terça-feira, 31 de março de 2020

A empresa que comercializa responde solidariamente com o fabricante de produtos contrafeitos pelos danos causados pelo uso indevido da marca

TERCEIRA TURMA
PROCESSO
REsp 1.719.131-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/02/2020, DJe 14/02/2020
RAMO DO DIREITODIREITO CIVIL, DIREITO MARCÁRIO
TEMA
Violação ao direito de exclusividade da marca. Dever de indenizar. Atuação colaborativa de empresas. Responsabilidade solidária (art. 942 do CC/2002). Possibilidade.
DESTAQUE
A empresa que comercializa responde solidariamente com o fabricante de produtos contrafeitos pelos danos causados pelo uso indevido da marca.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A questão perpassa por assentar os limites da responsabilidade pela exposição à venda de produtos contrafeitos. Nesse cenário, é importante consignar que a contrafação é a reprodução, no todo ou em parte, de marca registrada, ou sua imitação, quando a imitação possa induzir confusão. Por meio dela, dilui-se a própria identidade do fabricante, criando-se na mente dos consumidores confusão sobre quem são os competidores e duplicando fornecedores para um mesmo produto (nesse sentido: REsp n. 1.032.014/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 4/6/2009).
A colocação de bens contrafeitos no mercado pode ser concretizada pelo próprio fabricante, ou por meio de terceiros, os quais se disponham a levar os bens contrafeitos à efetiva exposição à venda. Nesses últimos casos, é nítido que a participação do terceiro é determinante para a criação daquela confusão acerca dos competidores, dificultando sobremaneira a vinculação do produto ao seu fabricante, função precípua do instituto da marca.
Assim, a violação do instituto marcário acaba sendo realizada não apenas pela fabricação de produto similar e pela imitação da marca, mas também pelos atos subsequentes que efetivamente introduzem no mercado a oferta dos bens contrafeitos. Tem-se aí a prática de uma causalidade comum, em que ambas as empresas concorrem efetivamente para o abalo do direito exclusivo da exploração de marca registrada.
É verdade que não há na Lei n. 9.279/1996 a previsão de hipóteses de solidariedade do dever de reparar decorrente de atos de contrafação. Entretanto, à míngua de regra específica, não se encontra a responsabilidade dos causadores do dano num vácuo legislativo absoluto, devendo-se aplicar, ao caso dos autos, a norma geral prevista no art. 942 do CC/2002. Com efeito, disciplina o referido dispositivo do Código Civil que os co-autores de violações a direitos de outrem respondem solidariamente pela obrigação de indenizar.
Desse modo, até mesmo uma eventual distinção acerca da proporção da concorrência de cada uma das condutas para causação do dano indenizável não pode ser oposta à vítima da violação marcária. Ademais, diante de contexto fático em que é possível se discriminarem condutas lesivas de ambas as empresas, a existência de grupo econômico apenas incrementa o ônus probatório daquele que pretende obstar a comprovação do fato constitutivo do direito à prestação jurisdicional. No caso, as empresas recorrentes, integrantes do mesmo grupo empresarial, atuaram ativamente na colocação dos bens contrafeitos no mercado: enquanto uma fabrica os bens, a outra oferta-os à comercialização, sendo, portanto, responsáveis solidárias pelo dano causado pela diluição da marca.

segunda-feira, 30 de março de 2020

Disponbilização gratuita do livro "A norma monetária", por Letácio Jansen

Letácio Jansen acaba de publicar no site www.economiajuridica.com o eBook “A Norma Monetária, reflexões sobre o significado do dinheiro” em que resume as suas indagações sobre a moeda. Ao aplicar o método de Hans Kelsen ao estudo da matéria conseguiu relativizar a noção de valor intrínseco; mostrou, por outro lado, o equívoco da suposição de Aristóteles de que a troca antecedeu a moeda e o erro de Adam Smith ao acrescentar, anacronicamente, o substantivo valor ao conceito de troca, para criar a noção de valor de troca. Por último, sustenta o absurdo de Savigny em defender a propriedade das pessoas sobre o poder aquisitivo das peças monetárias. Defende que as suas proposições ajudarão aqueles que defendem a Renda Básica Universal, por um lado, e a Teoria Monetária Moderna ( MMT ) por outro, diante da conclusão que afinal oferece de que a moeda nacional embora seja um valor não “tem” valor. Como o mundo monetário é um só – nas palavras de Arthur Nussbaum - o autor gostaria de debater sobre essa  tema com especialistas de outros áreas das ciências sociais

O imóvel gerador dos débitos condominiais pode ser objeto de penhora em cumprimento de sentença, ainda que somente o ex-companheiro tenha figurado no polo passivo da ação de conhecimento

TERCEIRA TURMA
PROCESSO
REsp 1.683.419-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 20/02/2020, DJe 26/02/2020
RAMO DO DIREITODIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL
TEMA
Débito condominial. Imóvel que passa a pertencer apenas à ex-companheira que não figurou na ação de cobrança. Cumprimento de sentença. Penhora do bem. Possibilidade. Obrigação propter rem.
DESTAQUE
O imóvel gerador dos débitos condominiais pode ser objeto de penhora em cumprimento de sentença, ainda que somente o ex-companheiro tenha figurado no polo passivo da ação de conhecimento.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Segundo o entendimento do STJ, a obrigação de pagamento das despesas condominiais é de natureza propter rem, ou seja, é obrigação "própria da coisa", ou, ainda, assumida "por causa da coisa". Por isso, a pessoa do devedor se individualiza exclusivamente pela titularidade do direito real, desvinculada de qualquer manifestação da vontade do sujeito.
Havendo mais de um proprietário do imóvel, como ordinariamente ocorre entre cônjuges ou companheiros, a responsabilidade pelo adimplemento das cotas condominiais é solidária, o que, todavia, não implica exigência de litisconsórcio necessário entre os co-proprietários, podendo o condomínio demandar contra qualquer um deles ou contra todos em conjunto, conforme melhor lhe aprouver.
Na hipótese, à época da fase de conhecimento, o imóvel encontrava-se registrado em nome dos dois companheiros, mostrando-se válido e eficaz o acordo firmado por apenas um dos proprietários com o condomínio. No caso, não sendo efetuado o pagamento do débito, é viável a penhora do imóvel gerador das despesas, ainda que, nesse novo momento processual, esteja o bem registrado apenas em nome da ex-companheira, que não participou da fase de conhecimento.

sábado, 28 de março de 2020

FERTILIZAÇÃO IN VITRO MELHOR TÉCNICA FALTA DE INFORMAÇÃO ADEQUADA INSUCESSO DO PROCEDIMENTO DANO MORAL

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. Clínica especializada em fertilização. Autores que contrataram com a ré a realização do procedimento de fertilização in vitro. Ausência de informação clara quanto a melhor técnica, que possui a maior chance de êxito aos autores, para que os mesmos pudessem consentir livre e conscientemente entre uma ou outra opção que lhe foi oferecida. Procedimento escolhido pelo casal que não obteve a fecundação, sendo concluído o serviço pago pelos autores. Sentença de parcial procedência que condenou a ré a pagar indenização por danos morais. Ré que não se desincumbiu do ônus de comprovar que informou aos autores quanto a técnica mais viável para a continuidade do procedimento contratado. Dano moral configurado. Valor arbitrado dentro dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. SENTENÇA QUE SE MANTÉM. RECURSOS A QUE SE NEGAM PROVIMENTO.

0055058-34.2015.8.19.0203 - APELAÇÃO
DÉCIMA OITAVA CÂMARA CÍVEL
Des(a). MARGARET DE OLIVAES VALLE DOS SANTOS - Julg: 13/11/2019 - Data de Publicação: 14/11/2019

sexta-feira, 27 de março de 2020

VIAGEM DE MÉDICO OBSTETRA AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA QUEBRA DA CONFIANÇA DANO MORAL RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO SEGURO SAÚDE

AÇÃO INDENIZATÓRIA - RESPONSABILIDADE CIVIL - ALEGAÇÃO DE DESÍDIA E NEGLIGÊNICA MÉDICA CARACTERIZADA POR VIAGEM REALIZADA POR OBSTETRA DE GESTANTE SEM A DEVIDA COMUNICAÇÃO E INDICAÇÃO DE PROFISSIONAL HABILITADO PARA ACOMPANHAMENTO EM CASO DE EMERGÊNCIA - AUTORA QUE AS VÉSPERA DO PARTO FOI ACOMETIDA DE INFECÇÃO URINÁRIA, SENDO INTERNADA, SEM CONSEGUIR CONTATO COM SUA OBSTETRA - QUEBRA DA RELAÇÃO DE CONFIANÇA EM MOMENTO DELICADO - EVIDENTE AFLIÇÃO E ANGÚSTIA SUPORTADOS - DANO MORAL CONFIGURADO - PROVA PRODUZIDA QUE NÃO ILIDIU FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO AUTORAL - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA E OBJETIVA DA SEGURADORA PELOS DANOS CAUSADOS POR SEUS MÉDICOS CREDENCIADOS - SÚMULA 293 DESTA CORTE DE JUSTIÇA - ALEGAÇÃO DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADA - VALOR INDENIZATÓRIO - CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO ATENDIDOS - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. Versa a demanda sobre alegada desídia médica, consubstanciada em viagem realizada pela obstetra da parte autora, sem comunicação, deixando a paciente desamparada as vésperas do parto, quando foi acometida por infecção urinária e sem indicação de outro profissional habilitado a acompanhá-la. Com efeito, inobstante ter a 1ª. recorrente deixado profissional de sua equipe para orientar seus pacientes, em sua ausência, verifica-se que a apelante não comprovou que informou previamente aos autores sobre sua viagem, bem assim a médica que atendeu a paciente é de outra especialidade (pediatria) e somente lhe orientou a procurar um hospital, sem qualquer outro amparo. Quebra de confiança entre médico e paciente em momento tão delicado. Evidente a angústia e aflições suportadas pelos autores, ante o risco vivenciado pela gestante e sua filha. Dano moral configurado. Valor indenizatório que não merece reparo, eis que fixado de acordo com as peculiaridades do caso e em observância aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Responsabilidade objetiva e solidária da seguradora. Art. 6º, VIII, do CDC. Enunciado Sumular 293, desta Corte de Justiça. Negado provimento a ambos os recursos. PPF

0014651-02.2015.8.19.0036 - APELAÇÃO
DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL
Des(a). EDSON AGUIAR DE VASCONCELOS - Julg: 11/12/2019 - Data de Publicação: 13/12/2019

quinta-feira, 26 de março de 2020

CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO REPARO DA REDE DE ENERGIA ELÉTRICA FALHA NO SERVIÇO LESÃO AO CONSUMIDOR TEORIA DA CAUSALIDADE ADEQUADA DANO MORAL

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. REPARO DA REDE DE ENERGIA ELÉTRICA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. Trata-se de ação de responsabilidade civil relatando o Autor que, enquanto executava suas atividades como padeiro, em razão de reparo na rede elétrica realizada pela Ré, o equipamento reiniciou em sentido contrário ao usual, puxando sua mão para o cilindro de massa. A sentença julgou improcedente o pedido, sob o fundamento de que não restou caracterizada a responsabilidade da Concessionária. Recurso do Autor. Laudo pericial afirmando que a inversão no funcionamento decorreu de falha na manutenção da rede elétrica efetuada pela Ré. Teoria da causalidade adequada. Resultado que não se produziria sem a inversão de fase. Falha na prestação do serviço. Dano moral configurado. Valor de R$ 30.000,00 que se mostra adequado às peculiaridades do caso concreto e observa os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Quanto à denunciação da lide, embora inadmissível nas relações de consumo, havendo apenas, como intervenção de terceiros, a possibilidade de chamamento ao processo, na forma do art. 101, inciso II do CDC, o que não se aplica à hipótese em comento, fato é que a denunciação já foi deferida, com manifestação da Denunciada em todas as fases do processo, sem qualquer prejuízo ao Autor. Portanto, forçosa a sua apreciação. Procedência da lide secundária como consequência do acolhimento do pedido principal. Condenação da Denunciada ao reembolso dos valores despendidos pela Denunciante, conforme previsto no contrato de prestação de serviços entre elas celebrado. RECURSO PROVIDO.

0002906-79.2006.8.19.0023 - APELAÇÃO
QUINTA CÂMARA CÍVEL
Des(a). DENISE NICOLL SIMÕES - Julg: 15/10/2019 - Data de Publicação: 16/10/2019

quarta-feira, 25 de março de 2020

O rol de procedimentos e eventos em saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS não é meramente exemplificativo

QUARTA TURMA
PROCESSO
REsp 1.733.013-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 10/12/2019, DJe 20/02/2020
RAMO DO DIREITODIREITO CIVIL, DIREITO DO CONSUMIDOR
TEMA
Planos e seguros de saúde. Agência Nacional de Saúde - ANS. Art. 4º, III, da Lei n. 9.961/2000. Rol de procedimentos e eventos em saúde. Caracterização como meramente exemplificativo. Impossibilidade. Mudança de entendimento (Overruling).
DESTAQUE
O rol de procedimentos e eventos em saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS não é meramente exemplificativo.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A Lei n. 9.961/2000 criou a Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, que tem por finalidade institucional promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde.
Extrai-se do art. 10, § 4º, da Lei n. 9.656/1998 c/c o art. 4º, III, da Lei n. 9.961/2000, a atribuição dessa Autarquia de elaborar a lista de procedimentos e eventos em saúde que constituirão referência básica para os fins do disposto na Lei dos Planos e Seguros de Saúde. Em vista dessa incumbência legal, o art. 2º da Resolução Normativa n. 439/2018 da ANS, que atualmente regulamenta o processo de elaboração do rol, em harmonia com o determinado pelo caput do art. 10 da Lei n. 9.656/1998, esclarece que o rol garante a prevenção, o diagnóstico, o tratamento, a recuperação e a reabilitação de todas as enfermidades que compõem a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde - CID da Organização Mundial da Saúde.
A elaboração do rol, em linha com o que se deduz do Direito Comparado, apresenta diretrizes técnicas relevantes, de inegável e peculiar complexidade, como: utilização dos princípios da Avaliação de Tecnologias em Saúde – ATS; observância aos preceitos da Saúde Baseada em Evidências – SBE; e resguardo da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do setor.
O rol mínimo e obrigatório de procedimentos e eventos em saúde constitui relevante garantia do consumidor para propiciar direito à saúde, com preços acessíveis, contemplando a camada mais ampla e vulnerável da população. Por conseguinte, em revisitação ao exame detido e aprofundado do tema, conclui-se que é inviável o entendimento de que o rol é meramente exemplificativo e de que a cobertura mínima, paradoxalmente, não tem limitações definidas. Esse raciocínio tem o condão de encarecer e efetivamente padronizar os planos de saúde, obrigando-lhes, tacitamente, a fornecer qualquer tratamento prescrito, restringindo a livre concorrência e negando vigência aos dispositivos legais que estabelecem o plano-referência de assistência à saúde (plano básico) e a possibilidade de definição contratual de outras coberturas.
Assim, o rol da ANS é solução concebida pelo legislador para harmonização da relação contratual, elaborado de acordo com aferição de segurança, efetividade e impacto econômico. A uníssona doutrina especializada alerta para a necessidade de não se inviabilizar a saúde suplementar. A disciplina contratual exige uma adequada divisão de ônus e benefícios dos sujeitos como parte de uma mesma comunidade de interesses, objetivos e padrões. Isso tem de ser observado tanto em relação à transferência e distribuição adequada dos riscos quanto à identificação de deveres específicos do fornecedor para assegurar a sustentabilidade, gerindo custos de forma racional e prudente.

terça-feira, 24 de março de 2020

No seguro de vida em grupo, não há abusividade na cláusula que permite a não renovação do contrato ou a renovação condicionada a reajuste por faixa etária

QUARTA TURMA
PROCESSO
REsp 1.769.111-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 10/12/2019, DJe 20/02/2020
RAMO DO DIREITODIREITO CIVIL
TEMA
Seguro de vida em grupo. Cláusula de reajuste do prêmio por faixa etária ou de não renovação. Abusividade. Não ocorrência.
DESTAQUE
No seguro de vida em grupo, não há abusividade na cláusula que permite a não renovação do contrato ou a renovação condicionada a reajuste por faixa etária.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Inicialmente, destaca-se que os contratos de seguros e planos de saúde são pactos cativos por força de lei, por isso renovados automaticamente (art. 13, caput, da Lei n. 9.656/1998), não cabendo, assim, a analogia para a análise da validade das cláusulas dos seguros de vida em grupo.
A função econômica do seguro de vida é socializar riscos entre os segurados e, nessa linha, o prêmio exigido pela seguradora por cada segurado é calculado de acordo com a probabilidade de ocorrência do evento danoso. Em contrapartida, na hipótese de ocorrência do sinistro, será pago ao segurado, ou a terceiros beneficiários, certa prestação pecuniária.
Em se tratando de seguros de pessoas, nos contratos individuais, vitalícios ou plurianuais, haverá formação de reserva matemática vinculada a cada participante. Na modalidade coletiva, o regime financeiro é o de repartição simples, não se relacionando ao regime de capitalização.
Assim, é legal a cláusula de não renovação dos seguros de vida em grupo, contratos não vitalícios por natureza, uma vez que a cobertura do sinistro se dá em contraprestação ao pagamento do prêmio pelo segurado, no período determinado de vigência da apólice, não ocorrente, na espécie, a constituição de poupança ou plano de previdência privada.
Dessa forma, a permissão para não renovação dos seguros de vida em grupo ou a renovação condicionada a reajuste que considere a faixa etária do segurado, quando evidenciado o aumento do risco do sinistro, é compatível com o regime de repartição simples, ao qual aqueles pactos são submetidos e contribui para a viabilidade de sua existência, prevenindo, a médio e longo prazos, indesejável onerosidade ao conjunto de segurados.
A cláusula de não renovação do seguro de vida, quando constituiu faculdade conferida a ambas as partes do contrato, assim como a de reajuste do prêmio com base na faixa etária do segurado, mediante prévia notificação, não configuram abusividade e não exigem comprovação do desequilíbrio atuarial-financeiro.

segunda-feira, 23 de março de 2020

Responsabilidade civil do Estado e dever de fiscalizar


Para que fique caracterizada a responsabilidade civil do Estado por danos decorrentes do comércio de fogos de artifício, é necessário que exista a violação de um dever jurídico específico de agir, que ocorrerá quando for concedida a licença para funcionamento sem as cautelas legais ou quando for de conhecimento do poder público eventuais irregularidades praticadas pelo particular.

Com essa tese de repercussão geral (Tema 366), o Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, negou provimento a recurso extraordinário interposto de acórdão em que o tribunal de origem deu provimento a recurso de apelação por considerar ausente o nexo causal entre as falhas noticiadas na prestação de serviços públicos e a explosão havida em loja de fogos de artifício (Informativos 917 e 918).

Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes, no qual expôs que a Constituição Federal, no art. 37, § 6º (1), adotou a responsabilidade objetiva do Estado pela teoria do risco administrativo, não pela teoria do risco integral. Várias são as decisões do Supremo Tribunal Federal nesse sentido e a apontar a impossibilidade de qualquer legislação, inclusive, ampliar isso e aceitar a teoria do risco integral.

A observância de requisitos mínimos, positivos e negativos, é necessária para a aplicação da responsabilidade objetiva. Na situação dos autos, dois requisitos positivos exigíveis estão ausentes. Inexiste conduta, comissiva ou omissiva, do poder público. Por conseguinte, o nexo causal não pode ser aferido.

A abertura de comércio de fogos com pólvora não é possível sem a perícia da Polícia Civil, órgão do Estado-membro. É ela que pode realizar a vistoria, não o município. Ademais, a legislação da municipalidade estabelecia o procedimento e previa a inspeção. Exigia, no protocolo, a comprovação do seu pedido e o recolhimento da taxa na Polícia Civil para dar sequência ao procedimento.

Entretanto, protocolada a pretensão, faltou a comprovação de ter sido feito requerimento na Polícia Civil. Logo, o procedimento administrativo ficou parado. A atuação do poder público municipal foi a esperada: aguardar a complementação dos documentos pelos requerentes. Nada seria exigível da municipalidade.

A atividade praticada pelos comerciantes era clandestina. Eles precisavam da licença para funcionar, o que só poderia ser concedido com prévia vistoria. Dessa maneira, os proprietários começaram a comercializar sem autorização.

Inclusive, a má-fé dos proprietários do imóvel foi reconhecida em outro processo relacionado a esta causa. Naqueles autos, o magistrado acentuou que, no local, funcionava verdadeiro depósito clandestino de pólvora, armazenada em quantidade tal que se fazia supor uma fábrica clandestina. Assim, existiu desvio na utilização do imóvel.

Percebe-se que, além da ausência de requisitos positivos, incide a culpa exclusiva dos proprietários, porque não aguardaram a necessária licença e estocaram pólvora.

O ministro Roberto Barroso pontuou que a discordância é sobre o nexo de causalidade. A omissão específica no comércio de fogos de artifício ocorrerá quando for concedida a licença para funcionamento sem as cautelas legais ou forem de conhecimento do poder público eventuais irregularidades praticadas pelo particular. O simples requerimento de licença de instalação ou o recolhimento da taxa de funcionamento não são suficientes para caracterizar o dever específico de agir.

Segundo o ministro Gilmar Mendes, a questão resume-se à responsabilidade por fato ilícito causado por terceiro, que instalou clandestinamente loja sem obedecer a legislação municipal, estadual e federal.

O ministro Marco Aurélio sinalizou que a responsabilidade do Estado é objetiva, considerado ato comissivo. A partir do momento em que se tem ato omissivo, a responsabilidade é subjetiva. Entendeu ser o município diligente ao não expedir a licença e exigir a observância de requisitos normativos.

Vencidos os ministros Edson Fachin (relator), Luiz Fux, Cármen Lúcia, Celso de Mello e Dias Toffoli, que deram parcial provimento ao recurso extraordinário, a fim de restaurar as conclusões da sentença.

O relator compreendeu ser objetiva a responsabilidade civil atribuível ao Estado também no caso de condutas omissivas. Necessário conjugar a dispensabilidade da comprovação de culpa do agente ou falha no serviço público com a imposição à Administração de um dever legal de agir. Ponderou que o município inverteu o procedimento regulamentar, deixou de realizar a vistoria prévia no prazo de 24 horas e permitiu a paralisação do processo administrativo. De igual modo, incorreu em violação de seu dever de exercício do poder de polícia. Por sua omissão, possibilitou que o comércio funcionasse clandestinamente e ali houvesse danos derivados de explosão.

O ministro Luiz Fux salientou que a responsabilidade municipal está em permitir que atividade de alta periculosidade se realizasse em área próxima a residências. A ministra Cármen Lúcia enfatizou que o município fora acionado; estava, portanto, ciente da instalação do que seria comércio de fogos de artifício. Por sua vez, o ministro Celso de Mello destacou a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal.

(1) CF: “Art. 37. (...) § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

  - 



RE 136861/SP, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento em 11.3.2020. (RE-136861)
1ª Parte: Vídeo
2ª Parte: Vídeo

Audio

Admite-se a flexibilização da orientação contida na súmula 385/STJ para reconhecer o dano moral decorrente da inscrição indevida do nome do consumidor em cadastro restritivo, ainda que não tenha havido o trânsito em julgado das outras demandas em que se apontava a irregularidade das anotações preexistentes, desde que haja nos autos elementos aptos a demonstrar a verossimilhança das alegações

TERCEIRA TURMA
PROCESSO
REsp 1.704.002-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/02/2020, DJe 13/02/2020
RAMO DO DIREITODIREITO DO CONSUMIDOR
TEMA
Compensação por danos morais. Inscrição indevida em órgão de proteção ao crédito. Anotações pretéritas discutidas judicialmente. Verossimilhança das alegações. Flexibilização da Súmula 385/STJ. Dano moral configurado.
DESTAQUE
Admite-se a flexibilização da orientação contida na súmula 385/STJ para reconhecer o dano moral decorrente da inscrição indevida do nome do consumidor em cadastro restritivo, ainda que não tenha havido o trânsito em julgado das outras demandas em que se apontava a irregularidade das anotações preexistentes, desde que haja nos autos elementos aptos a demonstrar a verossimilhança das alegações.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Cinge-se a controvérsia a decidir se a anotação indevida do nome do consumidor em órgão de restrição ao crédito, quando preexistentes outras inscrições cuja regularidade é questionada judicialmente, configura dano moral a ser compensado.
Consoante a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, não cabe indenização por dano moral por inscrição irregular em órgãos de proteção ao crédito quando preexistem anotações legítimas, nos termos da Súmula 385/STJ, aplicável também às instituições credoras. Nesse sentido, veja-se o REsp 1.386.424/MG, julgado pela Segunda Seção sob o rito dos recursos especiais repetitivos (Tema 922).
Igualmente, mostra-se acertado o entendimento do Tribunal de origem no sentido de que, até o reconhecimento judicial definitivo acerca da inexigibilidade do débito, deve ser presumida como legítima a anotação realizada pelo credor junto aos cadastros restritivos. E essa presunção, via de regra, não é ilidida pela simples juntada de extratos comprovando o ajuizamento de ações com a finalidade de contestar as demais anotações.
Nada obstante, tal raciocínio, em determinadas hipóteses, pode colocar o consumidor em situação excessivamente desfavorável e de complexa solução, especialmente quando as ações forem ajuizadas concomitantemente – como na espécie – ou em curto espaço de tempo, na medida em que ele se vê numa espécie de "círculo vicioso", porquanto o reconhecimento do dano moral em cada um dos processos ajuizados estaria, em tese, condicionado ao trânsito em julgado dos demais, nos quais, por sua vez, não se concederia a respectiva indenização devido à pendência das outras demandas em que a regularidade dos mesmos registros está sendo discutida.
Certo é que não se pode admitir que seja dificultada a defesa dos direitos do consumidor em juízo, exigindo-se, como regra absoluta, o trânsito em julgado de todas as sentenças que declararam a inexigibilidade de todos os débitos e, consequentemente, a irregularidade de todas as anotações anteriores em cadastro de inadimplentes para, só então, reconhecer o dano moral.
Atenta a esse aspecto, a Terceira Turma, ao julgar o REsp 1.647.795/RO admitiu a flexibilização da orientação contida na Súmula 385/STJ para reconhecer o dano moral decorrente da inscrição indevida do nome da consumidora em cadastro restritivo, ainda que não tenha havido o trânsito em julgado das outras demandas em que se apontava a irregularidade das anotações preexistentes (julgado em 05/10/2017, DJe 13/10/2017).
Portanto, a fim de que se possa flexibilizar a aplicação da Súmula 385/STJ há de haver nos autos elementos aptos a demonstrar a verossimilhança das alegações do consumidor quanto à irregularidade das anotações preexistentes.

sábado, 21 de março de 2020

É possível o redirecionamento da condenação de veicular contrapropaganda imposta a posto de gasolina matriz à sua filial

TERCEIRA TURMA
PROCESSO
REsp 1.655.796-MT, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/02/2020, DJe 20/02/2020
RAMO DO DIREITODIREITO DO CONSUMIDOR
TEMA
Propaganda enganosa. Posto de gasolina. Matriz. Bandeira diversa. Condenação. Contrapropaganda. Arts. 56, inciso XII, e 60 do Código de Defesa do Consumidor. Redirecionamento. Filial. Possibilidade.
DESTAQUE

É possível o redirecionamento da condenação de veicular contrapropaganda imposta a posto de gasolina matriz à sua filial.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Cinge-se a controvérsia a definir a possibilidade de redirecionamento da condenação pela prática de propaganda enganosa (arts. 56, XII, e 60 do Código de Defesa do Consumidor) imposta a posto de gasolina matriz à sua filial, que restou obrigada a veicular a contrapropaganda.
No caso, a empresa matriz foi condenada pela prática de propaganda enganosa por ter comercializado marca de combustível diversa da sua bandeira, restando condenada a veicular contrapropaganda, cujo cumprimento da ordem foi redirecionado à empresa filial.
Nesse sentido, salienta-se que embora possuam CNPJ diversos e autonomia administrativa e operacional, as filiais são um desdobramento da matriz por integrar a pessoa jurídica como um todo.
Assim, eventual decisão contrária à matriz por atos prejudiciais a consumidores é extensível às filiais.
Sob a ótica consumerista é indiferente qual a empresa infratora, incidindo à hipótese a teoria da aparência. O consumidor ao buscar os produtos ofertados, desconhece os meandros empresariais, que não lhe dizem respeito. Como é sabido, "os integrantes da cadeia de consumo, em ação indenizatória consumerista, também são responsáveis pelo danos gerados ao consumidor, não cabendo a alegação de que o dano foi gerado por culpa exclusiva de um dos seus integrantes" (AgRg no AREsp 207.708/SP, Relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe 3/10/2013).
Ademais, a contrapropaganda é a sanção prevista para a prática de propaganda enganosa ou abusiva, tendo como um dos seus intuitos evitar a nocividade causada ao mercado consumidor desse tipo de conduta comercial.
Desse modo, a filial deve cumprir o comando judicial, de modo a evitar que novas ofensas ao direito consumerista sejam reiteradas. A circunstância de a matriz ter encerrado suas atividades em determinada cidade e sido transferida para outro município, onde supostamente ainda penderia de construção um novo posto de combustível, com outra bandeira, não obstaculiza a observância da medida pela filial em prol dos consumidores, seja por inexistência de impedimento para tanto, seja pela importância de se evitar práticas similares.

sexta-feira, 20 de março de 2020

O interesse jurídico no ajuizamento direto de ação de usucapião independe de prévio pedido na via extrajudicial

TERCEIRA TURMA
PROCESSO
REsp 1.824.133-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/02/2020, DJe 14/02/2020
RAMO DO DIREITODIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL
TEMA
Ação de usucapião. Interesse processual. Exigência de prévio pedido na via extrajudicial. Descabimento.
DESTAQUE
O interesse jurídico no ajuizamento direto de ação de usucapião independe de prévio pedido na via extrajudicial.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A controvérsia diz respeito ao interesse processual para ajuizamento direto de ação de usucapião ante a recente ampliação das possibilidades de reconhecimento extrajudicial da usucapião.
O reconhecimento extrajudicial da usucapião foi previsto, inicialmente, no art. 60 da Lei do Programa "Minha Casa, Minha Vida" (Lei n. 11.977/2009), com aplicação restrita ao contexto da regularização fundiária.
Com o advento do CPC/2015, a usucapião extrajudicial passou a contar com uma norma geral, não ficando mais restrita apenas ao contexto de regularização fundiária. Nos termos do art. 216-A da Lei n. 6.015/1973 (incluído pelo art. 1.071 do CPC/2015 e alterado pela Lei n. 13.465/2017): "Sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião, que será processado diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo [...]".
Assim, a existência de interesse jurídico no ajuizamento direto de ação de usucapião, independentemente de prévio pedido na via extrajudicial, ante a expressa ressalva quanto ao cabimento direto da via jurisdicional. A doutrina elucida que "Não é um dever da parte eleger a via administrativa, podendo optar pela ação judicial, ainda que preenchidos os requisitos da usucapião extrajudicial".
Ademais, como a propriedade é um direito real, oponível erga omnes o simples fato de o possuidor pretender se tornar proprietário já faz presumir a existência de conflito de interesses entre este o atual titular da propriedade, de modo que não seria possível afastar de antemão o interesse processual do possuidor.

quinta-feira, 19 de março de 2020

Para a aplicação da exceção à impenhorabilidade do bem de família prevista no art. 3º, IV, da Lei n. 8.009/1990 é preciso que o débito de natureza tributária seja proveniente do próprio imóvel que se pretende penhorar

TERCEIRA TURMA
PROCESSO
REsp 1.332.071-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/02/2020, DJe 20/02/2020
RAMO DO DIREITODIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL
TEMA
Contrato de permuta de imóveis. Imóvel cedido com débito de IPTU. Débito quitado pelo permutante que recebeu o imóvel. Reembolso. Ação de cobrança em cumprimento de sentença. Penhora do imóvel cedido que não possuía débito tributário. Exceção à proteção legal conferida ao bem de família. Impossibilidade.
DESTAQUE
Para a aplicação da exceção à impenhorabilidade do bem de família prevista no art. 3º, IV, da Lei n. 8.009/1990 é preciso que o débito de natureza tributária seja proveniente do próprio imóvel que se pretende penhorar.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Cinge-se a controvérsia a definir se é possível a penhora de imóvel, no bojo de ação de cobrança em fase de cumprimento de sentença, em razão da exceção à impenhorabilidade do bem de família prevista no art. 3º, IV, da Lei n. 8.009/1990.
No caso, celebrou-se entre as partes um contrato particular de permuta de imóveis urbanos, em que seria transmitida uma casa residencial em troca de um lote de terreno. Por ocasião da celebração do referido contrato, pactuou-se que cada parte assumiria os tributos e taxas que viessem a incidir sobre os imóveis permutados, responsabilizando-se pela existência de débitos pendentes.
Após a concretização da permuta e transferência da posse, constatou-se que o imóvel cedido por uma das partes possuía débitos de IPTU relacionados a anos anteriores à celebração do contrato. Assim, a parte adversa quitou os débitos fiscais junto à Municipalidade e ajuizou ação de cobrança contra o ora recorrente buscando o reembolso dos valores pagos, a qual foi julgada procedente pelas instâncias ordinárias.
Na fase de cumprimento de sentença, o imóvel transferido ao recorrente (casa residencial), que antes pertencia aos recorridos, e que não possuía débitos tributários, foi penhorado para garantia da dívida objeto da referida ação de cobrança, com base no art. 3º, IV, da Lei n. 8.009/1990, o qual dispõe que poderá ser penhorado o bem de família "para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar".
Não obstante, para a aplicação da exceção à impenhorabilidade do bem de família prevista no aludido dispositivo legal é preciso que o débito de natureza tributária seja proveniente do próprio imóvel que se pretende penhorar. Em outras palavras, era preciso que os débitos de IPTU fossem do próprio imóvel penhorado. Na hipótese, contudo, o imóvel penhorado não tinha qualquer débito tributário.
Ademais, o débito referente ao IPTU do imóvel repassado pelo recorrente foi integralmente quitado pela outra parte, razão pela qual não se está cobrando "impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas", mas, sim, o reembolso dos valores pagos pelos autores em função do não cumprimento de cláusula contratual pelo recorrente, a qual estabelecia que a permuta dos imóveis deveria ser efetivada sem qualquer pendência fiscal.
Com efeito, por se tratar de norma de exceção à ampla proteção legal conferida ao bem de família, a interpretação do art. 3º, inciso IV, da Lei n. 8.009/1990, deve se dar de maneira restritiva, não podendo ser ampliada a ponto de alcançar outras situações não previstas pelo legislador.

quarta-feira, 18 de março de 2020

O arrendante é o responsável final pelo pagamento das despesas, junto a pátio privado, com a remoção e a estadia do automóvel apreendido em ação de reintegração de posse

TERCEIRA TURMA
PROCESSO
REsp 1.828.147-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 20/02/2020, DJe 26/02/2020
RAMO DO DIREITODIREITO CIVIL
TEMA
Arrendamento mercantil. Inadimplemento contratual do arrendatário. Veículo apreendido. Despesas de remoção e estadia em pátio privado. Obrigação propter rem. Responsabilidade do arrendante.
DESTAQUE
O arrendante é o responsável final pelo pagamento das despesas, junto a pátio privado, com a remoção e a estadia do automóvel apreendido em ação de reintegração de posse.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Cinge-se a controvérsia a definir se o arrendante é responsável pelo pagamento das despesas de remoção e estadia de veículo em pátio de propriedade privada quando a apreensão do bem deu-se, por ordem judicial, no bojo de ação de reintegração de posse por ele ajuizada em desfavor do arrendatário, dado o inadimplemento contratual.
No que concerne à propriedade do bem objeto de contrato de arrendamento mercantil, tem-se que, enquanto perdurar o arrendamento mercantil, o arrendante é o seu proprietário para efeitos financeiros (REsp 1.725.404/SP, Segunda Turma, DJe 23/05/2018).
Sobre o tema, vale lembrar que as despesas decorrentes do depósito do veículo em pátio privado referem-se ao próprio bem, ou seja, constituem obrigações propter rem. Essa espécie de obrigação provém "da existência de um direito real, impondo-se a seu titular", de maneira que independe da manifestação expressa ou tácita da vontade do devedor.
Na espécie, isso equivale a dizer que as despesas com a remoção e a guarda dos veículos objeto de contrato de arrendamento mercantil estão vinculadas ao bem e a seu proprietário, ou seja, ao arrendante. Este é, inclusive, o mesmo entendimento adotado por este STJ quando se trata de veículo alienado fiduciariamente.
Sendo hipótese diversa, frise-se a inaplicabilidade do entendimento firmado no REsp 1.114.406/SP, julgado sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos, uma vez que tal precedente amolda-se às hipóteses em que a busca e apreensão do veículo decorre do cometimento de infrações administrativas de trânsito, situação em que as despesas relativas à remoção, guarda e conservação do veículo arrendado não serão de responsabilidade da empresa arrendante, mas sim do arrendatário, que, nos termos da Resolução n. 149/2003 do Contran, se equipara ao proprietário enquanto em vigor o contrato de arrendamento.
Por fim, é importante ter em vista, ainda, que os referidos gastos foram presumivelmente destinados à devida conservação do automóvel, cuja propriedade é do próprio arrendante, como já consignado.
Portanto, não se tratando de apreensão de veículo em razão do cometimento de infração de trânsito, deve-se manter o entendimento de que a responsabilidade pelo pagamento das despesas de remoção e estadia do veículo em pátio privado é da empresa arrendante.

terça-feira, 17 de março de 2020

Nos contratos de financiamento com cláusula de alienação fiduciária, quando houver a conversão da ação de busca e apreensão em ação de execução nos moldes do art. 4º do Decreto-Lei n. 911/1969, o débito exequendo deve representar o valor da integralidade da dívida (soma das parcelas vencidas e vincendas do contrato)

TERCEIRA TURMA
PROCESSO
REsp 1.814.200-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/02/2020, DJe 20/02/2020
RAMO DO DIREITODIREITO CIVIL
TEMA
Contrato de financiamento com cláusula de alienação fiduciária. Busca e apreensão. Bem não localizado. Conversão em ação de execução. Art. 4º do Decreto-Lei n. 911/1969. Débito exequendo. Integralidade da dívida.
DESTAQUE
Nos contratos de financiamento com cláusula de alienação fiduciária, quando houver a conversão da ação de busca e apreensão em ação de execução nos moldes do art. 4º do Decreto-Lei n. 911/1969, o débito exequendo deve representar o valor da integralidade da dívida (soma das parcelas vencidas e vincendas do contrato).
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A conversão da ação de busca e apreensão em ação de execução é inovação trazida pela Lei n. 13.043/2014 – que alterou a redação dada ao art. 4º do Decreto-Lei n. 911/1969 –, uma vez que, anteriormente, tal conversão somente poderia dar-se em ação de depósito.
Anteriormente à promulgação da Lei n. 13.043/2014, esta Corte Superior entendia que o prosseguimento com a cobrança da dívida dava-se com relação ao menor valor entre o valor de mercado do bem oferecido em garantia e o valor do débito apurado. Contudo, após a alteração legislativa, tem-se que a manutenção deste entendimento não parece se amoldar ao real escopo da legislação que rege a matéria atinente à alienação fiduciária.
Isso porque, não realizada a busca e apreensão e a consequente venda extrajudicial do bem, remanesce a existência de título executivo hábil a dar ensejo à busca pela satisfação integral do crédito.
O próprio art. 5º do DL n. 911/1969 dispõe que, se o credor preferir recorrer à ação executiva, direta ou a convertida na forma do art. 4º, serão penhorados, a critério do autor da ação, bens do devedor quantos bastem para assegurar a execução, o que denota a intenção de conferir proteção ao valor estampado no próprio título executivo.
Ademais, registra-se que o art. 3º do DL n. 911/1969 prevê que, após cumprida a liminar de busca e apreensão, o bem só poderá ser restituído livre de ônus ao devedor fiduciante, na hipótese de este pagar a integralidade da dívida pendente.
Sob esse aspecto, inviável admitir que a conversão da ação de busca e apreensão em ação de execução represente apenas a busca pelo valor do "equivalente em dinheiro" do bem – o que, no caso, representaria o valor do veículo na Tabela FIPE –, impondo ao credor que ajuíze outra ação para o recebimento de saldo remanescente.
Ao revés, deve-se reconhecer que o valor executado refere-se, de fato, às parcelas vencidas e vincendas do contrato de financiamento, representado pela cédula de crédito bancário.

segunda-feira, 16 de março de 2020

O condomínio, por ser uma massa patrimonial, não possui honra objetiva apta a sofrer dano moral

TERCEIRA TURMA
PROCESSO
REsp 1.736.593-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/02/2020, DJe 13/02/2020
RAMO DO DIREITODIREITO CIVIL
TEMA
Compensação de dano moral. Legitimidade ativa do condomínio. Pretensão exercida para defender interesse próprio. Natureza jurídica do condomínio. Ente despersonalizado. Violação da honra objetiva. Dano moral não configurado.
DESTAQUE
O condomínio, por ser uma massa patrimonial, não possui honra objetiva apta a sofrer dano moral.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Os condomínios são entes despersonalizados, pois não são titulares das unidades autônomas, tampouco das partes comuns, além de não haver, entre os condôminos, a affectio societatis, tendo em vista a ausência de intenção dos condôminos de estabelecerem, entre si, uma relação jurídica, sendo o vínculo entre eles decorrente do direito exercido sobre a coisa e que é necessário à administração da propriedade comum.
Com efeito, caracterizado o condomínio como uma massa patrimonial, não há como reconhecer que seja ele próprio dotado de honra objetiva, senão admitir que qualquer ofensa ao conceito que possui perante a comunidade representa, em verdade, uma ofensa individualmente dirigida a cada um dos condôminos, pois quem goza de reputação são os condôminos e não o condomínio, ainda que o ato lesivo seja a este endereçado.
Isso porque, concretamente, essa pretensão compensatória deduzida em juízo limita-se subjetivamente aos condôminos que se sentiram realmente ofendidos, não refletindo, por óbvio, pretensão do condomínio, enquanto complexo jurídico de interesses de toda coletividade e que se faz representar pelo síndico.
Assim, diferentemente do que ocorre com as pessoas jurídicas, qualquer repercussão econômica negativa será suportada pelos próprios condôminos, a quem incumbe contribuir para todas as despesas condominiais, e/ou pelos respectivos proprietários, no caso de eventual desvalorização dos imóveis no mercado imobiliário.

sexta-feira, 13 de março de 2020

ESCOLA PÚBLICA AGRESSÃO FÍSICA E VERBAL A ALUNO MÃE DE ALUNO AGRESSOR CONDENAÇÃO RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO DANO MORAL


Apelação. Ação de indenização por danos morais. Agressão física e verbal de menor dentre de escola estadual. A sentença condenou os réus solidariamente, ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 bem como ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios no valor de 10% sobre o valor da condenação, na forma dos arts. 82, §2°, e 85, §2°, do novo Código de Processo. Apelam os réus. Responsabilidade objetiva do Estado na forma do art. 37, § 6° da CRFB, por se tratar de fato ocorrido em instituição de ensino da rede pública, nas dependências da mesma, fato, inclusive, que nunca foi negado pela ré. Dever de guarda e de segurança dos alunos que se encontram sob sua custódia durante grande parte do dia. Responsabilidade da ré Niomar que decorre em razão de ser a responsável legal, genitora da agressora, cabendo a sua responsabilização pelos atos cometidos pela menor, que restou demonstrado através de provas produzidas. Conduta da menor Viviane que não se encontra adstrita ao período em que estava no colégio, a ponto de excluir a responsabilidade da genitora. Troca de mensagens comprovando a perseguição em relação a Camille, assim como atitudes de vangloria pela agressão. Necessidade de controle pelos pais, e imposição de valores. Dano moral presente e mantido em seu valor originário já que a autora foi agredida física e verbalmente dentro das dependências da instituição de ensino do Estado na frente de outros alunos do colégio. Publicização do ocorrido, acarretando intenso vexame à apelada. Juros e correção mantidos na forma fixada em sentença, observado o que restou definido no Tema 905 do STJ e 810 do STJ, quanto ao ente público. Recursos desprovidos.

0009933-32.2015.8.19.0045 - APELAÇÃO
VIGÉSIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL
Des(a). NATACHA NASCIMENTO GOMES TOSTES GONÇALVES DE OLIVEIRA - Julg: 07/11/2019 - Data de Publicação: 08/11/2019