DIREITO CONSTITUCIONAL – PROCESSO LEGISLATIVO; COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE; INICIATIVA PARLAMENTAR; MEIO AMBIENTE; PROTEÇÃO DOS ANIMAIS; CONTROLE REPRODUTIVO DE CÃES E GATOS
Proteção dos animais e controle reprodutivo de cães e gatos encontrados nas ruas no âmbito estadual - ADI 4.959/AL
ODS: 3, 11 e 15
Resumo:
É constitucional — por não violar a reserva de iniciativa do chefe do Poder Executivo para projetos de lei que envolvam a criação de órgãos, cargos e funções na Administração Pública (CF/1988, arts. 61, § 1º, “a” e “e” e 84, VI, “a”) — lei estadual, de iniciativa parlamentar, que dispõe sobre a proteção e a defesa de animais e o controle de reprodução e regulamentação da vida de cães e gatos encontrados nas ruas.
Não obstante a legislação questionada estabeleça política pública que gera para o poder público atribuições e despesas, ela não cria órgão nem disciplina a estrutura da Administração. Nesse contexto, esta Corte já decidiu que a mera possibilidade de uma proposição parlamentar ter como consequência o aumento de despesas para a Administração não se revela circunstância suficientemente apta a caracterizar violação à cláusula de reserva de iniciativa do Poder Executivo (1).
Ademais, a proteção da fauna e do meio ambiente se insere na competência legislativa concorrente da União, dos estados e do Distrito Federal (CF/1988, art. 24, VI), bem como na competência administrativa comum da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios (CF/1988, art. 23, VI e VII).
A lei estadual questionada institui também política que assegura direitos fundamentais, como a saúde pública, ao evitar a disseminação de doenças, sem constituir, entretanto, óbice à atuação suplementar dos municípios relativamente às suas particularidades para tratar de interesses locais.
Com base nesses entendimentos, o Plenário, por unanimidade, julgou improcedente a ação direta para declarar a constitucionalidade da Lei nº 7.427/2012 do Estado de Alagoas.
(1) Precedente citado: ARE 878.911 RG (Tema 917 RG)
(2) Lei nº 7.427/2012 do Estado de Alagoas: “Art. 1º Fica instituída no âmbito do Estado de Alagoas a adoção de medidas sanitárias e de proteção que objetivam o controle reprodutivo de cães e gatos na forma regulamentada por esta Lei. Art. 2º As medidas sanitárias e de proteção serão realizadas através da: I – identificação e registro do animal; II – esterilização cirúrgica; III – adoção de campanhas educacionais para a conscientização pública da realização das atividades descritas nos incisos I e II. Art. 3º É vedada a eliminação da vida de cães e gatos pelos Órgãos de controle de zoonoses, pelos canis situados no Estado de Alagoas e por estabelecimentos congêneres, à exceção da eutanásia. Art. 4º A eutanásia só será permitida em caso de males, doenças graves, enfermidades infectocontagiosas incuráveis que coloquem em risco a saúde dos seres humanos ou de outros animais e deverá obrigatoriamente: I – ser justificada por laudo do responsável técnico dos órgãos. canis e estabelecimentos congêneres regulamentados por esta Lei; II – o laudo descrito no inciso I, nos casos em que se façam necessários para diagnóstico dos males, doenças graves e enfermidades infectocontagiosas, deverão ser precedidos de exame laboratorial; III – os documentos descritos nos incisos I e II deste artigo ficarão à disposição das entidades de proteção dos animais. Art. 5º Caso o animal recolhido não se enquadre nas hipóteses em que é permitida a eutanásia, conforme disciplinado no art. 4º, ele permanecerá à disposição do seu proprietário ou cuidador pelo prazo de setenta e duas horas, oportunidade em que será esterilizado. Parágrafo Único. Vencido o prazo disposto no caput deste artigo, o animal não resgatado será disponibilizado para adoção e registro após sua identificação às entidades de proteção dos animais ou a pessoa física mediante a assinatura de termo integral de reponsabilidade pelo adotante. Art. 6º O animal de rua com histórico de mordedura, injustificada e comprovada por laudo médico, será inserido em programa especial de adoção, de critérios diferenciados, prevendo assinatura de termo de compromisso pelo qual o adotante se obrigará a cumprir o estabelecido em legislação específica para cães bravios, a manter o animal em local seguro e em condições favoráveis ao seu processo de ressocialização. Parágrafo Único. Caso não seja adotado em noventa dias, o animal poderá ser eutanasiado. Art. 7º É proibido abandonar animais em qualquer área pública ou privada. Parágrafo Único. O(s) animal(is) que não possa(m) ser mantido(s) por seu proprietário será(ão) encaminhado(s) ao Serviço Médico Veterinário e de Controle de Zoonoses, ou outra instituição adequada à sua adoção, pública ou privada, que tenha por finalidade a proteção e manutenção de animais. Art. 8º Caso o cão venha a ser um animal comunitário, para os fins desta Lei é o cão que estabelece com uma determinada comunidade laços de dependência e manutenção, embora não possua responsável único e definido, será esterilizado e registrado. Parágrafo Único. O cão comunitário poderá ser devolvido à comunidade de origem mediante a assinatura de termo integral de responsabilidade por um cuidador especial. Art. 9º O recolhimento dos animais descritos nesta Lei observará os procedimentos protéticos de manejo, transporte e averiguação da existência de proprietário, do responsável ou do cuidador na sua comunidade. Art. 10. Para efetivação desta Lei, o Poder Público poderá viabilizar as seguintes medidas: I – destinação, por órgão público, de local para a manutenção e exposição dos animais disponibilizados para adoção, que será aberto à visitação pública, onde os animais serão separados conforme critério de compleição física, de idade e de temperamento; II – os animais não adotados passarão a ser de responsabilidade do Estado de Alagoas em local e assistência incluindo se for o caso tratamento adequado; III – campanhas que conscientizem o público da necessidade de esterilização, de vacinação periódica e de que o abandono, pelo padecimento infligido ao animal, configura, em tese, prática de crime ambiental; e a prática de maus tratos que significa toda e qualquer ação voltada contra os animais que implica em crueldade, especialmente ausência de alimentação mínima necessária, excesso de peso de carga, tortura, uso de animais feridos, submissão a experiências pseudocientíficas, e o que mais dispõe o Decreto Federal nº 24.645, de 10 de julho de 1.984 (Decreto de proteção dos animais); IV – orientação técnica aos adotantes e ao público em geral para os princípios da tutela responsável de animais, visando atender às suas necessidades físicas, psicológicas e ambientais; V – solicitar e acompanhar as ações dos órgãos da Administração, Direta ou Indireta, que têm incidência no desenvolvimento dos programas de proteção e de defesa dos animais; VI – propor alterações na legislação vigente para a criação, transporte, manutenção e comercialização, visando aprimorar e garantir maior efetividade no respeito ao direito legítimo e legal dos animais, evitando-se a crueldade aos mesmos e resguardando suas características próprias; VII – solicitar ações que visem, no âmbito do Estado, junto à sociedade civil, a defesa e a proteção dos animais. Art. 11. O Poder Executivo deverá regulamentar a presente Lei. Art. 12. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 13. Revogam-se as disposições em contrário.”
ADI 4.959/AL, relator Ministro Nunes Marques, julgamento virtual finalizado em 18.10.2024 (sexta-feira), às 23:59