sábado, 30 de abril de 2022

"Palestra divulgada no youtube Exploração comercial por terceiros Dano moral"

 


Apelação Cível. Direito de Imagem. Palestra dada a instituição de ensino lançada, com a autorização do palestrante, no YouTube. Ré que, anos após, concebe curso de Direito Desportivo e utiliza aquelas imagens em seu material didático, sem autorização do palestrante ou recompensa financeira. Sentença de procedência do pedido. Inconformismo de ambas as partes. 1. Preliminar de incompetência que não merece acolhida. Ação de reparação de danos morais por atos ilícitos cometidos na internet e, portanto, sem local físico definido, que atrai a regra de competência prevista no artigo 53, IV, ¿a¿, do CPC/15, que determina como competente o foro do lugar do ato ou fato, que não necessariamente coincide com o local da sede do réu. 2. Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ante a manifesta inexistência de relação consumerista entre as partes. Ilícito porventura existente que deve ser apreciado à luz das regras de responsabilidade civil. 3. A veiculação de vídeos na internet traduz evidente ato de publicidade, no sentido de a todos permitir a sua visualização, mas não equivale à transferência do conteúdo para o domínio público, como a permitir sua livre exploração comercial por terceiros. 4. A inclusão de palestras alheias em material didático, ainda que públicas, importa, portanto, em ilícita apropriação econômica da imagem alheia. 5. Extensão do dano moral que deve ser proporcional à publicidade e ao destaque dados à imagem alheia. 6. Circunstâncias do caso que justificam a redução da indenização fixada para R$ 20.000,00. 7. Recurso da ré parcialmente provido para reduzir o dano moral e apelo adesivo do autor prejudicado.

 

 

0042671-45.2019.8.19.0203 – Apelação - Décima Sexta Câmara Cível - Des(a). Eduardo Gusmao Alves De Brito Neto - Julg: 08/03/2022 - Data de Publicação: 11/03/2022

sexta-feira, 29 de abril de 2022

"Seguro-saúde Tratamento psiquiátrico Internação em clínica específica Exclusão contratual Abusividade Direito ao reembolso das despesas efetuadas Dano moral in re ipsa"

 


Apelação cível. Relação de consumo. Seguro saúde. Paciente, menor incapaz pela idade, portadora de transtornos psiquiátricos. Indicação médica de internação em clínica específica por ser a única capaz de atender as especificidades do quadro. Ré que não comprova possuir, em sua rede, estabelecimento capaz de fornecer o tratamento adequado. Exclusão contratual de tratamento psiquiátrico que não se sustenta ante a determinação, pela Resolução CONSU N° 11/1998 no sentido de que as operadoras de plano de saúde e seguros privados de assistência à saúde são obrigados ao tratamento de todos os transtornos psiquiátricos com CID-10. se o plano de saude contratado possui cobertura para dada patologia, não pode se recusar a autorizar o tratamento recomendado por médico assistente, a quem cabe decidir sobre o melhor meio terapêutico para seu paciente. cláusula que exclui ou limita a cobertura que se revela abusiva, devendo ser afastada. jurisprudência. súmulas 340 e 338, do TJERJ. Resoluções da Anvisa e da ANS não podem se sobrepor às normas contidas em leis, como as nº 9.656/98 e nº 8.078/90, tampouco às constitucionais, que garantem o direito à vida e à saúde. reembolso das despesas que, entretanto, deve se dar nos limites impostos pelo contrato. danos morais in re ipsa. (S. 209 e 339/TJRJ). valor fixado (R$ 8.000,00) que se mostra razoável e proporcional às circunstâncias do caso concreto. Recurso conhecido e parcialmente provido.

0073314-39.2021.8.19.0001 – Apelação - Nona Câmara Cível - Des(a). Daniela Brandão Ferreira - julg: 22/02/2022 - data de publicação: 24/02/2022


quinta-feira, 28 de abril de 2022

"Ação de alimentos Filho maior Coobrigados Chamamento ao processo Faculdade do autor Litisconsórcio facultativo ulterior simples"

 


Direito civil. Família. Ação de alimentos. Filha maior. Ação ajuizada em face do genitor. Decisão que defere o chamamento ao processo da genitora. Irresignação da autora. Provimento. A obrigação alimentar é de responsabilidade dos pais, e ambos têm o dever legal de sustento da prole, na forma do disposto no art. 1.566, iv do CC/02, devendo cada qual contribuir para a manutenção dos filhos na medida dos seus recursos, conforme preceitua o art. 1.703 do CC/02. "se cabe ao autor indicar, na petição inicial, em face de quem pretende obter os alimentos, é correto concluir que ao autor da ação - credor dos alimentos - deve ser franqueada a possibilidade de, se quiser, provocar a integração do polo passivo prevista no art. 1.698 do CC/2002" (Resp 1715438/RS, rel. Ministra Nancy Andrighi, terceira turma, julgado em 13/11/2018, DJE 21/11/2018). A autora possui plena capacidade processual e pode livremente escolher quem serão os coobrigados que responderão à ação de alimentos. Não é crível impor à parte autora a obrigação de litigar com quem excluiu do polo passivo. A consequência da opção de não chamar todos os coobrigados para compor a lide, é a concordância tácita com os alimentos que puderem ser prestados apenas pelo coobrigado em face de que decidiu demandar, ainda que o valor seja aquém do requerido. A inclusão de todos os coobrigados no polo passivo é faculdade da autora, em razão de que a natureza jurídica da regra do art. 1.698 do CC/02 é de litisconsórcio facultativo ulterior simples. Entendimento do e. Superior tribunal de justiça acerca do tema e deste E. Tribunal de justiça. Reforma da decisão. Provimento do recurso.

0015736-24.2021.8.19.0000 - Agravo de Instrumento - Décima Quarta Câmara Cível - Des(a). Cleber Ghelfenstein - Julg: 24/03/2022 - Data de Publicação: 25/03/2022


quarta-feira, 27 de abril de 2022

"Transferência de conta-corrente para outra agência Ausência de comunicação Acesso à conta Impossibilidade Falha na prestação do serviço Dano moral"

 


Apelações cíveis. Direito do consumidor. Ação de indenização por danos materiais e morais. Transferência de agência da conta corrente sem prévia comunicação. Consumidora que ficou sem acesso ao dinheiro disponível na sua conta corrente. Falha na prestação do serviço. Sentença de parcial procedência. Apelo da instituição financeira e da autora. A demandante comprovou que em 26/10/2020 descobriu que o saldo de sua conta original estava zerado quando tomou ciência do encerramento da conta antiga e da abertura de nova conta pela instituição financeira. Entretanto, os problemas de acesso à conta persistiram sem que o antigo cartão de débito tivesse acesso à nova conta como informado pela gerente, o que somente foi solucionado depois de 07/01/2021, quando a autora recebeu o novo cartão de débito. Não há prova de que o Banco réu tenha comunicado previamente à autora a mudança da sua conta nem a data de entrega do novo cartão à consumidora, sendo certo que em 04/11/2020 foi enviado um e-mail pela gerente do Banco à autora comunicando os dados bancários para acesso via aplicativo de celular e informado que a migração da conta teria ocorrido em 24/10/2020. Importa registrar que os extratos de apresentados pela autora comprovam que a última movimentação financeira na sua conta antiga se deu em 23/10/2020 e na nova conta em 07/01/2021, o que corrobora a alegação de falha no cartão de débito, bem como as diversas ligações para reclamações comprovadas pela autora junto ao réu. Caracteriza litigância de má-fé a alteração da verdade dos fatos, na forma do artigo 80, II, do Código de Processo Civil, consistente na afirmação intencional e sabidamente inverídica em tentativa deliberada de induzir o magistrado a erro. Instituição financeira que apresentou tela de movimentação financeira propositalmente com as datas das movimentações cortadas, com o argumento de que houve movimentação de valores disponíveis na nova conta com o cartão da autora ainda durante o ano de 2020, quando na realidade aquelas entradas eram referentes ao período de 23/10/2020 no qual a autora ainda possuía acesso à antiga conta bancária e foram migrados para os dados da nova conta após a incorporação da agência em 24/10/2020 e de 26/10/2020 quando a autora precisou ir pessoalmente à agência e descobriu a migração das contas. Atuar do réu incompatível com a boa-fé e lealdade, que configura litigância de má-fé. Dano moral configurado pela falha na prestação de serviços. A indenização a título de dano moral deve ser fixada em conformidade com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, razão por que o quantum fixado em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) não comporta a majoração pretendida, de acordo com o disposto no verbete sumular 343 deste Tribunal: a verba indenizatória do dano moral somente será modificada se não atendidos pela sentença os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na fixação do valor da condenação. Recurso da autora conhecido e parcialmente provido para condenar o banco réu pela litigância de má-fé, por alterar a verdade dos fatos, à multa processual correspondente a 2% (dois por cento) do valor da causa devidamente atualizado e corrigido, na forma do artigo 80, II c/c 81 do Código de Processo Civil. Recurso do réu conhecido e desprovido.

0227073-57.2020.8.19.0001 - Apelação - Décima Sétima Câmara Cível - Des(a). Cezar Augusto Rodrigues Costa - Julg: 08/03/2022 - Data de Publicação: 11/03/2022


terça-feira, 26 de abril de 2022

"Programa de televisão Exibição de imagem Ausência de autorização Imagem difundida na internet Desimportância Dano moral"

 


Apelação cível. Direito civil. Ação indenizatória. Imagem da autora exibida em programa de televisão, sem autorização, com referências maliciosas dos apresentadores à pessoa retratada. Sentença de procedência parcial. Irresignação da parte ré. Vídeo do referido programa que demonstra a exibição não autorizada da imagem da autora e o uso de palavras maliciosas para se referir à pessoa retratada. Disponibilidade da figura em diversos sítios eletrônicos não autoriza a veiculação no programa de TV. Dever da emissora de verificar a procedência das imagens recebidas antes de exibi-las na programação. Desnecessidade de tentativa amigável de resolução da controvérsia antes da judicialização da demanda. Dano moral caracterizado e mantido. Recurso desprovido.

0018522-56.2017.8.19.0008 - Apelação - Segunda Câmara Cível - Des(a). Elisabete Filizzola Assunção - julg: 14/03/2022 - data de Publicação: 17/03/2022


segunda-feira, 25 de abril de 2022

"Hospital municipal Recusa de atendimento Parto em via pública Responsabilidade objetiva Dano moral in re ipsa"

 


Apelação cível. Direito administrativo. Responsabilidade civil. Município de rio das ostras. Hospital da rede pública. Recusa atendimento médico. Parto em via pública. Demanda visando a condenação do réu ao pagamento de danos morais no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais). Sentença procedência, condenando a ré ao pagamento de compensação pelo dano moral no valor de R$15.000,00 (quinze mil reais) e honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação. Recorre o réu, postulando a reforma integral da sentença para que sejam julgados improcedentes os pedidos iniciais, por ausência de prova da suposta negativa de atendimento; ausência de nexo de causalidade e inocorrência de danos morais. Subsidiariamente, requer a minoração do quantum indenizatório e dos honorários advocatícios recurso que não merece prosperar. A responsabilidade civil do réu apelado, pessoa jurídica de direito público, é objetiva. Teoria do risco administrativo (artigo 37, § 6º, da Constituição Federal). demandante que deve comprovar a conduta, o nexo causal e o dano, aspectos que, de fato, restaram suficientemente demonstrados. termo circunstanciado e prova testemunhal. elementos colacionados aos autos que conferem verossimilhança ao alegado nexo de causalidade entre a recusa de atendimento no hospital da rede pública e a ocorrência do parto no interior de veículo, não tendo havido conduta médica adequada. parte ré a quem caberia comprovar causa de rompimento desse nexo, mas assim, não procedeu, deixando o município de produzir qualquer prova que demonstrasse o acerto do atendimento médico dado à autora. dano moral in re ipsa. verba indenizatória arbitrada em R$15.000,00 (quinze mil reais), que de adequa à situação narrada e aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Precedente. Súmula 343 do TJRJ. Impossibilidade de minoração dos honorários advocatícios, tendo em vista que estes já foram fixados no percentual mínimo previsto no art. 85, §3º, I do CPC. Desprovimento do recurso. Majoração dos honorários advocatícios para 12% (doze por cento) sobre o valor da condenação, na forma do art.85, §11, do CPC.

0011061-13.2018.8.19.0068 - APELAÇÃO - Vigésima Terceira câmara Cível - Des(a). Cintia Santarem Cardinali - julg: 08/03/2022 - data de publicação: 14/03/2022

domingo, 24 de abril de 2022

Indicação de livro: "20 anos do Código Civil: perspectivas presentes e futuras", coordenado por Heloísa Helena Barboza



“Em tempos ainda de pandemia, algumas boas novas merecem ser enaltecidas e divulgadas à comunidade acadêmica e científica de maneira geral. Com esse espírito foi concebido o projeto da presente obra coletiva '20 anos do Código Civil: perspectivas presentes e futuras'. Todo marco normativo, do porte do código civil, merece especial atenção em virtude da proposta de sistematização e permanência das normas nele contidas. Em 10 de janeiro de 2022 foi celebrado o vigésimo ano da sanção do código civil brasileiro em vigor. O Código Civil de 1916 foi representativo da racionalização dos interesses básicos de uma sociedade patriarcal que não deixara de lado sua vocação privatista, nem se libertara do arcabouço econômico. Com orientação distinta, o código civil de 2002 buscou formular suas normas com base nos princípios da eticidade, da socialidade e da operabilidade”

http://mail.editoraprocesso.com.br/obras/20-anos-do-codigo-civil--perspectiva-presentes-e-futuras/174 

sábado, 23 de abril de 2022

"Plano de saúde Câncer de próstata Pessoa idosa Cirurgia por videolaparoscopia Procedimento menos invasivo Recusa indevida Dano moral"

 


Apelação cível. Relação de consumo. Ação indenizatória. Contrato de plano de saúde. Negativa de autorização. Procedimento cirúrgico. Autor diagnosticado com adenocarcinoma localizado na próstata. Indicação médica para a realização de procedimento cirúrgico por videolaparoscopia, em razão da idade avançada do paciente. Procedimento menos invasivo. Recusa do plano sob o argumento de não estar contemplado no rol de procedimentos estabelecidos pela agência nacional de saúde suplementar - ans. Recusa indevida. Falha na prestação de serviço. Cabe ao médico assistente, e não ao plano de saúde, decidir qual o melhor tratamento ou técnica cirúrgica mais adequada. Súmula 211 tjerj. Abusividade manifesta da negativa de cobertura. Rol da ans não é de enumeração taxativa. Precedentes desta corte. Jurisprudência dominante no stj. A cobertura do plano diz respeito às doenças e não ao tipo de tratamento. Danos morais configurados. Quantum indenizatório fixado em R$ 10.000,00 que se encontra dentro dos limites da razoabilidade e proporcionalidade. Negado provimento ao recurso.


0050335-20.2020.8.19.0001 - Apelação

Décima Terceira Câmara Cível

Des(a). Valéria Dacheux Nascimento - Julg: 17/02/2022 - Data de Publicação: 22/02/2022


sexta-feira, 22 de abril de 2022

"Programa de televisão Uso indevido de voz Direito personalíssimo Prova de eventual prejuízo Desnecessidade Danos moral e material"

 


Apelação cível. Direito civil. Direitos da personalidade. Uso indevido de voz. Comercialização e utilização pela ré. Prova pericial que concluiu que a voz utilizada no programa televisivo era da autora. Sentença que julgou procedente os pedidos autorais, para condenar o réu a indenizar a autora pelos danos patrimoniais decorrente do uso indevido de sua voz, bem como pelos danos morais no montante de R$ 15.000,00. Irresignação do réu. Em suas razões recursais alega que a prova pericial não pode ser considerada legítima, bem como que a autorização para utilização da voz não era necessária, pois a gravação era dirigida ao público e de amplo acesso a todos, alega ainda que o dano moral não é devido e se revela desproporcional. Entendimento firmado pelo STJ que a voz humana encontra proteção nos direitos da personalidade, seja como direito autônomo ou como parte integrante do direito à imagem ou do direito à identidade pessoal. Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada da imagem de pessoa, com fins exclusivamente econômicos e publicitários, ainda que se trate de pessoa pública. Inteligência da súmula 403 do STJ. Em que pese ser plenamente possível e válido o negócio jurídico que tenha por objeto gravação de voz, no caso em comento, não houve qualquer autorização por parte da apelada. Verba indenizatória que somente será modificada se não atendidos na sentença os critérios da proporcionalidade e da razoabilidade. Inteligência da súmula 343 do TJRJ. Recurso conhecido, negado provimento para manter sentença tal qual lançada.

 

 

0150733-29.2007.8.19.0001 - Apelação

Décima Quarta Câmara Cível

Des(a). Nadia Maria de Souza Freijanes - Julg: 10/02/2022 - Data de Publicação: 11/02/2022


quinta-feira, 21 de abril de 2022

"Empresa brasileira de correios e telégrafos Contrato de saúde coletivo Falecimento do titular Cancelamento de plano Violação dos princípios da boa-fé e da confiança Dano moral"

 


Apelação cível. Contrato de saúde coletivo destinado aos empregados da Empresa Brasileira de Correios - ECT. Contrato em sistema de autogestão mantido mediante pagamento de contribuição mensal dos associados. Falecimento do titular. Cancelamento unilateral do plano 180 dias após a data do óbito em prejuízo de sua viúva, que figurava como dependente do contrato. Aplicação por analogia dos artigos 30, § 1º e 31, § 2º da Lei 9.656/98 e Súmula Normativa 13 da ANS. Cancelamento que desvirtua o próprio aspecto teleológico do contrato, pautado na segurança e na estabilidade. Violação dos princípios da boa-fé objetiva e da confiança. Correta a sentença que determina a manutenção da dependente no plano arcando, integralmente, com a sua prestação após o período de remissão. Precedentes jurisprudenciais. Pessoa idosa, portadora de patologia a necessitar de tratamento médico contínuo, objetivamente prejudicado com o cancelamento. Dano moral configurado. Reparação fixada em consideração aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Enunciado nº 343, da Súmula do TJRJ. Precedentes jurisprudenciais. Manutenção da sentença. Desprovimento do recurso.

 

 

0020973-49.2020.8.19.0202 - Apelação

Décima Oitava Câmara Cível

Des(a). Margaret de Olivaes Valle dos Santos - Julg: 23/02/2022 - Data de Publicação: 24/02/2022


quarta-feira, 20 de abril de 2022

"Exame para diagnóstico de covid-19 Coleta de material Falha na prestação do serviço Quebra da confiança Desvio produtivo do consumidor Restituição do valor pago Majoração do dano moral"

 


Apelação cível. Ação indenizatória. Falha na prestação do serviço de coleta de material para exame de covid-19. Perda da confiança. Cancelamento e recusa em restituir o preço adiantado. Desvio produtivo. Majoração da indenização arbitrada. A demandante-recorrente se insurgiu contra o capítulo de sentença que arbitrou em R$ 1.000,00 (mil reais) o dano moral suportado decorrente da falha na prestação do serviço de coleta e exame de detecção do COVID-19. Para tanto, argumentou que a coleta de material insuficiente para a realização do diagnóstico pelos prepostos da ré-apelada, a perda da confiança no serviço ofertado, a procura de outro laboratório para a realização do exame que tinha caráter urgente e a resistência da demandada-recorrida em devolver o dinheiro caracterizaram desvio produtivo de grave proporção, apto a fundamentar a fixação de valor compensatório superior àquele alcançado pelo d. magistrado. Quantum reparatório. Critérios de arbitramento equitativo pelo juiz. Método bifásico. Valorização do interesse jurídico lesado e das circunstâncias do caso concreto. Indenização que merece ser majorada para R$5.000,00. Precedentes. Provimento do recurso.

 

 

0014690-10.2020.8.19.0202 - Apelação

Décima Segunda Câmara Cível

Des(a). Alcides da Fonseca Neto - Julg: 17/02/2022 - Data de Publicação: 21/02/2022


terça-feira, 19 de abril de 2022

"Alimento impróprio para consumo Larvas de insetos Ingestão do produto Desnecessidade Risco de lesão à saúde Dano moral in re ipsa"

 


Apelação cível. Relação de consumo. Ação indenizatória. Alimento impróprio para consumo. Torradas Multi Grãos. Produto dentro da validade. Corpo estranho dentro do produto retirado da embalagem, após a compra, este que foi consumido pela apelante. Larvas de inseto. Sentença de improcedência. Violação ao dever de segurança e qualidade. Prova testemunhal que confirma os fatos alegados pela autora. Laudo de Exame de Material pelo ICCE que constata a impropriedade do alimento pela presença de pupário, indicando que as larvas já teriam se transformado em insetos adultos, concluindo-se que todas as fases evolutivas do inseto foram completadas dentro do pacote de torradas. Responsabilidade objetiva pelo fato do produto dos integrantes do seu ciclo produtivo-distributivo (art. 12 CDC). Dano e nexo causal. Ônus do fornecedor em provar que o defeito não existe, encargo do qual não se desincumbiu. Pedido de danos morais que não se baseia em doença contraída pelo consumo da larva encontrada no produto, e sim pela ingestão do corpo estranho. Inaplicabilidade da Súmula 383 TJRJ. Jurisprudência consolidada do STJ que entende que, mesmo na hipótese de não haver ingestão (esta que, nestes autos, aconteceu), a mera compra de produto impróprio para o consumo expõe o consumidor a risco de lesão à sua saúde. Dano moral que se caracteriza in re ipsa. Sensação de náusea, asco e repugnância que acomete quem é surpreendido com o alimento nessas condições, afetando a incolumidade físico-psíquica. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (art. 1º, III CF/88). Quantia indenizatória fixada em R$ 5.000,00 Razoabilidade. Precedentes. Provimento do recurso. Inversão da sucumbência.

 

 

0126014-02.2015.8.19.0001 - Apelação

Quinta Câmara Cível

Des(a). Cristina Tereza Gaulia - Julg: 30/11/2021 - Data de Publicação: 01/12/2021


segunda-feira, 18 de abril de 2022

"Inadimplência Cancelamento do contrato Cláusula abusiva Não pagamento pelo sinistro Dano moral in re ipsa"

 


Apelação cível. Relação de consumo. Cobrança de indenização securitária. Contrato de proteção veicular. Veículo roubado. Recusa do pagamento da indenização sob alegação de inadimplência. Cláusula contratual que autoriza o cancelamento do contrato após a inadimplência superior a cinco dias, sem a prévia comunicação ao segurado, é abusiva. Verbete nº 616 da súmula do colendo superior tribunal de justiça. Precedentes deste egrégio tribunal de justiça do estado do Rio de Janeiro. Dano moral configurado in re ipsa. Indenização do dano moral fixada na quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), de acordo com os parâmetros impostos pelos princípios da razoabilidade e da vedação ao enriquecimento sem causa. Veículo alienado fiduciariamente e em nome de terceiro. Impossibilidade de pagamento integral da indenização enquanto não for quitado o financiamento e apresentado o recibo de transferência do veículo em favor da empresa ré. Pagamento que deverá ser limitado à diferença entre a indenização integral e o valor a ser quitado junto à financeira. Sentença que se reforma, em parte. Recurso a que se dá parcial provimento.

0299028-51.2020.8.19.0001 - Apelação

Oitava Câmara Cível

Des(a). Augusto Alves Moreira Junior - julg: 08/02/2022 - data de publicação: 14/02/2022


domingo, 17 de abril de 2022

Indicação de livro: "Pós-constitucionalização do direito civil", coordenado por Paulo Nalin, Lygia Maria Copi e Vitor Ottoboni Pavan

 


"A constitucionalização do direito civil ganhou força no Brasil principalmente após a promulgação da Constituição de 1988. O Direito Civil construído no século XX precisava se amoldar aos valores da Constituição Cidadã, principalmente ao seu vértice axiológico: a pessoa humana e sua dignidade. No transcorrer de mais de três décadas a metodologia se consolidou, sem descuidar dos necessários avanços em razão das transformações sociais, tecnológicas e econômicas. A constituição em sua dimensão prospectiva nos desafia a promover uma construção hermenêutica do direito civil no ordenamento jurídico constitucional que reverta em benefício das pessoas e de suas relações coexistenciais, promovendo autonomia, liberdade, dignidade, redução das desigualdades e desenvolvimento pessoal. A obra aborda justamente a consolidação de um direito civil na legalidade constitucional e suas perspectivas para o porvir, tendo em vistas as tensões entre os diversos valores constitucionais e apontando para um estado já posterior à constitucionalização do direito civil, isto é, que não a supera, mas a complementa conforme as demandas sociais emergentes. Com abordagem voltada à teoria geral, aos direitos da personalidade, aos contratos, à responsabilidade civil, à propriedade, às famílias, às sucessões e ao processo civil, o livro oferece uma visão panorâmica e atual do Direito Civil, sensível às necessidades dos seus destinatários finais: as pessoas e suas relações"

https://editorathoth.com.br/produto/posconstitucionalizacao-do-direito-civil/426

sábado, 16 de abril de 2022

"O seguro de vida não pode ser instituído por pessoa casada em benefício de parceiro em relação concubinária"

 


QUARTA TURMA
Processo

REsp 1.391.954 - RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por maioria, julgado em 22/03/2022.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL


Tema

Seguro de vida. Instituidor casado não separado de fato ou judicialmente. Concubina beneficiária. Impossibilidade. Expressa vedação legal. Art. 793 do CC/2002.

DESTAQUE

O seguro de vida não pode ser instituído por pessoa casada em benefício de parceiro em relação concubinária.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A controvérsia está em analisar a adequação à lei civil de contrato seguro de vida, em que indicada como beneficiária parceira em relação concubinária mantida concomitantemente a matrimônio válido, sem que houvesse separação judicial ou de fato.

Na vigência do Código Civil de 1916, a partir da interpretação conjunta dos arts 1.177 e 1.474, consolidou-se a jurisprudência no sentido de vedar a indicação de concubina com beneficiária de seguro de vida de homem casado e não separado de fato ou judicialmente, em razão de estar ela legalmente impedida de receber doação do segurado.

Com a vigência do Código Civil de 2002, a regra do art. 1.177 foi literalmente reproduzida no art. 550, sendo certo, de outra parte, que o art. 793 do novo Código explicitou a impossibilidade de a concubina ser beneficiária de seguro de vida instituído por homem casado e não separado de fato ou judicialmente.

Diante disso, permanece íntegra a orientação do STJ firmada com base no Código de 1916, e positivada no art. 793 do Código em vigor, inspirada na proteção do ordenamento jurídico ao casamento e à união estável.

Esse entendimento se harmoniza com o recente julgamento pelo STF do RE 1.045.273/SE, com repercussão geral reconhecida, no qual foi estabelecida a seguinte tese: "A preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1723, § 1º, do Código Civil, impede o reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins previdenciários, em virtude da consagração do dever de fidelidade e da monogamia pelo ordenamento jurídico-constitucional brasileiro".

Não sendo válida a designação da concubina (primeira beneficiária), a indenização deve ser paga respeitando a indicação alternativa feita pelo falecido segurado para a hipótese de não prevalecer a primeira beneficiária, no caso, o filho oriundo do relacionamento (segundo beneficiário), ao qual não se estende a vedação do art. 793 do Código Civil.

sexta-feira, 15 de abril de 2022

"A atribuição dinâmica do ônus probatório acerca da realização de acessões/benfeitorias em imóvel de propriedade do cônjuge varão, objeto de eventual partilha em ação de divórcio, pode afastar a presunção do art. 1.253 do Código Civil de 2002"

 


Processo

Processo sob segredo judicial, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 29/03/2022, DJe 31/03/2022.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema

Bem imóvel. Presunção legal juris tantum de realização acessões/benfeitorias pelo cônjuge varão. Interrupção da união conjugal. Comunhão parcial de bens. Deslocamento do ônus probatório. Teoria da carga dinâmica.

DESTAQUE

A atribuição dinâmica do ônus probatório acerca da realização de acessões/benfeitorias em imóvel de propriedade do cônjuge varão, objeto de eventual partilha em ação de divórcio, pode afastar a presunção do art. 1.253 do Código Civil de 2002.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Cinge-se a controvérsia a definir se a atribuição dinâmica do ônus probatório acerca da realização de acessões/benfeitorias em imóvel de propriedade do cônjuge varão, objeto de eventual partilha em ação de divórcio, pode afastar a presunção do art. 1.253 do Código Civil de 2002.

Referida presunção pertence à categoria de presunções relativas (juris tantum) e, por isso, pode ser elidida por prova em contrário, sobretudo diante da relevância da dimensão temporal da prova relativa para a análise do caso concreto. Assim, é fundamental definir se as acessões/benfeitorias são realizadas em períodos coincidentes com a relação matrimonial, hipótese em que esses bens deveriam ser partilhados. Ademais, a presunção presente no direito das coisas deve ceder lugar a outra presunção legal muito cara ao direito de família, constante do art. 1.660, I e IV, do CC/2002, segundo a qual se presume o esforço comum dos cônjuges na aquisição dos bens realizada na constância da relação matrimonial sob o regime da comunhão parcial, situação em que os respectivos bens devem ser partilhados.

Para dar concretude ao princípio da persuasão racional do juiz, insculpido no art. 371 do CPC/2015, aliado aos postulados de boa-fé, de cooperação, de lealdade e de paridade de armas previstos no novo diploma processual civil (arts. 5º, 6º, 7º, 77, I e II, e 378 do CPC/2015), com vistas a proporcionar uma decisão de mérito justa e efetiva, que foi introduzida a faculdade de o juiz, no exercício dos poderes instrutórios que lhe competem (art. 370 do CPC/2015), atribuir o ônus da prova de modo diverso entre os sujeitos do processo quando diante de situações peculiares (art. 371, § 1º, do CPC/2015). A instrumentalização dessa faculdade foi denominada pela doutrina processual teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova ou teoria da carga dinâmica do ônus da prova.

Desse modo, é indiferente procurar saber simplesmente quem teria realizado as construções ou edificações no imóvel objeto do litígio, mas é imprescindível definir em que momento elas teriam sido realizadas, se na constância ou não da união conjugal, mostrando-se mais adequado carrear a produção dessa prova para quem é o (co)proprietário do imóvel.

Em conclusão, a participação do cônjuge varão como coproprietário do imóvel em cujas acessões/benfeitorias foram realizadas faz presumir também o esforço comum do cônjuge virago na sua realização (art. 1.660, I e IV, do CC/2002), além de que ocorreram interrupções no vínculo matrimonial, são peculiaridades que autorizam a dinamização do ônus probatório para o recorrente (art. 371, § 1º, do CPC/2015). Definir se elas foram realizadas na constância do vínculo conjugal ou não vai proporcionar ao magistrado a segurança jurídica necessária para deliberar se devem compor ou não o acervo patrimonial a ser partilhado na ação de divórcio.

quinta-feira, 14 de abril de 2022

"A cessão, pelo arrendatário do imóvel, de posição contratual ou de direitos decorrentes de contrato de arrendamento residencial no âmbito do PAR, somente será válida se forem cumpridos os seguintes requisitos: I) atendimento, pelo novo arrendatário, dos critérios para ingresso no PAR; II) respeito de eventual fila para ingresso no PAR; e III) consentimento prévio pela Caixa Econômica Federal, na condição de agente operadora do Programa"

 


Processo

REsp 1.950.000-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/03/2022, DJe 25/03/2022.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL


Tema

Programa de arrendamento residencial (PAR). Cessão de posição contratual pelo arrendatário. Possibilidade. Requisitos de validade. Flexibilização dos critérios pela CEF. Impossibilidade.

DESTAQUE

A cessão, pelo arrendatário do imóvel, de posição contratual ou de direitos decorrentes de contrato de arrendamento residencial no âmbito do PAR, somente será válida se forem cumpridos os seguintes requisitos: I) atendimento, pelo novo arrendatário, dos critérios para ingresso no PAR; II) respeito de eventual fila para ingresso no PAR; e III) consentimento prévio pela Caixa Econômica Federal, na condição de agente operadora do Programa.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O Programa de Arrendamento Residencial (PAR) foi instituído pela Lei n. 10.188/2001 "para atendimento da necessidade de moradia da população de baixa renda, sob a forma de arrendamento residencial com opção de compra", cabendo a gestão do Programa ao Ministério das Cidades (hoje incorporado ao Ministério do Desenvolvimento Regional) e a sua operacionalização à Caixa Econômica Federal, conforme o art. 1º da referida lei.

A cessão, pelo arrendatário (art. 1º, caput) do imóvel, de posição contratual ou de direitos decorrentes de contrato de arrendamento residencial no âmbito do PAR não é prevista no art. 1º, § 3º, contudo, não é proibida pelo art. 8º, § 1º, todos da Lei nº 10.188/2001, porquanto o primeiro dispõe sobre a destinação a ser dada pela Caixa Econômica Federal aos imóveis adquiridos no âmbito do PAR e o segundo impõe vedações temporárias apenas àquele que adquire o imóvel objeto do PAR pelo processo de desimobilização.

Cuida-se, assim, de hipótese não vedada expressamente pela Lei nº 10.188/2001, razão pela qual sua legalidade deve ser analisada mediante os princípios e a finalidades do PAR, bem como por eventuais normas do Código Civil aplicáveis à espécie e que atentem ao PAR

O art. 425 do Código Civil autoriza a estipulação de contratos atípicos e a possibilidade de um dos contratantes ceder sua posição contratual a outro está, ainda, relacionada à função social do contrato (art. 421 do CC), porquanto permite, por exemplo, que o devedor evite a inadimplência, repassando a obrigação para terceiro interessado no negócio jurídico e com capacidade financeira para adimpli-la, satisfazendo, inclusive, o interesse do credor.

Ademais, nos termos do art. 10 da Lei nº 10.188/2001, "aplica-se ao arrendamento residencial, no que couber, a legislação pertinente ao arrendamento mercantil".

No âmbito do PAR, a cessão de posição contratual também exerce importante função social, tendo em vista que pode evitar que o beneficiário original do Programa saia prejudicado, caso não consiga mais pagar as parcelas referentes ao arrendamento.

É necessário o respeito a eventual fila para ingresso no PAR, sob pena de inviabilizar o andamento normal do Programa, ao permitir que terceiros sejam beneficiados antes daqueles que aguardavam a disponibilidade de um imóvel para iniciarem o arrendamento residencial.

Ademais, o art. 6º, parágrafo único, da Lei nº 10.188/2001 prevê expressamente que "para os fins desta Lei, considera-se arrendatária a pessoa física que, atendidos os requisitos estabelecidos pelo Ministério das Cidades, seja habilitada pela CEF ao arrendamento".

Logo, diferentemente da regra geral aplicável ao arrendamento mercantil (em que o consentimento pode ocorrer a qualquer tempo), é fundamental, no caso de cessão de posição contratual em relação ao PAR, que o consentimento seja prévio.

quarta-feira, 13 de abril de 2022

"A condição resolutiva de doação verbal estabelecida entre pai e filho e desconhecida por terceiros não produz efeitos jurídicos contra estes"

 


Processo

REsp 1.905.612-MA, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por maioria, julgado em 29/03/2022.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL


Tema

Doação entre pai e filho. Cláusula resolutiva. Contrato verbal. Força obrigatória. Partes anuentes.

DESTAQUE

A condição resolutiva de doação verbal estabelecida entre pai e filho e desconhecida por terceiros não produz efeitos jurídicos contra estes.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Na hipótese, a doação foi formalizada por meio de um documento impróprio, em que o doador retirou-se de uma sociedade limitada e declarou "nada ter a receber dela ou dos seus sócios, pelo que dá a todos eles plena, geral e irrevogável quitação", não tendo constado desse documento a cláusula resolutiva invocada.

Optou o doador por deixar a empresa e, no mesmo instrumento, formalizar o ato de doação de sua participação societária para o seu filho, que passou a integrar a aludida sociedade limitada na proporção do capital social doado.

Como é sabido, a doação é um negócio jurídico benéfico, e como tal, de acordo com o disposto no art. 114 do Código Civil, deve ser objeto de interpretação restritiva.

Postos tais parâmetros, extrai-se, em primeiro lugar, que a doação formalizada em um instrumento de alteração de contrato social não corresponde à prática costumeira, haja vista a lei exigir a escrituração pública ou um documento particular, em regra, típico, com finalidade específica.

Da mesma forma, não é usual a cisão de um contrato em duas partes: uma escrita e outra verbal. Mais do que isso: não é possível que um contrato seja formalizado, ao mesmo tempo, de forma escrita e, de outra, de forma oral; menos ainda, por tratar-se de um encontro de vontades, se os pólos, nas duas frações do ajuste, não forem rigorosamente as mesmas.

Assim, claramente o que se observa é a existência de um ajuste formal, escrito, que reconhece a doação e oficializa a alteração societária; e outro, feito de forma verbal, que vincula apenas o filho donatário, que, com ele, segundo testemunhas, teria aquiescido de forma individual e apartada.

Fixada, portanto, a moldura fática, resta definir o tratamento jurídico a ser aplicado aos fatos comprovados no processo, isto é, o estabelecimento das consequências jurídicas que devem ser aplicadas ao caso concreto.

Inicialmente, deve ser considerado que, se a vontade real do doador era distinta daquela manifestada no instrumento de modificação societária, que também instrumentalizou a doação, é evidente a sua reserva mental. E ainda mais relevante: se as testemunhas comprovam, como, de fato, comprovaram, que o filho donatário sabia que a verdadeira intenção do pai era a de reaver a sua participação societária em momento futuro, pode-se concluir pela existência de claro indício de negócio simulado (art. 167, §1º, II, do Código Civil), pois os demais sócios não foram informados do verdadeiro propósito da transação entabulada, na surdina, apenas entre doador e donatário (pai e filho).

De acordo com o inciso V do art. 1.071 do Código Civil, a modificação do contrato social depende da deliberação dos sócios, que, nos termos do art. 1.076, I, deve ser tomada pelos votos correspondentes a, no mínimo, três quartos do capital social.

Logo, não tendo o doador retirante da sociedade manifestado de forma aberta e formal a sua verdadeira intenção no momento em que formalizou o negócio, não é possível afirmar se ele teria obtido a concordância dos demais sócios em relação àquela alteração societária, caso fosse revelado o real propósito do doador de reaver a sua condição de sócio após o implemento da condição por ele instituída, de forma verbal, unilateral e reservada, e aceita apenas pelo filho beneficiário, que o substituiu na sociedade.

Nesse passo, oportuno ponderar que, embora não se admita - exceto para bens móveis de pequena monta -, que as cláusulas de um contrato de doação possam ser constituídas verbalmente, é possível, na esteira do art. 446, I, do CPC/2015, a utilização da prova testemunhal para comprovar a divergência entre a vontade real e a vontade declarada nos contratos simulados.

Portanto, não pairam dúvidas acerca da existência da combinação entre pai e filho (doador e donatário), mas não é possível o reconhecimento de que o arranjo estabelecido entre os dois tenha o condão de atingir terceiros, que dele não participaram.

Evidentemente, em que pese a existência de comprovação dos ajustes entabulados entre as diferentes partes, não é possível submeter aos demais sócios uma condição inserida num acordo verbal do qual eles não fizeram parte. Como se sabe, o contrato faz lei entre as partes, mas não produz efeitos na esfera juridicamente protegida de terceiros que não tomaram parte na relação jurídica de direito material.

terça-feira, 12 de abril de 2022

"O adquirente de imóvel deve pagar as taxas condominiais desde o recebimento das chaves ou, em caso de recusa ilegítima, a partir do momento no qual as chaves estavam à sua disposição"

 


Processo

REsp 1.847.734-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 29/03/2022, DJe 31/03/2022.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

     
Tema

Despesas condominiais. Posse do imóvel. Entrega das chaves. Recusa ilegítima ao recebimento das chaves. Responsabilidade pelas taxas de condomínio. Adquirente do imóvel.

DESTAQUE

O adquirente de imóvel deve pagar as taxas condominiais desde o recebimento das chaves ou, em caso de recusa ilegítima, a partir do momento no qual as chaves estavam à sua disposição.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

As despesas condominiais, devido à sua natureza propter rem, são obrigações provenientes da própria coisa que recaem sobre o proprietário da unidade imobiliária ou sobre os titulares de um dos aspectos da propriedade - a exemplo da posse -, desde que tenha estabelecido relação jurídica direta com o condomínio. Por tais razões, a responsabilidade pelo pagamento também pode ser transferida para o adquirente do imóvel em caso de inadimplemento do antigo titular (art. 1.345 do CC/2002).

Além disso, nos termos do art. 1.334 do CC/2002, os promitentes compradores e os cessionários de direitos relativos às unidades autônomas são equiparados aos proprietários. Assim, diante da celebração de compromisso de compra e venda, o dever de adimplir as cotas condominiais pode ser tanto do promissário comprador quanto do promitente vendedor, a depender das circunstâncias do caso concreto, sem prejuízo de eventual direito de regresso.

No julgamento do Recurso Especial repetitivo n. 1.345.331/RS, a Segunda Seção desta Corte Superior estabeleceu que o registro do compromisso de compra e venda não define a responsabilidade pelo pagamento das obrigações condominiais, mas a relação material com o imóvel, consistente na imissão na posse pelo promissário comprador e pela ciência inequívoca do condomínio acerca da transação (Tema Repetitivo n. 886).

Seguindo tal linha de raciocínio, o STJ sufragou o entendimento no sentido de que o promitente comprador passa a ser responsável pelo pagamento das despesas condominiais a partir da entrega das chaves, tendo em vista ser este o momento em que tem a posse do imóvel.

Portanto, a posse é o elemento fático que gera para o adquirente do imóvel a obrigação de arcar com as despesas condominiais, haja vista que passa a usufruir - ou tem à sua disposição - toda a estrutura organizada do condomínio. Tanto é assim que, se o condomínio tiver ciência da alienação da unidade imobiliária, afasta-se a legitimidade passiva do proprietário para responder pelas referidas taxas a partir do momento em que a posse passou a ser exercida pelo promissário comprador.

Registra-se que a recusa em receber as chaves constitui, em regra, comportamento contrário aos princípios contratuais, principalmente à boa-fé objetiva, desde que não esteja respaldado em fundamento legítimo. Por sua vez, a rejeição em tomar a posse do imóvel, sem justificativa adequada, faz com que o adquirente das unidades imobiliárias passe a ser responsável pelas taxas condominiais.

Em tais situações, a resistência em imitir na posse (e de receber as chaves) configura mora da parte adquirente, pois deixou de receber a prestação devida pelo alienante (no caso, a construtora). Nessa circunstância, o art. 394 do CC/2002 deixa claro que se considera em mora o credor que não quiser receber o pagamento e/ou a prestação no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer.

Sendo assim, não há fundamento legal para responsabilizar a construtora pelas taxas condominiais se a sua obrigação de entregar as chaves foi devidamente cumprida, ainda que fora do prazo previsto contratualmente.

Dessa forma, o adquirente (promissário comprador ou permutante) deve pagar as taxas condominiais desde o recebimento das chaves ou, em caso de recusa ilegítima, a partir do momento no qual as chaves estavam à sua disposição.

segunda-feira, 11 de abril de 2022

"A empresa que expede convites a jornalistas para a cobertura e divulgação de seu evento, ou seja, em benefício de sua atividade econômica, e se compromete a prestar o serviço de transporte destes, responde objetivamente pelos prejuízos advindos de acidente automobilístico ocorrido quando de sua prestação"

 


TERCEIRA TURMA
Processo

REsp 1.717.114-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 29/03/2022.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL


Tema

Convite para cobertura jornalística. Benefício econômico para empresa. Fornecimento de transporte e hospedagem. Acidente automobilístico. Falecimento de jornalista. Responsabilidade civil objetiva. Teoria do risco. Incidência. Art. 927 do Código Civil.

DESTAQUE

A empresa que expede convites a jornalistas para a cobertura e divulgação de seu evento, ou seja, em benefício de sua atividade econômica, e se compromete a prestar o serviço de transporte destes, responde objetivamente pelos prejuízos advindos de acidente automobilístico ocorrido quando de sua prestação.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A controvérsia centra-se em saber se a montadora de veículos que, ao ensejo de promover o lançamento de um produto no mercado, expede convites a determinados jornalistas para a cobertura e divulgação de seu evento, comprometendo-se a prestar serviço de hospedagem e de transportes aéreo e rodoviário a estes, responde civilmente pelos prejuízos advindos de acidente automobilístico que ceifou a vida de um daqueles jornalistas, ocorrido justamente por ocasião do deslocamento ao evento.

Não se trata, juridicamente, de a montadora ter procedido a um simples envio de convite de cortesia ao grupo de jornalismo, inserto nos chamados contratos benéficos, em que apenas uma das partes aufere benefício ou vantagem, regido pelo art. 392 do Código Civil. A montadora de veículo comprometeu-se a promover o serviço de hospedagem e, no que importa à controvérsia, o de transportes aéreo e rodoviário em favor do grupo de jornalistas, a serem prestados não de modo desinteressado, mas sim com o claro propósito de beneficiar sua atividade econômica, por meio da cobertura jornalística e divulgação do lançamento de seu produto, no que residiria sua remuneração indireta.

A essa finalidade, oportuno trazer à colação especializada doutrina civilista que, ao tratar do chamado transporte de mera cortesia, bem obtempera não se estar diante de tal figura quando a remuneração pelo serviço de transporte dá-se de modo indireto, circunstância que autoriza, nesse caso, a aplicação da teoria do risco proveito.

O modo pelo qual este transporte seria efetivado - se diretamente pela montadora ou por meio de outras empresas contratadas para realização desse serviço - não altera o fato indiscutível de que esta, efetivamente, assumiu a obrigação, perante o grupo de jornalistas, de efetuar o transporte destes para a cobertura do evento de lançamento do produto da montadora.

Para os efeitos perseguidos na subjacente ação indenizatória, em que se discute a responsabilidade da montadora, tomadora do serviço de transporte, e da transportadora, cujo preposto causou o acidente, mostra-se absolutamente indiferente examinar se a empresa de turismo, nos limites ajustados contratualmente, poderia ou não subcontratar o serviço de transporte. Quando muito, esta matéria de defesa poderia autorizar, em tese, o direito de regresso da montadora contra a empresa de turismo, mas não para afastar sua responsabilidade pelos danos advindos de acidente automobilístico por ocasião da prestação de serviço de transporte de pessoas por ela contratado, no seu interesse e em benefício de sua atividade econômica. Tampouco é relevante examinar se a montadora, ao contratar a empresa de turismo incorreu em qualquer modalidade de culpa, in eligendo ou in vigilando, ou mesmo a relação de preposição entre elas.

É, pois, incontroverso que os contratos firmados entre a montadora e a agência de turismo e entre esta e a transportadora, coligados entre si, ostentavam, como finalidade/objeto comum, a prestação do serviço de transporte ao grupo de jornalistas, pelo qual se comprometeu a montadora. As relações internas, estabelecidas no âmbito de cada ajuste, a vincular as partes contratantes, não repercutem, tampouco podem ser oponíveis ao lesado pela prestação deficiente do serviço de transporte contratado pela montadora, no interesse de sua atividade comercial.

A posição jurídica da montadora é, a toda evidência, de tomadora do serviço de transporte de pessoas, contratado no interesse e em benefício de sua atividade econômica. Em face disso, ressai inafastável a sua responsabilidade objetiva pelos danos advindos do acidente automobilístico ocorrido quando de sua prestação, com esteio na teoria do risco, agasalhada pela cláusula geral (de responsabilidade objetiva) inserta no parágrafo único do art. 927 do Código Civil.

domingo, 10 de abril de 2022

Indicação de livro: "20 anos do Código Civil: relações privadas no século XXI", coordenado por Guilherme Calmon Nogueira da Gama e Thiago Ferreira Cardoso Neves


 (...) “Entre os objetivos da obra coletiva, encontram-se (a) o aprofundamento do estudo teórico e a análise das questões práticas decorrentes da aplicação das normas do Código Civil de 2002, não apenas sob o prisma do referencial normativo codificado, mas também da Constituição Federal de 1988 e dos microssistemas legislativos, procedente à qualificação jurídica de novas figuras que têm se destacado na atualidade, nos vários segmentos do Direito Civil e do Direito de Empresa; (b) a análise crítica da aplicação das normas codificadas e extracodificadas também conexas, sob o enfoque da atuação dos tribunais, em especial do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça e dos tribunais em geral, sem descurar da importância da contribuição doutrinária durante as duas décadas desde a edição do Código Civil; (c) a realização de diagnóstico sobre os pontos positivos e os pontos negativos do Código Civil de 2002 e, quiçá, apresentar propostas para aperfeiçoamento das normas jurídicas codificadas.

A obra coletiva se revela fundamental eis que o período de vinte anos desde a edição do Código Civil houve um tempo razoável para identificação dos avanços e dos retrocessos na aplicação das suas normas – ou mesmo da consideração de normas não coerentes com o tempo presente. Ademais, em razão de inúmeros fenômenos da economia, da sociologia, da política, da psicologia, da medicina, entre outras áreas do conhecimento humano, vários institutos, noções e categorias de Direito Civil têm sido repensados, a demonstrar a abordagem inter e multidisciplinar dos temas que impactam no sistema jurídico. A tecnologia e a criatividade humana vêm permitindo a expansão de vários institutos e noções clássicas do Direito Privado, como a título exemplificativo os contratos eletrônicos, os negócios inteligentes, as técnicas de reprodução humana assistida, os danos causados em decorrência dos avanços científicos. Há necessidade de uma visão profunda e crítica das novas necessidades quanto ao tratamento normativo no âmbito do Código Civil.

Desse modo, é plenamente justificável a consolidação do estudo do período de vinte anos desde a edição do Código Civil, de forma sistematizada e multidisciplinar por meio de uma obra única, que aborde os aspectos principais das relações jurídicas que envolvam os institutos, categorias e noções do Direito Civil”.

https://www.editorafoco.com.br/produto/20-anos-do-codigo-civil-2022