terça-feira, 30 de abril de 2024

"Em contrato estimatório, se as mercadorias forem vendidas a terceiros após o processamento da recuperação judicial, os créditos das consignantes possuem natureza concursal, submentendo-se aos efeitos do plano de recuperação judicial"

 


Processo

REsp 1.934.930-SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 2/4/2024, Dje 10/4/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO FALIMENTAR

Tema

Recuperação judicial. Contrato estimatório. Momento de constituição do crédito. Fato gerador. Vínculo jurídico que se estabelece com a entrega da coisa móvel ao consignatário. Contrato firmado antes do deferimento do pedido de recuperação judicial. Venda das mercadorias em data posterior. Natureza concursal do crédito. Art. 49, caput, da Lei n. 11.101/2005.

DESTAQUE

Em contrato estimatório, se as mercadorias forem vendidas a terceiros após o processamento da recuperação judicial, os créditos das consignantes possuem natureza concursal, submentendo-se aos efeitos do plano de recuperação judicial.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A controvérsia consiste em definir qual é o momento de constituição do crédito oriundo de contrato estimatório, a fim de analisar a sua sujeição ou não ao plano de recuperação judicial.

Nos termos do art. 49, caput, da Lei n. 11.101/2005, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

A noção de crédito envolve basicamente a troca de uma prestação atual por uma prestação futura. A partir de um vínculo jurídico existente entre as partes, um dos sujeitos cumpre com a sua prestação (a atual), com o que passa a assumir a condição de credor, conferindo à outra parte (o devedor) um prazo para a efetivação da contraprestação. Nesses termos, o crédito se encontra constituído, independente do transcurso de prazo que o devedor tem para cumprir com a sua contraprestação, ou seja, ainda que inexigível.

A Segunda Seção desta Corte Superior, por ocasião do julgamento do REsp 1.843.332-RS, sob o rito dos repetitivos, fixou a seguinte tese (Tema 1051): "Para o fim de submissão aos efeitos da recuperação judicial, considera-se que a existência do crédito é determinada pela data em que ocorreu o seu fato gerador".

Nos termos do que dispõem os arts. 534 e 535 do Código Civil, pelo contrato estimatório, também chamado de "venda em consignação", o consignante entrega bens móveis ao consignatário, que fica autorizado a vendê-los, pagando àquele o preço ajustado, salvo se preferir, no prazo estabelecido, restituir-lhe a coisa consignada. Nessa modalidade contratual, o consignatário não se exonera da obrigação de pagar o preço, se a restituição da coisa, em sua integridade, se tornar impossível, ainda que por fato a ele não imputável.

Conforme assentado pela doutrina, o contrato estimatório apenas se aperfeiçoa com a efetiva entrega do bem móvel com o preço estimado ao consignatário, tratando-se, portanto, de contrato real. O consignante, ao entregar o bem móvel, cumpre com a sua prestação, com o que passa a assumir a condição de credor, ocasião em que é conferido à outra parte (consignatário/devedor) um prazo para cumprir com a sua contraprestação, qual seja, a de pagar o preço ajustado ou restituir a coisa consignada.

Na hipótese, as recorrentes, integrantes do chamado "Grupo Abril", receberam em consignação diversas revistas das recorridas/interessadas (editoras) antes do ajuizamento do pedido de recuperação judicial, porém a venda a terceiros dessas mercadorias se efetivou em data posterior.

O fato gerador do crédito em discussão ocorreu no momento em que as mercadorias foram entregues às recorrentes (consignatárias), isto é, antes do ajuizamento do pedido de recuperação judicial, quando se perfectibilizou o vínculo jurídico entre as partes, decorrente do contrato estimatório firmado, independente do transcurso do prazo que elas teriam para cumprir com a sua contraprestação (pagar o preço ou restituir a coisa), ou seja, ainda que o crédito fosse inexigível e ilíquido.

Dessa forma, se após o processamento da recuperação judicial, as mercadorias foram vendidas a terceiros, o crédito das consignantes, evidentemente, possui natureza concursal, devendo se submeter aos efeitos do plano de soerguimento das recuperandas, nos termos do que determina o art. 49, caput, da Lei n. 11.101/2005.

segunda-feira, 29 de abril de 2024

"Não incide o Código de Defesa do Consumidor no caso de concessionária de serviços públicos pertencente a grande grupo econômico, que pressupõe elevado nível de organização e planejamento para participação de processos licitatórios e sujeição a agências de regulação setorial"

 


Processo

REsp 1.802.569-MT, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por maioria, julgado em 12/3/2024, DJe 11/4/2024.

Ramo do Direito

DIREITO DO CONSUMIDOR

Tema

Concessionária de energia elétrica controlada. Aplicações financeiras resgatadas para liquidação de débitos da holding. Cédulas de crédito bancário representativas de mútuos. Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Teoria finalista mitigada. Não comprovação da vulnerabilidade técnica, econômica ou jurídica.

DESTAQUE

Não incide o Código de Defesa do Consumidor no caso de concessionária de serviços públicos pertencente a grande grupo econômico, que pressupõe elevado nível de organização e planejamento para participação de processos licitatórios e sujeição a agências de regulação setorial.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

No caso, a concessionária de energia elétrica, que era controlada por uma sociedade anônima, pleiteou a condenação da instituição financeira a abster-se de fazer novas movimentações na conta corrente ou conta de investimento, bem como à devolução dos valores retidos e utilizados para amortização das dívidas da controladora. A concessionária defende que sua relação com a instituição financeira é disciplinada pelo Código de Defesa do Consumidor.

Quanto ao ponto, em julgados mais recentes, a partir de uma interpretação teleológica do CDC, esta Corte tem admitido temperamentos à teoria finalista, de forma a reconhecer sua aplicabilidade a situações em que, malgrado o produto ou serviço seja adquirido no fluxo da atividade empresarial, seja comprovada a vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica do contratante perante o fornecedor.

Com a adoção, por conseguinte, da teoria finalista mitigada, a jurisprudência autoriza a expansão da concepção de relação de consumo, de forma a abranger em seu espectro relações que, à vista da adoção da teoria finalista pura, seriam excluídas do âmbito de regulação do CDC.

No caso, as características dos negócios jurídicos realizados entre a concessionária e a instituição financeira não permitem reconhecer qualquer tipo de vulnerabilidade que possibilite a incidência da norma consumerista a uma relação que, em princípio, estaria excluída, por configurar aquisição de serviços destinados à implementação da atividade econômica, isto é, inserida no fluxo da atividade empresarial da sociedade.

Destarte, considerando o vulto das obrigações garantidas, a recorrência das pactuações e das autorizações fornecidas ao banco - como reconhecido pelas instâncias ordinárias para identificar o comportamento contraditório (venire contra factum proprium) -, a característica da concessionária ao pertencer a grande grupo econômico ordenado tendente à prestação de serviços públicos concedidos - que pressupõe elevado nível de organização e planejamento para participação de processos licitatórios e sujeição a agências de regulação setorial -, não se pode reconhecer, por nenhum viés, que exista algum tipo de vulnerabilidade que autorize a incidência do Código de Defesa do Consumidor.

domingo, 28 de abril de 2024

Indicação de livro: "Ensaios sobre Direito Constitucional, Processo Civil e Direito Civil. Uma homenagem ao Professor José Manoel de Arruda Alvim", coordenada por Gilmar Mendes, Paulo Dias de Moura Ribeiro, Ingo Wolfgang Sarlet e Otávio Luiz Rodrigues Jr.



José Manoel de Arruda Alvim conseguiu, em sua longa existência, conciliar qualidades muitas vezes inconciliáveis. Um visionário no uso das ferramentas da Tecnologia da Informação como instrumento ancilar das atividades jurídicas, sejam elas da advocacia, da magistratura ou da docência, Arruda Alvim era também um colecionador de canetas-tinteiro. Antes de todos de sua geração, ou de pessoas muito mais jovens, ele trabalhava com editores de texto na época das máquinas de escrever ou, mais recentemente, com a escrita por áudio. Nada disso, contudo, impedia-o de cultivar o clássico e o atemporal.

Aqui se exterioriza outra das “contradições coerentes” de Arruda Alvim: o especialista em áreas do saber jurídico tão distintas, como o Direito Privado e o Direito Público. Não que ele fosse adepto da mixagem dos dois grandes setores do Direito. Tratava-se apenas de reunir em sua pessoa um universo de saberes invulgar e extraordinário, que lhe permitia transitar por entre as províncias do Direito Privado e do Direito Público com a tranquilidade dos juristas clássicos.

Agradecer a Arruda Alvim é o objetivo deste liber amicorum. Gratidão por sua existência, por sua amizade, por seus livros, por seus ensinamentos, por seus estímulos, enfim, agradecer por ele haver tocado a vida de cada um(uma) dos(as) autores(as) desta obra coletiva.

Muitos obrigados, Arruda Alvim.”

*Texto retirado da Apresentação da obra, escrita por Gilmar Mendes, Paulo Dias de Moura Ribeiro, Ingo Wolfgang Sarlet e Otavio Luiz Rodrigues Jr. 

https://editora.institutodc.com.br/produto/coletanea-arruda-alvim/

sábado, 27 de abril de 2024

"À luz do Decreto-lei n. 7.661/1945, a anulação de negócio jurídico realizado pela empresa falida após a decretação da quebra prescinde do ajuizamento de ação revocatória, podendo ser pronunciada, de ofício, pelo juízo falimentar"

 


QUARTA TURMA
Processo

REsp 1.958.096-PR, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 5/3/2024, DJe 14/3/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO FALIMENTAR

Tema

Falência. Venda de imóvel após a decretação da quebra. Nulidade do negócio jurídico declarada de ofício pelo juízo falimentar. Possibilidade. Ação Revocatória. Desnecessidade. Violação ao art. 40, § 1º, do Decreto-lei n. 7.665/1945.

DESTAQUE

À luz do Decreto-lei n. 7.661/1945, a anulação de negócio jurídico realizado pela empresa falida após a decretação da quebra prescinde do ajuizamento de ação revocatória, podendo ser pronunciada, de ofício, pelo juízo falimentar.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Cinge-se a controvérsia em verificar se o juiz responsável pelo processo de falência pode declarar, nos autos do processo falimentar, a nulidade de negócio jurídico de compra e venda de imóvel realizado pela empresa falida após a decretação da quebra, independentemente da propositura de ação revocatória.

A exigência da propositura de ação revocatória para a anulação de negócio jurídico realizado por empresa falida, após a decretação da quebra, não encontra respaldo no Decreto-lei n. 7.661/1945, sob pena de violação ao seu art. 40, § 1º, que não faz menção à necessidade do ajuizamento da referida demanda nesse tipo de situação.

Independentemente da boa-fé de terceiros, o negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo, nos termos do art. 169 do Código Civil. Ou seja, a boa-fé de terceiro adquirente não tem o condão de afastar a nulidade do negócio jurídico feito em desacordo com a lei.

Assim, se a boa-fé não pode transformar um ato nulo em ato válido, a exigência de propositura de ação específica para que se declare a referida nulidade não é razoável. Ao contrário, não há sentido em se exigir o ajuizamento de ação que será julgada procedente, especialmente se há para o terceiro prejudicado a possibilidade de opor os embargos de terceiro previstos no art. 674 do CPC.

Ademais, cabe ressaltar que não só o art. 40, § 1º, do Decreto-lei n. 7.661/45, mas também o art. 168, parágrafo único, do Código Civil indicam que a nulidade absoluta não só pode como deve ser pronunciada de ofício pelo juiz, independentemente de ação específica.

sexta-feira, 26 de abril de 2024

"Não é possível que se aplique à licitação entre os pretendentes à adjudicação de bem penhorado as regras relativas ao concurso de credores na hipótese de múltiplos credores com créditos de valores distintos"

 


Processo

REsp 2.098.109-PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 5/3/2024, DJe 7/3/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Bem imóvel penhorado. Adjudicação. Licitação entre os pretendentes. Art. 876, § 6º, do CPC. Regras relativas ao concurso de credores. Arts. 908 do CPC e 962 do CC. Impossibilidade de aplicação. Necessidade de requerimento do credor ou de terceiro para concorrer à adjudicação.

DESTAQUE

Não é possível que se aplique à licitação entre os pretendentes à adjudicação de bem penhorado as regras relativas ao concurso de credores na hipótese de múltiplos credores com créditos de valores distintos.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O instituto da adjudicação está previsto nos artigos 876 e 877 do CPC, destacando-se como pressupostos para o exercício da faculdade de adjudicar: a) o oferecimento de preço não inferior ao da avaliação; e b) a capacidade para adjudicar.

É possível que haja diversos legitimados na promoção da adjudicação, conforme dispõe o art. 876, §6º, do CPC, hipótese em que se procederá à licitação entre os legitimados pretendentes. Para tanto, é indispensável que haja requerimento do credor ou de terceiro para concorrer à adjudicação.

A licitação entre pretendentes (art. 876 e 877 do CPC) não se confunde com o concurso de preferências (art. 908 e 909 do CC).

O concurso de credores, disciplinado pelos arts. 908 e 909 do CPC, instaura-se na hipótese de disputa sobre o dinheiro arrecadado pela adjudicação do bem a terceiro, ou seja, em relação ao produto da adjudicação, enquanto a licitação entre os pretendentes à adjudicação diz respeito ao bem penhorado.

Não é possível autorizar que o credor que não requereu a adjudicação se aproveite do procedimento adjudicatório com fundamento no concurso de credores e na possibilidade de rateio dos valores, sob pena de antecipação do concurso de credores, o qual se restringe à distribuição do produto da adjudicação.

Na espécie, verifica-se que o recorrente sequer requereu à adjudicação, não havendo razões para anular o feito e aplicar o instituto do concurso de credores sobre o bem propriamente dito. Prevalência do princípio da isonomia entre credores e observância ao procedimento da adjudicação.

quinta-feira, 25 de abril de 2024

"É inválido o instrumento de confissão de dívida cuja origem decorre de valores cedidos em contrato de fomento mercantil (factoring), ainda que o referido instrumento de confissão, assinado pelo devedor e duas testemunhas, tenha força executiva"

 


TERCEIRA TURMA
Processo

REsp 2.106.765-CE, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 12/3/2024, DJe 15/3/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO EMPRESARIAL

Tema

Contrato de fomento mercantil. Factoring. Instrumento particular de confissão de dívida. Invalidade. Ausência de direito de regresso. Risco da atividade mercantil.

DESTAQUE

É inválido o instrumento de confissão de dívida cuja origem decorre de valores cedidos em contrato de fomento mercantil (factoring), ainda que o referido instrumento de confissão, assinado pelo devedor e duas testemunhas, tenha força executiva.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

factoring (faturização ou fomento mercantil) pode ser definido, em linhas gerais, como a operação mercantil por meio da qual determinada empresa (faturizadora) compra os direitos creditórios de outra (faturizada), mediante pagamento antecipado de valor inferior ao montante adquirido. Nessa operação, há assunção de riscos para a empresa faturizadora, isto é, com a transferência do crédito pela faturizada - geralmente manifestado por meio de títulos de crédito -, há o risco de que o montante transferido não seja pago na data do vencimento.

A solvabilidade dos títulos, destarte, consubstancia álea inerente à atividade mercantil desenvolvida. Na hipótese de posterior inadimplência do título transferido, a doutrina leciona que a faturizadora não poderá cobrar a faturizada, porquanto a transferência do crédito, no factoring, realiza-se em caráter pro soluto, sem corresponsabilidade da faturizada, a qual, por sua vez, apenas responde pela existência do crédito no momento da cessão.

Segundo a doutrina, no caso de factoring, não há responsabilidade do endossante ou do cedente, porquanto haveria uma compra do crédito e dos riscos. Ora, havendo a compra dos riscos do faturizado não se pode exigir dele o pagamento do título.

O Superior Tribunal de Justiça compartilha desse entendimento e reforça, em diversos julgados, que a faturizadora não tem direito de regresso contra a faturizada em razão de inadimplemento dos títulos transferidos, visto que tal risco é da essência do contrato de factoring. Como consequência, nos contratos de faturização, são nulas eventuais cláusulas de recompra dos créditos vencidos e de responsabilização da faturizada pela solvência dos valores transferidos (AgInt no REsp n. 2.051.414/SP, Terceira Turma, julgado em 11/12/2023, DJe de 15/12/2023 e AgInt no AREsp n. 2.368.404/ES, Quarta Turma, julgado em 18/9/2023, DJe de 22/9/2023).

Do mesmo modo, a Terceira Turma decidiu pela invalidade das notas promissórias emitidas com o fim de garantir a solvência dos créditos cedidos no bojo de operação de factoring, bem como pela insubsistência de eventual fiança ou aval aposto na cártula garantidora, in verbis: "[...] A natureza do contrato de factoring, diversamente do que se dá no contrato de cessão de crédito puro, não dá margem para que os contratantes, ainda que sob o signo da autonomia de vontades que regem os contratos em geral, estipulem a responsabilidade da cedente (faturizada) pela solvência do devedor/sacado. [...] afigurando-se nulos a disposição contratual nesse sentido e eventuais títulos de créditos emitidos com o fim de garantir a solvência dos créditos cedidos no bojo de operação de factoring, cujo risco é integral e exclusivo da faturizadora" (REsp n. 1.711.412/MG, Terceira Turma, julgado em 4/5/2021, DJe de 10/5/2021).

Nessa linha de raciocínio, deve ser considerado inválido o instrumento de confissão de dívida cuja origem decorre de valores cedidos em contrato de faturização (factoring). Em que pese o instrumento de confissão assinado pelo devedor e duas testemunhas tenha força executiva (art. 784, III, CPC), a origem desse débito corresponde à dívida não sujeita a direito de regresso. Logo, admitir a validade e autorizar a exigibilidade do referido título subverteria a própria lógica do fomento mercantil.

Desse modo, não há que se falar em livre autonomia da vontade das partes para instrumentalizar título executivo a fim de, sob nova roupagem (contrato de confissão de dívida), burlar o entendimento consolidado por esta Corte de Justiça acerca do tema.

terça-feira, 23 de abril de 2024

"Prestação de serviços - Monitoramento de imóvel - Ação de rescisão contratual e indenização por danos materiais por suposta falha no monitoramento e alarme contratados junto à ré"

 


"CONTRATO - Prestação de serviços - Monitoramento de imóvel - Ação de rescisão contratual e indenização por danos materiais por suposta falha no monitoramento e alarme contratados junto à ré - Sentença de parcial procedência - Apelo da ré - Ônus probatório - Aplicação da legislação consumerista à espécie - Não obstante, necessidade de se colacionar elementos mínimos para comprovar a falha de serviços imputada à requerida - Acervo fático-probatório que comprova a invasão do estabelecimento da autora em área abrangida por fotodetectores contratados da ré - Mídia juntada pela requerente que demonstra que o invasor transitou por diversas áreas da loja, permanecendo no estabelecimento por grande período de tempo sem que houvesse o acionamento dos alarmes ou a emissão de sinalização para permitir o início do plano de ação em caso de invasão - Ré que não se desincumbiu do ônus processual em demonstrar o funcionamento adequado dos aparelhos - Falha na prestação dos serviços configurada - Responsabilidade da ré pela rescisão contratual - Restituição das parcelas devida, condicionada à devolução dos equipamentos de segurança, conforme determinado pela sentença - Danos materiais emergentes - Nexo de causalidade direto entre a falha na prestação dos serviços e os danos descritos pela autora - Relação de valores apresentada que se mostra condizente com os prejuízos atestados, ao passo em que a ré não trouxe elementos concretos hábeis a derrogar o valor da indenização material - Danos materiais emergentes mantidos - Sentença mantida - Recurso improvido". (Apelação Cível n. 1006083-56.2022.8.26.0224 - Guarulhos - 32ª Câmara de Direito Privado - Relator: Mary Grün - 14/09/2023 - 31542 - Unânime)

segunda-feira, 22 de abril de 2024

"Responsabilidade civil - Óbito da companheira e genitora dos autores, que realizava frequentemente faxina na residência do réu, a título gratuito - Contato com cerca elétrica de alta tensão instalada no galinheiro"

 


"DANO MORAL - Responsabilidade civil - Óbito da companheira e genitora dos autores, que realizava frequentemente faxina na residência do réu, a título gratuito - Contato com cerca elétrica de alta tensão instalada no galinheiro - Parcial procedência, com condenação do demandado a indenizar os autores em R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), montante a ser dividido entre os três - Irresignação do réu - Alegada excludente de responsabilidade por culpa exclusiva da vítima - Não configuração - Dispositivo instalado sem a devida advertência sobre seus riscos, em lugar acessível e com excesso de carga - Requerido que, na própria defesa, confessou ter esquecido de desligar o ofendículo ao sair para trabalhar - Comprovação da conduta negligente, do dano e do nexo causal (artigo 186 e 927 do Código Civil) aptos a ensejarem a responsabilidade civil - Quantum indenizatório que atende aos ditames da razoabilidade e proporcionalidade, não ensejando o locupletamento ilícito dos requerentes - Perda de ente querido que se encontra entre os bens jurídicos de maior envergadura, não comportando indenização aviltante - Sentença mantida - Recurso improvido". (Apelação Cível n. 1000457-40.2016.8.26.0459 - Pitangueiras - 6ª Câmara de Direito Privado - Relator: Rodolfo Pellizari - 04/09/2023 - 13478 - Unânime)

domingo, 21 de abril de 2024

Indicação de livro: "M&A: regime societário e contratual", de Nelson Eizirik (ed. Quartier Latin)


 "A presente obra apresenta uma análise teórica e prática do regime societário e contratual das operações de M&A. Em sua primeira parte trata das operações de reestruturação societária, disciplinadas na Lei das S.A., no Código Civil, e na regulamentação da C.V.M., quando envolvidas companhias abertas. Assim, expõe, com alguns exemplos hauridos da experiência prática do autor como advogado, parecerista e árbitro, o tratamento jurídico das fusões, cisões, incorporação de sociedade e incorporação de ações, bem como da oferta pública de aquisição de ações, seja a obrigatória, seja a voluntária. Na segunda parte são analisadas as operações de aquisição de participações societárias e de ativos das empresas, com foco no estudo das principais cláusulas utilizadas nos contratos, descrevendo como, quando procedentes do exterior, podem ser adaptadas ao nosso sistema de direito obrigacional. Na terceira parte são apresentados comentários – de natureza mais pessoal – sobre como devem ser interpretadas as operações de reestruturação societária e os contratos de aquisição de ações ou quotas"

https://www.amazon.com.br/Regime-Societ%C3%A1rio-Contratual-Nelson-Eizirik/dp/6555752629


sábado, 20 de abril de 2024

"Danos morais, materiais e estéticos - ... - Queimadura causada por depilação a laser na região das pernas - ... - Autora, ademais, que se dirigiu a parque aquático no dia seguinte ao procedimento, conduta contraindicada em razão da possível exposição ao sol"

 


"RESPONSABILIDADE CIVIL - Danos morais, materiais e estéticos - Prestação de serviços - Queimadura causada por depilação a laser na região das pernas - Recurso interposto pela autora em face de sentença de improcedência - Não acolhimento - Perita que foi categórica ao afirmar que o procedimento foi realizado conforme as práticas usuais e que a autora apresentou complicação inerente ao procedimento, sem sequelas - Autora, ademais, que se dirigiu a parque aquático no dia seguinte ao procedimento, conduta contraindicada em razão da possível exposição ao sol - Falha na prestação de serviços não configurada - Indenização indevida - Precedentes deste Tribunal - Sentença preservada - Recurso improvido. (Apelação Cível n. 1001312-50.2021.8.26.0004 - São Paulo - 3ª Câmara de Direito Privado - Relator: Viviani Nicolau - 06/09/2023 - 42902 - Unânime)

sexta-feira, 19 de abril de 2024

"No caso de descumprimento contratual decorrente do atraso na entrega de imóvel, os lucros cessantes não são presumíveis, pois dependem da finalidade do negócio, destinação ou qualidade do bem (edificado ou não), bem como da demonstração do prejuízo direto do adquirente"

 


QUARTA TURMA
Processo

AgInt no REsp 2.015.374-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Rel. para acórdão Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por maioria, julgado em 2/4/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema
 

Descumprimento contratual. Atraso na entrega de obra de imóvel. Lucros cessantes. Presunção. Impossibilidade. Finalidade do negócio, destinação do bem e prejuízos do comprador. Averiguação. Necessidade.

DESTAQUE

No caso de descumprimento contratual decorrente do atraso na entrega de imóvel, os lucros cessantes não são presumíveis, pois dependem da finalidade do negócio, destinação ou qualidade do bem (edificado ou não), bem como da demonstração do prejuízo direto do adquirente.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A jurisprudência da Segunda Seção do STJ, firmada na sistemática dos recursos repetitivos, é de que, "no caso de descumprimento do prazo para a entrega do imóvel, incluído o período de tolerância, o prejuízo do comprador é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, a ensejar o pagamento de indenização, na forma de aluguel mensal, com base no valor locatício de imóvel assemelhado, com termo final na data da disponibilização da posse direta ao adquirente da unidade autônoma" (REsp n. 1.729.593/SP, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, julgado em 25/9/2019, DJe 27/9/2019).

Quando o atraso se dá na entrega de imóvel edificado, é possível vislumbrar, de antemão, independentemente da destinação do bem - residencial ou comercial - que a injusta privação do seu uso enseja o pagamento de lucros cessantes, pois seja para moradia própria, fixação de estabelecimento comercial ou auferimento de renda advinda da locação do bem, a utilização de parâmetro afeto a aluguel mensal de imóvel assemelhado mostra-se adequada à realidade atinente à qualidade do bem, pois o imóvel edificado está apto a servir a tais propósitos.

A despeito de ocorrer a possibilidade de, eventualmente, em casos específicos, existir lucro cessante decorrente do atraso na entrega das obras de infraestrutura de terreno/lote não edificado, via de regra, é inviável, de plano, consignar tal encargo por presunção de prejuízo para toda e qualquer hipótese envolvendo referidos bens de modo a fazer incidir, ante a injusta privação do seu uso, o pagamento de indenização prontamente estabelecida na forma de aluguel mensal, com base em valor locatício de imóvel assemelhado.

Considera-se imprescindível, para tal fim, averiguar ao menos a finalidade do negócio, a destinação e a qualidade do bem. Ademais, essa Corte tem entendimento pacífico no sentido de que em se tratando de imóvel não edificado, eventual inadimplência do comprador não enseja o pagamento de taxa de fruição justamente em razão de se tratar de terreno sem edificação, ante o princípio de não ter sido utilizado para qualquer fim.

A premissa utilizada para tal compreensão pode ser analogicamente aplicada à questão envolvendo os lucros cessantes, já que, não sendo o terreno edificado, não é dado presumir que fosse utilizado para qualquer finalidade imediata, seja residencial, implementação de negócio, locatícia, entre outros, a autorizar a incidência de parâmetro vinculado a valor de aluguel mensal de bem assemelhado. Isso porque, fora casos muito específicos, não é comum que se proceda à locação de imóvel não edificado em loteamento, visto servirem os terrenos para construção futura de residência, implementação de negócio ou especulação imobiliária.

A realidade posta a debate - vinculada a atraso na entrega de lote/terreno não edificado - demanda que se faça um distinguishing em relação ao entendimento sedimentado em recurso repetitivo - diga-se, específico para descumprimento do prazo de entrega de bem edificado - dada a expressa disposição da lei (arts. 402 e 403) segundo a qual os lucros cessantes representam aquilo que o credor razoavelmente deixou de lucrar, por efeito direto e imediato da inexecução da obrigação pelo devedor.

Ora, caso o terreno servisse ao propósito de edificação futura para implementação de moradia ou negócio, é certo que tal não se daria imediatamente. Do mesmo modo, na hipótese de os lotes terem sido adquiridos para especulação imobiliária, o acréscimo patrimonial não se verificaria de plano, constituindo mera expectativa futura de ganho. Por tais razões, ainda que tenha havido descumprimento contratual decorrente do atraso na entrega do imóvel não edificado, os lucros cessantes não são passíveis de presunção, devendo ser devidamente demonstrados e cotejados para representar aquilo que o adquirente efetivamente deixou de lucrar em virtude do prejuízo direto e imediato do comportamento do devedor, afinal, nos lucros cessantes é imprescindível que se tenha certeza da vantagem perdida.

quinta-feira, 18 de abril de 2024

"A depender do caso concreto, a suspeita de ocorrência da adoção irregular de criança não justifica a sua inserção em abrigo institucional"

 


Processo

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 2/4/2024.

Ramo do Direito

DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Tema
 

Ação de guarda. Adoção intuitu personae. Acolhimento de criança. Burla ao cadastro do sistema nacional de adoção. Inobservância do rito de adoção. Indícios de risco à integridade física e psíquica. Inexistência. Princípio do melhor interesse. Vínculo afetivo com a família substituta. Primazia do acolhimento familiar.

DESTAQUE

A depender do caso concreto, a suspeita de ocorrência da adoção irregular de criança não justifica a sua inserção em abrigo institucional.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Trata-se de ação de guarda consensual provisória, com pedido liminar de tutela provisória de urgência. Os impetrantes queriam regularizar uma situação que já durava nove meses, explicando que assumiram a guarda do menor porque a mãe biológica não estava em condições de cuidar dele devido a problemas de saúde. Eles afirmaram que já tinham uma relação de amizade com a família da mãe antes do nascimento do menor e que o acolheram desde os primeiros dias de vida. Além disso, assinaram um Termo de Responsabilidade perante o Conselho Tutelar, com o consentimento da mãe.

Por expressa previsão constitucional e infraconstitucional, as crianças e os adolescentes têm o direito de ver assegurado pelo Estado e pela sociedade atendimento prioritário do seu melhor interesse e garantida suas proteções integrais, devendo tais premissas orientar o seu aplicador, principalmente, nas situações que envolvam abrigamento institucional.

A jurisprudência deste Tribunal consolidou-se no sentido da primazia do acolhimento familiar em detrimento da colocação de menor em abrigo institucional, salvo quando houver evidente risco concreto à sua integridade física e psíquica, de modo a se preservar os laços afetivos eventualmente configurados com a família substituta.

Segundo a Quarta Turma desta Corte, "A ordem cronológica de preferência das pessoas previamente cadastradas para adoção não tem um caráter absoluto, devendo ceder ao lema do melhor interesse da criança ou do adolescente, razão de ser de todo o sistema de defesa erigido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que tem na doutrina da proteção integral sua pedra basilar" (HC 468.691-SC).

O abrigamento institucional do menor que, aparentemente, está bem inserido em um ambiente familiar, além de ter seus interesses superiores preservados, com formação de suficiente vínculo socioafetivo com os seus guardiões de fato, tem o potencial de acarretar dano grave e de difícil reparação à sua integridade física e psicológica.

quarta-feira, 17 de abril de 2024

"O ato do indivíduo de contratar um seguro sobre a vida de outrem com a intenção de ceifar a vida do segurado impede o recebimento da indenização securitária por quaisquer dos beneficiários e gera nulidade do contrato"

 


TERCEIRA TURMA
Processo

REsp 2.106.786-PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 2/4/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Ação de cobrança. Seguro sobre a vida de outrem. Homicídio do segurado praticado pela contratante do seguro. Nulidade do contrato que impede o recebimento da indenização securitária por quaisquer dos beneficiários.

DESTAQUE

O ato do indivíduo de contratar um seguro sobre a vida de outrem com a intenção de ceifar a vida do segurado impede o recebimento da indenização securitária por quaisquer dos beneficiários e gera nulidade do contrato.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O propósito recursal consiste em definir se, no contrato de seguro sobre a vida de outrem, a morte do segurado causada por ato ilícito do contratante obsta o recebimento da indenização securitária pelos demais beneficiários do seguro. Na espécie, a contratante do seguro ajustou seguro sobre a vida de seu esposo e colocou fim à vida do segurado com a intenção de receber a indenização securitária.

No seguro sobre a vida de outrem, contratante e segurado (titular do interesse garantido) são pessoas distintas. O segurado é o portador do risco de morte, mas não participa da contratação e o contratante é quem celebra o contrato, assume todas as obrigações e adquire a qualidade de beneficiário do seguro, por ser titular do interesse garantido.

O indivíduo que contrata um seguro sobre a vida de outrem com a intenção de ceifar a vida do segurado e, por conseguinte, obter a indenização securitária, além de buscar a garantia de interesse ilegítimo, age, de forma deliberada, com a intenção de prejudicar outrem. A ausência de interesse na preservação da vida do segurado acarreta a nulidade do contrato de seguro por violação ao disposto nos arts. 757, 762 e 790 do CC/02.

Ante a gravidade do vício de nulidade que contamina o contrato de seguro celebrado com a intenção de garantir ato doloso e sem interesse legítimo do contratante, ele não pode produzir qualquer efeito jurídico. Logo, ainda que haja outros beneficiários do seguro além do autor do ato ilícito, eles não receberão a indenização securitária.

terça-feira, 16 de abril de 2024

"A operadora de plano de saúde tem a obrigação de custear o transporte sempre que, por indisponibilidade ou inexistência de prestador no município de demanda, pertencente à área geográfica de abrangência do produto, o beneficiário for obrigado a se deslocar para município não limítrofe àquele para a realização do serviço ou procedimento de saúde contratado"

 

TERCEIRA TURMA
Processo

REsp 2.112.090-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 19/3/2024, DJe 22/3/2024.

Ramo do Direito

DIREITO DO CONSUMIDOR, DIREITO DA SAÚDE

Tema
 

Plano de saúde. Indisponibilidade ou ausência de prestador da rede assistencial no município de demanda. Necessidade de transporte do beneficiário para outro município não limítrofe da mesma região de saúde. Obrigação de custeio do transporte pela operadora.

DESTAQUE

A operadora de plano de saúde tem a obrigação de custear o transporte sempre que, por indisponibilidade ou inexistência de prestador no município de demanda, pertencente à área geográfica de abrangência do produto, o beneficiário for obrigado a se deslocar para município não limítrofe àquele para a realização do serviço ou procedimento de saúde contratado.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O art. 16, X, da Lei n. 9.656/1998, dispõe que, dos contratos, regulamentos ou condições gerais dos planos privados de assistência à saúde devem constar dispositivos que indiquem com clareza, dentre outros, a área geográfica de abrangência, a qual, de acordo com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), corresponde à área em que a operadora fica obrigada a garantir todas as coberturas de assistência à saúde contratadas pelo beneficiário, podendo ser nacional, estadual, grupo de estados, municipal ou grupo de municípios (art. 1º, § 1º, I, da Resolução Normativa n. 259/2011 - atual art. 1º, § 1º, I, da Resolução Normativa n. 566/2022 da ANS).

Por sua vez, o art. 2º da Resolução Normativa n. 259/2011 da ANS (atual art. 2º da Resolução Normativa n. 566/2022 da ANS) acrescenta que a operadora deverá garantir o atendimento integral dessas coberturas no município onde o beneficiário os demandar, desde que seja integrante da área geográfica de abrangência e da área de atuação do produto.

Assim como no SUS (art. 2º, I, Decreto n. 7.508/2011), a saúde suplementar trabalha com o conceito de regiões de saúde (agrupamentos de municípios limítrofes), o qual é dirigido às operadoras com a única finalidade de permitir-lhes integrar a organização, o planejamento e a execução de ações e serviços de saúde que prestam (art. 1º, § 1º, V, da Resolução Normativa n. 259/2011 - atual art. 1º, § 1º, V, da Resolução Normativa n. 566/2022); tal conceito, portanto, não pode ser utilizado como um mecanismo que dificulta o acesso do beneficiário às coberturas de assistência à saúde contratadas.

Não é razoável que o beneficiário seja obrigado a custear o seu deslocamento para receber atendimento fora do município de demanda integrante da área geográfica de abrangência estabelecida no contrato, sobretudo em município que sequer é limítrofe a este, ainda que sejam ambos da mesma região de saúde, especialmente considerando que a distância entre os municípios de uma mesma região de saúde pode ser bastante longa, ainda mais para quem necessita de tratamento médico.

Logo, seguindo a diretriz do art. 4º da Resolução Normativa n. 259/2011 (atual art. 4º da Resolução Normativa n. 566/2022 da ANS), conclui-se que, se, no município de demanda, não houver prestador da rede assistencial apto a realizar o serviço ou o procedimento demandado, caberá à operadora, no prazo regulamentar, garantir o atendimento em: (i) prestador não integrante da rede assistencial no município de demanda; ou (ii) prestador, integrante ou não da rede assistencial, em município limítrofe ao município de demanda; ou (iii) prestador, integrante ou não da rede assistencial, em município não limítrofe ao município de demanda, mas integrante da mesma região de saúde deste, garantindo o transporte - ida e volta - do beneficiário; ou (iv) prestador, integrante ou não da rede assistencial, em município não integrante da região de saúde do município de demanda, garantindo o transporte - ida e volta - do beneficiário.