no momento em que foram feitas, o patrimônio do doador tinha condições para desqualificar o excesso”.
O relator da rescisória, ministro Salomão, entendeu que tal interpretação não contraria a literalidade nem o espírito da lei quanto ao tema. Dizia o artigo 1.176 do Código Civil de 1916, correspondente ao artigo 549 do atual: “Nula é também a doação quanto à parte que exceder a de que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.” O ministro ainda afirmou que, mesmo que só se pudesse conhecer o patrimônio total do doador após a abertura da sucessão, isso não afastaria a necessidade de o autor demonstrar, nesse momento, que as doações violaram o direito dos herdeiros necessários quando efetuadas. “O argumento de que a ação apenas seria cabível após a abertura da sucessão não significa que o patrimônio a ser levado em consideração seja o existente no momento do óbito”, concluiu Salomão.

DIREITO CIVIL. CLÁUSULA DE CONTRATO BANCÁRIO. PESQUISA, DIVULGAÇÃO E INFORMAÇÃO AO CRC.



A cláusula contratual que dispõe sobre a autorização para consultar, pesquisar e divulgar informações à Central de Risco de Crédito do Banco Central do Brasil – CRC pela instituição financeira não viola o direito à intimidade e ao sigilo bancário. A Res. n. 2.724/2000-Bacen, que substituiu a Res. n. 2.390/1997-Bacen, regulamentou fornecimento de informações ao CRC, dispondo que as instituições financeiras nela discriminadas devem prestar informações acerca dos débitos e responsabilidades por garantias de clientes. Inicialmente, cabe registrar que o CRC não constitui um serviço restritivo ou negativo. As informações nele constantes referem-se às operações e aos títulos de crédito no âmbito do Sistema Financeiro Nacional, bem como às respectivas garantias contratadas, tanto por pessoas físicas quanto jurídicas perante às instituições financeiras. Seu desiderato é a monitoração de todos os bancos e instituições congêneres com vistas à manutenção da estabilidade do sistema bancário e, por conseguinte, do próprio sistema de crédito mediante a proteção dos recursos depositados pelos cidadãos nas referidas instituições. A mencionada resolução também determinou que o acesso às informações do CRC só é possível mediante autorização do cliente pesquisado. Assim, por estar redigida de acordo com a legislação vigente, a cláusula contratual em questão não importa numa fragilização da proteção dada ao consumidor de serviços bancários. As informações a serem divulgadas, pesquisadas e consultadas, segundo a cláusula, são consolidadas, ou seja, são informações seguras e precisas. Ademais, as instituições financeiras são responsáveis pelos danos causados pelo lançamento incorreto ou indevido que venha a causar prejuízo ao consumidor. Precedentes citados: REsp 786.239-SP, DJe 13/5/2009, e REsp 994.253-RS, DJe 24/11/2008. REsp 1.346.050-SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 20/11/2012.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Plano de saúde é obrigado a cobrir atendimento domiciliar para doença prevista no contrato

O ministro Luis Felipe Salomão, do STJ, ao julgar o AREsp 90117 em 06/12/2012, reconheceu como abusiva a cláusula restritiva de direito que exclui do plano de saúde o custeio de serviço de home care (internação domiciliar), quando a doença está abrangida pelo contrato. A decisão beneficiou uma segurada de São Paulo e obriga a Amil Assistência Média Internacional a arcar com o tratamento especial. A segurada ingressou com ação de obrigação de fazer e obteve sucesso em primeira instância. O juiz entendeu que a necessidade de acompanhamento da paciente no sistema de home care estava justificada por relatórios médicos, segundo os quais ela dependia de outra pessoa para todas as atividades básicas diárias. A Amil apelou e o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) acolheu a tese de que a recusa na continuidade da prestação do serviço não seria abusiva, pois a exclusão, uma limitação possível, estava prevista no contrato. Além disso, entendeu que o fato de o serviço já ter sido prestado por certo período não leva, por si só, à conclusão de que a administradora reconheceu a obrigação. A paciente recorreu, mas o recurso especial não foi admitido pelo TJSP. Ela, então, apresentou agravo diretamente ao STJ, para que o Tribunal Superior analisasse a questão.
Ao decidir a questão monocraticamente, o ministro Salomão restabeleceu a sentença e reafirmou que o paciente consumidor do plano de saúde não pode ser impedido por cláusula limitativa de receber tratamento com o método mais moderno do momento em que instalada a doença coberta pelo contrato. Salomão lembrou diversos precedentes do STJ que já vêm reconhecendo a ilegalidade da recusa das seguradoras em custear determinados tratamentos indicados para doenças que têm a cobertura prevista no contrato do plano de saúde. Em um deles (REsp 668.216), o então ministro Carlos Alberto Menezes Direito (já falecido) ponderou que o contrato pode dispor sobre as patologias cobertas, não sobre o tipo de tratamento para cada patologia alcançada pelo plano. “Na verdade, se não fosse assim, estar-se-ia autorizando que a empresa se substituísse aos médicos na escolha da terapia adequada, de acordo com o plano de cobertura do paciente”, afirmou em seu voto. O STJ já reconheceu, em outros julgamentos, a obrigatoriedade do custeio de prótese em procedimento cirúrgico coberto pelo plano de saúde (Ag 1.139.871 e REsp 1.046.355); cobertura de tratamento quimioterápico para tratamento de câncer (REsp 668.216 e ); custeio de medicamentos correlatos ao tratamento de quimioterapia, ministrados em ambiente domiciliar (Ag 1.137.474), e serviço de home care (Ag 1.390.883 e AREsp 215.639).

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Fiador responde por juros de mora desde a data de vencimento dos aluguéis não pagos

A Quarta Turma do STJ, ao julgar o REsp 1264820 em 04/12/2012, decidiu que, no caso de inadimplemento de contrato de aluguel e execução do fiador, este é obrigado a suportar os juros de mora desde o vencimento das parcelas não pagas, e não apenas a partir de sua citação. Seguindo o voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão, a Turma manteve decisão das instâncias ordinárias e negou recurso especial interposto por um fiador condenado a responder pelos aluguéis não quitados na época devida, com juros moratórios desde o vencimento. O dono do imóvel alugado havia ingressado com ação de despejo por falta de pagamento, cumulada com a cobrança de aluguéis e encargos, requerendo a citação dos fiadores.
Para o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, existindo cláusula de responsabilidade do fiador até a entrega das chaves, a mera prorrogação do contrato não extingue a fiança. Como o contrato especificava o valor do aluguel e a data de pagamento, os juros moratórios deveriam incidir desde o vencimento de cada parcela, de acordo com o artigo 397 do Código Civil. Em sua defesa, o fiador alegou que o início da fluência dos juros deveria se dar na citação, e não como entendeu o tribunal estadual. Para ele, na qualidade de fiador, não tinha a obrigação de pagar os aluguéis no vencimento, pois a obrigação seria do locatário, que recebia os documentos para pagamento em sua residência. Ao analisar o recurso, o ministro Luis Felipe Salomão observou que a questão controvertida consistia em saber se os juros de mora referentes a débito do fiador, relativo a prestações mensais previstas no contrato de locação de imóvel urbano, correm da mesma forma que para o afiançado ou somente a partir da citação.
O magistrado destacou que, segundo a Súmula 214 do STJ, o fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento com o qual não consentiu e, por razões de equidade, também não pode ser responsável por despesas judiciais antes de sua citação, visto que não lhe foi dada a possibilidade de satisfazer a obrigação que afiançou. Porém, o ministro lembrou que a fiança não constitui obrigação distinta da contraída pelo afiançado, colocando-se o fiador na condição de devedor subsidiário. Na fiança, afirmou o ministro, o fiador se obriga a satisfazer uma obrigação assumida pelo devedor e, salvo pactuação em contrário, ele assume também os acessórios da obrigação principal. Para Luis Felipe Salomão, “a mora ex re independe de qualquer ato do credor, como interpelação ou citação, porquanto decorre do próprio inadimplemento de obrigação positiva, líquida e com termo implementado, cuja matriz normativa é o artigo 960, primeira parte, do Código Civil de 1916, reproduzido no Código Civil atual, no caput do artigo 397”.
Diz o artigo 397 que, nessas situações, o inadimplemento da obrigação “constitui de pleno direito em mora o devedor”. O parágrafo único desse artigo estabelece que, “não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação judicial ou extrajudicial”. “Assim”, acrescentou o ministro, “em se tratando de mora ex re, aplica-se o antigo e conhecido brocardo dies interpellat pro homine (o termo interpela no lugar do credor). A razão de ser é singela: sendo o devedor sabedor da data em que deve ser adimplida a obrigação líquida, porque decorre do título de crédito, descabe advertência complementar por parte do credor”. Ele concluiu que, portanto, “havendo obrigação líquida e exigível a determinado termo – desde que não seja daquelas em que a própria lei afasta a constituição de mora automática –, o inadimplemento ocorre no vencimento”. Salomão observou ainda que o artigo 823 do Código Civil “prevê expressamente que a fiança pode ser em valor inferior ao da obrigação principal e contraída em condições menos onerosas, limitando-se, todavia, ao valor da obrigação principal”. Assim, segundo ele, diante dessa expressa previsão legal, seria possível ao fiador pactuar que a incidência dos juros de mora se desse apenas a partir de sua citação, o que não ocorreu no caso.

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

STJ Especial - Franquia: veja o que o STJ vem decidindo sobre o tema

Quem nunca pensou em abrir um negócio? Muitas pessoas que querem mudar de vida e se tornar seu próprio chefe recorrem à franquia para realizar esse sonho. De acordo com um estudo feito pela Associação Brasileira de Franchising (ABF), o segmento de franquias no Brasil cresceu 16,9% em 2011, atingindo o faturamento de mais de R$ 88 bilhões. Atualmente, representa 2,3% do PIB nacional. Para a ABF, o setor cresceu um pouco mais do que o esperado. Além disso, o bom momento da economia nacional e o aumento da renda da população foram os principais motivos dessa alta. A franquia é uma modalidade de negócio comercial que envolve a distribuição de produtos ou serviços, mediante condições estabelecidas em contrato, entre franqueador e franqueado. Em expansão no país, a modalidade comercial envolve a concessão e transferência de marca, tecnologia, consultoria operacional, produtos ou serviços. No Brasil, a modalidade se iniciou em 1960, com escolas de idiomas. Até o início dos anos 80, a franquia esteve concentrada em áreas tradicionais como distribuição de veículos, combustíveis e engarrafamento de bebidas. Em 1992, quando o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) passou a reconhecer e autorizar a entrada de marcas internacionais no Brasil, o mercado foi aberto à competição nacional. Por essa razão, criou-se a Lei 8.955/94, que é responsável pelos assuntos de franchising no país. De modo geral, as franquias oferecem inúmeras vantagens, mas os desentendimentos entre franqueadores e franqueados podem acabar parando na Justiça. Muitos desses impasses chegaram ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Veja alguns casos julgados sobre o tema.
O contrato de franquia é essencialmente uma figura de comércio, celebrado entre comerciantes para o fornecimento de produtos e serviços para terceiros, estes sim os destinatários finais. Portanto, as disposições do Código de Defesa do Consumidor (CDC) não se aplicam aos franqueados. Seguindo esse entendimento, o STJ não tem aplicado aos contratos de franquia as regras do CDC. Para o Tribunal, a relação entre o franqueador e o franqueado não está subordinada ao CDC, pois há uma lei especial que define a formação do contrato e as condições prévias da contratação. Por essa razão, a Quarta Turma manteve decisão do Tribunal de Justiça de Alagoas que referendou o juízo da comarca de Brusque (SC) como foro competente para julgar e processar ação de rescisão contratual com pedido de indenização, movida por seis empresas franqueadas contra a Colcci Indústria e Comércio de Vestuários Ltda. (REsp 632958). A Turma, seguindo voto do relator, ministro Aldir Passarinho Junior, concluiu que o foro competente para processar e julgar esse tipo de ação é aquele livremente escolhido pelas partes. No caso, as franqueadas queriam que a ação fosse processada na comarca de Maceió. Alegaram que a competência do foro de Brusque não foi devidamente informada no contrato e que houve desrespeito ao princípio da boa-fé. Sustentaram que, por se tratar de contrato de adesão, o foro competente seria o lugar onde a obrigação deve ser satisfeita. A Colcci, por sua vez, argumentou que as franquias firmadas em 1998 foram renovadas inúmeras vezes com o comparecimento dos litigantes à cidade de Brusque (sede da empresa); que as empresas franqueadas nunca questionaram a validade do pacto celebrado entre as partes, e que o contrato de franquia não se assemelha a contrato de adesão. Ao analisar a questão, o relator destacou que, ao contrário do alegado, as empresas franqueadas não se enquadram como destinatárias finais do produto. Para ele, franqueado não é consumidor, pois sua situação é bem diferente da conceituação contida nos artigos 2º e 3º do CDC, de modo algum se enquadrando como destinatário final. Da mesma forma, a franquia, em si, não pode ser entendida como espécie de produto ou serviço.
Em outro caso, a Quarta Turma manteve decisão que condenou franqueados da Rede Wizard a se absterem do uso da marca, da reprodução de livros didáticos e de materiais para professores, bem como ao ressarcimento pelos danos gerados (REsp 695792). Os franqueados da escola de línguas, concomitantemente, constituíram nova franquia intitulada Wisdom Franchising, cujo material didático utilizado seguia a mesma linha pedagógica e idêntica estrutura metodológica da Wizard. O colegiado, seguindo entendimento do relator, ministro Luis Felipe Salomão, manteve a decisão da Justiça paranaense por entender que a relação principal da questão dizia respeito ao contrato de franquia celebrado entre a Wizard Brasil e os franqueados, sendo o vínculo jurídico estabelecido diretamente com os segundos, sem nenhuma ligação com a primeira.
Ao julgar o REsp 818799, o STJ manteve decisão do tribunal paulista que condenou a empresa Jack Alimentos e Medicamentos Ltda. a indenizar, por danos morais, a Bob’s Indústria e Comércio Ltda. No caso, a Jack, que tinha a franquia de seis estabelecimentos Bob’s na cidade de São Paulo, descumpriu termos previstos no contrato em caso de rescisão, após o fim do acordo de franquia do uso das marcas, logotipos e sistemas de produção e venda do Bob’s. Segundo dados do processo, a franqueada descumpriu cláusula de obrigação de não atuar no negócio explorado pela Bob’s no período de 18 meses após o término da franquia, num raio de 20 quilômetros do local em que ficava o restaurante. A cláusula tinha por objetivo a proteção da marca. Após refletir sobre o caso, o relator, ministro Castro Filho, manteve a indenização ao Bob’s por danos morais, mas negou o pedido de danos materiais. Mesmo ressalvando que, em regra, “o descumprimento de disposição contratual, por si só, não enseje reparação a título de dano moral”, o ministro observou que a decisão da Justiça paulista havia considerado que, na hipótese, a operação dos estabelecimentos como se fossem Bob’s implicava “sério risco à imagem e ao nome da autora”.
Em outro julgamento também envolvendo produto de marca e franqueada, a Terceira Turma manteve decisão que permitiu à Churrascaria Porcão Ltda. realizar a busca e apreensão de todo material ou produto da Zaks Alimentos e Bebidas Ltda., que ostentasse sinais ou marcas da Porcão (Rcl 1554). A decisão é do ministro Castro Filho, que atendeu ao pedido da empresa. Em agosto de 2000, a churrascaria propôs ação contra a empresa de alimentos, na comarca do Rio de Janeiro. O objetivo era receber valores decorrentes do descumprimento do contrato de franquia estabelecido entre as partes, além de obrigar a franqueada a cumprir as cláusulas estabelecidas em caso de rescisão do contrato. Uma liminar foi concedida pelo juiz, determinando a busca e apreensão. A Zaks, no entanto, ajuizou ações na Bahia, pedindo a nulidade do contrato de franquia ou sua rescisão. A empresa pretendia a liberação das obrigações perante a churrascaria e a autorização de utilizar seu estabelecimento comercial sem quaisquer restrições impostas em decorrência da rescisão do contrato de franquia. Por fim, pediu a condenação da franqueadora ao pagamento de indenização pelos danos sofridos. Com decisões diferentes, uma em cada estado, um conflito de competência foi instaurado entre o juízo da 2ª Vara da comarca da capital do estado do Rio de Janeiro e o juízo da 22ª Vara Cível de Salvador. Ao julgar o conflito, a Segunda Seção do STJ decidiu que a competência era do juiz de direito da comarca do Rio de Janeiro. Na ocasião, o relator do conflito, ministro Carlos Alberto Menezes Direito, afirmou que, “sopesadas as circunstâncias, atentando-se, ainda, para o expressivo valor da franquia (R$ 300 mil), o que revela ser a franqueada empresa de considerável porte, entendo que deve prevalecer o foro eleito pelas partes, não se justificando a intervenção para declarar a nulidade da cláusula em questão”. Assim, o juiz do Rio de Janeiro tornou sem efeito a liminar concedida pelo juiz de Salvador à Zaks e confirmou a concedida à churrascaria. Expedida carta precatória, a empresa de alimentos entrou com mandado de segurança pedindo, em liminar, a suspensão da ordem. O Tribunal de Justiça da Bahia concedeu, sustando o ato, até a publicação da decisão sobre a competência tomada pelo STJ. A churrascaria protestou. Após vários pedidos para que fosse permitido o cumprimento do mandado de busca e apreensão, o Porcão entrou com reclamação no STJ, pedindo liminarmente a suspensão da liminar concedida no mandado de segurança. Alegou que estava plenamente configurado o desrespeito à decisão da Segunda Seção no conflito de competência. Ao analisar a questão, Castro Filho concordou: “Afiguram-se presentes os requisitos para a suspensão do ato impugnado, na forma do artigo 188, II, do Regimento Interno desta Corte, mormente em razão da decisão proferida no referido conflito.”

É possível inclusão do sobrenome de companheiro, mesmo sem impedimento legal para o matrimônio

A Terceira Turma do STJ, ao julgar o REsp 1206656 em 29/11/2012, decidiu que é possível a alteração de registro de nascimento para a inclusão do sobrenome de companheiro, mesmo quando ausente comprovação de impedimento legal para o casamento, conforme exigia o artigo 57, parágrafo 2°, da Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/73). A Turma, seguindo o voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, reformou decisão do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), que havia negado o pedido de alteração de registro a uma mulher que mantém união estável há mais de 30 anos. Para a relatora, a consolidação da união estável no cenário jurídico nacional, com a Constituição de 1988, deu nova abrangência ao conceito de família e impôs ao Judiciário a necessidade de adaptar à nova ordem jurídica a interpretação das leis produzidas no ordenamento anterior. Isso se dá com a Lei 6.015, anterior à instituição legal do divórcio. “A mera leitura do artigo 57, parágrafo 2º, da Lei 6.015, feita sob o prisma do artigo 226, parágrafo 3º, da Constituição, mostra a completa inadequação daquele texto de lei, o que exige a adoção de posicionamento mais consentâneo à realidade constitucional e social hoje existente”, concluiu.
A companheira ajuizou ação pedindo a mudança do registro. Em primeira instância, o pedido foi negado ao entendimento de que ela não apontou nenhum impedimento legal para o casamento, que possibilitasse a adoção do sobrenome do companheiro dentro da união estável, de acordo com a Lei de Registros Públicos. O TJGO manteve a sentença por entender que a pretensão da mudança de nome esbarra no artigo 57, parágrafo 2º, da Lei 6.015. Esse dispositivo permitia que a mulher, e só ela, nas situações de concubinato, adotasse o sobrenome do homem com quem vivia, mas sem suprimir seu próprio nome de família. Para isso, porém, era obrigatório que a mulher demonstrasse a existência de impedimento legal para o casamento, naqueles tempos anteriores à Lei do Divórcio. Para o TJGO, o fato de não poderem se casar no regime de comunhão parcial de bens, pois o companheiro tem mais de 60 anos, não constitui o impedimento matrimonial exigido pela Lei dos Registros Públicos como condição para a alteração do nome, uma vez que eles poderiam se casar em outro regime. Inconformada, a companheira recorreu ao STJ alegando que o TJGO não interpretou corretamente a Lei 6.015 à luz da Constituição de 88. Para ela, o fato de não poder se casar com o companheiro segundo o regime de bens desejado, em virtude da idade, configura impedimento suficiente para a aplicação da exceção prevista no artigo 57, parágrafo 2º, daquela lei.
Ao analisar a questão, a relatora destacou que a Lei 6.015 tem merecido constantes ajustes, ditados tanto pela Constituição superveniente, como pelas profundas alterações sociais pelas quais o país tem passado nas últimas décadas. Segundo Nancy Andrighi, a união estável carece de regulação específica quanto à adoção de sobrenome pelo companheiro, não se encontrando na Lei 6.015 os elementos necessários para a regulação da matéria. Na verdade, o artigo 57 trata da adoção de sobrenome em relações concubinárias, em período anterior à possibilidade de divórcio, focando-se, portanto, nas relações familiares à margem da lei, que não podiam ser regularizadas ante a indissolubilidade do casamento então existente. “Essa normatização refletia a proteção e exclusividade que se dava ao casamento – que era indissolúvel –, no início da década de 70 do século passado, pois este era o único elemento formador de família, legalmente aceito, fórmula da qual derivavam as restrições impostas pelo texto de lei citado, que apenas franqueava a adoção de patronímico, por companheira, quando não houvesse a possibilidade de casamento, por força da existência de um dos impedimentos descritos em lei”, disse a ministra. Segundo ela, o texto do dispositivo legal está em harmonia com a nova ordem jurídica. “Esse anacrônico artigo de lei não se presta para balizar os pedidos de adoção de sobrenome dentro de uma união estável”, acrescentou.
Na ausência de regulação específica, afirmou a relatora, o problema deve ser resolvido pela aplicação analógica das disposições do Código Civil relativas à adoção de sobrenome no casamento, porque é claro “o elemento de identidade entre os institutos”. Como a adoção do sobrenome do cônjuge no casamento (situação regulada) é semelhante à questão do sobrenome na união estável (assunto não regulado), “a solução aplicada à circunstância normatizada deve servir para a fixação da possibilidade de adoção de patronímico de companheiro dentro da união estável”. Segundo Nancy Andrighi, “onde impera a mesma razão deve prevalecer a mesma decisão”. “A única ressalva que se faz, e isso em atenção às peculiaridades da união estável, é que seja feita a prova documental da relação, por instrumento público, e nela haja a anuência do companheiro que terá o nome adotado, cautelas dispensáveis dentro do casamento, pelas formalidades legais que envolvem esse tipo de relacionamento, mas que não inviabilizam a aplicação analógica das disposições constantes no Código Civil”, acrescentou a ministra.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Goodyear é condenada a indenizar homem que ficou tetraplégico após acidente de carro

A Quarta Turma do STJ, ao julgar o REsp 1281742 em 28/11/2012, condenou a Goodyear Brasil Produtos de Borracha Ltda. a indenizar um aposentado que ficou tetraplégico após acidente de carro ocasionado por defeito no pneu fabricado pela empresa. A Turma, em decisão unânime, fixou pensão mensal vitalícia no valor de um salário mínimo e determinou que a fabricante constitua capital para garantir o pensionamento. No dia 27 de janeiro de 1996, o aposentado, juntamente com o motorista de uma caminhonete D-20, seguia pela rodovia Castelo Branco, sentido interior-capital. No km 40, em São Paulo, o pneu traseiro direito do veículo estourou e ocasionou o acidente. O aposentado sofreu contusão medular cervical severa e ficou em estado de “tetraplegia flácida sensitivo-motora com nível T-3”, locomovendo-se em cadeira de rodas. Diante dessa situação, ingressou com ação de indenização por danos morais e materiais contra a fabricante do pneu. O juízo de primeira instância condenou a Goodyear a reembolsar as despesas médicas e hospitalares até a recuperação ou morte do aposentado e a incluir seu nome na folha de pagamento da empresa, para a satisfação de despesas vincendas. A empresa foi condenada ainda a indenizar pelos danos morais no valor de mil salários mínimos, com pagamento imediato e de uma só vez, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, calculados de forma simples desde a data do acidente.
Não satisfeitos, tanto a empresa quanto o aposentado recorreram da decisão. A Goodyear sustentou que não havia prova inequívoca do defeito do produto, nem do nexo causal entre o dano sofrido pelo aposentado e o suposto estouro do pneu. Alegou parcialidade do perito, uma vez que fora indicado pelo aposentado, e impossibilidade de liquidação por arbitramento das despesas médicas, além de considerar excessivo o valor atribuído a título de indenização por dano moral. Requereu ainda que a correção e os juros moratórios incidentes sobre a indenização fossem calculados a partir da fixação da quantia devida e não da data do acidente. A vítima, por sua vez, sustentou que, embora aposentada na ocasião do acidente, possuía capacidade de trabalho, por isso seria cabível a fixação de pensão vitalícia a seu favor. Afirmou que o valor imposto a título de dano moral não cumpre o papel de punir a empresa adequadamente, tampouco inibe futuras reincidências, e que os juros de mora sobre o valor da indenização deveriam ser compostos. No Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), o recurso do aposentado foi negado. Já o do fabricante do pneu foi parcialmente provido para alterar o termo inicial da correção monetária sobre o valor da indenização por dano moral. Diante dessa decisão do TJSP, as partes interpuseram recurso especial.
Ao analisar os pedidos, o relator do caso, ministro Marco Buzzi, observou que, em relação ao questionamento da Goodyear sobre o perito nomeado pelo juízo, é irrelevante o fato de ter sido indicado por uma das partes, principalmente quando não evidenciada, nem alegada de modo concreto, nenhuma irregularidade nos trabalhos. O magistrado destacou ainda que, fixados pelo tribunal de origem os danos morais em mil salários mínimos e declarada a existência de nexo causal entre o defeito de fabricação que causou o estouro do pneu e o acidente automobilístico, torna-se inviável a revisão desses entendimentos, pois isso exigiria reexame de provas, proibido pela Súmula 7 do STJ. Segundo o ministro Marco Buzzi, por se tratar de relação de consumo, a responsabilidade do fabricante é objetiva, “ficando a cargo do consumidor demonstrar o fato constitutivo de seu direito e, ao fornecedor, o ônus de demonstrar a ocorrência de quaisquer das causas excludentes da responsabilidade”. Como o TJSP, com base nas provas do processo, reconheceu que o acidente ocorreu em razão de defeito do pneu, o relator observou que o ônus probatório do autor estava esgotado. De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, caberia então à Goodyear demonstrar a exclusão de sua responsabilidade por uma das seguintes hipóteses: que não colocou o produto no mercado, que o defeito não existiu ou que a culpa foi exclusivamente do consumidor ou de terceiro. “Se não se desincumbiu dessa prova, a responsabilidade está configurada”, disse o relator.
O ministro Marco Buzzi observou que o aposentado tem razão quanto ao pedido de pensão em vista da limitação da capacidade de trabalho, e destacou que a legislação civil admite ressarcir não apenas a quem, na ocasião da lesão, exerça atividade profissional, mas igualmente aquele que, embora não a exercitando, veja restringida a possibilidade de trabalho futuro. “Havendo redução parcial da capacidade laborativa em vítima que, à época do ato ilícito, não desempenhava atividade remunerada, a base de cálculo da pensão deve se restringir a um salário mínimo”, afirmou o ministro, citando precedentes do STJ. Assim, foi fixada a pensão vitalícia de um salário mínimo mensal. Quanto à cobrança de juros compostos, o ministro disse ser inviável quando a obrigação de indenizar resulta de ilícito de natureza eminentemente civil. Já em relação à pretensão do aposentado em aumentar a indenização por danos morais, a Turma não acolheu o pedido, por considerar razoável o valor estipulado em mil salários mínimos. A jurisprudência do STJ só admite a revisão de valores nas condenações por dano moral quando se mostram flagrantemente excessivos ou irrisórios. O ministro destacou ainda que o STJ tem se pronunciado no sentido de que a indenização deve ser suficiente para compensar a vítima e desestimular reincidências por parte do ofensor, não podendo constituir enriquecimento sem causa. Dessa forma, negou o recurso especial da fabricante do pneu e deu provimento parcial ao recurso do aposentado.

domingo, 9 de dezembro de 2012

Juiz proíbe que americano pai de 9 crianças tenha mais filhos




Homem deve mais de R$ 180 mil em pensão para seis mulheres. 'Pena que a corte não tenha autoridade para fazer esterilizações', disse juiz.

Corey foi proibido de ter outros filhos até que possa comprovar que pode manter as crianças (Foto: Divulgação) Um juiz do estado americano de Wisconsin emitiu uma ordem que proíbe que Corey Curtis, de 44 anos, tenha mais filhos, e pague o equivalente a R$ 180 mil que deve em pensão para seis mulheres com as quais se relacionou. Curtis seria pai de nove crianças e, de acordo com o site “The Smoking Gun”, o juiz Tim Boyle proibiu que o homem continue procriando compulsivamente até que pague o dinheiro que deve, e tenha condições de criar seus filhos. “É uma pena que a corte não tenha autoridade para fazer esterilizações”, disse Boyle. “O senso comum afirma que não devemos ter filhos que não podemos manter”. Além de não poder ter mais crianças até que prove que pode mantê-los, Corey passará por um período probatório de três anos. “Os juízes fazem as regras”, lamentou Curtis. “Se é isso que ele acha a respeito da minha condição, então vou cumprir”.
Fonte:  G1, 06/12/2012

DIREITO CIVIL. DIES A QUO DO PRAZO PRESCRICIONAL. REPARAÇÃO DE DANOS DECORRENTES DE FALECIMENTO.



O termo inicial da contagem do prazo prescricional na hipótese em que se pleiteia indenização por danos morais e/ou materiais decorrentes do falecimento de ente querido é a data do óbito, independentemente da data da ação ou omissão. Não é possível considerar que a pretensão à indenização em decorrência da morte nasça antes do evento que lhe deu causa. Diferentemente do que ocorre em direito penal, que considera o momento do crime a data em que é praticada a ação ou omissão que lhe deu causa, no direito civil a prescrição é contada da data da "violação do direito". REsp 1.318.825-SE, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/11/2012.

Editora deve pagar R$ 240 mil à atriz Carolina Ferraz por dano moral pelo uso indevido da imagem

O Grupo de Comunicação Três S/A, editor da revista IstoÉ Gente, deve pagar R$ 240 mil a título de indenização por danos morais à atriz Carolina Ferraz. Também são devidos R$ 120 mil para reparação de dano patrimonial. A empresa foi processada pela atriz por promover campanha publicitária de lançamento da revista anunciando o fim de seu casamento, com a utilização de sua imagem sem autorização. O pagamento foi determinado pela Terceira Turma do STJ, ao julgar o REsp 1102756 em 26/11/2012, que atendeu, em parte, ao pedido da atriz. Ela interpôs recurso contra decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que havia reformado a sentença para excluir o dano moral. A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, ressaltou que a jurisprudência do STJ estabelece que “independe de prova de prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais”. Esse é o exato teor da Súmula 403 do STJ. Mesmo em se tratando de pessoa pública, o uso não autorizado de imagem com fins comerciais impõe o dever de compensar danos morais. A própria decisão do tribunal estadual, segundo observou a relatora, concluiu que houve exposição da imagem da atriz em âmbito nacional, sem prévia autorização, com fins exclusivamente econômicos e publicitários, em razão de campanha promovida pela editora e veiculada na revista IstoÉ e em outdoors espalhados pelo país.
A relatora afirmou que o valor da indenização deve levar em conta o porte econômico do causador do dano e o nível socioeconômico da vítima. Ela manteve o montante de R$ 240 mil reais fixados em primeiro grau. Levou em conta que a vítima é “notória atriz de teatro e televisão” e que sua imagem foi utilizada indevidamente em todo o território nacional. Considerou ainda a finalidade lucrativa da exibição e o grande porte econômico da empresa. A Turma negou o pedido da atriz para que fosse aplicada a indenização por litigância de má-fé prevista no artigo 18 do Código de Processo Civil (CPC). Concedida em primeiro grau, no percentual de 10% sobre o valor da causa, a indenização foi afastada pelo TJSP.
A empresa de comunicação também recorreu ao STJ. Queria reduzir o valor da condenação por dano material (R$ 120 mil), que alegou ser excessivo. Contudo, a relatora observou que a redução da quantia arbitrada não foi discutida pelo TJSP. Nem mesmo houve embargos de declaração para que o tribunal estadual se manifestasse sobre o tema. Dessa forma, por falta de prequestionamento, o pedido da editora foi negado. Todos os ministros da Terceira Turma seguiram o voto da relatora.

sábado, 8 de dezembro de 2012

Cidade indiana proíbe mulheres de usar celular para evitar fugas com amantes

O Conselho de uma cidade do estado de Bihar, no leste da Índia, proibiu o uso de celulares por mulheres, sob a alegaçãod e que os telefones estavam "prejudicando a atmosfera social", fazendo com que jovens fugissem com amantes - uma decisão que gerou protestos enfurecidos de ativistas. Além da proibição, o conselho de Sunderbari, cidade que fica em uma área predominantemente muçulmana a 385 quilômetros de Patna, capital de Bihar, também impôs a multa de dez mil rúpias (180 dólares) para cada menina flagrada usando um celular na rua. Se a mulher for casada, a multa é de duas mil rúpias (36 dólares). "Sempre nos causa muito constrangimento quando alguém pergunta quem fugiu desta vez", disse Manuwar Alam, que preside o recém-formado comitê para assegurar a proibição, referindo-se a conversas com vizinhos de outras cidades. Ele disse que o número de fugas e relacionamentos sem casamento cresceram nos últimos meses, com pelo menos seis garotas e mulheres fugindo de suas casas. "Até mulheres casadas estão abandonando os maridos para fugir com amantes. Isso é vergonhoso para nós" disse Alam. "Então, decidimos atacar firmemente. Celulares estão prejudicando a atmosfera social".
Fonte: Reuters, 05/12/2012


Rejeitada desconsideração de personalidade jurídica de empresa extinta antes da ação de cobrança

Para o STJ, a desconsideração da personalidade jurídica de empresa, para que suas obrigações atinjam os sócios, exige a prática de atos que configurem a ocorrência de confusão patrimonial ou desvio de finalidade da sociedade empresarial. Só assim é possível afastar a separação patrimonial entre sócios e sociedade. De acordo com a jurisprudência da Corte, embora destinada à satisfação do direito do credor, a desconsideração da personalidade jurídica é medida excepcional. Por isso, não pode ser aplicada nos casos em que for constatada a insolvência da empresa ou a simples impossibilidade de serem honradas obrigações em razão do encerramento das suas atividades. Seguindo esse entendimento, a Quarta Turma do STJ, em 27/11/2012, negou o REsp 762555 em que o autor pretendia a declaração da desconsideração da personalidade jurídica de empresa que já havia encerrado suas atividades antes do ajuizamento da ação principal do recorrente. O objetivo era fazer a penhora de bens do diretor gerente falecido recair sobre a herança deixada. Em ação de cobrança por inadimplemento de contrato ajuizada em 1980, o juízo de primeiro grau aplicou a desconsideração da personalidade jurídica com base, exclusivamente, no encerramento das atividades da empresa, tido por irregular apenas em razão de não ter sido requerida a baixa dos registros na junta comercial. O encerramento foi anterior ao ajuizamento da ação ordinária, que correu à revelia da empresa ré – que não mais existia – e gerou um título judicial que está sendo executado. Como todo o patrimônio da empresa foi vendido em 1979, foi determinada a penhora de bens do diretor gerente. Contudo, ele faleceu em 1984 e os bens foram partilhados em 1987, o que levou a penhora a recair sobre a herança. A decisão de primeiro grau foi reformada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina. “A dissolução irregular de empresa não pode ser tida como motivo único para a responsabilização do sócio, sob pena de gerar situações por demais injustas”, constou do acórdão.
O recurso especial contra a decisão de segundo grau foi negado pelo desembargador convocado Honildo Amaral (aposentado). A ministra Isabel Gallotti, relatora do agravo regimental contra a decisão monocrática de Amaral, constatou no processo que o patrimônio do diretor gerente arcou com dívidas da sociedade já existentes na época de seu falecimento. Ela observou que não havia sequer sentença condenatória da empresa quando do término do inventário. Além disso, a ministra considerou o fato de não haver evidências de que o sócio gerente, falecido pai do herdeiro recorrido, tenha praticado ato com violação do contrato social da empresa. “A mera circunstância de haver dívida não paga pela sociedade empresarial ré, cujas atividades cessaram sem a devida baixa na junta comercial, dívida esta constituída por sentença anos após o encerramento das atividades da empresa e o óbito do sócio gerente, não configura confusão patrimonial ou desvio de finalidade aptos a ensejar a desconsideração da personalidade jurídica para alcançar o patrimônio do falecido ex-sócio gerente”, explicou a relatora. A Turma ressalvou não ser aplicável na hipótese a Súmula 435, que cuida de redirecionamento da execução fiscal à pessoa do sócio, com base em regras específicas de direito tributário. Esse entendimento foi seguido por todos os ministros da Quarta Turma, que negaram provimento ao agravo regimental.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Para Segunda Seção, tarifas em financiamento são legais desde que previstas no contrato

A fixação de tarifas administrativas em contrato de financiamento é prática legal, desde que elas sejam pactuadas em contrato e em consonância com a regulamentação do Banco Central. A decisão é da Segunda Seção do STJ, em 26/11/2012, ao analisar o REsp 1270174 em processo no qual o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) julgou nula a cobrança de tarifas ou taxas feita por uma instituição bancária. O TJRS entendeu que a prática violaria os artigos 46 e 51 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), ao transferir para o cliente custos próprios da atividade bancária. No entendimento da Seção, a cobrança é legal, desde que pactuada em contrato, o que possibilita que o consumidor esteja plenamente informado sobre sua existência. A decisão atinge todos os tipos de concessão de crédito bancário ou financeiro e envolve taxas com diferentes denominações, como taxas para abertura de cadastro (TAC), emissão de carnês (TEC) ou análise de crédito. De acordo com o entendimento da Segunda Seção, é possível a revisão pelo Judiciário, a pedido do consumidor, se comprovado que a cobrança é exagerada, em confronto com os parâmetros de mercado, ou causa desequilíbrio na relação contratual.
A decisão na Seção ocorreu por maioria, prevalecendo o voto da relatora, ministra Isabel Gallotti. A ministra entendeu que a prática não viola o CDC, desde que seja explicitado o valor dos custos administrativos nos contratos de conta-corrente, financiamento e outros. Se esses custos estiverem mencionados de forma expressa e discriminada no contrato, ao invés de serem embutidos na taxa de juros, isso possibilitará que o consumidor os conheça e tenha melhores condições de negociar. Embutir todos os custos administrativos do financiamento na taxa de juros, segundo a ministra Gallotti, não atende aos princípios da transparência e da boa-fé objetiva. O ministro Paulo de Tarso Sanseverino proferiu voto em sentido diverso. Para ele, seja qual for o nome que se dê à tarifa em questão, o fato é que se destina a cobrar custos administrativos do banco. Esse entendimento foi seguido pela ministra Nancy Andrighi. É imprescindível, segundo o ministro, que o banco faça uma pesquisa para verificar a capacidade financeira do cliente, com o objetivo de reduzir o risco de inadimplência. A pesquisa, no caso, não poderia ser entendida como serviço autônomo prestado ao consumidor, de modo a justificar a cobrança da tarifa.
A jurisprudência do STJ é no sentido de que as tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC), entre outras, quando efetivamente contratadas pelo consumidor, são legítimas, cabendo ao Poder Judiciário revisar o contrato nos casos em que for comprovado abuso na cobrança. O Conselho Monetário Nacional (CMN), segundo voto da relatora, editou diversas regulamentações sobre a remuneração pelos serviços bancários, entre elas as Resoluções 2.303/96, 2.747/00, 2.878/01, 2.892/01, 3.518/07 e 3.919/10. O entendimento do STJ é coerente com todas elas. No recurso julgado pela Segunda Seção, não ficou demonstrado que as tarifas estivessem sendo cobradas em desacordo com a regulamentação, nem que o valor acordado fosse abusivo.