quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

CIRURGIA ESTETICA IMPLANTE DE SILICONE INFECCAO POR MICROBACTERIA RESPONSABILIDADE CIVIL DE ESTABELECIMENTO HOSPITALAR DANOS MORAIS E MATERIAIS DANO ESTETICO

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS, MATERIAIS E ESTÉTICOS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. CIRURGIA ESTÉTICA DE IMPLANTE DE PRÓTESE MAMÁRIA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. ERRO MÉDICO. INOCORRÊNCIA. DESENVOLVIMENTO DE QUADRO INFECCIOSO EM UMA DAS MAMAS DA PACIENTE. INFECÇÃO HOSPITALAR PELA BACTÉRIA MYCROBACTERIUM FORTUITUM. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO HOSPITAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. INOCORRÊNCIA DE CASO FORTUITO EXTERNO. DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS CONFIGURADOS. QUANTUM QUE DEVE SER MANTIDO EM OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. PRECEDENTES DO STJ E DESTE TRIBUNAL. 1. Paciente que apresentou infecção em uma das mamas após cirurgia para implante de próteses de silicone. 2. Na hipótese de responsabilidade civil por erro médico oriunda de cirurgia estética, a qual se notabiliza pela obrigação de resultado a ser atingido pelo profissional, são aplicáveis as regras da responsabilidade subjetiva com culpa presumida. 3. Na espécie, a melhora estética pretendida (implante de silicone nos seios), o conjunto probatório evidencia a adoção do procedimento adequado ao fim pretendido e a infecção contraída não enseja erro médico, afastando-se o dever de indenizar. 4. A responsabilidade civil dos hospitais e estabelecimentos de saúde congêneres é objetiva no que diz respeito à atividade hospitalar em si, caso da infecção hospitalar, conforme precedentes do STJ e deste Tribunal. 5. Na espécie, embora nenhum nosocômio esteja imune ao surgimento de infecções nas suas dependências, a clínica de saúde não se desincumbiu do ônus da prova do alegado atendimento das rotinas estabelecidas pela Lei nº. 9.431/97 e Portaria nº 2.616/98 do Ministério da Saúde. 6. Hipótese em que a infecção hospitalar foi contraída pela autora em razão de falha do nosocômio nos procedimentos e métodos de desinfecção e assepsia dos instrumentos cirúrgicos, o que acarreta defeito na prestação do serviço e o consequente dever de indenizar. 7. Prova pericial conclusiva. 8. Danos extrapatrimoniais configurados. 9. A reparação por danos extrapatrimoniais deve ser suficiente para atenuar as consequências das ofensas aos bens jurídicos tutelados, não significando, por outro lado, um enriquecimento sem causa, assim como deve ter o efeito de punir o responsável de forma a dissuadi-lo da prática de nova conduta, sendo que a quantia fixada na sentença em R$ 15.000,00 está em consonância com os parâmetros deste Tribunal, levando-se em consideração também o Enunciado nº 116 veiculado pelo Aviso 52/2011 e precedentes desta Corte. 10. A cicatriz no seio da autora gera sentimento negativo, de natureza intimamente subjetiva, que autoriza a indenização pela deformidade estética no valor de R$ 5.000,00 fixado na sentença. 11. Danos materiais regularmente comprovados. RECURSO DO 2.º APELANTE A QUE SE DÁ PROVIMENTO E DA 1.ª E DO 3.º DESPROVIDOS.
Precedente citado: STJ REsp 1097955/MG, Rel. Nancy Andrighi, julgado em 27/09/2011. TJRJ AC 014150-70.2009.8.19.0001, Rel. Des. Tereza C. S. Bitttencourt Sampaio, julgado em 15/01/2014.
VIGESIMA TERCEIRA CAMARA CIVEL CONSUMIDOR -
Des(a). LUCIANO SILVA BARRETO - Julg: 30/07/2014

terça-feira, 30 de dezembro de 2014

INTERNET OPERACAO SIGILOSA DA POLICIA FEDERAL DIVULGACAO DE INFORMACOES ENVOLVENDO MENOR OBRIGACAO DE REMOCAO DO CONTEUDO DANO MORAL IN RE IPSA MULTA DIARIA

APELAÇÃO. DIREITO DAS RELAÇÕES DE CONSUMO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZATÓRIA. DISPONIBILIZAÇÃO DE FERRAMENTA PARA DIVULGAÇÃO DE CONTEÚDO ATRAVÉS DA REDE MUNDIAL DE COMPUTADORES. INTERNET. PLATAFORMA GOOGLE PLUS. DIREITO INTERTEMPORAL: FATO OCORRIDO ANTES DA VIGÊNCIA DO MARCO CIVIL DA INTERNET. Constituição da República: artigo 5º, IV: "é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato." RESPONSABILIDADE. FISCALIZAÇÃO DAS INFORMAÇÕES DIVULGADAS. HIPÓTESE QUE NÃO SE CONFUNDE COM O GERENCIAMENTO DE MECANISMOS DE BUSCA NA INTERNET E INDEXAÇÃO DE INFORMAÇÕES. DEMONSTRADA A ILICITUDE O DETENTOR DO CONTROLE SOBRE A PLATAFORMA DISPONIBILIZADA DEVERÁ RESTRINGIR O ACESSO AO CONTEÚDO IMPUGNADO. NEGATIVA DO PROVEDOR. IMPOSSIBILIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DO RESPONSÁVEL PELA DIVULGAÇÃO QUE OBRIGA O APELADO A ATUAR EM PROL DA LEGALIDADE E ETICIDADE NO USO DA SUA FERRAMENTA. CONTEÚDO QUE EXPÕE PESSOA MENOR. VINCULAÇÃO DO SEU NOME A OPERAÇÃO SIGILOSA DA POLÍCIA FEDERAL DESTINADA A INVESTIGAR CONDUTAS CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. OBRIGAÇÃO DE REMOÇÃO DO CONTEÚDO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. REPERCUSSÃO DA DIVULGAÇÃO SOBRE A PERSONALIDADE DA ADOLESCENTE APELANTE. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO EM R$ 15.000,00. VALOR NECESSÁRIO E SUFICIENTE PARA A REPROVAÇÃO E PREVENÇÃO DA LESÃO IMATERIAL. RECURSO AO QUAL SE DÁ PROVIMENTO.
Precedente citado: STJ AgRg no REsp 1396963/RS, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 08/05/2014.
VIGESIMA QUINTA CAMARA CIVEL CONSUMIDOR -
Des(a). CLAUDIO LUIZ BRAGA DELL ORTO - Julg: 08/08/2014

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

PAI AFETIVO OU REGISTRAL ACAO PROPOSTA PELO PAI BIOLOGICO RECONHECIMENTO DE FILHO PREVALENCIA DA PATERNIDADE SOCIO-AFETIVA INTERESSE DE(O) MENOR

APELAÇÃO. DIREITO CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. PATERNIDADE BIOLÓGICA. PATERNIDADE REGISTRAL. PRETENSÃO DO PAI BIOLÓGICO DE SER RECONHECIDO NESTA QUALIDADE NO ASSENTAMENTO REGISTRAL DO FILHO. PATERNIDADE SÓCIO-AFETIVA QUE PERDURA DESDE A CONCEPÇÃO E NASCIMENTO DA CRIANÇA. INTERESSE MAIOR DO INFANTE QUE DEVE SER PRESERVADO. MANUTENÇÃO DA SITUAÇÃO FÁTICA E JURÍDICA ATUAL. POSSIBILIDADE DE MODIFICAÇÃO PELO PRÓPRIO QUANDO ATINGIR A MAIORIDADE. Se o interesse da genitora colide, ainda que eventualmente, com o interesse do filho, é de ser nomeado curador à lide àquele (CPC, 9º, I, 2ª parte). Não ocorrendo prejuízo, seja pela contestação apresentada pelo pai registral, seja pelo julgamento de improcedência do pedido, afasta-se a anulação do processo. Ainda que não exista dúvida quanto à ascendência biológica do filho, deve ser mantido o reconhecimento da paternidade social, familiar e afetiva, conforme constante originalmente no registro de nascimento, preservando a estabilidade emocional da criança. Possibilidade futura do próprio interessado em buscar a alteração de seus dados, sopesando seus interesses (CC, 1.614), após atingir a maioridade civil. Conhecimento e desprovimento do recurso.
VIGESIMA SEGUNDA CAMARA CIVEL -
Des(a). ROGERIO DE OLIVEIRA SOUZA - Julg: 30/07/2014

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

CONFLITO ENTRE CONDOMINOS DESENTENDIMENTO QUANTO AO USO DA GARAGE OFENSA A HONRA OFENSA A DIREITOS DA PERSONALIDADE REDUCAO DO DANO MORAL PRINCIPIO DA RAZOABILIDADE

APELAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DESENTENDIMENTO ENTRE VIZINHOS. AGRESSAO VERBAL. OFENSA A HONRA. VIOLAÇÃO DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE. DEVER DE INDENIZAR. QUANTIFICAÇÃO. PRINCIPIO DA RAZOABILIDADE. REDUÇÃO. Como é sabido, a reparação do dano moral, assegurada pelo art. 5º, inciso X da Constituição Federal, visa amenizar o dano sofrido, dando algum conforto material ao ofendido. E, para que exista o dever de reparar o dano, imprescindível a ocorrência de três elementos fundamentais que informam a responsabilidade civil: i - ato ilícito causado pelo agente; ii - dano; iii - nexo de causalidade entre um e outro (art. 927 do CC/02). Com a inicial foram juntadas fotos tiradas na data do ocorrido que, de fato, mostram a postura contundente e intimidadora do apelante. Por sua vez, o depoimento apresentado pela testemunha também comprova a conduta violadora dos direitos da personalidade da autora. Esse comportamento hostil apresentado pelo apelante, também já foi observado em momentos anteriores, conforme se extrai dos documentos acostados no processo. Assim, na hipótese dos autos a parte autora logrou êxito em comprovar a prática de ato ilícito, do nexo causal e do dano, restando acertada a decisão de procedência do pedido inicial, motivo porque não merece reforma nesse ponto. No que tange ao dano moral, este deve ser este fixado de acordo com o bom senso e o prudente arbítrio do julgador, sob pena de se tornar injusto e insuportável para o causador do dano. Para fixação desse valor, deve-se obedecer ao critério da razoabilidade, objetivando o atendimento da sua dúplice função - compensatória dos sofrimentos infligidos à vítima e inibitória da contumácia do agressor - sem descambar para o enriquecimento sem causa da vítima. Deve-se considerar, portanto, para fins de fixação do quantum, a intensidade da lesão, as condições socioeconômicas do ofendido e de quem deve suportar o pagamento dessa verba compensatória. É de ser considerado que a imposição dessa verba tem como fundamentos o princípio da mitigação da dor e do sentido didático da condenação. Sendo assim, fiel ao princípio da razoabilidade, mostra-se devida a redução do quantum compensatório fixado em R$20.000,00, para R$5.000,00 (cinco mil), patamar condizente com os precedentes em hipóteses semelhantes. Recurso a que se dá parcial provimento.
Precedente citado: TJRJ AC 0005824-88.2003.8.19.0208, Rel. Des. Mario Assis Gonçalves, julgado em 23/01/2013.
TERCEIRA CAMARA CIVEL -
Des(a). RENATA MACHADO COTTA - Julg: 14/08/2014

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

MORTE DECORRENTE DE COLISAO DE VEICULOS MENOR HABILITADO PARA DIRIGIR CULPA DO MOTORISTA RESPONSABILIDADE SOLIDARIA DOS PAIS

Apelação. Ação indenizatória. Colisão de veículos. Óbito da esposa e mãe dos recorridos. Culpa da motorista que avançou, indevidamente, o semáforo, provocando a colisão. Prova testemunhal que elucidou, inequivocamente, a questão. Culpa comprovada da primeira apelante. Acidente ocorrido em 16/10/2000. Menor habilitado para dirigir. Inteligência do parágrafo único do artigo 1518, do Código Civil de 1916. Responsabilidade solidária de ambos os pais. Precedentes do C.STJ. Pensão correspondente a 2/3 do salário mínimo até o menor completar os 25 anos de idade. Precedentes do C.STJ. Salário mínimo que deve corresponder ao valor da data da sentença. Súmula nº 490, do STF. Quantum dos danos morais em harmonia com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Juros compostos aplicados somente em desfavor da primeira apelante. Provimento parcial do apelo para afastar os juros compostos aplicados em desfavor do segundo e terceiro apelantes.
Precedente citado: STJ REsp 146994/PR, Rel. Min. Nilson Naves, julgado em 16/03/1999.
SEGUNDA CAMARA CIVEL -
Des(a). PAULO SERGIO PRESTES DOS SANTOS - Julg: 06/08/2014

Homem enganado consegue cancelar registro de paternidade reconhecida voluntariamente

Um homem conseguiu na Justiça o direito de alterar o registro civil de suposto filho seu, para retirar a paternidade voluntariamente reconhecida. Por maioria de três votos a dois, a Terceira Turma considerou que houve vício de consentimento no ato da declaração do registro civil, pois ele foi induzido a acreditar que era o pai do bebê.

A jurisprudência do STJ entende que a ausência de vínculo biológico não é suficiente, por si só, para afastar a paternidade. Os magistrados analisam outras circunstâncias do caso, como a formação de vínculo socioafetivo com o menor e as eventuais consequências dessa ruptura. Para que seja possível desfazer uma paternidade civilmente reconhecida, é preciso que haja vício de consentimento na formação da vontade.

No caso, o autor da ação alegou que teve uma única relação sexual com a mãe do garoto antes da notícia da gravidez e somente após certo tempo passou a desconfiar da paternidade. O autor disse que chegou a viver com a mãe da criança e a pagar pensão alimentícia ao suposto filho, mas não se sentia obrigado a manter essa situação depois de constatar que não é o pai biológico.

A relatora do processo, ministra Nancy Andrighi, que ficou vencida no julgamento, defendeu que, uma vez reconhecida a paternidade, só a comprovação de vício de consentimento fundado em erro ou coação poderia desfazer a situação jurídica estabelecida. A ministra considerou que não havia erro no caso, pois era de se presumir que o suposto pai, ao tomar conhecimento da gravidez, tivesse alguma desconfiança quanto à paternidade que lhe foi atribuída.

Em novembro do ano passado, ela foi relatora de um processo sobre situação semelhante. A Terceira Turma, na ocasião, decidiu que o registro não poderia ser anulado, pois o erro capaz de caracterizar o vício deve ser grave, e não basta a declaração do pai de que tinha dúvida quanto à paternidade no momento do reconhecimento voluntário.

No último processo julgado, no entanto, prevaleceu o voto do ministro João Otávio de Noronha, para quem, no caso analisado, o erro é óbvio e decorre do fato de o autor da ação ter sido apontado pela mãe como pai biológico da criança, quando na verdade não o era. Além da ocorrência de erro essencial, capaz de viciar o consentimento do autor, teria ficado patente no processo a inexistência tanto de vínculo biológico quanto de vínculo afetivo entre as partes.

Noronha afirmou que o registro civil deve primar pela exatidão, e é de interesse público que a filiação se estabeleça segundo a verdade da filiação natural. A flexibilização desse entendimento, segundo ele, é admitida para atender às peculiaridades da vida moderna e ao melhor interesse da criança, mas em situações de exceção – o que não é o caso dos autos analisados, em que deve haver a desconstituição do registro por erro.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

NARRATIVA DE FATOS OFENSIVOS EM BLOG LIBERDADE DE EXPRESSAO EXCESSO DANO IRREPARAVEL PRESENCA DOS REQUISITOS LEGAIS TUTELA ANTECIPADA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. INDEFERIMENTO DE TUTELA INIBITÓRIA ANTECIPADA. MATÉRIAS VEICULADAS EM "BLOG" NA INTERNET. REFORMA DA DECISÃO. 1. O agravante pretende coibir o agravado de promover comentários em seu blog sobre o Comitê Olímpico Brasileiro, que, segundo alega, tratam-se de difamações e acusações inverídicas. 2. Decisão que indefere a antecipação de tutela, ao fundamento de que a demanda exige o aprofundamento da instrução probatória, incompatível com o instituto, ante a prova documental exibida. 3. Em linho de princípio, os comentários ofensivos feitos contra o agravado excedem ao princípio da liberdade de expressão. 4. Dano irreparável ou de difícil reparação, consistente no risco de abalo da imagem do agravante. 5. Presença dos requisitos autorizadores da antecipação da tutela previstos no art. 273, do C.P.C. Precedentes desta E. Corte de Justiça. 6. Concessão da tutela inibitória para determinar que o agravado se abstenha de fazer acusações sobre o agravante em seu "blog" na internet, sob pena de multa de R$ 1.000,00 a cada comentário ofensivo. 7. Recurso parcialmente provido.
Precedente citado: TJRJ AI 0049323-52.2012.8.19.0000, Rel. Des. Cherubin Helcias Schwartz, julgado em 18/12/2012.
0060617-67.2013.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO
OITAVA CAMARA CIVEL -
Des(a). MONICA MARIA COSTA DI PIERO - Julg: 03/06/2014

Segunda Seção reafirma que bem de família do fiador em contrato de aluguel é penhorável

Em julgamento de recurso especial sob o rito dos repetitivos (artigo 543-C do Código de Processo Civil), a Segunda Seção firmou a tese de que é possível a penhora de bem de família de fiador apontado em contrato de locação, ante o que dispõe o artigo 3º, inciso VII, da Lei 8.009/90.

De acordo com o dispositivo, a impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

O colegiado, de forma unânime, seguiu a jurisprudência já firmada pelo STJ e também pelo Supremo Tribunal Federal. “A jurisprudência desta corte é clara no sentido de que é possível a penhora do bem de família de fiador de contrato de locação, mesmo quando pactuado antes da vigência da Lei 8.245/91, que alterou o artigo 3º, inciso VII, da Lei 8.009”, afirmou o relator do recurso, ministro Luis Felipe Salomão.

A ação de cobrança de aluguéis e encargos locatícios foi ajuizada por um espólio. O juízo de primeiro grau acolheu o pedido e declarou rescindido o contrato de locação, decretou o despejo e condenou todos os réus, solidariamente, ao pagamento dos aluguéis e encargos da locação vencidos e os vincendos até a data da desocupação do imóvel.

A sentença transitou em julgado, e o espólio iniciou o seu cumprimento, tendo sido penhorados imóveis dos fiadores, que apresentaram exceção de pré-executividade. Entre outras questões, sustentaram a inconstitucionalidade do artigo 3º da Lei 8.009. O juízo, no entanto, rejeitou a alegação de impenhorabilidade do bem de família em vista dos precedentes judiciais.

Os fiadores recorreram, e o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul tornou insubsistente a penhora que recaiu sobre um dos imóveis. “A pretensão de expropriação do imóvel residencial do fiador ganha maiores contornos de inadmissibilidade quando, em comparação com o direito posto ao devedor principal, percebe-se que a garantia negada ao garantidor é amplamente assegurada ao afiançado”, afirmou o tribunal.

Em seu voto, o ministro Salomão destacou que, conforme o artigo 1º da Lei 8.009, o bem imóvel destinado à moradia da entidade familiar é impenhorável e não responderá pela dívida contraída pelos cônjuges, pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas no artigo 3º da norma.

“Infere-se, pois, que a legislação pátria, a par de estabelecer como regra a impossibilidade de se impor a penhora sobre bem imóvel destinado à moradia do indivíduo e de sua família, excetuou a hipótese do fiador em contrato de locação, permitindo que tal gravame seja lançado sobre o imóvel”, concluiu Salomão.

Entretanto, o ministro ressaltou que há divergência na doutrina sobre o tema em discussão. De um lado, autores como José Rogério Cruz e Tucci e Carlyle Popp entendem que o bem de família do fiador não pode ser penhorado para satisfação de débito em contrato de locação.

Por outro lado e em conformidade com a jurisprudência do STJ e do STF, doutrinadores como Álvaro Villaça Azevedo, Alessandro Segalla e Araken de Assis defendem ser legítima a penhora, com base no artigo 3º da Lei 8.009.

No caso julgado, a decisão do TJMS, ao considerar inválida a penhora sobre o bem de família de fiador de contrato locatício, contrariou o artigo 3º e divergiu do entendimento já pacificado no STJ e também no STF, razão pela qual foi reformada.

Processo: REsp 1363368

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

UNIAO ESTAVEL EX-COMPANHEIRA DIFICULDADE DE REINSERCAO NO MERCADO DE TRABALHO NECESSIDADE DO PENSIONAMENTO COMPROVACAO MANUTENCAO DE PERCENTUAL

AÇÃO DE ALIMENTOS. UNIÃO ESTÁVEL. EX-COMPANHEIRA QUE SE DEDICOU AOS CUIDADOS DO LAR. DIFICULDADE DE REINSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO COMPETITIVO. SÁUDE ABALADA. COMPROVAÇÃO DA NECESSIDADE DO PENSIONAMENTO. MANUTENÇÃO DO PERCENTUAL ARBITRADO. Ação de alimentos ajuizada por ex-companheira. Comprovação da união estável e da necessidade da Alimentanda em receber os alimentos. Alimentos provisórios fixados em 30% (trinta por cento) dos rendimentos líquidos do alimentante. Sentença de procedência parcial. Apelação da Autora se insurgindo quanto à redução do percentual fixado a título de alimentos para 15% (quinze por cento) dos rendimentos líquidos do alimentante e quanto ao reconhecimento de sucumbência recíproca. Embora a Apelante tenha comprovado sua condição de saúde delicada e o fato de não ter exercido atividade laborativa durante a união, não seria justo condenar o Demandado a pensionamento superior ao que a Alimentanda perceberia se estivesse trabalhando em função equivalente a seu último emprego. Correta a redução do percentual dos alimentos para 15% (vinte por cento), em respeito ao binômio necessidade/possibilidade, bem como em atenção aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. A fixação dos alimentos em percentual inferior ao requerido não leva à aplicação da regra do artigo 21 do Código de Processo Civil. Precedentes desta Corte e do Colendo Superior Tribunal de Justiça. Conhecimento e provimento parcial do Recurso.
Precedente citado: STJ AgRg no Ag 1075624SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 02/06/2009. TJRJ AC 0002728-23.2011.8.19.0002, Rel. Des. Mauro Dickstein, julgado em 24/07/2012.
DECIMA NONA CAMARA CIVEL -
Des(a). LUCIO DURANTE - Julg: 24/06/2014

Terceira Turma afasta prescrição e reabre discussão sobre herança milionária

A Terceira Turma reformou acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que havia declarado a prescrição de apólices da dívida pública federal adquiridas entre os anos de 1914 e 1955 por um falecido fazendeiro da cidade mineira de Sabinópolis e que estavam sob a custódia do Banco Mercantil do Rio de Janeiro, instituição posteriormente incorporada ao Banco Itaú.

A propriedade de 1.266 apólices emitidas para financiar investimentos de interesse nacional – como as ferrovias Madeira-Mamoré, São Luís-Caxias e Passo Fundo-Uruguaiana, a dragagem dos rios que deságuam na baía do Rio de Janeiro e até a reorganização do Exército – constam do inventário de bens deixados pelo falecido fazendeiro aos seus herdeiros.

No caso julgado, duas herdeiras requereram o direito de receber 300 apólices ou os créditos de títulos do Tesouro Nacional referentes às suas cotas na partilha, que totalizavam mais de R$ 27 milhões em valores de 1998.

A Justiça mineira entendeu que o contrato de depósito foi extinto por prescrição, uma vez que não foi reclamado no prazo de 25 anos, conforme disposto no artigo 1º da Lei 2.313/54. As herdeiras de Elpídio de Pinho Tavares recorreram ao STJ alegando que o contrato de depósito carece de prazo determinado, pois é dever do depositário a guarda do objeto até que o depositante o reclame, e que sua extinção depende de aviso prévio publicado no Diário Oficial.

Segundo o relator do recurso no STJ, ministro Moura Ribeiro, no caso de depósito regular e voluntário de bens, o artigo 1º da Lei 2.313 prevê o prazo de 25 anos para sua permanência na instituição bancária. Mas também determina, em seu parágrafo 1º, que após esse prazo ele deve ser transferido ao Tesouro Nacional, abrindo-se novo prazo de cinco anos para o depositante reaver os títulos recolhidos aos cofres públicos.

Moura Ribeiro ressaltou que, nesse caso, o prazo extintivo de cinco anos ocorre em benefício do patrimônio nacional, e não da instituição bancária. Portanto, ele só deve ser contado se houver prova da efetiva transferência dos bens ao Tesouro Nacional mediante publicação de editais, o que não ocorreu no caso julgado.

De acordo com o ministro, não existem nos autos nem sequer indícios de comprovação dessa transferência, obrigação a cargo da instituição financeira. “Não existindo prova da remessa dos títulos para o Tesouro Nacional e da publicação de editais, não ocorre prescrição para o depósito regular, por força da Lei 2.313 (artigo 1º, parágrafo 2º)”, ressaltou o ministro em seu voto.

Para Moura Ribeiro, é incontroverso nos autos que os títulos estão em poder da instituição financeira desde fevereiro de 1956 e que o contrato não foi livremente desfeito em razão da morte do seu titular. “Daí porque é de se considerar existente a relação contratual de depósito regular, sem a ocorrência de extinção, não havendo que se falar em prescrição”, disse o relator.

Com esse entendimento, a Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso para reformar o acórdão recorrido e determinar o retorno do processo à instância de origem para o seu regular prosseguimento.

Processo: REsp 1253262

segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

PROVEDOR DE HOSPEDAGEM DE SITE VIDEO COM CONTEUDO OFENSIVO INCITACAO A VIOLENCIA REMOCAO COERCITIVA CUMPRIMENTO DE OBRIGACAO DE FAZER PRESUNCAO DE SOLIDARIEDADE


APELAÇÃO CÍVEL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. PROVEDOR DE INTERNET. RETIRADA DE VÍDEO QUE INCITA À VIOLÊNCIA E DEPREDAÇÃO DE BENS DE CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO, EM MANIFESTAÇÃO CONTRA AUMENTO DE TARIFAS, POSTADOS NO YOUTUBE. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA, QUE CONDENOU O RÉU A RETIRADA DO VÍDEO INDICADO NA INICIAL E OUTROS SIMILARES, EM 24 HORAS, APÓS A DEVIDA INTIMAÇÃO DA OFENDIDA, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA DE R$ 15.000,00. APELLO DO GOOGLE, PRETENDENDO A IMPROCEDÊNCIA DO PLEITO INICIAL. O S.T.J FIRMOU ENTENDIMENTO DE QUE OS PROVEDORES DE CONTEÚDO NÃO RESPONDEM OBJETIVAMENTE PELA INSERÇÃO, POR TERCEIROS, DE INFORMAÇÕES ILEGAIS NO SITE, TODAVIA, OS PROVEDORES DE INTERNET EMBORA NÃO POSSAM SER OBRIGADOS A EXERCER UM CONTROLE PRÉVIO DO CONTEÚDO DAS POSTAGENS INSERIDAS NOS SÍTIOS, DEVEM, ASSIM QUE TIVEREM CONHECIMENTO DO POST ILEGAL, DEVIDAMENTE IDENTIFICADO POR SUA URL, ABUSIVO OU OFENSIVO, REMOVÊ-LO PREVENTIVAMENTE NO PRAZO MÁXIMO DE 24 HORAS, ATÉ POSSAM APRECIAR A VERACIDADE DAS ALEGAÇÕES, PARA CONFIRMANDO-AS, EXCLUIR DEFINITIVAMENTE O POST OU, TENDO-AS POR INFUNDADAS, RESTABELECER SEU LIVRE ACESSO, SOB PENA DE RESPONDEREM SOLIDARIAMENTE COM O AUTOR DIRETO DO DANO EM VIRTUDE DA OMISSÃO. A SENTENÇA ANDOU NA ESTEIRA DA JURISPRUDÊNCIA DESSE E.TJRJ E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, SOPESANDO TANTO A IMPOSSIBILIDADE DE MONITORAMENTO PRÉVIO E LOCALIZAÇÃO DE CONTEÚDO OFENSIVO, BEM COMO O PAPEL DOS PROVEDORES DE SERVIÇOS DA INTERNET, A IMPOSSIBILIDADE DE CONTROLE EDITORIAL DAS INFORMAÇÕES, QUE SE EQUIPARARIA À QUEBRA DE SIGILO DA CORRESPONDÊNCIA, NA FORMA DO ART. 5º , XII DA CR/88, COM A GARANTIA DE LIBERDADE DE CRIAÇÃO, EXPRESSÃO, VEDAÇÃO AO ANONIMATO E O DEVER DE INFORMAÇÃO (ART. 5º, IV, IX E 220 DA CR/88) BEM COMO A NECESSIDADE E VIABILIDADE DE UM CONTROLE E EXCLUSÃO POSTERIOR DE POSTAGENS ILEGAIS OU COM CONTEÚDO OFENSIVO OU QUE INCITE VIOLÊNCIA, MEDIANTE COMUNICAÇÃO DOS OFENDIDOS, SOB PENA DE RESPONDER DE FORMA SOLIDÁRIA COM O AUTOR DA PRÁTICA, EM RAZÃO DE SUA OMISSÃO. ENTRETANTO, DEVE SER EXCLUÍDA DO DISPOSITIVO DA SENTENÇA A EXPRESSÃO ¿OU OUTRO DE SIMILAR CONTEÚDO¿, SOB PENA DO REFERIDO COMANDO SE TRANSFORMAR EM PODER GENÉRICO DA AUTORA EM REALIZAR CENSURA. POR FIM, O VÍDEO JÁ SE ENCONTRA FORA DE CIRCULAÇÃO NA INTERNET, NÃO HAVENDO RAZÃO PARA MODIFICAÇÃO DA MULTA COERCITIVA. RECURSO PROVIDO EM PARTE.
Precedente citado: STJ REsp 1406448/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/10/2013. TJRJ AC 0006161-50.2012.8.19.0212, Rel. Des. Marcia Alvarenga, julgado em 26/06/2014.
SEXTA CAMARA CIVEL -
Des(a). INES DA TRINDADE CHAVES DE MELO - Julg: 31/07/2014

Sócio minoritário não tem legitimidade para acionar controlador por prejuízo sofrido pela empresa

O acionista não tem legitimidade para acionar judicialmente o controlador da companhia que, em abuso de poder, causa prejuízo econômico à empresa. A legitimidade só ocorre se o prejuízo atingir diretamente o patrimônio do sócio, situação em que este pode ingressar com ação individual, mediante os requisitos legais previstos pela Lei 6.404/76 (Lei da Sociedade por Ações).

A decisão é da Terceira Turma ao julgar processo em que um acionista minoritário da empresa Rádio Clube de Pernambuco S/A acusou seus controladores de promover uma série de ações fraudulentas contra ele.

O entendimento do STJ é que, em relação ao acionista controlador, pode ser aplicado – por analogia à responsabilidade do administrador – o procedimento previsto no artigo 159 da Lei 6.404. Entretanto, se os danos causados ao sócio ocorrem de forma indireta, cabe ao prejudicado ajuizar a chamada ação social.

O recurso foi interposto pela Rádio Clube de Pernambuco contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que julgou procedente o pedido para responsabilizar a sociedade pelos prejuízos causados ao acionista minoritário.

A Terceira Turma reformou a decisão do TJRJ e julgou o processo extinto sem resolução de mérito, com fundamento no artigo 267, VI, do Código de Processo Civil. O ministro João Otávio de Noronha, que proferiu o voto vencedor, afirmou que embora a responsabilidade civil se estenda contra o controlador, o autor da ação, no caso, não preencheu os requisitos dos parágrafos 3º e 4º do artigo 159 da Lei 6.404.

Esse artigo estabelece que compete à companhia, mediante deliberação da assembleia-geral, propor ação de responsabilidade civil contra o administrador pelos prejuízos causados ao seu patrimônio.

Conforme o artigo 3º, qualquer acionista poderá promover a ação se não for proposta no prazo de três meses da deliberação da assembleia-geral. Se a assembleia deliberar não promover a ação, poderá ela ser proposta por acionistas que representem 5%, pelo menos, do capital social.

No caso, o sócio minoritário detinha 3,3273% da empresa, a qual, segundo ele, recebeu da União R$ 220.810.239 em decorrência de condenação judicial. Disse que, por intermédio dos controladores, a empresa celebrou contratos de mútuo com várias outras sociedades, também por eles controladas, pelos quais foi transferida a quantia de R$ 172.662.142.

O autor da ação alegou que todas as empresas beneficiárias dos empréstimos são controladas pelos mesmos sócios controladores da Rádio Clube de Pernambuco, empresa mutuante, o que demonstraria a simulação e a fraude. O pedido, em primeiro e segundo graus, foi julgado parcialmente procedente para determinar que as rés – a rádio e as empresas beneficiárias dos empréstimos – se abstivessem de efetuar novas transferências do dinheiro recebido da União.

As empresas tomadoras dos empréstimos foram ainda condenadas, em caráter solidário, a pagar ao autor, a título de perdas e danos, a quantia de R$ 5.744.987, correspondente a 3,3273% de R$ 172.662.142, corrigida de acordo com os índices constantes da tabela do TJRJ.

A Terceira Turma entendeu que a decisão das instâncias inferiores não poderia ser mantida, já que os danos narrados pelo autor da ação não foram diretamente causados a ele. Tais prejuízos teriam sido causados primordialmente à sociedade.

Processo: REsp 1214497

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

CESSAO DE DIREITOS AQUISITIVOS SOBRE IMOVEL NEGOCIO JURIDICO CELEBRADO POR FALECIDO FRAUDE NULIDADE REINTEGRACAO DE POSSE DIREITO DE RETENCAO

CIVIL. NEGÓCIO JURÍDICO. CESSÃO DE DIREITO SOBRE IMÓVEL. FRAUDE. NULIDADE. REGISTRO IMOBILIÁRIO. CANCELAMENTO DOS ATOS SUBSEQUENTES. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. DIREITO DE RETENÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. Ação anulatória de escritura pública de cessão de direitos sobre imóvel celebrada anos depois do óbito do cedente, cumulada com nulidade do respectivo registro do imóvel e das transmissões subsequentes e correspondentes registros, além de reintegração de posse e indenização. O Autor ou seu espólio não pode propor ação contra si mesmo, restando caracterizada a confusão que implica na extinção do feito sem resolução de mérito. A prova dos autos demonstra de forma conclusiva a fraude e a nulidade do negócio jurídico celebrado por falecido. A invalidade da cessão de direitos acarreta a nulidade dos negócios jurídicos subsequentes e dos respectivos registros imobiliários, pois se o negócio jurídico é nulo, não há falar no direito de propriedade dos terceiros de boa-fé. Reconhecida a nulidade dos negócios jurídicos, impõe-se o retorno da plena propriedade e da posse aos Autores. Na ação de responsabilidade civil a vítima deve comprovar o ato lesivo, o dano e o agente. Embora caracterizada a lesão, a prova não identifica quem cometeu a fraude, e sem a definição do nexo causal e do causador do dano torna-se inviável acolher o pedido indenizatório. Em algum momento da cadeia sucessória do registro imobiliário o negócio jurídico de transmissão da propriedade passou a se revestir de boa fé, sem que seja possível definir quando. Prospera a pretensão de perda das benfeitorias, uma vez que a construção levantada no terreno pela incorporação imobiliária aderiu ao solo como define o artigo 79 do Código Civil, formando o bem imóvel. Por outro lado, os atuais possuidores das unidades exercem a posse de boa fé com lastro em justo título, motivo por que têm direito de retenção e à prévia indenização. Se houve sucumbência recíproca as despesas processuais são divididas e os honorários de advogado compensados. Recurso provido em parte.
QUINTA CAMARA CIVEL -
Des(a). HENRIQUE CARLOS DE ANDRADE FIGUEIRA - Julg: 05/08/2014

Cônjuge casado em separação convencional é herdeiro necessário e concorre com descendentes

A Terceira Turma manteve decisão que reconheceu a condição de herdeira necessária à viúva casada sob o regime de separação convencional de bens, mantendo-a no cargo de inventariante.

Para a Turma, o artigo 1.829, inciso I, do Código Civil  de 2002 confere ao cônjuge casado sob o regime de separação convencional de bens a condição de herdeiro necessário, que concorre com os descendentes do falecido independentemente do período de duração do casamento, com vistas a lhe garantir o mínimo para uma sobrevivência digna.

A única filha do autor da herança recorreu ao STJ contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que reconheceu a viúva de seu pai como herdeira necessária. Sustentou que o cônjuge casado no regime de separação convencional de bens não é herdeiro necessário, citando para tanto um precedente da própria Terceira Turma nesse sentido, julgado em 2009.

Segundo a recorrente, na hipótese de concorrência com descendentes, deveria ser negado ao cônjuge sobrevivente casado sob o regime da separação convencional o direito à herança, pois ele não possuiria direito à meação e tampouco à concorrência sucessória. Concluiu pela necessidade de manutenção do regime de bens estipulado, que obrigaria as partes tanto em vida como na morte.

O relator do recurso, ministro Villas Bôas Cueva, destacou que o concurso hereditário na separação convencional impõe-se como norma de ordem pública, sendo nula qualquer convenção em sentido contrário, especialmente porque esse regime não foi arrolado como exceção à regra da concorrência posta no artigo 1.829, inciso I, do CC.

“O regime da separação convencional de bens, escolhido livremente pelos nubentes à luz do princípio da autonomia de vontade (por meio do pacto antenupcial), não se confunde com o regime da separação legal ou obrigatória de bens, que é imposto de forma cogente pela legislação (artigo 1.641 do CC), no qual efetivamente não há concorrência do cônjuge com o descendente”, acrescentou o ministro.

Villas Bôas Cueva ressaltou ainda que o novo Código Civil, ao ampliar os direitos do cônjuge sobrevivente, assegurou ao casado pela comunhão parcial cota na herança dos bens particulares, ainda que sejam os únicos deixados pelo falecido, direito que pelas mesmas razões deve ser conferido ao casado pela separação convencional, cujo patrimônio é composto somente por acervo particular.

O relator destacou que, no precedente invocado pela recorrente (REsp 992.749), afirmou-se que "se o casamento foi celebrado pelo regime da separação convencional, significa que o casal escolheu conjuntamente a separação do patrimônio. Não há como violentar a vontade do cônjuge após sua morte, concedendo a herança ao sobrevivente”.

Entretanto, o ministro disse que as hipóteses de exclusão da concorrência, tais como previstas pelo artigo 1.829, I, do CC, evidenciam a “indisfarçável intenção” do legislador de proteger o cônjuge sobrevivente. Segundo ele, “o intuito de plena comunhão de vida entre os cônjuges (artigo 1.511) motivou, indubitavelmente, o legislador a incluir o sobrevivente no rol dos herdeiros necessários, o que reflete irrefutável avanço do Código Civil de 2002 no campo sucessório”.

Processo: REsp 1472945

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

CRIACAO DE ANIMAIS DE RACA FALHA VACINAL MORTE DE ANIMAIS NEXO DE CAUSALIDADE LAUDO PERICIAL MAJORACAO DO DANO MORAL

AGRAVO DO § 1º DO ART. 557 DO CPC. DECISÃO MONOCRÁTICA EMENTADA COMO A SEGUIR: "RITO ORDINÁRIO. INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS, MATERIAIS E LUCROS CESSANTES. AÇÃO MOVIDA PELA PROPRIETÁRIA DE UM CANIL EM QUE 30 ANIMAIS DA RAÇA POODLE FORAM ACOMETIDOS POR UM SURTO DE CINOMOSE, MESMO APÓS A APLICAÇÃO DE VACINA FABRICADA PELA MERIAL, E COMERCIALIZADA PELO HOSPITAL VETERINÁRIO DE CORRÊAS. DESPROVIMENTO DO AGRAVO RETIDO DA AUTORA, CONTRA A DECISÃO QUE INDEFERIU A INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO, DIANTE DA AUSÊNCIA DA RELAÇÃO DE CONSUMO. DESACOLHIMENTO DO PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS FEITO EM RECONVENÇÃO. O FATO DE A FABRICANTE DA VACINA CONSTAR NO POLO PASSIVO DA AÇÃO, POR SI SÓ, NÃO É CAPAZ DE GERAR DANO MORAL À EMPRESA. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO DA AUTORA. REALIZAÇÃO DE DUAS PERÍCIAS, POR MÉDICOS VETERINÁRIOS DISTINTOS, TENDO AMBOS CONCLUÍDO PELA FALHA VACINAL. A 2ª PERÍCIA ATRIBUIU TÃO SOMENTE AO HOSPITAL VETERINÁRIO A RESPONSABILIDADE PELA QUEBRA DA "CADEIA DE FRIO" -- CONSISTENTE NO AUMENTO DA TEMPERATURA DA VACINA, POR FALHA NA REFRIGERAÇÃO, TORNANDO-A INÓCUA. COMPROVADO O NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE A DOENÇA QUE ACOMETEU CERCA DE 30 CÃES E A SUPOSTA QUEBRA DA "CADEIA DE FRIO". ÓBITO DE DOIS POODLES. MAJORAÇÃO DO VALOR DA VERBA INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. DÁ-SE PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO DA APELANTE 03, E NEGA-SE SEGUIMENTO AOS RECURSOS DA APELANTE 01 E DO APELANTE 02, NA FORMA DO ART. 557, CAPUT, E § 1º-A, DO CPC." DESPROVIMENTO DOS RECURSOS.
Precedente citado: STJ Ag Rg no AREsp353207/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 10/06/2014. TJRJ 0489434-10.2012.8.19.0001, Rel. Des. Roberto Guimarães, julgado em 21/05/2014.
DECIMA OITAVA CAMARA CIVEL -
Des(a). HELENA CANDIDA LISBOA GAEDE - Julg: 05/08/2014

Serasa não indenizará consumidora por reproduzir informação de cartório sem notificação prévia

Os órgãos de proteção ao crédito não violam direito dos consumidores quando incluem em seu banco de dados elementos constantes nos registros do cartório de protesto, mesmo sem prévia notificação. A decisão é da Segunda Seção, em julgamento de recurso especial representativo de controvérsia repetitiva de autoria da Serasa S/A.

Para o colegiado, os órgãos de proteção ao crédito exercem atividade lícita e relevante ao divulgar informação que goza de fé e domínio públicos. Portanto, não é o caso de incidência do artigo 43, parágrafos 2º e 3º, do Código de Defesa do Consumidor, sob pena de violação ao princípio da publicidade e mitigação da eficácia do artigo 1º da Lei dos Cartórios (Lei 8.935/94).

“Ademais, as informações prestadas pelo cartório de protesto não incluem o endereço do devedor (artigo 27, parágrafo 1º, e 30 da Lei 9.492/97), de modo que a exigência de notificação resultaria em inviabilização da divulgação dessas anotações pelos órgãos de proteção ao crédito”, afirmou o relator do recurso, ministro Luis Felipe Salomão.

A tese, firmada sob o rito dos recursos repetitivos (artigo 543-C do Código de Processo Civil), deve orientar a solução dos processos idênticos que tiveram a tramitação suspensa até esse julgamento. Só caberá recurso ao STJ quando a decisão de segunda instância for contrária ao entendimento firmado pela corte superior.

Cheque extraviado

A consumidora ajuizou ação de reparação de danos contra a Serasa, sustentando que o seu nome estava no cadastro de inadimplentes pela existência de protesto em quatro cheques extraviados e que a abertura do cadastro não obedeceu ao artigo 43, parágrafo 2º, do CDC, pois não foi previamente comunicada. Por isso, pediu indenização de dano moral.

O juiz de primeiro grau condenou a Serasa ao pagamento de R$ 3 mil a título de danos morais, sentença mantida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal.

No STJ, a Serasa alegou que não procedeu à abertura de cadastro no nome da consumidora, mas apenas reproduziu fielmente em seu banco de dados informação de protesto existente em cartório de Pernambuco.

Relevância dos cadastros

Em seu voto, o ministro Salomão destacou que não se pode menosprezar, à luz da realidade econômica e social, a relevância dos cadastros de inadimplentes mantidos pelos órgãos do sistema de proteção ao crédito. No Brasil, o CDC disciplina essas atividades, estabelecendo o artigo 43 que os bancos de dados e cadastros relativos a consumidores, os serviços de proteção ao crédito e congêneres são entidades de caráter público.

Quanto ao serviço de protesto, o relator ressaltou que eles são destinados a assegurar a publicidade, autenticidade e eficácia dos atos jurídicos. “O registro de protesto de título de crédito ou outro documento de dívida é de domínio público, gerando presunção de veracidade do ato jurídico, dado que deriva do poder certificante que é conferido ao oficial registrador e ao tabelião”, afirmou Salomão.

Segundo o ministro, a Serasa limitou-se a divulgar informações fidedignas constantes do cartório de protesto, motivo pelo qual não se pode cogitar em ilicitude ou eventual abuso de direito por parte do órgão de proteção ao crédito.

Para efeito de recurso repetitivo, a Segunda Seção definiu que “diante da presunção legal de veracidade e publicidade inerente aos registros do cartório de protesto, a reprodução objetiva, fiel, atualizada e clara desses dados na base de órgão de proteção ao crédito – ainda que sem a ciência do consumidor – não tem o condão de ensejar obrigação de reparação de danos”.

O colegiado, de forma unânime, acolheu o apelo da Serasa e julgou improcedente o pedido da consumidora.

Processo: REsp 1444469

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

DIREITO AUTORAL SERVICOS REMUNERADOS PARA FOTOGRAFAR ESPETACULO REPORTAGEM EM REVISTA, ILUSTRADA COM FOTOGRAFIA AUSENCIA DE INDICACAO DO NOME DO AUTOR DANO MORAL IN RE IPSA

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO AUTORAL. INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL. FOTOGRAFIA POR ENCOMENDA COM PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DEVIDAMENTE REMUNERADA. DANO MATERIAL QUE NÃO SE VERIFICA, JÁ QUE É DIREITO DA CONTRATANTE DIVULGAR A PEÇA TEATRAL POR MEIO DAS FOTOGRAFIAS ENCOMENDADAS PARA ESTE FIM. AUSÊNCIA DE CESSÃO ONEROSA DA FOTOGRAFIA À PARTE RÉ. VEICULAÇÃO DE OBRA FOTOGRÁFICA PELA DEMANDADA, EM REVISTA CULTURAL SEMANAL, A FIM DE DIVULGAR PEÇA TEATRAL EM CARTAZ. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO NOME DO AUTOR JUNTO À OBRA FOTOGRÁFICA. DANO MORAL IN RE IPSA. REDUÇÃO DO QUANTUM REPARATÓRIO QUE SE IMPÕE. MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA PARA O PERCENTUAL DE 20% SOBRE A CONDENAÇÃO. RECURSOS AOS QUAIS SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO.
Precedente citado: STJ REsp 132896/MG, Rel. Min. Ari Pargendler, julgado em 17/08/2006. TJRJ AC 0081283-33.2006.8.19.0001, Rel. Des. Ricardo Couto, julgado em 10/04/2013.
DECIMA TERCEIRA CAMARA CIVEL -
Des(a). FERNANDO FERNANDY FERNANDES - Julg: 07/08/2014

Para Quarta Turma, autor de ação de paternidade tem de apresentar indício do relacionamento

Diante da recusa do réu a fazer o exame de DNA, a presunção de paternidade deve ser considerada dentro do conjunto de provas levantado no processo. Essa recusa não acarreta automaticamente a procedência do pedido, pois é necessário que o autor da ação de paternidade apresente indícios mínimos da existência de relacionamento entre a genitora e o investigado.

O entendimento é da Quarta Turma ao julgar um processo em que o réu se recusou por duas vezes a fazer o exame, e o juízo de primeiro grau reconheceu a presunção absoluta por considerar que seria impossível ao autor da ação apresentar provas por outros meios, tendo em vista se tratar de um relacionamento esporádico e clandestino.

O juízo afirmou que seria desarrazoado impor ao autor prova impossível. O réu, no entanto, reclamou que o magistrado antecipou o julgamento da matéria e com isso cerceou sua defesa, já que não havia no processo elementos mínimos que indicassem a existência do suposto relacionamento entre o casal. A sentença se baseou no artigo 232 do Código Civil, segundo o qual a recusa à perícia ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter com o exame.

De acordo com o ministro Luis Felipe Salomão, que proferiu o voto vencedor na Quarta Turma, a questão deve ser tratada da mesma forma como quando há revelia em processo de investigação de paternidade. Nesses casos, os fatos alegados não podem ser tidos como verdadeiros, cabendo ao autor apresentar prova mínima dos fatos alegados. O ministro considera que a recusa ao exame de DNA não é mais grave do que a revelia.

“Também deve o autor, por simetria, provar minimamente os fatos apontados na inicial da ação”, afirmou Salomão.

O relator do processo, ministro Marco Buzzi, que ficou vencido no julgamento, afirmou que não se poderia exigir a produção de provas por parte do autor da ação, porque esta seria impossível. Segundo ele, o relacionamento sexual, muitas vezes, reveste-se de caráter reservado e furtivo, o que dificulta a produção de prova.

Para Salomão, a prova do relacionamento amoroso não é condição indispensável para a declaração de paternidade, muito menos a prova de um relacionamento clandestino ou esporádico. Mas a prova indireta, consistente em indícios, deve ser produzida para que seja prestigiada a verdade real dos fatos. Ele votou no sentido de que o processo volte à primeira instância para que sejam produzidas as provas necessárias.

Segundo alegações do processo, o autor, atualmente com 32 anos, teria tido educação custeada no exterior pelo réu, mas sempre por meios indiretos e com a preocupação de não deixar provas da paternidade.

O réu sustentou que, dado o seu poder econômico, é inviável fornecer material genético toda vez que alguém alega ser seu filho, ainda mais diante de uma realidade de laboratórios mal equipados e de profissionais mal treinados.

No Brasil não há norma que obrigue a pessoa a se submeter ao exame de DNA.

No recurso de apelação, a defesa sustentou que, nos termos do artigo 2º-A da Lei 8.560/92 (com redação dada pela Lei 12.004/09), “a recusa do réu em se submeter ao exame genético gerará a presunção de paternidade, a ser apreciada com o conjunto probatório”. A defesa sustenta que não houve contexto probatório levado em consideração pela sentença.

Ao julgar a matéria, o Tribunal de Justiça de São Paulo aplicou o enunciado da Súmula 301 do STJ, a qual determina que, “em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade” – ou seja, presunção relativa, que admite prova em contrário.

O TJSP apontou julgado do Supremo Tribunal Federal segundo o qual “a necessidade da produção da prova há de ficar evidenciada para que o julgamento antecipado da lide implique cerceamento de defesa” (RE 101.171).

O ministro Luis Felipe Salomão considerou que, no caso em julgamento, não houve menção na sentença nem no acórdão aos fatos narrados ou às provas eventualmente produzidas pelas partes.

“Tudo no processo revela a necessidade de as instâncias ordinárias avaliarem com mais precisão a situação posta nos autos, que é extremamente delicada”, disse o ministro. Salomão entende que o TJSP pode vir a aplicar o enunciado da Súmula 301 do STJ, como o fez, mas após o necessário cotejo da prova produzida.

Votaram com Salomão os ministros Raul Araújo e Antonio Carlos Ferreira para dar parcial provimento ao pedido do réu recorrente. A ministra Isabel Gallotti também deu parcial provimento, mas em menor extensão.

O ministro Marco Buzzi, relator original, negou provimento por entender que a procedência da ação investigatória é medida necessária, tendo em vista que não existe nos autos nenhuma prova capaz de desconstituir a presunção relativa de paternidade decorrente da recusa do réu.

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

SUPRIMENTO JUDICIAL DE CONSENTIMENTO MENOR SOB A GUARDA DA MAE GENITORA DOMICILIADA NO EXTERIOR ESTUDO SOCIAL E PSICOLOGICO FAVORAVEL VISITACAO PATERNA INTERESSE DA CRIANCA

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE SUPRIMENTO JUDICIAL PARA MORADIA NO EXTERIOR. ESTUDO SOCIAL E PSICOLÓGICO FAVORÁVEIS A AMBOS OS GENITORES. VINDA DA CRIANÇA AO BRASIL NO PERÍODO ESTABELECIDO PARA CONVIVER COM O PAI. PREVALÊNCIA DO INTERESSE DA CRIANÇA QUE RECOMENDA SUA PERMANÊNCIA COM A GENITORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Inviável a guarda compartilhada da filha do casal, hoje com sete anos incompletos, por ter sua genitora fixado residência nos Estados Unidos, onde constituiu novo núcleo familiar. Pretensão da genitora de suprir a autorização paterna para residência da criança no exterior, vindo ao Brasil em períodos estipulados para convivência com o genitor. Avaliação psicológica e de estudo social das partes restando demonstrado que ambos os genitores possuem condições de criar a menor, sendo destacado o estreito vínculo afetivo que tem com a mãe. Melhor interesse da menor que recomenda sua permanência com a genitora, assegurando-lhe uma convivência saudável. Assegura-se o direito do genitor de visitação à filha menor sendo, indiscutivelmente, inerente ao poder familiar estabelecido no art. 1.630 do Código Civil e, no caso, estando a filha com um dos genitores implica necessariamente, no reconhecimento ao outro do direito de visitá-la, devendo a infante regressar ao Brasil, às expensas da mãe, nos períodos estabelecidos, a fim de conviver com o genitor. Os honorários advocatícios devem ser estabelecidos em conformidade com o disposto no art. 20, §3º, suas alíneas e §4º do CPC, impondo-se sua majoração. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
SEGUNDA CAMARA CIVEL -
Des(a). ELISABETE FILIZZOLA ASSUNCAO - Julg: 06/08/2014

Surpresas repugnantes: o dano moral decorrente de corpo estranho em alimentos

“Encontrei uma espécie de coágulo. Não sei se era um pedaço de papelão ou mofo. Algo com a consistência de ameixa. O suco que deveria ser branco estava esverdeado. Havia vários pontos mofados dentro da caixa”, descreveu a auditora de trânsito Luciana Borges Marinho, moradora de Águas Claras (DF), ao contar do corpo estranho que encontrou na caixa do suco de soja que havia tomado.

Primeiro, sentiu nojo, raiva e frustração. Depois, dor no estômago. O marido, que tinha tomado um copo inteiro, ficou o dia todo com azia. Ela fotografou, divulgou na internet, informou à vigilância sanitária e denunciou o caso para emissoras de TV, mas nenhuma deu importância. Até pensou em mover uma ação. Foi a um laboratório tentar fazer análise microbiológica, mas acabou desistindo quando soube que precisava passar por consulta médica e realizar exame de sangue para confirmar que tinha consumido o produto. Parou por aí.

Não é à toa que consumidores preocupados com a saúde prefiram alimentos naturais a industrializados. Situações como a que Luciana Marinho vivenciou têm se repetido com frequência. E os riscos são grandes. Se um alimento contaminado for ingerido, pode causar sérios prejuízos à saúde, inclusive a morte. Ainda que nada disso ocorra, parte da doutrina jurídica e da jurisprudência dos tribunais brasileiros considera que o sentimento de repugnância do consumidor ao se deparar com algo estranho no alimento que pretendia consumir, por si só, gera outro tipo de dano: o moral.

Dano extrapatrimonial

“Verificada a ocorrência de defeito no produto, inafastável é o dever do fornecedor de reparar também o dano extrapatrimonial causado ao consumidor, fruto da exposição de sua saúde e segurança a risco concreto”, disse a ministra Nancy Andrighi, da Terceira Turma, no julgamento do recurso especial de uma empresa de bebidas (REsp 1.454.255). Os ministros do colegiado confirmaram a decisão da ministra e reconheceram a responsabilidade da fornecedora pela sujeira encontrada no interior da garrafa de água mineral.

O artigo 12, parágrafo 1º, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor (CDC) dispõe que o produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera – levando-se em consideração o uso e os riscos razoavelmente esperados.

Com base nisso, Andrighi afirmou que o corpo estranho encontrado na garrafa de água mineral tornou o produto defeituoso, “na medida em que, na hipotética deglutição do corpo estranho, não seria pequena a probabilidade de ocorrência de dano” à saúde física ou à integridade psíquica do consumidor.

Quantificação do dano

Diante de tantas demandas que chegam ao Poder Judiciário, o STJ tem se posicionado de forma favorável ao consumidor. Quanto ao valor da indenização, embora não existam critérios fixos para a quantificação do dano moral, o tribunal tem afirmado que a reparação deve ser suficiente para desestimular o ofensor a repetir a falta, sem, contudo, permitir o enriquecimento ilícito do consumidor.

Essa foi a posição adotada pela Terceira Turma em novembro de 2013. O ministro Sidnei Beneti (já aposentado) manteve a condenação da Indústria de Torrone Nossa Senhora de Montevérgine ao pagamento de R$ 10 mil por dano moral a consumidora que adquiriu e até comeu parte de uma barra de cereais contendo larvas e ovos de inseto (AREsp 409.048).

Na decisão monocrática, posteriormente confirmada pelo colegiado, Beneti tomou as circunstâncias do caso e a condição econômica das partes como parâmetro para avaliar a indenização fixada em segunda instância – a qual julgou ser proporcional ao dano.

Em outra ocasião, Beneti considerou adequado o valor correspondente a 50 salários mínimos para reparar o dano moral sofrido por criança que feriu a boca ao comer linguiça em que havia um pedaço de metal afiado (AREsp 107.948).

De acordo com o ministro, para ponderar o valor da reparação do dano moral, devem ser consideradas as circunstâncias do fato, as condições do ofensor e do ofendido, a forma e o tipo de ofensa e as suas repercussões no mundo interior e exterior da vítima. Apesar disso, “ainda que, objetivamente, os casos sejam bastante assemelhados, no aspecto subjetivo são sempre diferentes”, comentou Beneti.

Responsabilidade civil

lei consumerista impõe ao fornecedor o dever de evitar que a saúde e a segurança do consumidor sejam colocadas em risco. A ministra Nancy Andrighi explica que o CDC tutela o dano ainda em sua potencialidade, buscando prevenir sua ocorrência efetiva. Tanto é que o artigo 8º se refere a riscos, e não a danos.

Caso esse dever não seja cumprido, o fornecedor tem a obrigação de reparar o dano causado por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos (artigo 12 do CDC). Essa reparação não se limita ao aspecto material, ou seja, à devolução do valor pago pelo produto.

O jurista Sergio Cavalieri Filho afirma que o dano moral não mais se restringe a dor, tristeza e sofrimento. Para ele, essa proteção jurídica se estende a todos os bens personalíssimos (Programa de Responsabilidade Civil). No mesmo sentido, a jurisprudência do STJ tem admitido a compensação do dano moral independentemente da demonstração de dor e sofrimento.

O ministro Marco Buzzi, da Quarta Turma, defende que esses sentimentos são consequência, e não causa determinante da ofensa a algum dos aspectos da personalidade. Segundo ele, “a configuração de dano moral deve ser concebida, em linhas gerais, como a violação a quaisquer bens personalíssimos que irradiam da dignidade da pessoa humana, não se afigurando relevante, para tal, a demonstração de dor ou sofrimento” (voto-vista no REsp 1.376.449).

Coca-Cola

Em março de 2014, a Terceira Turma manteve a condenação da Coca-Cola Indústrias Ltda. ao pagamento de 20 salários mínimos de indenização a consumidora que encontrou um corpo estranho – descrito por ela como algo semelhante a uma lagartixa – dentro da garrafa de refrigerante, sem, contudo, ter consumido o produto. A perícia apontou que se tratava de um tipo de bolor.

A maioria do colegiado entendeu que mesmo não tendo ocorrido a abertura da embalagem e a ingestão do produto, a existência do corpo estranho colocou em risco a saúde e integridade física ou psíquica da consumidora (REsp 1.424.304).

Os ministros Sidnei Beneti e Paulo de Tarso Sanseverino acompanharam o voto da relatora, ministra Nancy Andrighi. “A aquisição de produto de gênero alimentício contendo em seu interior corpo estranho, expondo o consumidor a risco concreto de lesão à sua saúde e segurança, ainda que não ocorra a ingestão de seu conteúdo, dá direito à compensação por dano moral, dada a ofensa ao direito fundamental à alimentação adequada, corolário do princípio da dignidade da pessoa humana”, defendeu Andrighi.

O entendimento, contudo, não está pacificado no âmbito do Tribunal da Cidadania. Na ocasião, os ministros Villas Bôas Cueva e João Otávio de Noronha divergiram da relatora, mas ficaram vencidos. Para Noronha, não tendo sido aberta a garrafa e consumida a bebida, o simples repúdio à situação causa desconforto, mas não dano moral – que, segundo ele, pode ser definido como sofrimento, constrangimento enorme, e não qualquer dissabor.

“Dissabores não dão azo a condenação por dano moral. É preciso que a pessoa se sinta realmente ofendida, realmente constrangida com profundidade no seu íntimo, e não que tenha um simples mal-estar”, afirmou o ministro.

Em seu voto-vista, Villas Bôas Cueva afirmou que a questão polêmica já foi objeto de várias discussões no STJ, prevalecendo, segundo ele, a orientação no sentido de não reconhecer a ocorrência de dano moral nas hipóteses em que o alimento contaminado não foi efetivamente consumido.

A Quarta Turma, em decisão unânime, já se manifestou de forma contrária em hipótese na qual não houve a ingestão do produto. No julgamento do REsp 1.131.139, o ministro Luis Felipe Salomão disse que a simples aquisição de um pacote de bolachas do tipo água e sal contendo objeto metálico que o torna impróprio para o consumo, sem que tenha havido a ingestão do produto, não acarreta dano moral que justifique indenização.

Extrato de tomate

Uma dona de casa cozinhava para sua família quando, ao utilizar um extrato de tomate, encontrou na lata um preservativo masculino enrolado. Indignada, levou o produto para análise na universidade local e entrou em contato com o fabricante, que se recusou a arcar com os prejuízos morais sofridos por ela (REsp 1.317.611).

Diante da negativa da Unilever Brasil, a consumidora buscou o Poder Judiciário. O juízo de primeiro grau fixou a indenização por danos morais em R$ 10 mil. A sentença foi impugnada, mas o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) manteve a decisão. Em seu entendimento, o fabricante deveria ser responsabilizado pela violação do princípio da segurança sanitária, pois a contaminação teria se dado “com grau de sujidade máximo”.

No recurso especial, a Unilever alegou a nulidade do processo devido ao indeferimento do pedido de prova pericial. Com essa prova, a empresa pretendia demonstrar que o preservativo não poderia ter sido inserido na fábrica e que, por essa razão, o dano experimentado pelo consumidor decorreria de fato próprio ou de fato de terceiro.

Contudo, a ministra relatora verificou que a prova tida como imprescindível foi indeferida de maneira fundamentada pelo TJRS, para o qual a possibilidade de que o preservativo estivesse no depósito dos ingredientes usados na fabricação do produto não poderia ser afastada por meio da análise do processo mecânico de produção.

Quanto ao valor da indenização, os ministros consideraram que não havia necessidade de revisão. Para tanto, tomaram como base precedente no qual o dano moral foi fixado em R$ 15 mil para hipótese em que o consumidor encontrou uma barata em lata de leite condensado. Trata-se do REsp 1.239.060.

“O abalo causado a uma dona de casa que encontra, num extrato de tomate que já utilizou para consumo de sua família, um preservativo aberto é muito grande. É perfeitamente natural que, diante da indignação sentida numa situação como essas, desperte-se no cidadão o desejo de obter justiça”, comentou a ministra Nancy Andrighi.

Salgadinho

O fornecedor ou fabricante que causa dano ao consumidor só se exime da responsabilidade quando consegue provar que não colocou o produto no mercado, ou que, embora tenha colocado, este não possui defeito que o torne impróprio para uso ou, ainda, que a culpa é exclusiva do consumidor ou de terceiro (parágrafo 3º do artigo 12 do CDC). É dele o ônus da prova, e não do consumidor.

“A previsão legal é sutil, mas de extrema importância na prática processual”, ressaltou o ministro Paulo de Tarso Sanseverino, da Terceira Turma, quando do julgamento do REsp 1.220.998.

No caso analisado, a empresa Pepsico do Brasil foi condenada a pagar dez salários mínimos de indenização por danos morais a consumidor que fraturou dois dentes porque mordeu uma peça metálica que estava na embalagem de salgadinho da Elma Chips.

O Tribunal de Justiça de São Paulo não afastou a responsabilidade objetiva da fabricante pelo acidente, já que ela não conseguiu demonstrar as excludentes do parágrafo 3º do artigo 12 do CDC. No STJ, a Pepsico buscou a inversão do ônus da prova e defendeu que o autor da ação não teria demonstrado o fato constitutivo de seu direito.

“A peculiaridade da responsabilidade pelo fato do produto (artigo 12), assim como ocorre na responsabilidade pelo fato do serviço (artigo 14), é a previsão, no microssistema do CDC, de regra específica acerca da distribuição do ônus da prova da inexistência de defeito”, comentou Sanseverino. Com base nisso, a Turma negou provimento ao recurso especial.

Em julgamento semelhante, a Quarta Turma manteve a condenação da empresa Pan Produtos Alimentícios ao pagamento de R$ 20 mil por danos morais a consumidor que encontrou três pedaços de borracha em barra de chocolate parcialmente consumida. “A jurisprudência desta corte é firme no sentido de reconhecer a possibilidade de lesão à honra subjetiva decorrente da aquisição de alimentos e bebidas contendo corpo estranho”, afirmou o relator, ministro Antonio Carlos Ferreira (AREsp 38.957).

Prazo de validade

Ainda que as relações comerciais tenham o enfoque e a disciplina determinadas pelo Código de Defesa do Consumidor, isso não afasta o requisito da existência de nexo de causalidade para a configuração da responsabilidade civil. Com base nesse entendimento, a Terceira Turma negou provimento ao recurso especial de consumidores que notaram a presença de ovos e larvas de inseto em chocolate que já estava com a data de validade vencida no momento do consumo (REsp 1.252.307).

Após ser citada, a empresa Kraft Foods Brasil defendeu que a contaminação não ocorreu em suas instalações industriais, porque o produto teria sido consumido fora do prazo de validade. Com isso, segundo ela, rompeu-se o nexo causal.

O ministro Massami Uyeda (já aposentado), que apresentou o voto vencedor, mencionou que o prazo de validade é resultado de estudos técnicos, químicos e biológicos, para possibilitar ao mercado consumidor a segurança de que, naquele prazo, o produto estará em plenas condições de consumo.

“O fabricante, ao estabelecer prazo de validade para consumo de seus produtos, atende aos comandos imperativos do próprio Código de Defesa do Consumidor, especificamente, acerca da segurança do produto, bem como da saúde dos consumidores”, ressaltou o ministro.

Para conhecer melhor a jurisprudência do STJ sobre o tema, acesse a Pesquisa Pronta.

Processos: REsp 1454255; AREsp 409048; AREsp 107948; REsp 1376449; REsp 1424304; REsp 1131139; REsp 1317611; REsp 1239060; REsp 1220998; AREsp 38957; REsp 1252307


O sistema scoring – pontuação usada por empresas para decidir sobre a concessão de crédito a clientes – foi reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça como um método legal de avaliação de risco, desde que tratado com transparência e boa-fé na relação com os consumidores.

Seguindo o voto do ministro Paulo de Tarso Sanseverino, a Segunda Seção definiu que a simples existência de nota desfavorável ao consumidor não dá margem a indenização por dano moral. No entanto, havendo utilização de informações sensíveis e excessivas, ou no caso de comprovada recusa indevida de crédito pelo uso de dados incorretos ou desatualizados, é cabível a indenização ao consumidor.

A tese passa a orientar os tribunais de segunda instância em recursos que discutem a mesma questão, já que se trata de recurso repetitivo. Hoje, há cerca de 250 mil ações judiciais no Brasil sobre o tema – 80 mil apenas no Rio Grande do Sul –, em que consumidores buscam ser indenizados em razão do sistema scoring (em alguns casos, pela simples existência da pontuação).

Com o julgamento da Segunda Seção na quarta-feira (12), as ações sobre o sistema scoring, que haviam sido suspensas em todas as instâncias por ordem do ministro Sanseverino, voltam a tramitar normalmente. Os recursos especiais sobrestados em razão do julgamento do repetitivo serão tratados de acordo com o artigo 543-C do Código de Processo Civil, e não mais serão admitidos recursos para o STJ quando o tribunal de segunda instância adotar a tese fixada pela corte superior.

O sistema scoring foi discutido em agosto na primeira audiência pública realizada pelo STJ, em que foram ouvidas partes com visões a favor e contra esse método de avaliação de risco.

Ao expor sua posição, o ministro relator disse que após a afetação do primeiro recurso especial como representativo de controvérsia (REsp 1.419.697), passou a receber os advogados e constatou que havia uma grande celeuma sobre o tema, novo no cenário jurídico.

O ministro rebateu um dos pontos sustentados pelos opositores do sistema, para os quais ele seria um banco de dados. Disse que, na verdade, trata-se de uma fórmula matemática que obtém uma determinada nota de risco de crédito a partir de dados do consumidor, em geral retirados de bancos de dados disponíveis no mercado. Ou seja, a partir de fórmulas, a empresa que faz a avaliação chega a uma pontuação de risco, resumida na nota final do consumidor. A análise passa por dados pessoais do consumidor e inclui eventuais inadimplências, ainda que sem registro de débitos ou protestos.

O ministro recordou que a regulamentação do uso de cadastros de proteção ao crédito, como SPC e Serasa, veio com o Código de Defesa do Consumidor (CDC), na década de 1990. Posteriormente, a Lei do Cadastro Positivo, de 2011, trouxe disciplina quanto à consulta de bancos de dados de bons pagadores, com destaque para a necessidade de transparência das informações, que sempre devem ser de fácil compreensão, visando à proteção da honra e da privacidade do consumidor.

Por todas as características expostas, o ministro Sanseverino entende que o sistema scoring não representa em si uma ilegalidade. Ele destacou, no entanto, que o consumidor tem o direito de conhecer os dados que embasaram sua pontuação. “O método é lícito, mas deve respeito à privacidade e à transparência. Além disso, devem ser respeitadas as limitações temporais, de cinco anos para o cadastro negativo e de 15 anos para o histórico de crédito”, afirmou.

O ministro explicou que esses pontos tiveram atenção especial do legislador quando da elaboração do CDC. A lei trata também do direito de acesso do consumidor aos dados relativos a ele nos cadastros de inadimplentes. De acordo com Sanseverino, a Lei do Cadastro Positivo também regulamentou a matéria. As limitações previstas nessa lei são cinco: veracidade, clareza, objetividade, vedação de informações excessivas e vedação de informações sensíveis.

No caso do sistema scoring, o ministro relator acredita ser necessário aplicar os mesmos critérios. Para ele, o fato de se tratar de uma metodologia de cálculo não afasta a obrigação de cumprimento desses deveres básicos, de resguardo do consumidor, contidos no CDC e na Lei do Cadastro Positivo.

O ministro ainda explicou que as empresas que prestam o serviço de scoring não têm o dever de revelar a fórmula do cálculo ou o método matemático utilizado. No entanto, devem informar ao titular da pontuação os dados utilizados para que tal valor fosse alcançado na avaliação de risco de crédito. “A metodologia em si constitui segredo de atividade empresarial, naturalmente não precisa ser revelada. Mas a proteção não se aplica aos dados quando exigidos por consulta pelo consumidor”, explicou.

Sanseverino destacou que essas informações, quando solicitadas, devem ser prestadas com clareza e precisão, inclusive para que o consumidor possa retificar dados incorretos ou desatualizados, para poder melhorar a performance de sua pontuação. Da mesma forma, o ministro entende que é essencial a transparência para que o consumidor possa avaliar o eventual uso de informações sensíveis (como origem social, cor da pele, orientação sexual etc.), para impedir discriminação, e excessivas (como gostos pessoais).

Ao definir as teses que serão adotadas no tratamento dos recursos sobre o tema, o ministro considerou lícita a utilização do sistema scoring para avaliação de risco de crédito. Quanto à configuração de dano moral, ele entende que a simples atribuição de nota não caracteriza o dano, e que é desnecessário o prévio consentimento do consumidor consultado, apenas devendo ser fornecida a informação sobre as fontes e os dados.

No entanto, para o relator, havendo excesso na utilização do sistema, como o uso de dados sensíveis e excessivos para a atribuição da nota, estando claro o desrespeito aos limites legais, fica configurando abuso, que pode ensejar a ocorrência de dano moral indenizável. O mesmo ocorre nos casos de comprovada recusa indevida de crédito por uso de dados incorretos ou desatualizados.

O julgamento foi unânime. Acompanharam o relator os ministros João Otávio de Noronha, Raul Araújo, Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Villas Bôas Cueva, Marco Buzzi, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro.

O ministro João Otávio de Noronha, ao votar, criticou as indústrias de dano moral que nascem diariamente. Para ele, o sistema scoring é um serviço para toda a coletividade, porque há, além de um cadastro informativo, um método de análise de risco.

“Ele não foi feito para prejudicar consumidor algum. Foi criado para beneficiar aqueles que pagam em dia e precisam de um acesso menos burocrático ao crédito. Fico perplexo que existam cerca de 250 mil ações contra essa metodologia”, afirmou.

A ministra Isabel Gallotti concordou com as observações de Noronha, destacando que o serviço de pontuação não é decisivo na concessão do crédito.

Em seu voto, o ministro Antonio Carlos Ferreira comentou que deve ser reconhecida a responsabilidade solidária na utilização de dados indevidos e incorretos.

Processo: REsp 1457199 e  REsp 1419697