sábado, 30 de julho de 2016

Reforma em imóvel público ocupado de modo irregular não gera indenização

A ocupação irregular em áreas públicas não configura posse, mas apenas detenção, não cabendo indenização por eventuais benfeitorias realizadas.

Com base nesse entendimento, a Segunda Turma afastou a obrigação da Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap) de indenizar particulares que ocuparam irregularmente imóveis administrados pela empresa, em cidade-satélite, e realizaram reformas ao longo de oito anos.

Em sentido contrário, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios havia defendido que a longa permanência no imóvel público, tolerada e consentida pela administração, não legitima a posse precária, contudo, dá aos ocupantes o direito de ressarcimento pelas benfeitorias úteis e necessárias.

Ao analisar o recurso especial, o ministro Herman Benjamin, relator, afirmou que o acórdão do TJDFT contraria a jurisprudência pacificada no STJ, no sentido de que, “restando configurada a ocupação indevida de bem público, não há falar em posse, mas em mera detenção, de natureza precária, o que afasta o direito de retenção por benfeitorias e o almejado pleito indenizatório à luz da alegada boa-fé” (AgRg no AREsp 824.129).

Ele mencionou diversos precedentes no mesmo sentido, inclusive de sua relatoria. Em um deles, Herman Benjamin afirma que atribuir à detenção efeitos próprios da posse “enfraquece a dominialidade pública, destrói as premissas básicas do princípio da boa-fé objetiva, estimula invasões e construções ilegais e legitima, com a garantia de indenização, a apropriação privada do espaço público” (REsp 945.055).

A turma, em decisão unânime, deu provimento ao recurso da Terracap e afastou a obrigação de indenizar os autores da ação reivindicatória.

Processo: REsp 1223141 

sexta-feira, 29 de julho de 2016

DIREITO DO CONSUMIDOR. DEVER DE ASSISTÊNCIA AO NEONATO DURANTE OS TRINTA PRIMEIROS DIAS APÓS O SEU NASCIMENTO.

Quando o contrato de plano de saúde incluir atendimento obstétrico, a operadora tem o dever de prestar assistência ao recém-nascido durante os primeiros trinta dias após o parto (art. 12, III, "a", da Lei n. 9.656/1998), independentemente de a operadora ter autorizado a efetivação da cobertura, ter ou não custeado o parto, tampouco de inscrição do neonato como dependente nos trinta dias seguintes ao nascimento. Inicialmente, o art. 12 da Lei n. 9.656/1998 prevê as modalidades de planos de saúde, na nomenclatura da lei, os segmentos, e, nessa extensão, os serviços mínimos compreendidos em cada uma das quatro modalidades estabelecidas. Na trilha do mecanismo desenvolvido pela citada lei, as operadoras de planos e seguros necessariamente oferecerão um serviço mínimo base, conforme descrito no art. 10 do citado diploma legal, e, a partir desse padrão (plano-referência), novos serviços poderão ser somados, agora tendo como referência as especificações das modalidades ou segmentações. Conclui-se, portanto, que é facultativa a inclusão de atendimento obstétrico na contratação do plano-referência (art. 12, III, a, da Lei n. 9.656/1998), quando, então, deverá ser respeitada, dentre outras, a seguinte exigência mínima: "a) cobertura assistencial ao recém-nascido, filho natural ou adotivo do consumidor, ou de seu dependente, durante os primeiros trinta dias após o parto;" Ainda, somada a essa cobertura, a lei assegura a possibilidade de inscrição do recém-nascido no plano ou seguro, como dependente, dispensado, inclusive o cumprimento dos períodos de carência e, aqui sim, desde que a inscrição ocorra no prazo máximo de trinta dias do nascimento (art. 12, III, b). Como visto, a disposição da alínea a do inciso III do art.12 é absolutamente clara ao afirmar que a modalidade de plano que incluir atendimento obstétrico deve garantir, no mínimo, cobertura assistencial ao recém-nascido durante os primeiros trinta dias após o parto, sem vincular essa prestação à prévia inscrição do recém-nascido no plano. Na verdade, a inscrição dentro dos trinta dias após o parto é condição, apenas, para que o filho se torne dependente do titular, pai ou mãe, sem a exigência das carências típicas, regulamentação, inclusive, a cargo da alínea b do mesmo inciso. Com efeito, o sentido da norma sob análise pode ser alcançado a partir de sua própria literalidade. Ademais, é importante não perder de vista que as previsões da Lei n. 9.656/1998 devem ser interpretadas a partir dos princípios gerais e contratuais do CDC. Desse modo, o evento que garante e impõe a assistência ao recém-nascido - nos termos da lei - é a opção do filiado consumidor pela contratação de plano com atendimento obstétrico, e não o fato de o parto do recém-nascido ter sido custeado pela operadora do plano. Inclusive, conforme entendimento doutrinário, há a necessidade de se compreender a cobertura ao recém-nascido em maior extensão e, nessa linha, defende que a lei merece reparos, apontando-os: "(...) pode ocorrer que o recém-nascido permaneça em tratamento por mais de trinta dias após o parto. Nos termos em que foi redigida, a norma permite que as operadoras transfiram a responsabilidade pelo custo do tratamento do recém-nascido para os pais ou responsável ultrapassado o prazo de trinta dias, quando não deve ser assim. Portanto, deve-se entender que a cobertura assistencial estende-se ao recém-nascido durante os primeiros trinta dias após o parto ou enquanto durar o tratamento, se iniciado durante os primeiros trinta dias." REsp 1.269.757-MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 3/5/2016, DJe 31/5/2016.

Arrendatário é responsável pelas multas de veículos de arrendamento mercantil

Nos contratos de aquisição de veículo sob regime de arrendamento mercantil (ou leasing), é do arrendatário (o que toma o bem) a responsabilidade pelo pagamento de multas decorrentes de infração por uso indevido do bem. O arrendamento mercantil é firmado quando uma pessoa jurídica (arrendadora) entrega algo a pessoa física ou jurídica, por prazo determinado, sendo facultada a compra do bem ao fim do contrato.

O entendimento foi estabelecido pelo Superior Tribunal de Justiça ao analisar diversas ações sobre o tema. Em 2011, a corte debateu o assunto sob o rito dos recursos repetitivos. O recurso discutia a possibilidade de a empresa arrendante ser responsabilizada por valores cobrados no caso de remoção, guarda e conservação de veículo apreendido em decorrência de infrações do arrendatário.

“Em se tratando de arrendamento mercantil, independentemente da natureza da infração que deu origem à apreensão do veículo, as despesas relativas à remoção, guarda e conservação do veículo arrendado não são da responsabilidade da empresa arrendante, mas sim do arrendatário”, concluiu o ministro Hamilton Carvalhido, hoje aposentado. Ele destacou que o arrendatário se equipara ao proprietário de veículo enquanto estiver em vigor o contrato de arrendamento.

O julgamento do recurso repetitivo originou o tema 453.

Processo: REsp 1114406 

quinta-feira, 28 de julho de 2016

DIREITO CIVIL E URBANÍSTICO. USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA E ÁREA DE IMÓVEL INFERIOR AO "MÓDULO URBANO".

Não obsta o pedido declaratório de usucapião especial urbana o fato de a área do imóvel ser inferior à correspondente ao "módulo urbano" (a área mínima a ser observada no parcelamento de solo urbano por determinação infraconstitucional). Isso porque o STF, após reconhecer a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, fixou a tese de que, preenchidos os requisitos do artigo 183 da CF, cuja norma está reproduzida no art. 1.240 do CC, o reconhecimento do direito à usucapião especial urbana não pode ser obstado por legislação infraconstitucional que estabeleça módulos urbanos na respectiva área em que situado o imóvel (dimensão do lote) (RE 422.349-RS, Tribunal Pleno, DJe 5/8/2015). REsp 1.360.017-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 5/5/2016, DJe 27/5/2016.

Empresas condenadas a pagar indenização por comercial irregular de cigarro

A Quarta Turma condenou um fabricante de cigarro e outras duas empresas de comunicação, responsáveis por um comercial considerado irregular, a pagarem indenização por dano moral coletivo de R$ 500 mil.

A indenização resulta de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios por considerar que o comercial de uma marca de cigarros afetou direitos difusos, atingindo crianças e adolescentes.  O anúncio foi veiculado em 2000, época em que a legislação brasileira não proibia publicidade de cigarro.

Os ministros da Quarta Turma aprovaram o voto do relator do caso, ministro Marco Buzzi, que manteve a condenação das empresas estabelecida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. O ministro reduziu, no entanto, o valor da indenização de R$ 4 milhões para R$ 1 milhão. Durante o julgamento, os ministros decidiram reduzir para R$ 500 mil.

No voto, o relator salientou a “tarefa hercúlea” de definir o prejuízo provocado à saúde pública pela publicidade. Marco Buzzi também citou o entendimento já firmado no STJ no sentido de limitar a intervenção da corte aos casos em que o valor da indenização é arbitrado em quantia irrisória ou excessiva.

O ministro ressaltou que a indenização definida pelo TJDFT, em valor atualizado, alcançaria R$ 15,87 milhões. “Veja-se, portanto, que a indenização revela-se desproporcional ao dano e merece reparos”, afirmou.

Marco Buzzi manteve ainda a decisão colegiada do TJDFT, negando pedido do MPDFT de divulgação de uma contrapropaganda para desfazer os malefícios causados pelo comercial do cigarro.

Para o ministro, uma contrapropaganda revela-se desnecessária em razão do longo período entre a divulgação do comercial e a data atual. “Ou seja, a sua divulgação não mais atende a função de desfazer os efeitos nocivos da publicidade veiculada”, concluiu.

Processo: REsp 1101949 

quarta-feira, 27 de julho de 2016

África do Sul declara inconstitucional bolsas de estudos para meninas virgens

A Comissão de Igualdade de Sexo da África do Sul (CGE) declarou nesta sexta-feira inconstitucional a lei criada em um distrito do país que consistia em dotar jovens de 16 anos virgens com bolsas de estudo, como recompensa pela "pureza". "Essa lei viola os direitos constitucionais de igualdade, dignidade e privacidade das meninas", declarou aos meios de comunicação locais a presidente da comissão, Keketso Maema. "As práticas culturais não podem ser usadas como um fator para que os não praticantes sejam impedidos de receber os serviços do governo", acrescentou. A CGE opinou que as beneficiadas das bolsas de estudos devem seguir recebendo a atribução econômica sem que seja preciso passar pelos exames de virgindade obrigatórios até agora. O governo do distrito de uThukela (na província oriental de Kwazulu-Natal) aprovou esta categoria de bolsas de estudos em janeiro. As estudantes que as receberam precisaram passar durante as férias escolares por exames para provar a virgindade. A CGE qualificou de "discriminatórias" estas bolsas de estudos, ao considerar "injusto" que as meninas tenham que cumprir com um requisito que não é obrigatório para os meninos. A sentença foi entregue às autoridades de uThukela. Espera-se que os líderes da região sigam as recomendações da comissão, um órgão habilitado pela Constituição e encarregado de zelar pela igualdade de gênero. A casa do rei dos zulus, Goodwill Zwelithini, elogiou a iniciativa, ao manifestar que a monarquia é favorável de que as jovens se mantenham virgens até o casamento. A região de Kwazulu-Natal é conhecida como Zululândia e é a pátria do povo zulu, majoritário na África do Sul e muito apegado à cultura e às tradições. A Casa Real Zulu é reconhecida pela Constituição e tem grande influência entre os membros do povo zulu, especialmente em zonas rurais.
Fonte: Terra, 17 de junho de 2016

DIREITO CIVIL. PERÍODO DE LEGALIDADE DA COBRANÇA DE TARIFA DE RENOVAÇÃO DE CADASTRO (TRC).

É válida cláusula contratual que prevê a cobrança da tarifa de renovação de cadastro (TRC) em contrato bancário celebrado ainda no período de vigência da Circular n. 3.371/2007 do BACEN (isto é, antes da vigência da Circular n. 3.466/2009 do BACEN, que passou a impossibilitar a cobrança da TRC). Quando do julgamento dos Recursos Especiais 1.251.331-RS e 1.255.573-RS, realizados sob o regime do art. 543-C do CPC (DJe 24/10/2013), a Segunda Seção do STJ, a propósito do exame da legalidade das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC), firmou raciocínio jurídico a respeito da cobrança de tarifas bancárias que serve de norte para o deslinde da questão aqui analisada. Naquela oportunidade, conclui-se que, "Ao tempo da Resolução CMN 2.303/1996, a orientação estatal quanto à cobrança de tarifas pelas instituições financeiras era essencialmente não intervencionista, vale dizer, 'a regulamentação facultava às instituições financeiras a cobrança pela prestação de quaisquer tipos de serviços, com exceção daqueles que a norma definia como básicos, desde que fossem efetivamente contratados e prestados ao cliente, assim como respeitassem os procedimentos voltados a assegurar a transparência da política de preços adotada pela instituição'". Além disso, assentou-se que, "Com o início da vigência da Resolução CMN 3.518/2007, em 30.4.2008, a cobrança por serviços bancários prioritários para pessoas físicas ficou limitada às hipóteses taxativamente previstas em norma padronizadora expedida pelo Banco Central do Brasil". No que diz respeito à possibilidade de cobrança da tarifa de renovação de cadastro (TRC), ressalta-se que, de acordo com a redação do art. 3º da Resolução n. 3.518/2007 do CMN - complementada pela Circular n. 3.371/2007 do BACEN -, "Os serviços prioritários para pessoas físicas, assim considerados aqueles relacionados às contas de depósitos, transferências de recursos, operações de crédito e cadastro, serão definidos pelo Banco Central do Brasil, que estabelecerá a padronização de nomes e canais de entrega, e identificados por siglas e a descrição dos respectivos fatos geradores" (caput) e "A cobrança de tarifas de pessoas físicas pela prestação, no País, de serviços prioritários fica limitada às hipóteses previstas no caput" (parágrafo único). Por sua vez, na Tabela I anexa à referida Circular n. 3.371/2007 do BACEN, constam como passíveis de cobrança a "1.1 Confecção de cadastro para início de relacionamento (que deve ter como sigla no extrato: CADASTRO)" e a "Renovação de cadastro (que deve constar no extrato como: RENOVAÇÃO CADASTRO)". Dessa maneira, seguindo-se o raciocínio jurídico empreendido no julgamento dos mencionados recursos repetitivos, deve-se reconhecer legítima a cobrança da tarifa de renovação de cadastro (TRC), tendo em vista a existência de previsão específica nas normas editadas pelas autoridades regulamentadoras. Deve-se destacar, entretanto, que, com o advento da Circular n. 3.466 do BACEN, de 11/9/2009, vigente a partir de 14/9/2009, a cobrança desta tarifa (a TRC) foi expressamente revogada, conforme disposto no art. 1º deste ato normativo: "Fica vedada, a partir da data de vigência desta circular, a cobrança da tarifa de 'Renovação de cadastro', código 1.2, pelas instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, e excluída sua menção das Tabelas I e II anexas à Circular nº 3.371, de 6 de dezembro de 2007." REsp 1.303.646-RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 10/5/2016, DJe 23/5/2016.

DIREITO AGRÁRIO E CIVIL. PRAZO MÍNIMO DE CONTRATO DE ARRENDAMENTO RURAL PARA A CRIAÇÃO DE GADO BOVINO.

É de cinco anos o prazo mínimo para a duração de contrato de arrendamento rural em que ocorra pecuária de gado bovino, independentemente da maior ou menor escala da atividade exploratória ou da extensão da área a que se refira o contrato. O arrendamento rural e a parceria agrícola, pecuária, agroindustrial e extrativista são os principais contratos agrários voltados a regular a posse ou o uso temporário da terra, na forma do art. 92 da Lei n. 4.504/1964 (Estatuto da Terra). A regulamentação desses institutos veio com a edição do Decreto n. 59.566/1966, em que consta expressamente o arrendamento rural como o contrato agrário por meio do qual uma pessoa se obriga a ceder a outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de imóvel rural, parte ou partes dele, incluindo ou não outros bens, benfeitorias ou facilidades com o objetivo de nele ser exercida atividade de exploração agrícola, pecuária, agroindustrial, extrativa ou mista, mediante, certa retribuição ou aluguel (art. 3º). A CF estabelece que a propriedade atenderá a sua função social (art. 5º, XXIII), revelando-se, pois, como instrumento de promoção da política de desenvolvimento urbano e rural (arts. 182 e 186). Para concretizar referida função social, deve-se buscar o adequado aproveitamento de seus recursos, a preservação do meio ambiente e o bem-estar socioeconômico dos agentes produtores que atuam diretamente na exploração e uso da terra. Dessa forma, mesmo diante da natureza privada do contrato agrário, é patente sua utilização também como instrumento de concretização da função social da propriedade rural, conforme idealizado pelo Estado, razão pela qual esse negócio jurídico está sujeito a inúmeras repercussões do direito público. Uma delas diz respeito à proteção, em contrato de arrendamento, da parte economicamente mais frágil (isto é, o arrendatário), conforme dispõe o art. 13 do Decreto n. 59.566/1966. Nesse contexto, citado decreto dispôs sobre o prazo mínimo (5 anos) a ser observado nos contratos de arrendamento rural que tenham por objeto atividade "de pecuária de grande porte para cria, recria, engorda ou extração de matérias primas de origem animal" (alínea a do inciso II do art. 13 do aludido decreto). Constitui a exegese teleológica das normas agraristas realizar o enquadramento de determinada atividade pecuária como de grande porte por meio da consideração do porte dos animais (gado vacum, bufalino, equino e asinino). Isso porque, para a criação, reprodução, engorda do gado vacum, por exemplo, necessita-se de tempo razoável, que se origina da espécie do animal, não da sua maior ou menor escala de atividade exploratória. Ademais, há orientação doutrinária de que a criação de gado bovino é suficiente para caracterizar a pecuária como de grande porte, sendo necessário maior prazo do contrato de arrendamento rural em razão dos ciclos exigidos de criação, reprodução, engorda e abate. Por conseguinte, é contrário à proteção ao exercício da atividade do arrendatário o entendimento segundo o qual se exija demonstração do volume de gastos e receitas da atividade pecuária para que, com a aferição da exata proporção do empreendimento, possa-se reconhecer a atividade pecuária como de grande porte. Assim sendo, adotando-se o entendimento de que o porte do rebanho é suficiente para caracterizar se a atividade pecuária exercida é de pequeno, médio ou grande porte, tem-se que a atividade pecuária relacionada a criação de gado bovino deve ser reconhecida como de "grande porte" para fins de incidência do art. 13, II, a, do Decreto n. 59.566/1966, que determina o prazo contratual mínimo de cinco anos. REsp 1.336.293-RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 24/5/2016, DJe 1/6/2016.

Determinada indenização de R$ 100 mil a paciente cega após cirurgia de catarata

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou o pagamento de indenização de R$ 100 mil por danos morais a paciente que ficou parcialmente cega após se submeter a cirurgia de catarata. A decisão foi unânime.

Em 2005, a autora passou por exames em instituto de oftalmologia em São Paulo, que apontaram a presença de catarata em seu olho direito. Após o diagnóstico, a paciente realizou cirurgia em hospital oftalmológico. A operação foi conduzida por profissionais do instituto responsável pelo diagnóstico.

Nos dias posteriores à realização da cirurgia, a paciente sentiu diversas dores no olho operado e, por isso, teve que realizar outras duas intervenções cirúrgicas. Mesmo assim, devido a uma infecção, a autora ficou sem a visão do olho direito, tendo inclusive perdido o bulbo ocular (uma das partes que compõe o sistema ocular).

Responsabilidade

Em primeira instância, o pedido de indenização foi negado. Baseado em perícia judicial, a juíza entendeu que os profissionais de saúde que atenderam a paciente agiram de forma adequada. A magistrada também considerou que havia dúvidas sobre o local de ocorrência da contaminação pós-operatória que ocasionou a cegueira parcial — no hospital ou fora dele. A decisão de primeiro grau foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

No recurso dirigido ao STJ, a paciente alegou que ficou comprovada no processo a infecção hospitalar e, dessa forma, não caberia a ela provar de quem foi a culpa pelo contágio e pela lesão definitiva. A autora também afirmou que o hospital e os profissionais de saúde não a avisaram, mesmo sendo diabética, sobre os riscos de insucesso do procedimento cirúrgico.

Origem dos danos

Ao analisar o recurso da paciente, os ministros decidiram reformar o julgamento de segunda instância. O relator do caso, ministro Marco Buzzi, destacou que os danos sofridos pela paciente resultaram de infecção hospitalar, o que afasta a responsabilidade dos médicos envolvidos na cirurgia.

O ministro Buzzi sublinhou que a responsabilização de hospitais e clínicas por infecção contraída em seus ambientes por paciente é objetiva, com base no risco do empreendimento, e não no exame simplesmente da culpa. Assim, é possível a análise de responsabilidade das pessoas jurídicas sem avaliar, necessariamente, os elementos relacionados à negligência, imperícia ou imprudência do corpo médico.

“Com efeito, não cabe afastar a responsabilidade do hospital por infecção contraída por paciente com base na inexistência de culpa dos agentes médicos envolvidos, pois nessas hipóteses incide a responsabilização objetiva”, afirmou o ministro ao apontar o nexo entre o dano sofrido pela paciente e os serviços prestados pelas instituições de saúde.

De acordo com a decisão do ministro Buzzi, como faziam parte da mesma cadeia de prestação de serviços, o instituto oftalmológico e o hospital arcarão de forma solidária com a indenização estabelecida pela turma.

Processo: REsp 1511072

terça-feira, 26 de julho de 2016

DIREITO CIVIL. HIPÓTESE DE AUSÊNCIA DE COBERTURA DO DPVAT.

O Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por veículos automotores de via terrestre (DPVAT) não cobre os danos de acidente ocasionado por trem. A Lei n. 6.194/1974 instituiu o "Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não", conhecido como seguro DPVAT. Por sua vez, o Anexo I do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) - que trata de definições utilizadas no próprio CTB - define "veículo automotor" como "todo veículo a motor de propulsão que circule por seus próprios meios, e que serve normalmente para o transporte viário de pessoas e coisas, ou para a tração viária de veículos utilizados para o transporte de pessoas e coisas. O termo compreende os veículos conectados a uma linha elétrica e que não circulam sobre trilhos (ônibus elétrico)". Nessa ordem de ideias, por meio da análise do referido Anexo, bem como das Resoluções ns. 555/2015 e 573/2015 do Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN), depreende-se que o veículo automotor se distingue das demais espécies, por contar com um movimento intrínseco em sua estrutura, locomovendo-se, de forma autônoma, por meio de motor. Salientado isso, é preciso definir a condição do trem e seus assemelhados (metrô e bonde), uma vez que se locomovem por meio de motor e utilizam trilhos. De antemão, deve-se ter em mente que a espécie de motor, seja por combustão de produtos inflamáveis ou por força elétrica, não é suficiente para se definir a questão. Em verdade, o marco divisor está sobre o modo (via) pelo qual os trens e seus assemelhados circulam. Isso porque, como dito, o próprio CTB estabelece que a expressão "veículo automotor" também compreende aqueles "conectados a uma linha elétrica e que não circulam sobre trilhos (ônibus elétrico)". Dessa forma, o trem, apesar de se autolocomover por motor, necessita da utilização de "trilhos", o que obsta a incidência do seguro previsto na Lei n. 6.194/1974. Com efeito, para fins de recebimento do seguro obrigatório DPVAT, o veículo deve apresentar um motor em sua estrutura, que o permita se autolocomover e circular por terra ou por asfalto (via terrestre). Nesse sentido, a Resolução n. 273/2012 da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), ao não incluir os veículos que trafegam sobre trilhos em nenhuma das categorias nela indicadas, também os afasta do pagamento de seguro DPVAT. REsp 1.285.647-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 12/4/2016, DJe 2/5/2016. 

Reconhecida legalidade da tarifa de renovação de cadastro bancário entre 2007 e 2009

É válida a cláusula contratual que prevê a cobrança da tarifa de renovação de cadastro (TRC) nos contratos bancários celebrados no período de vigência da Circular 3.371/2007 do Banco Central do Brasil. Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu parcialmente recurso interposto pelo Itaú Unibanco S.A. contra ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ).

Na ação, o MP requereu, entre outros pontos, a nulidade das cláusulas contratuais, a restituição em dobro dos valores cobrados indevidamente dos consumidores e a reparação dos danos materiais e morais coletivos no valor mínimo de R$ 100 mil. Sustentou que tal cláusula seria abusiva por não se tratar de serviço prestado em benefício do cliente, mas de um encargo da instituição financeira indevidamente transferido para o consumidor.

O banco alegou ilegitimidade do Ministério Público para agir na questão, legalidade da tarifa e propôs a devolução simples em caso de reconhecida abusividade da cobrança. Para a instituição financeira, o MP não possui legitimidade ativa para agir em demanda que envolve direitos individuais disponíveis e restritos às pessoas que contratam com o sistema bancário.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) considerou abusiva a cobrança da tarifa de renovação cadastral, afastou a condenação por dano moral coletivo e determinou a devolução simples dos valores indevidamente cobrados de cada consumidor lesado. O banco recorreu ao STJ.

Cobrança legítima
O relator do recurso no STJ, ministro João Otávio de Noronha, reiterou a legitimidade do Ministério Público para propor ação civil pública com o intuito de discutir a cobrança de tarifas/taxas supostamente abusivas estipuladas em contratos bancários. No julgamento, aplicou entendimento pacificado no tribunal para nortear seu voto.

Ele lembrou que em julgamento de recurso repetitivo, a Segunda Seção do STJ reconheceu a legalidade das tarifas bancárias, desde que pactuadas de forma clara no contrato e atendida a regulamentação expedida pelas autoridades competentes; ressalvando-se, apenas, eventual abuso, devidamente comprovado, caso a caso, em comparação com os preços cobrados no mercado.

De acordo com o relator, seguindo esse raciocínio jurídico e havendo previsão específica nas normas editadas pelas autoridades regulamentadoras, deve-se reconhecer legítima a cobrança da tarifa de renovação de cadastro durante o período de vigência da Circular 3.371, que vigorou de 6 de dezembro de 2007 a 14 de setembro de 2009.

“Nesse contexto, merece provimento o recurso especial no ponto em que pugna pelo reconhecimento da legalidade da cobrança da tarifa de renovação de contrato e das cláusulas contratuais que a previam, durante o período em que vigorou a Circular n. 3.371/2007, que expressamente autorizava a cobrança”, concluiu o ministro.

Por unanimidade, a turma também isentou o banco do dever de restituir os valores recebidos a esse título e do pagamento dos ônus de sucumbência.

Processo: REsp 1303646

segunda-feira, 25 de julho de 2016

Direito à educação: ensino privado e acesso a pessoas com deficiência

O Plenário, após converter em julgamento de mérito o exame de referendo de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade — ajuizada em face do § 1º do art. 28 e do “caput” do art. 30, ambos da Lei 13.146/2015 —, deliberou, por maioria, julgar o pleito improcedente. Os dispositivos impugnados tratam da obrigatoriedade das escolas privadas de oferecer atendimento educacional adequado e inclusivo às pessoas com deficiência. Reputou que a responsabilidade pela alteridade é um elemento estruturante da Constituição. Nesse sentido, a atuação do Estado na inclusão das pessoas com deficiência pressupõe a ideia de que essa ação tem via dupla, ou seja, traz benefícios a toda a população. Em outras palavras, todos os cidadãos têm o direito ao acesso a uma democracia plural, de pessoas, credos, ideologias e outros elementos. Especificamente, a Constituição prevê em diversos dispositivos a proteção da pessoa com deficiência (artigos 7º, XXXI; 23, II; 24, XIV; 37, VIII; 40, § 4º, I; 201, § 1º; 203, IV e V; 208, III; 227, § 1º, II, e § 2º; e 244). Ao se compreender pluralidade e igualdade como duas faces da mesma moeda, entende-se que a igualdade não se esgota com a previsão normativa de acesso igualitário a bens jurídicos, mas engloba também a previsão normativa de medidas que possibilitem, de fato, esse acesso e sua efetivação concreta. A respeito, fora promulgado o Decreto 6.949/2009 (Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência), que reconhece, em seu art. 24, o direito à educação como isento de discriminação e determina que os Estados partes da Convenção assegurem sistema educacional inclusivo em todos os níveis, de maneira que as pessoas com deficiência não poderão ser excluídas do sistema educacional geral sob alegação de deficiência. Ou seja, à luz dessa Convenção e, por consequência, da própria Constituição (art. 5º, § 3º), o ensino inclusivo em todos os níveis é imperativo que se põe mediante regra explícita. Além disso, se é certo que se prevê como dever do Estado facilitar às pessoas com deficiência sua plena e igual participação no sistema de ensino e na vida em comunidade, bem como, de outro lado, a necessária disponibilização do ensino primário gratuito e compulsório, é igualmente certo inexistir qualquer limitação da educação das pessoas com deficiência somente a estabelecimentos públicos ou privados que prestem o serviço público educacional. A Lei 13.146/2015 estabelece a obrigatoriedade de as escolas privadas promoverem a inserção das pessoas com deficiência no ensino regular e prover as medidas de adaptação necessárias sem que o ônus financeiro seja repassado às mensalidades, anuidades e matrículas.


O Tribunal entendeu inferir-se que, por meio da lei impugnada, o Brasil atendera ao compromisso constitucional e internacional de proteção e ampliação progressiva dos direitos das pessoas com deficiência. Não obstante o serviço público de educação ser livre à iniciativa privada, isso não significa que os agentes econômicos que o prestam possam fazê-lo ilimitadamente ou sem responsabilidade. É necessária a sua autorização e avaliação de qualidade pelo Estado, bem como o cumprimento das normas gerais de educação nacional. De igual modo, os estabelecimentos privados não podem eximir-se dos deveres de estatura constitucional impostos ao sistema educacional do País. À escola não é dado escolher, segregar, separar, mas é dever ensinar, incluir, conviver. A vivência cotidiana, o convívio com o diferente, são valores educacionais em si mesmos, e têm riqueza própria, pois desenvolvem o acolhimento, a tolerância e a ética. Portanto, o ensino inclusivo milita em favor da dialógica implementação dos objetivos esquadrinhados pela Constituição. É somente com a efetivação desses valores que pode haver a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, voltada para o bem de todos. Assim, o ensino inclusivo é política pública estável. Se as instituições privadas de ensino exercem atividade econômica, devem se adaptar para acolher as pessoas com deficiência, prestando serviços educacionais que não enfoquem a deficiência apenas sob a perspectiva médica, mas também ambiental. Ou seja, os espaços devem ser isentos de barreiras, as verdadeiras deficiências da sociedade. Esses deveres devem se aplicar a todos os agentes econômicos, e entendimento diverso implica privilégio odioso, porque oficializa a discriminação. Vencido o Ministro Marco Aurélio, que julgava o pedido parcialmente procedente. Considerava que a intervenção estatal no mercado deveria ser minimalista e que a obrigação principal, em se tratando de educação, é do Estado. Asseverava ser constitucional a interpretação dos artigos atacados no que encerram planejamento quanto à iniciativa privada, sendo inconstitucional a interpretação que leve a ter-se como obrigatórias as múltiplas providências determinadas pela lei.
ADI 5357 MC-Referendo/DF, rel. Min. Edson Fachin, 9.6.2016. (ADI-5357)

DIREITO CIVIL. ABRANGÊNCIA DE CLÁUSULA SECURITÁRIA DE INVALIDEZ TOTAL PERMANENTE.

O fato de o beneficiário de seguro de vida em grupo ter sido reformado pelo Exército em razão de incapacidade total para sua atividade habitual (serviço militar) não implica, por si só, o direito à percepção de indenização securitária em seu grau máximo quando a apólice de seguro estipula que esse grau máximo é devido no caso de invalidez total permanente para qualquer atividade laboral. Isso porque, tal como ocorre com a aposentadoria por invalidez reconhecida pelo INSS, o laudo que atesta a incapacidade total do trabalhador não exonera o segurado de realizar nova perícia para demonstrar sua invalidez total e permanente para o trabalho para fins de percepção da indenização securitária (AgRg no Ag 1.158.070-BA, Quarta Turma, DJe 13/8/2015; e AgRg no Ag 1.086.577-MG, Terceira Turma, DJe 11/5/2009). Somente se admitiria entendimento contrário ao ora adotado se houvesse cláusula que estabelecesse que a declaração de invalidez total para a atividade habitual do segurado implicaria o reconhecimento da incapacidade para qualquer atividade laboral para fins de percepção do quantum indenizatório devido por invalidez total permanente. REsp 1.318.639-MS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 26/4/2016, DJe 6/5/2016. 

Cláusula de raio, inserida em contratos de shopping center, não é abusiva

A cláusula de raio, inserida em contratos de locação de espaço em shopping center, não é abusiva. O entendimento é da Quarta Turma, firmado em julgamento de recurso especial. Para o colegiado, os shoppings constituem uma estrutura comercial híbrida e peculiar e as cláusulas extravagantes servem para garantir o fim econômico do empreendimento.

A chamada cláusula de raio proíbe os lojistas de um shopping de explorar o mesmo ramo de negócio em um determinado raio de distância, com o objetivo de restringir a concorrência de oferta de bens e serviços no entorno do empreendimento.

No caso apreciado, o Sindicato dos Lojistas do Comércio de Porto Alegre ajuizou ação declaratória de inexigibilidade contra um shopping da cidade para que fosse declarada a nulidade da cláusula de raio inserida nos contratos firmados com os lojistas do empreendimento.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul acolheu o pedido sob o fundamento de que a cláusula de raio viola o princípio da livre concorrência com os outros shoppings; cria obstáculos para os empreendedores interessados em expandir o negócio; além de acarretar prejuízos ao consumidor, que é induzido a frequentar determinado centro de compras para encontrar o estabelecimento que procura.

No caso concreto, também foi alegada alteração contratual, ampliando, de 2 para 3 km, o raio a ser respeitado pelos lojistas para não instalar outro estabelecimento comercial do mesmo ramo. Para o TJRS, a modificação violou o princípio da boa-fé objetiva.

No STJ, o entendimento do tribunal gaúcho não foi mantido. O relator, ministro Marco Buzzi, destacou que a modalidade específica do contrato entre os lojistas e shopping objetiva a viabilização econômica e administrativa, bem como o sucesso do empreendimento, almejados por ambas as partes.

O relator também afastou a alegação de prejuízo ao consumidor. Além de a instalação dos lojistas em outros empreendimentos depender de inúmeros fatores e concordando com a sentença, ele esclareceu que a cláusula de raio acaba potencializando a concorrência com a abertura de outros empreendimentos no entorno.

Marco Buzzi também entendeu ser inviável impor limitações a contratos firmados baseando-se apenas em situações genéricas, sem um caso concreto que alegue a abusividade da cláusula e os prejuízos sofridos.

Em relação à modificação contratual que ampliou a distância da cláusula de raio, o relator entendeu que, uma vez respeitados os contratos de locação em curso, a modificação não apresenta ilegalidade ou abusividade.

Isso porque o dono do negócio pode impor limitações e condições para o uso de sua propriedade por terceiros, ressalvada a possibilidade de reexame da matéria via judicial ante a provocação da parte que se considerar lesada.

Processo: REsp 1535727 

sábado, 23 de julho de 2016

Obrigação dos pais de prestar alimentos a filho maior de idade depende de prova

O filho que atinge a maioridade tem que comprovar a necessidade ou que frequenta curso técnico ou universitário para continuar recebendo pensão alimentícia. A decisão unânime foi da Terceira Turma ao analisar um recurso apresentado contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

O caso envolve ação ajuizada por um filho, com quase 21 anos de idade, contra o pai, com a finalidade de cobrar pensão alimentícia no total de R$ 52.248,00. O alimentando completou a maioridade em setembro de 2010 e ingressou com a ação em setembro de 2012.

Na sua defesa, o pai alegou que o filho não comprovou a necessidade dos alimentos, cobrados apenas dois anos após completar sua maioridade. Na oportunidade, enfatizou que há 10 anos não mantinha relação socioeconômica com o filho.

O TJRS julgou, por unanimidade, “descabido” o argumento do pai de que seria preciso comprovar a necessidade do filho para recebimento de pensão alimentícia. Inconformado, o genitor recorreu ao STJ.

O relator do caso na Terceira Turma, ministro Villas Bôas Cueva, citou o entendimento do STJ de que, apesar de a maioridade não fazer interromper a obrigação de pagamento, “eventual pedido de cancelamento de pensão alimentícia está sujeito a decisão judicial mediante contraditório”.

Para o ministro, o advento da maioridade não extingue, de forma automática, o direito à percepção de alimentos, “os quais passam a ter fundamento nas relações de parentesco, em que se exige a prova da necessidade do alimentado”, que não foi produzida no caso em análise.

“Incumbe ao interessado, já maior de idade, nos próprios autos e com amplo contraditório, a comprovação de que não consegue prover a própria subsistência sem os alimentos ou, ainda, que frequenta curso técnico ou universitário”, afirmou. 

No voto, o ministro reconheceu em parte os argumentos apresentados pelo pai e determinou o retorno do processo ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul para que o filho tenha a oportunidade de comprovar a necessidade da pensão.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

sexta-feira, 22 de julho de 2016

Acesso ao Whatsapp em celular apreendido, só com a autorização judicial

O acesso ao conteúdo de conversas pelo Whatsapp em celular apreendido durante flagrante pela polícia precisa de autorização judicial para ser considerado como prova em processo judicial. A decisão inédita foi da Sexta Turma ao julgar um habeas corpus de um suspeito detido pela Polícia Militar em Rondônia.

No dia 18 de março de 2014, uma patrulha da PM recebeu informação da Polícia Federal de que um pacote com drogas seria entregue pelos Correios em uma casa nos arredores da capital, Porto Velho. Os policiais aguardaram no local até que, por volta do meio-dia, um carro dos Correios entregou a encomenda.

Os policiais surpreenderam o suspeito e abriram o pacote, que continha 300 comprimidos de ecstasy. O recebedor da mercadoria tentou fugir, pulando o muro e se escondendo no imóvel vizinho, mas acabou preso. No flagrante, os policiais militares apreenderam o celular do suspeito.

A prisão em flagrante foi convertida em prisão preventiva. Todavia, o investigado foi solto por um habeas corpus do Supremo Tribunal Federal, no dia 19 de maio de 2014.

A seguir, a defesa do suspeito ajuizou um novo habeas corpus, dessa vez para anular as provas obtidas a partir dos dados acessados no celular. Na argumentação, defendeu que eram ilegais as transcrições das conversas via Whatsapp, feitas pela perícia.

A defesa alegou que a polícia precisa de autorização judicial, “antes de proceder à devassa unilateral no conteúdo” do aparelho. Para o Ministério Público de Rondônia, acessar o celular apreendido após um flagrante se trata de um “expediente comum”, previsto no artigo 6º do Código de Processo Penal.

Para os procuradores, o acesso aos dados não encontra impedimento semelhante ao da interceptação telefônica e que a autoridade policial agiu estritamente para cumprimento da lei. O pedido para anular as provas foi negado pela Justiça de Rondônia.

Inconformada, a defesa recorreu ao STJ, cabendo ao ministro Nefi Cordeiro, da Sexta Turma, a relatoria do caso.

Na decisão favorável à defesa, divulgada esta semana, o ministro considerou que o acesso às conversas via Whatsapp, “forma de comunicação escrita, imediata, entre interlocutores”, representa “efetiva interceptação inautorizada” de comunicação.

“É situação similar às conversas mantidas por e-mail, onde para o acesso tem-se igualmente exigido a prévia ordem judicial”, comparou o ministro. Para ele, o celular deixou de ser instrumento de conversação pela voz, permitindo acesso à correspondência eletrônica, de mensagens e de outros aplicativos semelhantes à telefonia convencional.

“Deste modo, ilícita é tanto a devassa de dados, como das conversas de Whatsapp obtidos de celular apreendido, porquanto realizada sem ordem judicial”, concluiu Nefi Cordeiro, sendo acompanhado pelos demais ministros da Sexta Turma.

Processo: RHC 51531

quinta-feira, 21 de julho de 2016

Em caso de perda total do veículo, valor pago por seguradora deve ser o da data do acidente

Em caso de perda total, a seguradora deve pagar a indenização referente ao valor médio de mercado do automóvel na data do acidente, e não na data do efetivo pagamento (liquidação do sinistro). A decisão é da Terceira Turma ao julgar um caso acontecido em Goiás.

Em junho de 2009, o proprietário de um caminhão da marca Scania se envolveu em um acidente com perda total. A seguradora pagou a indenização em setembro do mesmo ano, com base na tabela FIPE, no valor de R$ 229.246,38.

 Insatisfeito com o valor pago, o proprietário ingressou com uma ação na Justiça para receber o valor da tabela FIPE do mês de junho, quando o caminhão valia R$ 267.959,00, uma diferença de R$ 11.916,72, já descontado o IPVA. Na defesa, o proprietário alegou que deve ser cumprido o artigo 781 do Código Civil.

A seguradora, por seu turno, sustentou que o pagamento com base no mês de liquidação do sinistro está de acordo com a Lei 5.488/68 e a Circular Susep n. 145 (7/9/2000), além de constar no manual do segurado entregue ao proprietário juntamente com a apólice do seguro.

O juiz de primeiro grau não aceitou os argumentos do proprietário do caminhão. O magistrado entendeu que a seguradora cumpriu determinação expressa constante no contrato de seguro, a qual prevê que o pagamento deveria ser feito com base na tabela FIPE vigente à época da liquidação do sinistro.

Inconformado, o proprietário recorreu ao Tribunal de Justiça de Goiás, que manteve a sentença. Não satisfeito, o dono do caminhão recorreu então ao STJ, cabendo a relatoria do caso ao ministro Villas Bôas Cueva, da Terceira Turma.

No voto, o ministro salientou que o CC de 2002 adotou, para os seguros de dano, o “princípio indenitário”, de modo que a indenização corresponda ao valor real dos bens perdidos, destruídos ou danificados que o segurado possuía logo antes da ocorrência do sinistro.

“Isso porque o seguro não é um contrato lucrativo, mas de indenização, devendo ser afastado, por um lado, o enriquecimento injusto do segurado e, por outro, o estado de prejuízo”, afirmou.

O ministro sublinhou que, nos termos do artigo 781 do CC, a indenização possui alguns parâmetros e limites, não podendo ultrapassar o valor do bem no momento do sinistro nem exceder o limite máximo da garantia fixado na apólice.

Para Villas Bôas Cueva, é abusiva a cláusula de seguro que impõe o cálculo da indenização com base no valor médio de mercado do bem vigente na data de liquidação do sinistro, “pois onera desproporcionalmente o segurado, colocando-o em situação de desvantagem exagerada, indo de encontro ao princípio indenitário”.

“Como cediço, os veículos automotores sofrem, com o passar do tempo, depreciação econômica, e quanto maior o lapso entre o sinistro e o dia do efetivo pagamento, menor será a recomposição do patrimônio garantido”, afirmou.

Para o ministro, o valor médio de mercado do veículo como parâmetro para a apuração da indenização deve observar a tabela FIPE vigente na data do acidente, e não a data do efetivo pagamento (liquidação do sinistro). O voto do relator foi aprovado por unanimidade pelos demais ministros da Terceira Turma.

Processo: REsp 1546163 

quarta-feira, 20 de julho de 2016

Cláusula de eleição de foro pode ser invalidada em caso de vulnerabilidade da parte

Nos chamados contratos de adesão (caracterizados quando uma das partes propõe os termos do acordo e a outra apenas concorda ou não com os pontos apresentados), o Superior Tribunal de Justiça possui o entendimento de que é possível invalidar a cláusula que elege o foro para julgamento de eventuais demandas judiciais, caso seja verificada a vulnerabilidade de uma das partes.

O entendimento da corte se estende inclusive a termos de ajuste firmados entre pessoas jurídicas. O posicionamento do tribunal embasou recentemente o julgamento de recurso especial.

Nele, uma corretora de ações buscava a manutenção da cláusula que estipulava a comarca do Rio de Janeiro como foro para possível litígio com investidor. De acordo com a empresa, o acionista não estava em posição de vulnerabilidade no momento da assinatura do contrato, pois conhecia bem o mercado financeiro.

Ao negar o pedido da corretora, o ministro relator, Luis Felipe Salomão, ressaltou que o relacionamento entre as partes deveria ser orientado pelo Código de Defesa do Consumidor. Dessa forma, era legítima a intenção do investidor de litigar contra a empresa no local onde morava, em Porto Alegre.

“Verificada a existência de relação de consumo no caso dos autos, o foro de residência do consumidor é competente para [...] a discussão judicial das questões a ele vinculadas, evitando-se a imposição do ônus a que ficaria obrigado com o deslocamento para deduzir defesa em Juízo no foro de eleição”, afirmou o ministro Salomão.

Os julgados relativos à eleição de foro em contratos de adesão estão agora disponíveis na Pesquisa Pronta, ferramenta on-line do STJ criada para facilitar o trabalho de quem deseja conhecer o entendimento dos ministros em julgamentos semelhantes.

A ferramenta reuniu 280 acórdãos sobre o tema Análise da validade da cláusula de eleição de foro nos contratos de adesão. Os acórdãos são decisões já tomadas por um colegiado de ministros do tribunal.

A ferramenta oferece consultas a pesquisas prontamente disponíveis sobre temas jurídicos relevantes, bem como a acórdãos com julgamento de casos notórios.

Embora os parâmetros de pesquisa sejam predefinidos, a busca dos documentos é feita em tempo real, o que possibilita que os resultados fornecidos estejam sempre atualizados.

A Pesquisa Pronta está permanentemente disponível no portal do STJ. Basta acessar Jurisprudência > Pesquisa Pronta, na página inicial do site, a partir do menu principal de navegação.

Processo: AREsp 476551

terça-feira, 19 de julho de 2016

Mantida condenação de médica por demora em parto que causou morte de bebê

De forma unânime, a Terceira Turma negou recurso de médica condenada pela demora na realização de um parto no Rio de Janeiro. Devido ao atraso da cirurgia cesárea, o bebê nasceu com danos neurológicos permanentes. Posteriormente, no curso do processo, o recém-nascido morreu.

Segundo os pais da criança, em 2001, a genitora deu entrada na clínica obstétrica já em trabalho de parto, mas houve demora na realização da cirurgia cesárea. Após o parto, o bebê apresentou quadro de asfixia, hipoglicemia e convulsão, que causaram paralisia de suas funções cerebrais.

Com base em laudo pericial, o juiz de primeira instância julgou improcedente o pedido de indenização dos autores. A sentença registrou que não houve comprovação da responsabilidade do hospital pelo erro médico que ocasionou a morte do recém-nascido. Também foi afastada a responsabilização das profissionais de saúde envolvidas no parto — uma médica obstetra, uma anestesista e uma pediatra.

Todavia, em segunda instância, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro entendeu que a demora no atendimento da mãe pela obstetra causou a falta de oxigenação no cérebro do bebê e, consequentemente, provocou os danos neurológicos ao recém-nascido. O colegiado manteve a exclusão de responsabilidade da clínica, da pediatra e da anestesista.

A obstetra recorreu ao STJ. Em sua defesa, alegou que, como foi chamada posteriormente ao processo (inicialmente, os autores processaram apenas a clínica) e o hospital foi absolvido, ela não poderia ser condenada exclusivamente. Alternativamente, a médica pediu que os efeitos da condenação recaíssem sobre a clínica, de forma solidária.

Os pedidos da obstetra foram negados pela Terceira Turma. De acordo com o relator do caso, ministro João Otávio de Noronha, o chamamento posterior ao processo não trouxe prejuízo à profissional de saúde, que teve a garantia de ampla defesa e inclusive participou da produção de provas.

Em relação à condenação exclusiva da obstetra, o ministro Noronha destacou que o tribunal carioca “concluiu pela ausência de responsabilidade civil da clínica e das médicas anestesista e pediatra, razão pela qual se afigura correta a improcedência dos pedidos em relação às mesmas e a responsabilização apenas da médica obstetra, cuja negligência foi reconhecida pelas instâncias de origem, sem que se vislumbre nenhuma ofensa legal”.

Com a manutenção da decisão de segunda instância, a médica deverá pagar o valor de R$ 50 mil para cada um dos autores (pai, mãe e criança).

Processo: REsp 1453887 

segunda-feira, 18 de julho de 2016

Quarta Turma não reconhece violação a direitos autorais em obra arquitetônica

Em julgamento de recurso especial, a Quarta Turma negou pedido de indenização por danos morais e materiais feito por um arquiteto. O profissional argumentou que teria sido ofendido seu direito autoral em projeto arquitetônico feito para abrigar a sede de uma empresa.

O arquiteto alegou que a imagem da sede passou a ser estampada em vários produtos comercializados pela empresa, como calendários, potes de doces e bolsas térmicas. Questionou o fato de não existir referência de sua autoria nos produtos, não ter recebido pagamento pela reprodução da imagem, além de terem sido feitas modificações no prédio sem o seu consentimento.

A sentença, confirmada no acórdão de apelação, julgou improcedente o pedido por considerar que, nos contratos sob encomenda, o autor não tem direito a outra remuneração senão a já pactuada em contrato. O tribunal estadual, no entanto, determinou que fosse afixada placa no local da obra com a identificação do autor do projeto.

O entendimento foi mantido pela Quarta Turma. De acordo com o relator, ministro Luis Felipe Salomão, como não existe regulamentação específica quanto à titularidade dos direitos autorais de obras feitas sob encomenda, cabe às partes, em contratos de prestação de serviços, fixar os limites dessa transmissão.

No caso apreciado, observou o relator, o contrato foi firmado de forma verbal e, segundo as conclusões das instâncias ordinárias, a obra foi criada a partir de uma encomenda específica dos donos da empresa. Eles desejaram a criação de um projeto que fizesse referência à origem germânica da família. Portanto, o desenho arquitetônico, nesse sentido, não seria uma obra artística de livre criação.

“Impossível se mostra qualquer solução que se distancie das impressões obtidas e registradas pelas instâncias ordinárias, no que respeita à intenção das partes, especialmente quanto à modalidade de exploração da obra encomendada, já que coube ao juízo a quo coletar as provas e foi ele quem esteve bem perto das partes”, disse Salomão.

A alegação de que a modificação da obra feriu os direitos autorias também foi rechaçada pelo relator, que entendeu acertada a conclusão do tribunal de origem. O acórdão recorrido destacou que o artigo 18 da Lei 5.194/ 66 prevê a possibilidade da realização de alterações no projeto por outro profissional habilitado, caso o autor original esteja impedido ou recuse-se a fazê-las.

A decisão também citou o artigo 26 da Lei 9.610/98 que garante ao autor o direito de repudiar a autoria da obra quando a modificação ocorrer sem o seu consentimento, tendo como única sanção ao proprietário a de não mais poder atribuir a autoria do projeto ao arquiteto originário.

Por aplicação da Súmula 7 do STJ, que veda a apreciação de provas em sede de recurso especial, o ministro relator entendeu pela impossibilidade da reforma do acórdão pelas poucas informações no processo a respeito das modificações realizadas na obra.

Salomão também destacou em seu voto o fato de a divulgação não ter relação com o projeto arquitetônico em si, mas com o objetivo de criar uma identidade da empresa.

“A imagem representada nos rótulos dos produtos da empresa, que trazem o prédio-sede em sua composição, tem a intenção muito clara de referenciar os produtos, de conferir identidade a eles, e em nada se relacionam à técnica arquitetônica. Diante da inexistência de evidências quanto ao uso ilícito da obra e sua exploração desautorizada, não há se falar em direito à indenização pleiteada”, concluiu o relator.

Processo: REsp 1290112